A caminhada da insubordinação dos bombeiros cariocas

Cabo Cruz, 31 anos, oito de corporação, fez uma longa caminhada que marcou sua vida. O bombeiro lotado na Ilha do Governador, Zona Norte do Rio de Janeiro, tinha na última quinta-feira (7), um curso obrigatório em Niterói, cidade do outro lado da Baía de Guanabara, a 30 quilômetros de distância. O motivo de tal odisseia é simples, os bombeiros cariocas são funcionários do Estado do Rio de Janeiro, e o governo vem enrolando para efetuar os pagamentos de seus funcionários. A crise vem se arrastando desde o final do ano passado. Além disso, os militares recebem um auxilio transporte de R$ 100 ao mês, mas a passagem de ônibus na capital carioca custa R$ 3,80, então fica fácil de ver que a conta não fecha.

Cabo Cruz em sua caminhada. Foto: Reprodução

O caminho que passa por várias vias expressas sem qualquer espaço para pedestres, incluía a ponte Rio Niterói. Antes de chegar à ponte o Cabo foi resgatado por uma viatura dos bombeiros a título de evitar riscos de acidente na ponte. Ele já havia caminhado 21 quilômetros. Em nota, o Corpo de Bombeiros do Rio disse que os militares tem o direito de ir ao trabalho como bem entenderem.

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Você deve estar perguntado, mas e dai? E daí que os bombeiros no Brasil são considerados militares, e como tal, estão sob um restrito código de conduta, que proíbe muitas coisas, inclusive protestar. Relembremos: em 2011, 439 bombeiros foram presos num protesto contra o salário de R$ 950, os manifestantes ocuparam um batalhão, e foram retirados de lá pelo BOPE.

Foto: Maurício Fidalgo

O ato do Cabo Cruz não passou em branco. Repercutiu na mídia e, sobretudo, na classe. Como resultado, um grupo de cerca de 50 bombeiros e familiares fizeram uma caminhada neste sábado (9). Conversamos com alguns dos bombeiros por lá. Com medo de represálias, os manifestantes preferiram não se identificar. Eles caminharam do quartel da Ilha do Governador até a Ilha do Fundão sob um sol escaldante tipicamente carioca. Assim como em 2011, familiares estiveram presentes. É que muitas destas famílias dependem exclusivamente do soldo destes bombeiros.

Foto: Maurício Fidalgo

Dentre as reivindicações estão à normalização dos salários dos servidores, que ainda não receberam o pagamento referente a março de 2016, uma atualização nos benefícios como o auxilio transporte e pagamento pelos serviços e plantões extras.

Segundo o presidente da Associação dos Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro, ABMERJ, o Subtenente Mesac, o ato não foi um protesto e sim uma ação de solidariedade ao cabo Cruz, que não esteve presente no ato por medo de represálias de seus superiores. No entanto, estiveram presentes seu irmão e sua mãe. Outro bombeiro, que preferiu não se identificar, fez questão de deixar claro: “ninguém aqui tem medo de cadeia não”.

Foto: Maurício Fidalgo

A ABMERJ faz parte do Movimento Unificado dos Servidores Públicos Estaduais (Muspe) que vem fazendo atos e manifestações contra as ações do governo estadual. Já são 33 categorias reunidas sob essa legenda. Algumas categorias ainda não aderiram a greve, como a segurança pública e a saúde, tudo isso àhámenos de três meses dos jogos olímpicos.