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Desporto

O wrestling é uma cena séria

Não é preciso ler as mitologias de Barthes para saber que o wrestling não é um desporto.

Na minha juventude o wrestling teve um papel importante. Muitas das minhas manhãs de sábado foram passadas na companhia do Tarzan Taborda, que relatava as emissões da então WWF americana. Ele convenceu-me, entre outras coisas, de que nunca tinha perdido um combate.

Só eu sei o quanto vibrei com os lutadores a sério da década de 90. Gajos como o Randy “Macho Man” Savage a partir a boca a otários como o Shawn Michaels eram o meu pequeno-almoço. Nos últimos tempos tenho andado desligado da coisa, mas não o suficiente para não me confrontar com a decadência do Ric Flair e do Hulk Hogan e com aparecimento de monstros como o Batista.

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A tour da WWE passou por Lisboa e eu queria reencontrar velhas glórias e descobrir novos talentos. No Pavilhão Atlântico percebi, sem preconceitos, que hoje a maior parte dos interessados são crianças e pré-adolescentes. A WWE nem tem nada que se queixar. Sábado foi dia dos avós acompanharem os netinhos à porrada — bom negócio.

Ainda assim, o pavilhão não encheu e temi pela qualidade do espectáculo. Felizmente, fiquei mais descansado quando vi que o cantor/apresentador/wrestler Axel estava por lá. Para mim, Axel é selo de qualidade. Fiquei num bom lugar e foi bom ver

superstars

mesmo à minha frente. O show abriu com um combate tag-team. O Rey Mysterio e o Sin Cara são mexicanos e os mexicanos curtem voar, portanto houve acrobacias e não faltou o 619 (um golpe que implica o uso das cordas para um uma patada rotativa dupla na cara dos adversários).

Ainda na primeira parte, o Wade Barrett lutou com outro fulano qualquer, não interessa quem. O Wade Barrett é o tipo de gajo que eu admiro porque me faz lembrar as velhas glórias. A distância entre o Wade Barrett e o Razor Ramón mede-se pelo palito que o segundo usava enquanto esmagava os adversários. Acreditem, este Barrett dá socos mesmo potentes. Foi muito fixe vê-lo sovar o outro gajo.

As “divas” também lá estiveram e os piropos surgiram naturalmente. A confusão das gajas não me entusiasma. Pelo contrário. É tudo tão denunciado e os gritinhos e as estaladas não fazem sequer parte daquilo a que eu chamo luta. Mesmo assim fiquei admirado com os putos. Empenharam-se mesmo em gritar “Natalya, you suck!” e não quebraram com as aberturas de pernas.

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Randy Orton e o Alberto del Rio trouxeram o último duelo da primeira parte. Estes gajos têm muita experiência. O Alberto del Rio é uma grande personagem. Ao contrário de Randy Orton, é um comunicador e está sempre a desafiar o público. É um arrogante riquinho e tem muita piada. Além disso, traz sempre o seu criado, o Ricardo Rodriguez, que é um palhaço que faz jogo sujo e que o ajuda a ganhar os combates quando os árbitros estão “distraídos”. Infelizmente, a dupla perdeu. Uma pena. O golpe final do Randy Orton é miserável. O RKO é um golpe que não lembra a ninguém e aposto que o próprio se aleija mais que os adversários.

A segunda parte trouxe o The Miz, um estiloso lutador que tem a mania que é estrela. Ainda bem que o Kofi Kingston o despachou com um chuto na boca. No final, Big Show vs Sheamus. O Big Show é um gigante do tempo do Hulk Hogan. Aliás, fez equipa com ele (nos nWo) quando o Hulk Hogan era mauzão. Como devem imaginar, o Big Show já teve todos os papeis possíveis no universo wrestling. Neste momento é mau e foi altamente vê-lo lutar. No final perdeu por

desqualification

(como dizem os putos) porque usou o árbitro como escudo — como se isso fosse preciso.

O wrestling traz-nos emoções e o melhor caminho para as sentirmos é acreditarmos nelas. Não é preciso ler as mitologias de Barthes para saber que o wrestling não é um desporto, é um espectáculo e é uma cena séria.