Pornô lésbico foi o tipo de pornô mais buscado de 2016

(Foto: falsas lésbicas no UK Porn Awards. Foto por Jamie Lee Curtis Taete.)

Esta matéria foi originalmente publicada na VICE UK.

No começo deste mês, o PornHub lançou suas estatísticas de 2016, e pelo segundo ano consecutivo "pornô lésbico" foi o termo mais buscado do site, logo atrás de "madrasta". Isso provavelmente porque pornô lésbico é popular com caras e minas — mulheres da América do Norte tem 86% mais chance de procurar por "lésbica" que os homens, por exemplo — enquanto pornô de "madrasta" provavelmente é um interesse mais masculino mesmo.

Mas o que tem em quatro peitos se esfregando que deixa tanta gente com tesão? Talvez a resposta seja óbvia. Mas achei que fazia sentido perguntar para lésbicas da vida real o que elas acham, e mais importante, como elas se sentem com isso. É nojento ou legal pensar que os homens do mundo descabelam o palhaço com o ato muito especial e particular de duas mulheres fazendo amor? Ou o pornô lésbico lembra tão pouco o sexo lésbico real que isso não importa?

Bom, primeiro, acho que "madrasta" parece muito mais excitante que "lésbica". É um pouco mais divergente. Socialmente, o lesbianismo vem se tornando um pouco mais "normal", então não tem mais aquela aura de "o que vocês fazem realmente?"

Fico meio desapontada que pornô lésbico tenha ficado no topo da lista. Isso reflete uma objetificação; isso reforça a ideia de que esse tipo de sexo é "diferente". Considerando quanta gente assiste pornô lésbico, eu penso: "você não pode dizer que sexo lésbico não é OK ou que é anormal e depois utilizar nosso sexo para bater punheta". Talvez por isso sexo lésbico seja subordinado — se você faz algo que está abaixo de você, você pode explorar isso, que é o que acontece com as mulheres na história o tempo inteiro. Agora está acontecendo quando transamos umas com as outras.

Quanto a se isso está ajudando a educar os homens sobre o que é realmente sexo lésbico, e a ideia de que o sexo existe sem eles, a pergunta aqui é: pornô mostra sexo lésbico real? Acho que uma lésbica pode ser mais exigente com o pornô lésbico que assiste porque está procurando mais autenticidade, então vamos atrás de algo mais amador, porém realista. No final das contas, pornô lésbico não mostra aos homens o que sexo lésbico realmente é, porque sexo lésbico não é para homens, então o pornô lésbico simplesmente não é a mesma coisa. Desculpa, caras!

Claro que pornô "lésbico" é o mais popular! Homens gostam de pornô lésbico porque podem ter uma ereção sem se sentirem comprometidos pela visão da ereção de outro cara. Isso não só faz eles sentirem que sua masculinidade está comprometida, mas também tem a questão do slut shaming: o que torna uma mulher impura? Todos esses pintos sujos entrando nela. Os caras amam o próprio pau, mas ver o pau de outro cara é nojento; eles preferem não ver nenhum. E quando esse não é o caso, as narrativas do pornô lésbico apenas sustentam a heteronormatividade, em cenas em que as mulheres ficam se tocando de um jeito exagerado e gemendo alto, e um homem chega na hora certa para consertar tudo com seu pinto.

Pessoalmente, não assisto pornô porque quero saber que nenhuma mulher foi prejudicada na produção do vídeo e isso é muito difícil de verificar. Segundo, não quero gozar com a mesma coisa que homens nojentos com quem eu nem conversaria estão assistindo. Terceiro, pornô lésbico online nunca é para lésbica, né? Nunca conheci uma lésbica que realmente goste disso. As garotas têm unhas compridas! Acho que a coisa mais atraente nas lésbicas, todas as lésbicas, é que para se assumir, para ir contra a corrente — e isso ainda é ir contra a corrente — e dar prazer a uma mulher, elas precisam tomar o controle ativo de sua sexualidade. E isso não se traduz quando duas mulheres — que estão fazendo aquela coisa de "gay for pay" — estão na frente das câmeras. Eu gostaria de ver um mundo onde as lésbicas são tão respeitadas quanto são fetichizadas e as atrizes pornôs tenham que remover as unhas postiças antes da inserção.

Definitivamente sou uma das mulheres pesquisando "pornô lésbico", e eu não diria que é melhor assistir pornô lésbico só porque transo com mulheres. Acho que minhas intenções são as mesmas: só quero me masturbar, certo? Mas gosto de pensar que assisto mulheres lésbicas transando de maneira autêntica. Muito pornô por aí é o que os homens imaginam que seja o sexo lésbico, e não acho isso excitante, então procuro por um gênero muito específico.

A diferença tem a ver com o olhar masculino. Alguns pornôs lésbicos são para homens, implícita ou explicitamente; implicitamente, o cara segurando a câmera fala com as duas mulheres e é parte da história ou do diálogo; mais explicitamente, duas mulheres estão se pegando e um homem entra no meio. No pornô lésbico mainstream, o jeito como as garotas transam é diferente: o sexo oral é até parecido, mas muitas vezes as garotas não sabem o que estão fazendo e o orgasmo parece falso. Enquanto as coisas que assisto podem ser interpretação, os vídeos geralmente são feitos por mulheres, as garotas parecem estar gostando mesmo, elas têm um visual mais estereotipado de lésbica, e não tem nenhum homem esperando para entrar no meio e comer as duas.

Acho que os homens se beneficiariam de assistir esse tipo de pornô — eles respeitariam mais o sexo lésbico, isso poderia fazer eles pararem de pensar que suas namoradas são anormais por ter um corpo real, e poderia ser mais informativo em vez de opressor.

Não fico surpresa com a popularidade do pornô "lésbico", honestamente. As pessoas sempre ficam fascinadas com algo que percebem como desafio às convenções "normativas". Elas gostam de absorver o que entendem como "o outro" se aproximando disso e batendo punheta duas vezes por dia. Para alguns, imagino que assistir pornô lésbico atende uma necessidade de substituir o que eles entendem como uma "falta"; é o desejo de intervir, de mediar e de projetar seus desejos numa cena onde você não é necessário ou desejado. Duas mulheres transando recusam dar lugar aos homens. E o que é mais excitante do que tentar arranjar um jeito de se meter na conversa?

Para as mulheres heterossexuais assistindo a esse tipo de pornô — e eu reconheço que há muitas — acho que há um elemento de curiosidade. A narrativa é de que homens jovens inocentes estão desesperados para entender o que as lésbicas fazem. Mas acho que isso exclui o fato de que essa é uma dúvida que muita gente tem, não só homens héteros jovens e perplexos. Mesmo sendo uma dúvida frustrante, acho que isso se resume à educação sexual que muitos recebem, e o modelo heteronormativo no qual essa educação é baseada, que muitas vezes impede um conhecimento amplo de outras práticas sexuais. Menos gente assistiria pornô lésbico se todo mundo tivesse recebido educação sobre isso.

Acho que não penso nisso como uma objetificação, porque não sou eu lá, ou nenhuma das minhas parceiras sexuais, sendo assistidas. E acho que temos o direito de assistir o que foi feito de maneira consensual e ética. Quando começamos a policiar e censurar o que estranhos assistem em suas próprias casas, há prós e contras — algumas coisas obviamente não são OK, como pornô com menores de idade. No entanto, na iminência da [Digital Economy Bill], que tem como alvo "atos sexuais não-convencionais", acho que é crucial entender quão rapidamente esse policiamento pode virar de cabeça para baixo, legislando os corpos e atos daqueles que a lei considerar "não-normativos" — e isso geralmente envolve o prazer feminino.

Honestamente, não frequento sites de pornô "mainstream" porque a maioria deles me deixa desconfortável — as questões de consenso são obscuras, não tem como saber sobre a segurança dos atores e atrizes no meio de um monte de vídeos de milhões de páginas como nomes como "adolescente leva na bunda". Mas fico surpresa em saber que "pornô lésbico" é número um.

Sei que muitas garotas se identificam como hétero assistindo pornô lésbico, simplesmente porque esses vídeos focam mais nas mulheres e no prazer delas do que o pornô hétero mainstream, mas isso não quer dizer muito, porque o padrão é realmente baixo. Posso apostar que a ascensão da popularidade do termo se deve parcialmente ao fato de que mais mulheres estão assistindo pornô, ou frequentando sites pornôs, enquanto a sexualidade delas se torna mais abertamente discutida e encorajada, e essas mulheres podem se sentir atraídas por essa palavra de busca — pela razão que mencionei antes, ou porque têm curiosidade sobre o próprio prazer, ou porque nossa geração tem uma sexualidade mais fluída. As visões dessas espectadores provavelmente se acrescentam as dos homens que assistem pornô lésbico para fetichizar relacionamentos queers entre mulheres.

De todas as minhas amigas queers, conheço poucas que assistem "pornô lésbico" como é vendido nesses sites. A maioria acha esses vídeos engraçados porque eles são muito errados. Outra razão é que muitos pornô com relacionamentos queers não apresentam a questão do consentimento claramente e têm muitas dinâmicas de poder estranhas envolvidas — "enganando pessoas para fazer coisas gay", etc., e não deveria ser assim. Acho que poucas mulheres queers procurando pornô ficariam satisfeitas ou confortáveis com a quantidade de tons e conotações não-consensuais. Precisamos de mais retratos saudáveis de relacionamentos sexuais no pornô. Novamente, isso tem que vir dos produtores, e não é tão difícil assim.

Finalmente, acho que sexo lésbico, como vendido no pornô, provavelmente contribuiu para que os homens achem OK parar duas garotas na rua e dizer "uau, eu adoraria assistir", ou abordar garotas que estão juntas num bar propondo um ménage. Ou, como já aconteceu milhões de vezes comigo, tirar fotos delas porque "é sexy". Isso faz os homens acreditarem que mulheres queers são para eles e para seu consumo, não indivíduos. Essa história de "pornô lésbico" ser o mais buscado seria revolucionária se mulheres LGBTQ realmente estivessem produzindo e participando desses filmes, colocando seu olhar nas histórias, em vez de deixar isso na mão de um cara branco que quer ver duas garotas hétero, que se encaixam na sua ideia de beleza, tocando os peitos uma da outra.

@MillyAbraham

Tradução: Marina Schnoor

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