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Opinião

"Sex Education". A terapia carnal que os mais puritanos deviam ver

A série da Netflix desconstrói com sagacidade os preconceitos e os estereótipos relacionados com o sexo na adolescência. E não só.
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Os personagens Otis Milburn (Asa Butterfield) e Maeve Wiley (Emma Mackey). Negócios negócios, romances à parte? A resposta está no pullover… (Imagem cortesia Netflix)

As séries britânicas têm sido pródigas em revelar argumentos inteligentes à volta de um assunto que nunca sairá de moda: sexo. Com acento no lado humorístico, temos assistido a produções que versam sobre a temática de forma directa ou indirecta, sem a preocupação de originar manifestos panfletários para o que devem ser os bons costumes.

Nos últimos anos, Fleabag (a melhor de todas), Catastrophe e Wanderlust, apimentaram o atribulado mundo dos relacionamentos e os dramas de algumas das suas personagens, ao tratarem o sexo por tu.

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Sex Education é mais um tiro certeiro no porta-aviões das almas puritanas (Olá CDS!) e, por ser uma narrativa com foco na adolescência, joga no campeonato de Skins e de Shameless. Não é, apesar disso, provocador como o primeiro ou caótico como o segundo – ambos com versões criadas para o público norte-americano.

Disponível na plataforma Netflix (ver o trailer acima), esta “educação” fala-nos de um teenager que, contra as suas perspectivas, vira conselheiro sexual no liceu onde estuda. Otis Mildburn (o actor Asa Butterfield) tem algumas semelhanças com o personagem James em The End of The Fu***ng World - no plano físico e na insegurança própria da idade -, excepto o adorno psicopata.

Com 16 anos, Otis é o arquétipo do rapaz acanhado que, aparentemente, não deseja ser mais que “o tipo que se senta ali no canto e ninguém conhece”. Quer passar despercebido de qualquer atenção, quer perder a virgindade e, antes de mais, pretende finalmente ver o “fogo de artíficio” da primeira masturbação.

A sua pacatez está à beira de se desmoronar e nessa jornada é acompanhado por três outras figuras principais. O melhor amigo Eric (homossexual em modo arco-íris que, de maneira pejorativa, seria tratado por “bicha”), a parceira de negócios e musa Maeve (a miúda indie com gosto literário apurado e de origens bastante humildes) e a mãe-galinha, Jean. Esta última desempenhada pela experiente Gillian Anderson (X-Files e The Fall), no papel de uma terapeuta sexual dada a “quecas” sem compromissos e com um bloqueio criativo que a impede de escrever o próximo livro.

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A dinâmica entre Adam Groff (o actor Condor Swindelis, à esq.) e Eric Effiong (Ncuti Gatwa) é uma crítica não só ao bullying, como à homofobia. (Cortesia Netflix)

Com diálogos interessantes e sabiamente pontuados de humor, somos confrontados com os fantasmas da sexualidade e da vida em geral que vai mais além do universo dos adolescentes (que, de acordo com um estudo levado a cabo no Reino Unido, em 2016, não andam assim muito deliciados com os “prazeres carnais”).

Os prosélitos da série sabem ao que me refiro. Em Sex Education, encontramos o aluno durão que não consegue ejacular por pressão familiar e, quem sabe, por excesso de ganza; a jovem interessada em priorizar o bem-estar dos lovers, mas que desconhece a satisfação da intimidade pessoal; a virgem que no meio da inquietação em perder os três, se confronta com a definição de vaginismo; a homofobia como território para considerações e violência estúpidas; ou o aborto como um fardo invariavelmente carregado no feminino.

Com uma vibração eighties que pode enganar no arranque do primeiro episódio (devido às roupas e aos cenários apresentados, só despertei para o aspecto temporal quando é mencionado o site Porn Hub), a criadora, Laurie Dunn, oferece-nos uma palete de relacionamentos que ficam em aberto para a segunda temporada, prevista para aportar no final deste ano ou início de 2020. Até lá, podes descobrir a opulenta banda sonora que, entre outros temas e artistas, conta com originais de Ezra Furman - o grupo chega a actuar em palco numa das cenas finais. Para que evites maus comportamentos (na escola ou noutros lugares), fica a saber que se fores parar ao inferno o melhor é levares protector solar. Pelo caminho, mete uns preservativos na maleta.

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Os primeiros anos da era teen podem ser revistos no filme Eight Grade ou na também novíssima série PEN15, servindo Lady Bird (nomeado para cinco Óscares em 2018) e Sex Education como naturais retratos do amadurecimento da puberdade.

Acima, podes ver o vídeo onde três actores do elenco aprendem expressões portuguesas (Emma Mackey, Aimee Lou Wood e Ncuti Gatwa via Instagram Netflix Portugal). Segundo as estimativas da plataforma de streaming, os oitos episódios de "Sex Education" foram vistos por “mais de 40 milhões de famílias nas primeiras quatro semanas”.


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