Grant Hart, do Hüsker Dü, morre aos 56 anos
Imagem: Martyn Goodacre / Getty Images.

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Grant Hart, do Hüsker Dü, morre aos 56 anos

A triste notícia foi confirmada por seu parceiro de banda, Bob Mould, na manhã desta quinta (14).

Matéria originalmente publicada no Noisey US .

Grant Hart, o inovador baterista, compositor e vocalista melhor conhecido pelo seu trabalho com o lendário trio de hardcore de Minnesota Hüsker Dü, faleceu. A notícia veio à tona pela Variety e logo em seguida veio a confirmação do colega de Hüsker Dü de Hart, Bob Mould. De acordo com informações, Hart havia sido diagnosticado com câncer.

"A trágica notícia do falecimento de Hart não foi inesperada para mim" escreveu Mould em nota no Facebook. "Meus sentimentos à família, amigos e fãs de Grant pelo mundo. Grant Hart era um talentoso artista visual, um maravilhoso contador de histórias e um músico assustadoramente talentoso. Todos aqueles que foram tocados por seu espírito nunca o esquecerão. Boa viagem, Grant. Sinto sua falta. Vá com os anjos."

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A bateria torta e cheia de batidas marcadas pela caixa eram determinantes para o clima de ansiedade no som do Hüsker Dü ao passo em que deixavam de ser heróis locais em St. Paul para se tornarem ícones do underground americano em meados dos anos 80. Compositor versátil, ele demonstrava sensibilidade tanto na melancolia acústica de"Never Talking to You Again" quanto no hit power-pop veloz de maior sucesso da banda, "Don't Want to Know if You Are Lonely". Como vocalista, ele apresentava um lado mais calmo e conciso, um contraponto ao exorcismo abrutalhado de Mould.

Hart nasceu em St. Paul no ano de 1961, caçula de cinco filhos naquilo que ele descrevia como "sua típica família disfuncional americana". Aos dez anos, perdeu o irmão mais velho em um acidente envolvendo bebida e direção, herdando assim sua coleção de discos e bateria. Ele tocou em bandas de garagem e de casamento durante o ensino médio, fazendo uns corres ainda vendendo maconha. Grant conheçou Mould na Cheapo Records em 1979 e, pouco depois, começaram a tocar juntos. Junto do baixista Greg Pine, o Hüsker Dü — "você se lembra?" em sueco — fez seus primeiros shows em Minneapolis naquele mesmo ano.

Mesmo não querendo ser jogado no mesmo saco que as bandas de hardcore que dominavam a cena punk da época, o disco de estreia do Hüsker Dü, Land Speed Record, de 1982, era um álbum rápido e rasteiro, gravado ao vivo, enfiando 11 músicas em um set de 16 minutos. O primeiro disco de estúdio dos caras, Everything Falls Apart, de 1983, mantinha esse espírito hardcoreano.

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O EP Metal Circus EP, lançado mais a frente daquele ano, foi o primeiro lançado pelo icônico selo de Greg Ginn, a SST — casa de bandas como Black Flag, Meat Puppers e Minutemen. Lá, a banda começou a experimentar melodias distorcidas e sensibilidade quase pop, características que viriam a defini-la no futuro. Hart também começou a se destacar como vocalista e compositor, contribuindo com a quase feliz "It's Not Funny Anymore" e a macabra, ainda que melódica"Diane". Ao passo em que o resto do EP, composto e cantado por Mould, lidasse com catarse e desarmonia, as canções de Hart levavam o Hüsker Dü e sua energia sem fim rumo à melodia.

"A versão do Hüsker Dü do ritual enérgico do hardcore nunca deveu em nada ao Minor Threat e Black Flag em termos de puro entusiasmo coletivo" escreveu Robert Christgau em sua resenha do disco, "e este EP traduz sua alma em música".

Ainda assim, o salto destes lampejos melódicos para Zen Arcade, de 1984, foi notável. Disco duplo composto por 24 faixas, quase todas gravadas em um só take, um noise-pop sem tempo pra respirar — o som de uma banda com ambição infindável. "Vamos tentar fazer algo maior que qualquer outra coisa próxima ao rock and roll", declarou Mould a Steve Albini em entrevista concedida à Matter Magazine em 1983. "Não sei o que será, temos que definir isso ainda, mas irá além da noção de 'punk rock' ou o que for". E foi isso que Zen Arcade foi.

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Com Mould muitas vezes adotando o pop-rock das primeiras faixas de Hart, o baterista bateu forte em Zen Arcade. "What's Going On" era uma sonzeira suada, rouca, com um piano agredido e guitarras sujas. "Standing By The Sea" alternava entre uma linha de baixo tensa, discordante, e algumas das explosões vocais mais passionais do Hüsker Dü. "Pink Turns to Blue" era uma perturbadora e provocante história de vício e morte, acompanhada por uma melodia assustadora. Em Zen Arcade, Hart mostrou que podia compôr o que bem entendesse.

A pedido de Joe Carducci, o outro dono da SST, o Hüsker Dü lançou mais um LP, New Day Rising, apenas seis meses depois. No lugar de soarem cansados, a banda parecia ainda mais afiada. Mais coeso e pensado que Zen Arcade, New Day Rising capturou a banda no ponto perfeito entre melodias pop e sensibilidade punk. O disco contava ainda como uma das melhores faixas de Hart, "Books About UFOs", um rock esquisitinho que não conseguia esconder um sorrisinho por detrás de guitarras barulhentas. Por um tempo, Hart parecia conseguir imitar Elvis Costello de forma brilhante; em Flip Your Wig, de 1986, sua "Green Eyes" parecia um daqueles sons açucarados de FM das antigas (ainda que tocado em uma garagem velha).

Em Candy Apple Grey, de 1986, a banda voltou-se para o íntimo, compondo um disco de dez faixas atormentadas que buscavam novas sonoridades a fim de capturar novos pontos baixos emocionais. A balada inconsolável de piano de Hart, "No Promise Have I Made", apresentava terrenos desconhecidos, de uma crueza emocional que nunca encontrou uma forma satisfatória de ser expressada. "Grant Hart termina com o amor de sua vida, Bob Mould não consegue se livrar de uma bad trip, e de mãos juntas eles se vendem à grande e malvada gravadora com o disco mais deprimente de uma carreira que nunca foi lá muito alegre", de acordo com Robert Christgau.

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O álbum foi também sua primeira chance de testar a recepção mainstream. Candy Apple Grey foi a estreia da banda pela Warner Bros, o que acabou rendendo um tempinho na MTV. Mesmo assim, seu auge foi chegar ao 140º lugar da Billboard.

Esta mesma época também trouxe à tona os atritos entre Hart e Mould, que vinham se desenvolvendo ao longo de anos. Hart viciou-se em heroína durante a gravação de Candy Apple Grey e foi diagnosticado — erroneamente, descobrimos depois — como soropositivo. O agente da banda de tempos, David Savoy, se matou pouco antes de começarem a turnê para o disco duplo de 1987 Warehouse: Songs and Stories. Mould acabou assumindo grande parte dos afazeres administrativos do grupo, como resultado. Entre morte, drogas e uma nova dinâmica, a banda chegava ao seu limite.

Hart deixou o Hüsker Dü em 1987 após um show que deu errado em Colombia, Missouri. Sua carreira solo veio logo depois. Em janeiro de 1988, era lançado o EP 2541 EP, seguido pela colcha de retalhos que foi o LP Intolerance. Tendo deixado as drogas de lado, Hart formou uma nova banda chamada Nova Mob, junto do baterista Michael Crego e Tom Merkl. Grant cantou e tocou guitarra no EP Admiral of the Sea, e no álbum The Last Days of Pompeii, ambos lançados em 1991.

Grant deu continuidade à carreira como artista solo em 1995 com o lançamento de Ecce Homo e quatro anos depois com Good News for Modern Man. Em 2013, o artista lançou, The Argument, descrito pelo próprio como seu mais ambicioso projeto desde Zen Arcade. Antes do falecimento, Hart trabalhava em um disco conceitual sobre o Unabomber.

O Amauri Gonzo fez essa playlist em homenagem ao Grant, e chupinhamos ela no Spotify da VICE Brasil.

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