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Sexo

Tem cara injetando células-tronco no próprio pênis

De longe não é a melhor das ideias para dar aquele grau no meninão.
Foto: Ani Dimi/Stocksy.

No começo deste ano, o bodybuilder que virou treinador, especialista em saúde e autodeclarado biohacker Ben Greenfield ganhou as manchetes ao anunciar que havia injetado células-tronco – coletadas de sua gordura corporal – diretamente em seu pênis para aumentar seu tamanho. O procedimento, insistia, havia sido uma beleza: em dias, o rapaz afirma ter tido ereções maiores e mais firmes, com orgasmos mais intensos. Ele admitiu, porém, que os orgasmos poderiam ser resultado de um efeito placebo e que não havia medido o suposto crescimento, mas ainda ainda assim insistiu que as células-tronco teriam se revelado um método eficaz para melhoria do “desempenho” masculino.

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Tudo isso pode ser encarado como um ato extremo levado adiante por um homem corajoso (ou doido). Mas Greenfield só pôde levar o procedimento adiante porque uma clínica chamada US Stem Cell se dispôs a realizar o procedimento para ele – e talvez esteja disposta a oferecer o mesmo tratamento para outros homens. Devo mencionar que entrei em contato com a clínica, mas até a publicação deste texto ainda não haviam respondido minhas perguntar.

Não é nada fácil encontrar outras clínicas que ofereçam, na caruda, tratamentos com células-tronco para aumento de pênis ou qualquer coisa do tipo, por mais que muitas ofereçam procedimentos semelhantes para o tratamento de impotência, encarando estes como procedimentos de aprimoramento masculino também, de acordo com Leigh Turner, professor da Universidade de Minnesota que estuda o mercado de células-tronco. “Algumas empresas”, comenta, “ficam bem felizes em proporcionar este tipo de serviço”.

Muitos homens parecem estar dispostos a gastar milhares de dólares por este aparentemente doloroso e bizarro serviço também. Turner comenta que é impossível calcular exatamente quantas pessoas buscam qualquer tipo de tratamento que envolva células-tronco; além do que, nenhuma das clínicas especializadas que oferecem quaisquer tipo de tratamentos para o pênis responderam às minhas tentativas de contato ao questionar sua base de clientes ou número de solicitações sobre tais práticas. Mesmo assim, Ryan Terlecki, urologista do Wake Forest Baptist Medical Center, um hospital de pesquisa conhecido por suas pesquisas (sérias e rigorosas) no campo das células-tronco, revela-me que homens lhe perguntam quanto a possíveis tratamentos para impotência com células-tronco quase que diariamente.

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Células-tronco são semelhantes a telas em branco, capazes de se transformarem em tecido altamente especializado para renovação quando necessário. Em linhas gerais, células-tronco de um embrião ou feto podem se transformar em qualquer tipo de tecido, já células-tronco adultas transformam-se no tipo de tecido do órgão em que residem. Pesquisas sobre o uso de células-tronco – incluindo células adultas manipuladas de forma a serem mais versáteis – para acelerar processos de cura ou tratar doenças graves atraíram interesse e entusiasmo por parte do público.

Até então, poucos tratamentos se provaram eficazes, caso do tratamento de doenças ligada ao sangue como a leucemia. Mas sob a legislação norte-americana, clínicas podem remover células-tronco legalmente de um adulto e, sem manipulação alguma, reinjetar estas células em seus corpos novamente, o que é encarado como uma prática inofensiva. Estudos controlados podem ainda obter permissão para manipular estas células antes da reinjeção, mas isto é raridade, já no caso das clínicas, estas não podem afirmar serem capazes de curar seja lá o que for através deste método ainda não comprovado.

Sendo bem claro: reinjetar células-tronco de gordura retiradas de um adulto diretamente no seu pau – para tratar impotência ou só dar um grau ali na região – não é um dos poucos tratamentos com células-tronco cuja eficácia foi comprovada. As clínicas que oferecem tais procedimentos são, inclusive, um fenômeno bastante recente. Então nos perguntamos: por que diabos estes estabelecimentos estão dispostos a comercializar um procedimento experimental (na melhor das hipóteses) como este? E por que tem tanto cara disposto a passar por isso, ainda mais quando encontram-se no mercado tantos outros suplementos e procedimentos que oferecem a mesma promessa de alguns centímetros ou maior potência às suas ereções?

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Ao menos parte do interesse parece vir do fato que alguns estudos demonstraram que certos tratamentos com células-tronco podem ajudar a lidar com um tipo bastante restrito de disfunção erétil ligado à danos nas terminações nervosas após uma prostatectomia. Tais estudos estão ainda em fase inicial, com grupos muito pequenos para provar algo de fato.

Mas algumas clínicas e homens presumem que se as células-tronco ajudam com a impotência, poderia fazer milagres em um pênis saudável também. Tamanho interesse, de acordo com os especialistas que consultei, se dá pelo fato de que as células-tronco tem sido tão tietada por pesquisadores e jornalistas, ainda que seu potencial permaneça tão vago, que acabam parecendo uma panaceia para muitos.

Aparentemente, os consumidores também presumem que, por mais que estes tratamentos com células-tronco sejam experimentais, não há risco envolvido já que o procedimento consiste em injetar no seu corpo algo que faz parte dele, o que para muitos homens é muito mais interessante do que tomar uma pílula – mesmo que seja apenas um suplemento natural – para aumentarem sua potência. Os caras que se metem nessa em vez de optarem por opções mais tradicionais, afirma Terlecki, também parecem ter grana de sobra e estarem dispostos a tentar qualquer coisa que possa lhes fazer sentir mais jovem e viril, caso de tratamentos dúbios com testosterona.

Mas em um pênis saudável, explica Terlecki, células-tronco não-manipuladas acabam sendo levadas pela corrente sanguínea em minutos e mesmo que ficassem ali por algum motivo, não há qualquer garantia de que se transformariam em algum tecido útil. Ou seja: tratamentos como o que o Greenfield tentou provavelmente não resultam em nada.

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Algumas clínicas podem seguir oferecendo tais tratamentos por acreditarem firmemente que a comunidade científica e reguladoras não entendem nada sobre células-tronco para compreenderem seus potenciais benefícios, mas claro que tem gente aí no meio provavelmente se aproveitando da empolgação em torno do tema e das atuais regulamentações. Turner me revelou ainda que boa parte das mais de 500 clínicas surgidas nos EUA entre 2011 e 2016 oferecendo tratamentos com células-tronco para os mais variados problemas não tem eficácia comprovada – de problemas nas juntas a Mal de Parkinson, e adivinhe só, todas administradas por gente já conhecida por explorar modas passageiras na medicina, com processos por fraude nas costas.

No ano passado, a agência reguladora dos EUA a FDA comprometeu-se a aumentar a fiscalização de clínicas de células-tronco. De qualquer forma, isto levará um tempo e envolverá um leve policiamento em cima das regras já existentes e não novas restrições quanto às práticas vigentes. Grupos de defesa ao consumidor, comenta Terlecki, não tem os recursos necessários para lidar com clínicas e suas práticas predatórias através de conscientização pública. Isso é preocupante, tendo em vista que procedimentos envolvendo células-tronco não estão livres de riscos.

Em teoria, afirma Terlecki, usar as células-tronco não-manipuladas de alguém para melhoria de desempenho sexual masculino não traz nenhum risco, o que pode fazer destes procedimentos mais seguros do que os que envolvem gordura, silicone ou injeções de óleo mineral, comumente buscados por homens. Tais “tratamentos” muitas vezes acabam resultando em deformidades, tecido danificado e cirurgias dolorosas para a remoção do tecido estranho de seus pênis.

Além do que, nem sempre podemos confiar de que estas clínicas estão atuando de acordo com as regras preexistentes. No último outono, por exemplo, a US Stem Cell, onde Greenfield fez seu tratamento, causou danos irreversíveis à visão em três pacientes que buscaram procedimentos com células-tronco para degeneração macular. Os danos certamente resultam de negligência, tendo em vista que a empresa não se saiu lá muito bem com investigações realizadas pela FDA. Cabe mencionar que procedimentos envolvendo células-tronco que deram errado já resultaram em células se instalando em locais fora do comum, desenvolvendo então massas semelhantes a tumores, o que na prática significa que há sempre o pequeno risco de, sem mais nem menos, surgir uma cartilagem ali na lateral do pênis após um tratamento envolvendo células-tronco.

Para Turner, os maiores riscos são menos físicos e mais conceituais, porém. Ele se preocupa bastante com a ideia de que o hype todo em torno da coisa acabe fazendo com que gente sem grana acabe se endividando ao entrar numa dessas, bem como a possibilidade de procedimentos feitos de qualquer jeito acabarem impactando negativamente a credibilidade em torno do sistema de saúde. O que pode ser feito agora, porém, é tentar deixar claro que não há nenhum benefício comprovado em socar uma agulha cheia de células-tronco no próprio pênis e torcer pra que nada de mais grave aconteça até a febre passar.

Artigo originalmente publicado na VICE US.

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