Os discos que mudaram a vida de músicos portugueses da nova geração
Foto por Sérgio Felizardo

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Música

Os discos que mudaram a vida de músicos portugueses da nova geração

Do rock, ao R&B, da pop mais ligeirinha, aos primórdios do metal progressivo, fizemos uma viagem aos discos que marcaram a infância e a adolescência daqueles que, hoje, fazem parte da linha da frente da música feita em Portugal.

A questão eterniza-se: estão os discos em vias de extinção? As constantes notícias sobre a sua morte têm sido bastante exageradas, até porque, de qualquer maneira, os discos que sucessivamente marcaram as gerações anteriores, continuam a chegar às mais novas, seja via MP3, Youtube ou streaming.

Os formatos físicos, todavia, já se sabe, são o sonho molhado de qualquer nostálgico. Quando metíamos a cassete todinha dentro daquele walkman e a ouvíamos do princípio ao fim, quando segurávamos nas mãos os discos de vinil e os colocávamos a tocar nos gira-discos - não lhes chamem leitores de vinil, por favor -, quando levávamos connosco aqueles discman grandalhões e até os mini-disc, que um dia alguém se vai esquecer que existiram.

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Vitor Espadinha diria: "Sim, eu sei, é triste viver de recordações", mas também é certo que estas coisas foram importantes nas vidas das pessoas. Por isso mesmo, juntámos um leque de artistas que, apesar de fazerem parte da nova geração da música feita em Portugal, cresceram a ouvir música em formato físico e pedimos-lhes para falarem sobre os discos que os marcaram. É ler, porque, não se esqueçam, já todos fomos crianças.

MOULLINEX

Foto cortesia Moullinex

"O Songs in the Key of Life, de Stevie Wonder, entrou na minha vida através da 'Isn't She Lovely'. A primeira cópia chegou pela mão de alguém que, provavelmente, não fazia ideia da relação que eu viria a ter com este disco e com o Stevie.

É um álbum duplo que marca a sua emancipação (etária) e a libertação dos espartilhos da Motown e reúne canções incríveis, experimentalismo, mensagens políticas intemporais e uma instrumentação incrível. Tem-me acompanhado toda a vida desde então e, a cada escuta, descubro um novo detalhe que me fascina".

SURMA

Forto cortesia Surma

"Sempre estive muito ligada à música country, folk e jazz dos 60s, desde muito pequena. O meu pai tem uma colecção imensa de discos de vinil e CDs dessa altura e sempre me incentivou a consumir muita música.

Passava os dias sentada no tapete da cave a ouvir CDs. Desde Beatles a Johnny Cash, Bob Dylan, a Miles Davis e Coltrane. Escolhi o disco do Hank Williams pois era aquele que ouvia mais quando era miúda. Pelo que a minha mãe me disse, o meu pai uma vez pôs o disco a tocar, tinha eu cerca de quatro anos e, depois disso, pedia sempre o mesmo. (risos) Ouvia-o todos os dias, talvez pela voz dele, ou pela calma que a música me transmitia. É um dos discos que me acompanha desde então".

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Foto cortesia Alex D'Alva Teixeira

"Cresci no seio de uma família um pouco conservadora devido à tradição cristã e, por isso, houve uma altura em que os meus pais não me permitiam ouvir música que não tivesse uma ligação com a doutrina religiosa que era ensinada em casa. Havia muita coisa que só podia ouvir em casa dos vizinhos da rua onde vivia, ou até mesmo às escondidas, nos momentos em que os adultos não estavam presentes. Só nessas alturas podia ser eu a escolher a estação de rádio e os canais de televisão por cabo dedicados à música.

Desde a primeira vez que ouvi Nirvana, senti que queria fazer o que Kurt Cobain estava a fazer: pegar numa guitarra e fazer música com intensidade. Queria de algum modo ser capaz de despertar noutras pessoas as mesmas emoções que a música desta banda despertava em mim. Ainda hoje, sempre que ouço as canções de Nevermind, sinto-me inspirado e cativado como se fosse a primeira audição.

Embora não haja a sensação de surpresa, ainda há sempre o mesmo fascínio e entusiasmo que sentimos ao experimentar algo único e intemporal. Provavelmente foi por causa dos Nirvana que percebi que teria de aprender a tocar um instrumento para ser capaz de fazer as minhas próprias canções, pois só assim seria capaz de realizar o meu sonho de ser vocalista de uma banda. Felizmente, hoje, essa é a minha realidade. Tenho uma banda com o meu melhor amigo e fazemos música juntos. Também podia falar sobre o primeiro álbum das Spice Girls, mas não o consigo encontrar…".

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Foto cortesia Rodrigo Gomes

"O single dos Video Kids, 'Woodpecker From Space', é um dos discos que mais me marcou na infância. Foi o primeiro disco que comprei. Ou melhor, que o meu pai me comprou, porque estávamos em 1985 e eu tinha quatro anos. Num dos passeios que dávamos ao domingo na antiga Feira do Relógio, em Chelas, pedi-lho.

Foi numa altura da febre do Break Dance. O meu pai chegava a casa do trabalho e eu pedia-lhe para ele pôr o disco, depois ele pegava-me pelas pernas, eu ficava com a cabeça no chão e ele rodava-me como se eu fosse um break dancer pro, coisa impossível para um miúdo de quatro anos, obeso, fazer sozinho".

VIOLET (A.M.O.R.)

Foto cortesia Violet

"Tinha 12 ou 13 anos quando o The House of Rythm saiu e comprei-o logo. Obrigada, mãe! A música house e o techno estavam a ter um momento enorme em Portugal e DJs como o Luís Leite, residente do mítico clube Alcântara-Mar, que gravou este mix, ou DJ Vibe, Jiggy, Ze MigL, XL Garcia, dominavam a cena.

É incrível pensar que esta música passava no Top+ - este CD vendeu 30 mil cópias, se não estou em erro - e que chegava a camadas tão jovens, que na altura apenas sonhavam em um dia poderem ir a raves (check). O que me emociona neste disco é a crueza quase naive das músicas escolhidas e as mixing skills incríveis de LL. Sei este mix de trás para a frente há 20 anos. Não posso dizer isso de mais mix nenhum e sou DJ".

DA CHICK

Foto cortesia Da Chick

"Este disco viu-me crescer. Era o tipo de cena que o meu pai me dava a ouvir em casa, ou no carro e que eu, encarregue pela playlist de Natal, punha a tocar para a família.

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Tem mesmo um significado muito especial para mim e ainda hoje me sabe bem ouvi-lo. Ensinou-me muito, de uma forma talvez inconsciente".

ZÉ PEDRO (HOLOCAUSTO CANIBAL)

Foto cortesia Zé Pedro

"A par do single da Sandra, one hit wonder nos anos 80, com 'Maria Magdalena', que entretanto se encontra em paradeiro incerto, Stand Up, dos Jethro Tull, foi, sem dúvida alguma, o disco que mais rodou no meu gira-discos durante a meninice.

Nessa altura o meu impulso de adquirir música, ou, mais provavelmente, de pedir para me ofertarem, prendia-se essencialmente com a capacidade que as capas dos trabalhos tinham de me cativarem de alguma forma. O conteúdo musical, esse, só era descoberto posteriormente. Se no caso da sedutora Sandra os motivos foram óbvios, no caso dos Jethro Tull o impulso consumista foi atiçado pela figura central da banda em pop up à qual me rendia de imediato sempre que abria e fechava o gatefold - ciclicamente, diga-se.

Depois das primeiras audições fui-me rendendo também à música, sobretudo pela diversidade de estilos incorporados, ancorados no blues e hard rock, mas indo muito mais além nos meandros progressivos. Lembro-me também dos solos entusiastas, os quais replicava avidamente, fosse em air guitar, fosse numa inofensiva vassoura, sem falhar uma única nota, claro!".

LUCÍA VIVES

Foto cortesia Lúcia Vives

"Por volta de 2010, no meu 5º/6º ano, arranjei um leitor de mp3 do Sporting para poder ouvir Sum 41. Foi a primeira banda de que gostei mesmo. Das primeiras vezes que me senti mesmo "badass" com música.

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Foi também a primeira banda que vi ao vivo. Com o meu pai. Detestou. Bazámos antes do fim porque estava chateado comigo. Adorei".

JOSÉ PENACHO (MARVEL LIMA)

Foto cortesia José Penacho

"Conheci os Beatles através de uma professora de inglês numa aula do 5º ano. Já tinha ouvido falar, mas nunca tinha ligado muito. A partir dessa aula nunca mais os larguei e são das minhas bandas preferidas, se não mesmo A banda.

Todos os fãs de Beatles têm o seu Beatle preferido, o meu é o George Harrison. Não é por acaso que a minha música preferida deles é a 'Something'. Desde a voz, ao estilo de tocar, sempre subtil, mas de carácter muito próprio, foi uma figura bastante marcante na minha escola do rock n' roll.

Outono Soundsystem

Escusado será dizer que no meu top 10 também está o All Things Must Pass, o magnum opus da sua carreira a solo, disco esse que a minha namorada me ofereceu recentemente (obrigado Sara). É um álbum em que Harrison teve toda a liberdade musical e mostrou realmente que sempre esteve ao nível de composição de Lennon ou de McCartney".

VAIAPRAIA

"Comprei o Cookbook, de Missy Elliott, quando estava a voltar de umas férias numas termas perto de Felgueiras. Fazia termas por causa da sinusite. Parámos numa bomba de gasolina a voltar para Setúbal e pedi ao meu pai para me oferecer o CD, que miraculosamente lá pairava, e ainda bem que ele ouviu as minhas preces.

Já conhecia a Missy Elliott da televisão. O vídeo dela com a Ciara… hum, incrível! Acho-a mesmo poderosa e contagiante, apesar não saber muito sobre a carreira dela, a sua vida pessoal, ou o seu posicionamento político. Não obstante, o R&B que passava na MTV nessa altura era delicioso. Tantas tardes livres a ver o 'Total Request Live' e a dançar em frente à televisão. Bem, e que programa ridículo era aquele, agora que penso".

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TERESA CASTRO (MIGHTY SANDS e CALCUTÁ)

Foto cortesia Teresa Castro

"Quando era pequena não ouvia muita música. E, agora que penso nisso, acho que é porque os meus pais não costumavam pôr música em casa. Gravava em cassetes as músicas que gostava da rádio. Às vezes eu e o meu irmão mais velho comprávamos uns CDs, tipo as compilações NOW!, ou os Greatest Hits dos Iron Maiden.

Quando comecei a ligar mais a música, para aí em 2007, tinha 12 ou 13 anos e, claro, já tínhamos Internet. Acho que foi no MSN que um rapaz que nem conhecia me enviou uma pasta com algumas músicas dos NOFX, Offspring e, mais importante, a 'Lithium', dos Nirvana. Quando chega ao primeiro "yeah yeah yeeaaah" a minha vida muda para sempre. Saquei música a música o álbum Nevermind e ouvia-o no meu Creative Zen o dia todo, todos os dias.

Só mais tarde é que o tive em formato físico. Descobrir a electricidade na música e toda aquela raiva foi revolucionário para mim. Gosto de saber que tenho isso em comum com imensa gente".


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