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Música

Slowly Exploding: uma Década da Perc Trax com os Artistas que Definiram a Gravadora

A gravadora que se estabeleceu como uma das labels essenciais da dance music no Reino Unido lança uma coletânea para comemorar dez anos na ativa.

Neste mês, a Perc Trax completa dez anos e, para marcar a ocasião, a gravadora está lançando uma compilação de novos e antigos lançamentos. O titulo da coletânea, Slowly Exploding, é em muitos sentidos uma descrição precisa da evolução do selo ao longo da última década. De forma gradual, a Perc Trax se estabeleceu como uma das gravadoras essenciais de dance music do Reino Unido, ganhando destaque não com uma explosão de hype, mas com uma espécie de detonação capturada em câmera lenta. Apesar que o mesmo não pode ser dito da música do selo: não há nada de moderado nos sons techno e industrial pelos quais a Perc Trax ficou conhecida.

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Para Ali Wells, que fundou o selo inicialmente como uma plataforma para os seus lançamentos como Perc, o sucesso foi uma surpresa. Como ele disse ao Resident Advisor em 2011: "Eu pensava que o selo só faria um lançamento e eu perderia um monte de dinheiro, pararia e ficaria com uns 500 ou 600 discos encalhados na minha garagem". Em parte, a longevidade inesperada do selo se deve ao empenho de Wells em trabalhar o nome dos artistas no seu catálogo. Artistas proeminentes hoje, como Sawf e Forward Strategy Group, por exemplo, fizeram sua estreia no selo. A aversão de Wells à familiaridade também garantiu um nível de imprevisibilidade, como a parceria surpresa, no ano passado, com as lendas do industrial do Einstürzende Neubauten.

Embora a gravadora seja mais comumente associada com um techno nervoso, os seus lançamentos seguidamente carregam influências de fora do gênero, incorporando EBM, noise, industrial e drum and bass. Do mesmo modo, o som brutal e via de regra descompromissado do selo é suavizado pela abordagem leve dos seus lançamentos, seja com "Pure & Simple", do Perc, atraindo comparações inapropriadas com a banda de pop dos anos 90 Hear'Say, a faixa inexplicavelmente intitulada "Violence Delays Cous Cous Time" (algo como "a violência atrasa a hora do cuscuz"), do Jean Ramesse, ou o humor negro de "David George", do Perc, com as suas cacarejantes vozes agudas evocando a terrível dupla de Bullingdon.

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Ao longo dos últimos três anos, a Perc Trax cristalizou uma estética própria, embora seja difícil ainda antecipar os rumos que a gravadora irá tomar. Há uma certa tensão entre as ambições de Wells para o selo e o seu desejo de desafiar as expectativas, muitas vezes predominando este último. Como o próprio Wells disse ao Quietus: "Não quero que todo lançamento seja um hit… Precisa ser um pouco dissonante, e eu posso estar com 30 e tantos anos agora, mas quero que algumas faixas irritem os meus pais, esse tipo de coisa".

Para comemorar os dez anos da Perc Trax, pedimos a alguns artistas do selo que nos falassem sobre o seu lançamento favorito, excluindo, é claro, os seus próprios. As contribuições vêm de uma variedade de nomes de peso como Truss, Forward Strategy Group e Sawf, e de artistas recém-chegados como Mondkopf e Martyn Hare. Também contribuímos com algumas escolhas próprias.

A ESCOLHIDA DO MONDKOPF: PERC - "LONDON, WE HAVE YOU SURROUNDED"

"O meu lançamento preferido da Perc Trax provavelmente é o primeiro disco do Perc, Wicker & Steel. Acho que ele me salvou do tédio que o techno e a música eletrônica em geral estavam me causando, porque ela parecia estar estagnada na época. Perc sempre teve uma abordagem única em relação ao techno – brutal, pesada e urbana – baseada nas suas próprias experiências em Londres e na Inglaterra. O disco é suor, metal, porrada de concreto, sangue enferrujado jorrando. É uma visão muito pessoal que me inspira."

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A ESCOLHIDA DO THUMP: PETE SWANSON - "PLEASURE AVERSE" FROM FERAL GRIND

Considerando a recente afinidade entre as cenas techno e noise, com muitos lançamentos da Perc Trax transitando entre as duas, é adequado que Wells tenha escolhido explorar esta intersecção com uma coletânea intitulada Feral Grind.

Lançada no ano passado, Feral Grind é uma coleção de onze faixas de alguns artistas de noise conhecidos como Prostitutes, Hive Mind e Pete Swanson e outros não tão famosos. A compilação feita por Wells ao lado do jornalista Justin Farrar não é, como você pode imaginar, uma seleção de faixas que penda mais para o lado mais de pista do noise, mas uma representação do espectro todo. Uma das faixas que mais se destacam é "Pleasure Averse", do Pete Swanson. A faixa rende uma comparação com o techno graças às suas frequências oscilantes, quase semelhantes a de um locked groove, embora a improvisação com sintetizadores que sustenta a melodia soe como psicodelia ligada numa corrente de alta voltagem.

Em alguns aspectos, a compilação oferece um dos melhores insights da estética da Perc Trax. Todos os lançamentos da gravadora parecem, de alguma forma, seja em som ou sensibilidade, tão ligados ao industrial dos anos 90 quanto aos pioneiros do gênero dos anos 70 e 80 como Cabaret Voltaire, Throbbing Gristle e Coil. Nesse sentido, Feral Grind parece uma afirmação das influências que moldaram a música do selo.

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A ESCOLHIDA DO PATRICK WALKER, DO FORWARD STRATEGY GROUP: SAWF - "GOVES"

"Para mim, uma das faixas que mais se destacam na nova coletânea da Perc Trax é "Goves", do Sawf. É um pouco mais acessível do que a maior parte do que ele produz e excepcionalmente linear para o estilo dele, mas a coisa toda me lembra das músicas que o Ade Fenton e o Chris McCormack costumavam fazer. Os stabs são incríveis, a música tem um feeling quase de animação – o que de novo é bastante incomum para o Sawf, que costuma ter uma intensidade mais violenta. Vou tocar essa danada por um bom tempo – é libertadora!"

A ESCOLHIDA DO DONOR/TRUSS: FORWARD STRATEGY GROUP - "WE'RE LOOKING FOR MANPOWER"

Truss: "Eu podia ter escolhido qualquer faixa do FSG do catálogo da Perc Trax, em particular "Ident", que, por acaso, é uma das músicas mais bonitas que eu já ouvi. Mas "We're Looking For Manpower" está em primeiro lugar na minha lista. Uma progressão de acordes de órgão capaz de induzir a um transe sobre uma percussão estrondosa resulta numa faixa techno de pista poderosa e carregada de emoção. Realmente excepcional.

A Perc Trax é uma das raras gravadoras que conseguiu evoluir e acompanhar os tempos sem nunca fazer movimentos bruscos para seguir o que estava em voga. Estabeleceu continuamente uma reputação sólida e um público ao redor de uma estética diferente, mas em constante evolução. Tudo isso pode ser atribuído à visão e aos ouvidos atentos do Ali no seu trabalho com os artistas."

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Donor: "Sou um grande fã dos lançamentos do Forward Strategy Group pela Perc Trax desde o EP Combat Code, de 2010, então foi um grande privilégio eles terem me pedido para remixar uma das faixas deles no lançamento. Como a Perc Trax evoluiu ao longo dos anos para o techno mais industrial pelo qual é conhecida hoje,  o FSG sem dúvida teve um papel importante no seu desenvolvimento. "We're Looking For Manpower", do EP New Formal, mistura sons industriais mais duros com pads mais orgânicos, criando o contraste perfeito. É bonita e brutal ao mesmo tempo, e sempre apropriada, e é por isso que é difícil que ela vá sair da minha playlist tão cedo."

A ESCOLHIDA DO YUJI KONDO: PERC - "MY HEAD IS SLOWLY EXPLODING"

"A música do Ali é sempre impressionante, especialmente Wicker & Steel, que para mim é um dos melhores discos de techno de todos os tempos. A minha faixa favorita, "My Head Is Slowly Exploding", evoca o mais intenso dos estados mentais. Tem esta atmosfera tensa e agourenta junto com uma percussão crua e violenta – é perfeita.

Sou profundamente grato ao Ali. A estética da Perc Trax influenciou o meu último EP, Radiate The Ocean From My Back, que é mais emotivo e tem uma narrativa mais explícita do que os meus trabalhos anteriores. Tive contato com o Ali pela primeira vez depois do primeiro disco dele, Wicker & Steel, ser lançado. No ano seguinte, eu o conheci pessoalmente num clube em Osaka onde eu estava tocando. Somos bons amigos desde essa época, e espero que ele volte logo ao Japão."

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A ESCOLHIDA DO THUMP: MONOKOPF - "RUINS"

Sendo exposto o tempo todo a uma saraivada constante de industrial techno, é difícil às vezes não sucumbir à exaustão. Ocasionalmente há algo broxante também no machismo declarado presente nas imitações mais odiáveis desta tendência recente. Felizmente a Perc Trax tem andado aberta à experimentações com ambient e beatless tanto quanto à percussão brutal e incessante. Essas faixas, que chegam como um alívio temporário, estão entremeadas na discografia do selo: "Horse Gum", do Perc, "Fading Centres", do Forward Strategy Group, e "Ruins", do Monokopf, do seu disco de estreia na Perc Trax, The Nicest Way. Esta última é prova de que os dois extremos podem coexistir em uma mesma produção; depois de vários minutos de um barulho de sangrar os ouvidos, a intensidade intimidadora finalmente cede lugar ao som crescente das cordas e harmonias de coral. Um final estranhamente animado e quase espiritual para uma faixa violenta."

A ESCOLHIDA DO MARTYN HARE: "TRUSS - "BROCKWEIR"

"A minha faixa favorita da Perc Trax é "Brockweir", do Truss, da coletânea Slowly Exploding. Não só é a minha faixa favorita da Perc Trax, mas rapidamente se tornou uma das minhas preferidas de todos os tempos de qualquer gravadora. Ela detona, simples assim. Para mim, ela resume o que é o techno, uma faixa de bater cabeça com um kick pesado sem frescura nenhuma; algo que soa simples, mas é tudo menos isso. Adoro faixas que você consegue dançar antes mesmo de o kick entrar na história. E, além disso, é uma pérola para mixar do começo ao fim. Aaaaah."

Slowly Exploding: 10 Years of Perc Trax 2004 – 2014 já está à venda aqui. Você pode seguir o Perc no Twitter e no Facebook. O Donor vai lançar o seu primeiro disco solo, ainda sem titulo definido, no começo do ano que vem. 

Tradução: Fernanda Botta