Este português quer cultivar canábis no melhor micro-clima da Europa: Sintra
Foto cortesia Filipe Catalão

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Drogas

Este português quer cultivar canábis no melhor micro-clima da Europa: Sintra

Num país internacionalmente elogiado pela política de descriminalização de drogas, o paradoxo da proibição do cultivo de marijuana, mesmo que para fins medicinais, continua a ser uma realidade.

Filipe Catalão, 30 anos, tem, como tantos outros jovens portugueses, sonhos e paixões. Duas delas, conta à VICE, são a Serra de Sintra e a planta da canábis. Juntá-las é o sonho que há algum tempo decidiu perseguir. O problema é que, num país elogiado internacionalmente pela sua política de descriminalização das drogas, a hipocrisia legislativa é ainda um obstáculo aparentemente intransponível.

"Tenho acompanhado, estudado e analisado esta indústria e a sua evolução desde o início e não me restam dúvidas que, nos países desenvolvidos, no longo prazo, a vontade do povo é sempre mais forte que a vontade dos legisladores", salienta. E o que é que Catalão vê no futuro da canábis em Portugal e, mais concretamente, em Sintra?

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A resposta é simples: "O micro-clima da Serra de Sintra permite-nos plantar canábis com um custo de produção imbatível e uma qualidade inigualável. Ao longo do tempo a estirpe da planta tornar-se-á única, devido ao seu desenvolvimento genético alimentado pelas características e sabores da Serra. O que pode ajudar a garantir a Portugal uma posição de liderança neste mercado, que na Europa vale entre 15 a 35 mil milhões de euros por ano, seja pelo modelo sustentável que pretendo implementar, seja pela qualidade alcançada no crescimento orgânico ao ar livre, devido a este micro-clima único no continente europeu".


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Filipe Catalão garante já ter clientes interessados, investidores e terrenos. Só que, claro, esbarrou na burocracia e numa lei que descriminaliza a posse, mas proíbe o cultivo, mesmo para fins medicinais. Uma discussão que decorre neste momento em vários países da Europa e do Mundo, mas que em Portugal parece continuar arredada dos centros decisores e dos media em geral. "Tenho o projecto apenas bloqueado pela lei que proíbe o cultivo da planta que tanto nos deu ao longo de toda a nossa história, inclusivamente as velas das Naus que nos levaram a descobrir o Mundo", lamenta.

E continua: "Tentei apresentar o projecto no Infarmed com vista a obter licença de cultivo para poder tornar o meu sonho realidade. Infelizmente deparei-me com obstáculos enormes por parte do lobby farmacêutico que quer manter o monopólio do comércio da planta, fazendo com que o acesso ao seu consumo seja feito apenas através de medicamentos produzidos por eles e aprovados pelos organismos de regulação e supervisão".

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O que se passa, como explica o empreendedor à VICE "é que as farmacêuticas fazem pressão junto dos organismos reguladores e legisladores, com o fim de tomarem conta, controlarem e comprarem toda a produção das plantações feitas em Portugal, precisamente porque sabem que somos o país europeu com maior potencial neste mercado pelas razões climáticas únicas que temos". E justifica: "É um crime contra os portugueses gastar recursos públicos sem qualquer tipo de retorno na guerra contra o cultivo desta planta, ao invés de apoiar as colheitas e devolver o valor aos portugueses através da regulação, legislação e supervisão inteligentes. Existe um mercado gigante no mundo inteiro, medicinal e recreativo, e temos o potencial e a responsabilidade não só de sermos líderes europeus de exportação, como de satisfazer responsavelmente a procura interna".

E o potencial de que fala Catalão é óbvio. O clima mediterrâneo, influenciado pelo Atlântico e caracterizado por temperaturas moderadas e invernos húmidos, típico do Portugal continental é uma mais valia inestimável.

"Embora o clima na zona do Cabo da Roca seja semi-árido, as montanhas de Sintra são consideradas moderadamente húmidas: a precipitação nas montanhas é muito mais elevada do que nas áreas circundantes. Por diferentes razões (o clima aqui tem sido moderado pelas montanhas de Sintra, a fertilidade dos solos e a sua relativa proximidade com o estuário do Tejo), a região atraiu um assentamento precoce considerável. Devido ao seu micro-clima, um enorme parque tem-se desenvolvido cheio de folhagem densa e uma diversidade botânica riquíssima. O clima temperado e forte humidade resultantes da proximidade com a costa favorecem o crescimento de um rico manto de floresta, incluindo espécies atlânticas e mediterrânicas", explica.

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Estudioso dedicado e tudo o que diga respeito a esta área, explica o processo em detalhe: "Se olharmos para a estação de crescimento natural da planta, de Abril a Setembro, observamos que se alcançam as condições meteorológicas perfeitas para a colheita: dias muito ensolarados e longos durante todo o Verão, com valores altos de humidade durante as noites. Enormes quantidades de água natural da montanha que pode ser captada em lençóis de água subterrâneos para alimentar as plantas. Solo altamente fértil devido à sua biodiversidade e composição comunitária. Simplesmente não se pode encontrar melhor do que a Serra de Sintra para a qualidade do crescimento orgânico ao ar livre".


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Com o modelo a poder ser replicável na Serra de Monchique, Açores e Madeira, Filipe, que nasceu em São Paulo, Brasil, de onde saiu com apenas dois meses para Portugal, diz acreditar na "Química, na Física e na Matemática acima de tudo". Estudou Engenharia Electrotécnica e de Computadores no Instituto Superior Técnico, curso que abandonou para enveredar por si próprio pelo estudo na área da Alta Finança e estrutura do Sistema Financeiro Mundial. Depois, partiu para em San Diego, Califórnia, EUA, onde fez o "Business English", um curso de língua inglesa direcionada para a economia/gestão. Regressou a Portugal para se inscrever em Gestão, no ISEG, mas acabou por não concluir, para se dedicar a 100 por cento à pesquisa profunda dos temas que mais o fascinavam.

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"A legalização do cultivo é inevitável. Quanto mais cedo se começar a adoptar um modelo inteligente, responsável e sustentável como o que aqui apresento, maior vantagem vai ter Portugal em relação aos seus competidores nestas colheitas. Temos de ser visionários, como sempre o fomos desde os Descobrimentos. Portugal deve ter coragem de mais uma vez dar o exemplo", sublinha.

E conclui: "Estou disposto a dar a cara e o tempo necessário para fazer passar um decreto-lei que legalize o cultivo desta planta da forma mais sensata. Já são plantados cerca de 100 hectares de Canábis medicinal no Alqueva que estão totalmente controlados por farmacêuticas inglesas, canadianas e israelitas. Sendo que o grande rendimento proveniente destas colheitas vai para essas farmacêuticas ao invés de ficar em Portugal".

Lê a "Carta a todos os portugueses", escrita em jeito de manifesto por Filipe Catalão.


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