FYI.

This story is over 5 years old.

Noticias

PM É Acusada de Racismo Após Divulgar Panfleto Para Crianças

A PM diz que o panfleto foi criado "por um cartunista policial militar – negro, destaque-se".

Crédito: Reprodução/Facebook

Era uma terça-feira (4) de agosto quando a educadora social Thaís Rosa resolveu abrir o material que a filha de sete anos havia recebido da Circo Escola Diadema, na região metropolitana de São Paulo. Intitulado "Dicas Para a Sua Residência", o folder impresso e distribuído pela Polícia Militar do Estado de São Paulo trazia a imagem de um sujeito negro, com cabelo black power e uma arma em punho, prestes a assaltar uma residência. Ao ver a imagem, a criança chegou a comparar o ladrão com um de seus parentes por conta da aparência. "Parece o tio", disse para a mãe.

Publicidade

Thaís, também integrante do coletivo DiadeNêga, passou os olhos pelo folder e reparou que havia um outro negro na ilustração, simbolizando um vigia despreparado. A menina fez outra comparação: "Parece um macaco, mãe". Os outros personagens são policiais e civis, todos brancos. "Eu me senti desrespeitada enquanto mulher negra, enquanto mãe que leva sua filha pra escola pra ter educação, e o que ela recebe é um estereótipo do seu próprio povo representado como desqualificado", relata a educadora, que fez fotos do panfleto e divulgou no Facebook.

Por e-mail, a assessoria de imprensa da PM informa que o material é antigo e já foi tirado de circulação. Eles disseram também que o panfleto foi desenhado "por um cartunista policial militar – negro, destaque-se". A nota frisa que "as ilustrações foram concebidas sem qualquer intenção preconceituosa racial, até porque, na Polícia Militar, instituição orientada por princípios de Direitos Humanos, grande parte do efetivo é afrodescendente".

Para a educadora social, a resposta não parece suficiente. "A abolição aconteceu há muito tempo. Racismo no Brasil é crime há muito tempo. Dizer que esse material é antigo… é de quando? Da época da escravidão? Não justifica."

O fato de um policial negro ter assinado as ilustrações também não parece amenizar a indignação de Thaís. "Ele é vítima de todo o sistema racista que vivemos nesse país", falou.

Crédito: Reprodução/ Facebook

Publicidade

Embora a polícia justifique que "a paleta de cores utilizada nas ilustrações exprime as diversas nuances da epiderme do povo brasileiro, podendo variar do claro ao escuro em qualquer personagem, não importando o papel, contexto ou função que desempenha em cada cartoon", Thaís discorda. "A criança ainda não tem capacidade intelectual de contextualizar aquilo. Ela vai ver a imagem mostrando o policial branco como protetor e as pessoas brancas como quem sofre com a violência. O negro é representado como o violento e o desqualificado."

Amanhã (14), a educadora e militante do movimento negro irá se encontrar com representantes da Defensoria Pública de São Paulo para encaminhar a denúncia. Ela também já entrou em contato com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) da cidade de Diadema, que possui um comitê de igualdade racial.

Negro, pai de um menino de quatro anos e amigo de Thaís, Thiago Fernandes, integrante do Coletivo Hip Hop Diadema, se sensibilizou com o ocorrido. "Por que a pessoa representada como criminoso sempre tem a pele escura? Por que esse padrão não muda?", disse à VICE por telefone. "Pra muitos, aquilo pode passar despercebido. Mas, pra nós, que somos negros periféricos e sabemos que o Estado age de uma forma violenta, percebemos na hora que tem um racismo institucional naquele panfleto."

A PM justifica que a retirada dos panfletos "foi motivada pelo objetivo de evitar interpretações equivocadas e oportunistas que nada contribuem para a questão racial". Thiago dá sua opinião: "As pessoas acham que você tá com mimimi. Isso já tá tão introjetado na cabeça do povo brasileiro, que ele acaba cometendo racismo e não percebe".

Thaís segue divulgando o acontecido e quer esclarecimentos oficiais. "Esse material é discriminatório, é preconceituoso e não pode ser passado para as crianças nem pra ninguém. Tem de ser retirado e tem de ser feita uma retratação."