É meio clichê dizer que nada de “bom” acontece depois das duas da madrugada, mas também é mentira. Veja, por exemplo, essa gloriosa briga na cadeia de pizzarias mais onipresente de Toronto, no Canadá.
O vídeo tem tudo para se tornar O Viral Perfeito. Não há contexto, mas contexto não é necessário. Há muitos socos voando, mas ninguém parece se machucar. A briga envolve principalmente mulheres, mas não há uma misoginia aparente, só namorados impressionados. Tem pelo menos um cara que sabe que está no meio de um vídeo viral. Tem o rosto conformado de um funcionário do Pizza Pizza que não parece ter mais de 25 anos, mas ainda parece velho demais pra essa merda.
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Nossa história começa em Toronto, Ontário, um lugar onde as saideiras acabam às 2h da manhã e não há muitas opções de alimentação para combater a ressaca do dia seguinte. O que temos aqui é um Pizza Pizza aparentemente perto de uma cena de bares. E quando você enfia um grupo de pessoas num restaurante pequeno com o mesmo objetivo (pedir seu pedaço de pizza favorito, molho extra, não derrubar molho na camiseta, dormir com a pessoa mais próxima, tudo dentro de 15 minutos) a tensão é alta. Em brigas em pizzarias fast food, ninguém é culpado, não há vencedores ou perdedores, só o jogo.
Apesar dessa briga particular ter acontecido na Queen e Broadview (o lado leste family-friendly de Toronto) às 3 da madrugada de domingo, gosto de pensar que ela poderia ter acontecido em qualquer lugar. Todo mundo tem suas diferenças, mas às 3h todos queremos as mesmas coisas.
Como todos os grandes vídeos começam, há aquele sentimento momentâneo do espectador de “Tive que assistir cinco segundos de comercial pra isso?”, mas esse sentimento passa rápido quando os gritos te atraem e nosso cinegrafista amador consegue colocar as coisas em ordem.
Temos alguns movimentos bem decentes nos primeiros segundos. Duas minas deslizam no balcão, um cara (preste atenção nele) que entra no enquadramento segurando uma caixa de pizza, um mata-leão sólido e um namorado magricela fazendo essa cara.
Aos 20 segundos, temos nosso primeiro trecho de áudio reconhecível entre os gritos. “Meu sapato! Meu sapato!”, alguém grita, provavelmente tendo o calçado realmente pisoteado ou dando um comentário “irônico” da segurança do fundão.
Você já se meteu numa briga, ou pelo menos testemunhou uma? É um fato científico que em toda briga envolvendo quatro ou mais participantes tem um baixinho que faz duas coisas – instiga ainda mais a treta e soca alguém na nuca.
Aos 24 segundos, encontramos a Mina Scooby-Loo. Ela tem 1,50 metro mesmo de plataformas, e tem também fúria e personalidade; ela dá o seu melhor e sabe que alguém vai a puxar pro meio da confusão antes que algo mais sério aconteça.
Também é nesse ponto que eu gostaria que tivesse mais ângulos de câmeras aqui, porque o cinegrafista não consegue se decidir onde focar quando a briga se divide em três. Os próximos 10 segundos não são dignos de nota exceto porque somos apresentados a outro personagem da briga – A Pessoa do “Deixa Disso”. Como já escrevi antes em minha cobertura sobre brigas, toda treta decente tem uma pessoa no meio que quer sincera e desesperadamente apartar a briga – quando na verdade só piora as coisas atrasando o inevitável. Você quer manter a paz? Deixe os idiotas se estapearem à vontade e separe antes que alguém se machuque seriamente.
“Acabei com a briga! Acabei com a briga!”, ela grita por cima de outra pessoa dizendo “Que porra é essa!” E, MEU DEUS DO CÉU, LÁ VEM A SCOOBY-LOO COM UMA CADEIRA!
Até que um cara achando tudo muito engraçado – que com certeza tinha saído de um bar “country” próximo –, coloca um fim na loucura antes que esse vídeo acabasse em sangue. Quer dizer, olha a cara dele. Nesse ponto, é ele quem está ganhando essa briga viral.
Aí vem o cara que entra casualmente no enquadramento, pega seu carregador de celular e provavelmente volta para sua mesa para fazer um live no Instagram, com a paz de espírito de saber que a bateria vai aguentar até o final. Ele é o Especulador de Brigas, ele não precisa ir pra casa, então vai ficar aqui. (Além disso, note que nosso querido cinegrafista dá uma risadinha – o cara nem consegue manter a seriedade e me faz pensar em escrever uma matéria sobre como risadinhas fora da tela são a nova risada enlatada.)
No ponto de 1 minuto e 15 segundos, o namorado magricela fica de saco cheio e percebe que está apenas representando o patriarcado aqui ao segurar a namorada. Ele desiste!
É a calma depois da tempestade agora. Cessa toda a gritaria e empurra-empurra se, até que nossos participantes tentam ficar em pé. (A maioria dos canadenses vai reconhecer esse momento como aquele quando você acha que o juiz vai entrar e separar dois esquentadinhos, mas não, o banco já está cheio, então ele deixa os meninos se cansarem.)
“Acabou”, alguém grita.
Mas não acabou.
Do lado leste vem a Mais Forte de Todas, derrubando humanos como pinos de boliche. É glorioso, mas não tão glorioso quanto a mulher no balcão que só quer pegar sua maldita pizza. Ela dá uma risada e sai da pizzaria para contar a história no Uber de volta para casa.
A briga continua (sério, como eles tinham energia pra isso às 3 da manhã?) e finalmente temos o momento que precisamos nessa época de Trump, as meias do Trudeau e o revival do emo. Das cinzas da nossa esperança na humanidade surge o Herói, esse cara.
Com um braço ele segura a Scooby-Loo, que agora ficou meio sobrecarregada na briga, e com a outra ele manda um salve para nós, os espectadores, e envolve nossas almas amargas no mais gostoso abraço. “Essa é a beleza da humanidade aparecendo num viral de gente bêbada brigando”, seus braços dizem. Ele até mostra a língua para nos dizer que “Sou o melhor”, quando um homem menor, num momento menor, poderia ter gritado “World Star!”
Nosso Herói, como um bom herói envolvido com roteiristas preguiçosos, não tem história e não vai ganhar uma aqui. Quer ele seja neurocirurgião ou chapeiro, esse é o momento dele, e diferente de muitos de nós, ele faz o melhor disso. Todo segundo dele na tela nos lembra que há um Deus neste mundo, e que sempre vai aparecer um viral para quando você achar que só existe desgraça na Terra.
Esse cara é o Herói, mas quando você achava que esse vídeo já tinha personagens demais, lá vem outro – o Cara que Está Velho Demais pra Essa Merda.
Atrás do balcão temos a verdadeira vítima aqui, o balconista do Pizza Pizza. O cara é profissional pra caralho, ele já viu essa novelinha centena de vezes antes e não aguenta mais. Esse cara trabalhando no balcão às 2 da madruga, provavelmente ganhando uma merreca, só quer ir embora, tomar um banho pra tirar o cheio de pizza, assistir um pouco de Netflix, dormir e esquecer isso tudo. Mas ele sabe que tem que trabalhar. Ele tem que servir pizza para gente bêbada e não vai fechar o lugar só porque alguém pisou no dedão do outro, ou olhou alguém de um jeito engraçado, ou só se sentia com tesão e cansado e tinha que descontar a frustração em alguém. Quando os políticos falam sobre o “contribuinte que dá duro”, eles estão falando desse cara – o cara que lida com babacas o dia inteiro, mas mostra a eles o respeito que eles não merecem. Então sabe o que você pode fazer da próxima vez que pedir um poutine ou um lanchão depois do bar? Deixe uma gorjeta para quem vai ter que limpar sua bagunça quando você sair.
“Isso é muito bom”, diz nosso cameraman na marca de 3:26, sabendo que tem material de qualidade nas mãos.
A coisa fica um pouco mais feia depois, quando uma garota começa a gritar “Pizza Pizza/Broke Ass Bitches” para as inimigas enquanto elas recuam, um slogan que gruda na cabeça e daria um remix bem legal, mas talvez não tão legal quando “11-11, Pizza Pizza“.
Com as combatentes deixando o lugar, nosso vídeo tem o final que merece, com o Herói correndo pelo lugar para receber elogios e “toca-aqui”s. “Você é o meu favorito”, diz alguém fora da imagem como se tivesse acabado de conhecer o vizinho engrado de uma sitcom.
E a chave de ouro é alguém gritando “molho extra”. E assim como molho extra às 2 da manhã, isso é a perfeição.
Agora podemos voltar… espera, tem um SEGUNDO VÍDEO.
Sim, esse é de um período posterior, mas usando meus 10 anos de experiência jornalística, posso dizer que foi alguns minutos depois, já que todo mundo está sentado nas mesmas mesas.
Os dois lados estão de volta e a briga continua dolorosamente autêntica. E, Deus que abençoe, a Scooby-Loo ainda está tentando entrar no meio. De nada vale isso nesse ponto, estamos há uns seis minutos numa briga numa das pizzarias mais populares da cidade. Cadê a polícia?
Sabe quando você sai da balada de madrugada, vê o sol nascendo e se sente suado, sujo e cansado? Bom, essa é a Parte 2 desse vídeo. A diversão acabou, agora a coisa é muito exaustiva de assistir, mesmo quando o Herói volta para receber mais apertos de mão e dois amigos competem para puxar o saco dele.
“Você foi o herói do dia”, diz o Amigo 1.
“Você ganhou a noite”, diz o Amigo 2.
“Onde está nossa comida?”, pergunta outra pessoa.
E aqui chegamos a nossa conclusão (tem um terceiro vídeo dos policiais resolvendo a treta. Eles acusaram formalmente uma pessoa por intoxicação pública, mas ninguém foi culpado pela briga.)
Como informou o Torstar, uma testemunha na pizzaria disse que a briga na fila começou quando alguém gritou que seu pedido estava demorando, pulou por cima do balcão e começou a jogar batatinhas.
Sim, parece que a treta começou quando alguém tentou proteger a honra do Pizza Pizza e do nosso nobre balconista. Não é uma gorjeta, mas tá valendo.
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Tradução: Marina Schnoor