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Música

As duas bandas mais misteriosas do mundo vão estar no Amplifest do Porto

Tipos canadianos e alemães que prometem abanar o norte.

Inevitavelmente, a programação de um festival é uma tarefa que fica complicada à medida que o ano vai avançando. Ou seja, um festival marcado para Outubro enfrenta mais obstáculos do que o mesmo tipo de evento em Junho: quando o ano chega ao seu décimo mês, uma boa parte das bandas já passou pelo país e são necessários argumentos fortes para atrair um público que já viu um pouco de tudo (e o Bon Iver três vezes). Sem temer nada disso, a Amplificasom é uma daquelas promotoras (nascida de um excelente blogue) que, depois de organizar umas quantas dezenas de concertos, atreveu-se a montar o seu próprio festival. E foi assim que nasceu o Amplifest, que, logo na sua primeira edição, assegurou a presença de gigantes como Justin Broadrick (em dose dupla, com Godflesh e Jesu) ou os Acid Mothers Temple & The Melting Paraiso U.F.O..

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Se Justin Broadrick é uma figura capaz de deixar uma pegada de dinossauro na memória de muita gente, o Amplifest conseguiu dobrar a parada e deixou-nos a todos sem palavras para o que aí vem: Godspeed You! Black Emperor e Bohren & Der Club of Gore. Mais do que dois simples colectivos, os GY!BE e os alemães dos discos sombrios são entidades absolutamente míticas e merecedoras de um estatuto que os coloca à parte de quase tudo. Além deles, serão muitos os outros heróis e vilões presentes nos três dias de Amplifest, no Porto: Amenra, Ufomammut, Six Organs of Admittance, Barn Owl, White Hills, Jozef van Wissem. O primeiro dia, 26 de Outubro, decorre no Passos Manuel. Os seguintes (27 e 28 de Outubro) prometem muito barulho no Hard Club. Só os meninos vão levar tampões para os ouvidos.

Com tudo isto, o Amplifest promete ser, durante muitos anos, o tipo de festival que faz borrar as cuecas a cada vez que anuncia o seu cartaz. Eu por acaso tinha uns boxers muito giros do Pateta e agora parecem os boxers do Mancha Negra. Um acidente escatológico como esse é o tipo de experiência que me foi descrita por amigos que já viram Godspeed You! Black Emperor em concerto (nomeadamente no Teatro São Luiz de Lisboa). Muitas vezes colados ao desígnio fácil do pós-rock, os GY!BE destacam-se no género pelo mistério envolvido nos seus instrumentais de vinte e tal minutos, e também por terem sabido exactamente quando deviam parar de editar nova música. Lançaram apenas uns poucos álbuns, mas foram sempre pertinentes e altamente generosos nas revelações sónicas e narrativas de cada um desses.

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Doze anos após o seu lançamento, o duplo

Lift Your Skinny Fists Like Antennas To Heaven

ainda continua a animar tópicos por essa internet fora, com inúmeras comparações alegóricas e teorias da conspiração dignas de um Octávio Machado. Há quem diga que se trata da banda-sonora para os sonhos do Abominável Homem das Neves. A mim soa-me muitas vezes a um disco de hinos de revolução e esperança para um novo submundo, que recusou permanecer na superfície da terra e obedecer aos poderes instituídos (a Coca-Cola, a Apple, os óculos brancos do Goucha). E, pronto, aqui fica a frase mais pretensiosa que até hoje escrevi para a VICE.

Submundo, metáforas e pretensão: ingredientes igualmente úteis para falar dos Bohren & Der Club of Gore, alemães de muito mistério, que, depois de um primeiro concerto cancelado, estão confirmadíssimos para este Amplifest. O que esperar então assim que o saxofone de Christoph Clöser começar a soar no Porto? Ao que tudo indica, um acontecimento único, um ritual de jazz noir que trepa as costas como uma tarântula, um passeio ora aéreo ora subterrâneo por todas as cidades que guardam muitos segredos e que viram todas as pinocadas mandadas às escondidas.

Qualidades essas que estão bem presentes em grande parte dos discos de Bohren & Der Club of Gore (excepto talvez

Geisterfaust

), que parecem conhecer todos os hábitos ocultos e conseguir transformá-los em música elegante e cheia de reminiscências.

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Gore Motel

é um primeiro disco como poucos na segurança da sua ciência, as quase duas horas e meia de

Midnight Radio

fazem dele um universo com vida própria (e muito para contar), e depois

Sunset Mission

é um renascer musical para a banda e tudo o que se quer do auto-rádio para guiar de noite. Os três são álbuns quase perfeitos e muitas vezes associados a uma série de lendas. Uma delas está neste

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que fiz há uns tempos num famoso site de venda de discos. As outras estão ainda por contar num Amplifest que já cheira a melhor festival do ano.