Adolescente, li numa dessas revistas que deixam nos salões de beleza o depoimento de uma mulher que teve uma doença bem horrível e quase perdeu a perna. Segundo ela, a pior coisa da doença não foi a dor e as horas intermináveis no hospital, mas sim quando ela se olhou no espelho e se sentiu feia. Parece absurdo se preocupar com a aparência em uma situação dessas, mas pensando bem, não é tanto assim. Ser percebida como feia pelos outros e, consequentemente, por si mesma, é uma preocupação constante quando se é mulher.
Nem sempre o horror de ser considerada feia sobrepõe uma doença. Há ainda a folha de papel passando de mão em mão dentro da sala de aula para eleger quem é a colega mais feia da sala de aula. Uma competição que ninguém quer sair como vencedora. Pensando nesse pavor de ser feia, dessa impressão que nos veem como monstros gosmentos saídos diretamente do pântano, a artista plástica Juliana Bernardino organizou a exposição “A menina mais feia da turma”, reunindo mais de 30 artistas que abordam o grotesco, o horror e o constrangimento da experiência feminina.
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“Ser nomeada a menina mais feia significa ser amaldiçoada, porque esse título vai te assombrar pelo resto da vida. E essa noção de retorno constante da assombração feia é algo que me interessa muito e está presente em muitos trabalhos da exposição,”a artista e curadora da exposição. É o universo grotesco, demente e violento que permeia a vida de uma mulher e sua relação com seu corpo e sexualidade colocado como um filme de horror, e como a maioria dos filmes do gênero, também podemos acrescentar as ansiedades dos homens em relação à natureza da feminilidade e sexualidade feminina, relações de gênero, ansiedade de castração — todas essas coisas grandiosas e carnudas.”
Fugindo do lugar comum de retratar mulheres como fontes inesgotáveis de força, bonitas naturalmente e perfeitas como um feed organizado de Instagram, a proposta de Bernardino ao lado das 35 artistas é trazer o mal-estar constante de estar sob o escrutínio de terceiros, seja você a mulher mais bonita ou a mais feia. “Alguns são artistas que acompanho o trabalho na intimidade e quis trazer para esse conversa, outros são trabalhos que admiro de longe que também estão de certa maneira obcecados pelo grotesco. Percebo um movimento para esse lado em várias artistas. Tô achando muito curioso e estimulante ver outras mulheres nojentas por aí. E, claro, quero estar do lado delas”, diz.
A exposição estreia no sábado no Ateliê 397 e conta com fotografias, pinturas, colagens e objetos feitos por artistas brasileiros e estrangeiros, sob a curadoria de Juliana.
A menina mais feia da turma
Artistas participantes: Abajur, Angela OD, ANNA, Aurora Bernardini, Bia Leite, Caroline Maria, Carolina Wan, Camila Soato, Eduarda Freire, Élle Bernardini, Felipa Queiroz, Fernanda Azou, Fernanda Galvão, Fernanda Vallois, Fotos dos Outros, Gabriela Monteiro, Heloisa Brandão, Heloisa Pajtak, Isaac Ebner, Julie Dias, Julia Milward, Juliana Bernardino, Lívia Aquino, Lyz Parayzo, Luisa Callegari, Manoela Cezar, Maria Livman, Mari de Camargo, Mari de Queiroz, Marie Queau, Mariana Manhães, Marina Ribas Borges, Mayla Goerisch, Nicole Venturini, Pepi Lemes, Roberta Uiop e Yan Copelli.
Local: Ateliê 397
Endereço: Rua Gonzaga Duque, 148 – Pompeia, São Paulo – SP
Data e horário: Abertura dia 19 de outubro de 14 às 20h no Ateliê 397 até o dia 9 de novembro
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