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​Para Essa Galera de São Paulo, Ferguson É Aqui

Protesto em São Paulo reuniu 800 pessoas na Praça da República contra o genocídio da população jovem e negra do Brasil.

Cada vez mais protestos estão pipocando em Ferguson, no resto dos EUA e no mundo contra o racismo institucionalizado da polícia, cujo estopim foi a absolvição do policial que atirou contra o jovem negro Michael Brown. Em São Paulo, diversas frentes de lutas se solidarizam com a causa e organizaram um protesto chamado "Ferguson É Aqui" que aconteceu nesta quinta-feira (18) na Praça da República.

O fotógrafo Felipe Larozza acompanhou o ato e conversou com diversos organizadores da manifestação, que se uniram para chamar atenção de que no Brasil casos como Ferguson são rotina diária de negros, moradores ou não da periferia.

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Segundo Juninho, membro do movimento Círculo Palmarino, a revolta dos estadunidenses foi aproveitada para discutir a violência policial brasileira. "Nós fizemos um gancho para debater uma coisa que está acontecendo há muito tempo no Brasil. Se lá três ou quatro foram mortos e 1 milhão de pessoas foram para a rua, aqui, só em 2012, foram 77% dos jovens mortos no Brasil eram negros," explica ele.

Após a concentração com uma trilha sonora apropriada, incluindo "Nego Drama" dos Racionais MC's, a marcha começou a andar rumo à Secretaria de Segurança Pública, na Rua Líbero Badaró.

Muitas bandeiras se uniram para protestar contra os números assustadores de mortes de jovens negros. "A importância de tudo isso aqui é que nunca foi tão expressivo a periferia exclamar que tem voz e (…) cada vez mais chegar com mais força," disse Wellington Lopes do Coletivo UniAfro.

Segundo o Mapa da Violência, que trouxe dados referentes ao ano de 2012, 82 jovens morreram por dia, somando um total de 30 mil por ano - 77% são negros. Um número disparadamente maior que a taxa de homicídios dos EUA. "O Brasil não fica atrás em mortes de jovens negros. Ano após ano muitas movimentações acontecem e ainda só aumenta essa taxa," explica Ananda Felisberto do Levante Popular da Juventude.

"Nós somos vítimas de repressão todos os dias, e não só nas periferias. A manifestação de hoje representa que, apesar de toda a repressão, a periferia não vai se calar e ela quer justiça," disse Jussara Basso, pertencente à coordenação estatal do MTST que apareceu em peso no centro da cidade.

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"No período nós recebemos muita repressão nas ocupações. Na ocupação Carlos Marighella por exemplo, armas de fogo foram usadas, jovens foram muito espancados pela polícia. Na Vila Nova Palestina, um policial chegou com uma arma para atirar na cabeça de um morador da ocupação, ele só não atirou porque tinham muitas testemunhas, mas ele falou que voltaria e mataria. E não mataria só um, mataria vários," continua.

A dificuldade de conseguir reunir moradores da periferia também é uma questão. "Mobilizar a periferia é muito difícil. Nós perdemos para todos os lados. Perdemos para o tráfico, para a polícia," explica Ananda que apontou também a importância da presença de jovens e estudantes na manifestação.

Além de diversas frentes do Movimento Negro do Brasil, punks circulavam entre a manifestação e também alguns black blocs. O clima continuou tranquilo por boa parte do caminho, quase não se viu polícia.

Muitos nomes eram mencionados durante a marcha, como Claudia Silva Ferreira, Amarildo e Douglas Rafael da Silva Pereira o dançarino do programa Esquenta, assassinado pela PM do Rio de Janeiro. Todos cidadãos e negros, mortos conta da brutalidade policial. Um símbolo, assim como Michael Brown do extermínio de negros no país.

Um pouco antes de chegar na Prefeitura de São Paulo, os participantes deitaram no chão do Viaduto do Chá com as duas mãos colocadas em volta pescoço em alusão ao menino de Fergusona Eric Garner de 43 anos de idade, morto pela polícia, que antes de morrer repetiu diversas vezes "não consigo respirar".

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Chegando ao destino final, 800 pessoas, segundo a Polícia Militar, se reuniram na frente da Secretaria de Segurança Pública. De acordo com a mesma, nenhum representante desceu por não saberem que o protesto aconteceria e que, segundo eles, os manifestantes bloquearam a porta impedindo a saída.

A Força Tática e a Tropa de Choque chegaram a dar as caras na Rua Líbero Badaró, mas não houve nenhum atrito.

Embora o clima obviamente fosse de tensão, talvez o incidente em Ferguson tenha servido mais do que inspiração para um único protesto no Brasil – acabou sendo um capítulo importante para a união de diferentes correntes em torno de uma pauta coesa. "(..) É uma luta muito importante. É uma unidade de respeito a uma pauta unitária, em relação à violência que os jovens sofrem quando se manifestam na rua e que precisa seguir em frente," finaliza Jussara.

Veja mais fotos do Felipe Larozza aqui e siga a Marie Declercq no Tumblr.

ATUALIZAÇÃO: Uma versão anterior deste artigo afirmava que o gesto de asfixia era uma alusão à Ferguson. Agradecemos aos nossos leitores pela retificação.