Os Oath Keepers Estão Prontos para a Guerra contra o Governo Federal dos EUA

FYI.

This story is over 5 years old.

Noticias

Os Oath Keepers Estão Prontos para a Guerra contra o Governo Federal dos EUA

A milícia fortemente armada se juntou com os mineradores de ouro de Oregon para disputar terras contra o governo federal dos Estados Unidos.

Matéria original da Edição de Setembro da VICE.

Numa manhã tranquila de sexta, em abril passado, uma multidão de cidadãos preocupados se reuniu para uma entrevista coletiva nos degraus do Tribunal de Josephine County, em Grants Pass, Oregon. Grants Pass, uma cidade de 23 mil habitantes num canto rural notoriamente violento dos EUA, estava recebendo muita atenção da mídia naquele momento, resultado de uma "operação de segurança" liderada por um cara chamado Joseph Rice, coordenador de um grupo local de Josephine County chamado Oath Keepers, numa pequena mina de ouro chamada Sugar Pine na floresta nos arredores da cidade.

Publicidade

A natureza exata da disputa era confusa mesmo para os que decidiram tomar lados, mas isso se centrava no argumento da Bureau de Gerenciamento de Terras de que os dois homens que possuíam os títulos da mina estavam comandando as operações ali sem se submeter ao processo de supervisão federal. Rice e os Oath Keepers se mobilizaram, atraindo voluntários de todo o país, para afastar uma possível incursão da BGT. A operação de segurança tinha crescido para abranger tanto um cerco defensivo do perímetro da mina, onde dezenas de homens e mulheres armados estavam acampados, como um acampamento-base numa propriedade imobiliária ao lado da Interstate 5, onde caminhões eram descarregavam suprimentos, planos eram feitos e mais voluntários eram processados. Os escritórios locais da BGT e do Serviço Florestal estavam fechados por preocupações com a "segurança dos funcionários". "Por favor", um dos mineiros teria dito aos jornais, "parem de ligar para a BGT e ameaçar o pessoal deles".

Uma dezena de moradores emergiu do tribunal. Eles, na maior parte, dirigiam seus comentários para Rice, um homem silencioso de estatura média e barba grisalha, com braços grossos e um boné sempre presente do Oath Keepers. A mensagem da multidão para ele era simples: eles queriam que ele e os Oath Keepers se afastassem do caso. Um ex-reitor da faculdade comunitária legal pediu que ele "deixasse o processo legal, o discurso racional e a boa e velha negociação determinarem um resultado não violento – pelo bem de todos nós". Alguns falaram de modo menos sutil. Um vendedor de artigos esportivos local chamado Dave Strahan se levantou e chamou os Oath Keepers de "bandidos armados malucos".

Publicidade

Aí um jovem ativista chamado Alex Budd abriu perguntas para a impressa. Nada de substancial saiu dos repórteres presentes, porém Rice, que é um homem imponente mesmo quando não está usando um fuzil pendurado no braço, falou do fundo. "Aqui vai uma pergunta", ele avisou. "Algum de vocês falou com os mineiros sobre isso?"

Ele estava se referindo a Rick Barclay e George Backes, em nome de quem Rice e os Oath Keepers tinham se mobilizado. Strahan, um homem também imponente, virou-se para Rice e disse: "Não estou aqui para responder suas perguntas, Joseph!".

Rice repetiu a pergunta e deu vários passos em direção às pessoas que estavam falando. "Se entendi direito", ele apontou, "vocês não falaram com os mineiros." Parecia que uma briga ia acontecer na frente de todas as câmeras. No entanto, de repente, os outros se viraram, como num sinal combinado, e foram para dentro do tribunal.

O rompimento na comunicação política não poderia ter sido mais completo. Os Oath Keepers tinham começado a operação porque havia o medo de que agentes do governo queimassem os equipamentos dos mineiros e a cabana onde eles dormiam antes de eles sequer terem a chance de fazer uma apelação. As pessoas da cidade envolvidas na entrevista coletiva, e a própria BGT, consideravam essa preocupação algo entre o infundado e o ridículo. A ordem de descumprimento, que tinha começado tudo, entraria em vigor em 24 horas – e parecia que ninguém sabia dizer como tudo ia acabar.

Publicidade

Vista das Montanhas Siskiyou do centro de Grants Pass.

Conflitos como o de Grants Pass se tornaram incrivelmente comuns no Oeste dos EUA. Velhas batalhas sobre a maneira como terras públicas são gerenciadas na região encontraram um modo de expressão no movimento Patriot, uma aglomeração de grupos (alguns armados, outros não) que se descrevem como defensores da Constituição. Esses grupos cresceram rapidamente depois da eleição de Barack Obama, de 150 organizações para mais de mil em 2014, ajudando a criar uma nova política de desobediência civil armada.

Em outubro passado, meses antes do evento no Oregon, o jornal High Country News, do Colorado, publicou uma série de reportagens ligadas aos conflitos em terras públicas sob a manchete "Desarmar o Oeste". A maioria dos americanos foi introduzida ao caso assistindo ao conflito anterior em abril, no rancho de Cliven Bundy, onde centenas de voluntários armados, muitos do Oath Keepers, atenderam ao chamado para uma "guerra" com a BGT e quase conseguiram uma: diante da mídia, os voluntários armados atiraram contra a BGT e o pessoal do xerife, conseguindo fazer a agência recuar. Ninguém envolvido enfrentou penalidades sérias – um fato difícil de processar. Basta imaginar o que teria acontecido com um homem negro que decidisse expressar sua visão da tirania apontando armas para um funcionário do governo em qualquer grande cidade do país. No mês seguinte, no Cânion Recapture, em Blanding, sudeste rural de Utah, manifestantes armados liderados por membros da família Bundy e simpatizantes se moveram até uma faixa de trilha que tinha sido fechada pela BGT. O comissário do condado, Phil Lyman, que não é um extremista e contribuiu para o projeto do HCN chamado "Desarmar o Oeste", teria dito: "Se as coisas não mudarem, não vai demorar muito para tiros serem disparados".

Publicidade

Os documentos que o HCN recebeu do Serviço Florestal e da BGT mostram 50 incidentes, que ocorreram apenas entre 2010 e 2014, descritos por eles como "confrontos sérios com tons antigovernamentais". Alguns parecem expressões relativamente inofensivas de sentimento antifederal, como um homem do Colorado que, ao ter sido supostamente encontrado por agentes pilotando um quadriciclo numa zona restrita aos agentes, afirmou: "Vou foder o mundo de vocês… aposto que estão de pau duro agora… seus viados de merda… deixa eu pegar no seu pau". Isso foi antes de socar um agente na cabeça e tentar agarrar a virilha dele.

Outros casos lembram mais tentativas de assassinato politicamente motivadas: em 2013, um homem de Cochise County, Arizona, foi condenado por tentativa de assassinato depois de disparar contra dois agentes da BGT perto de sua casa, em Happy Camp Canyon. Alguns meses depois, sete tiros de fuzil foram disparados contra um empregado do serviço florestal que dirigia uma caminhonete pela Floresta Nacional Tahoe, na Sierra Nevada. Mais perto de Grants Pass, alguém, nesse mesmo ano, jogou bombas incendiárias no pessoal de um acampamento da BGT perto de Mount Hood. As citações parecem rastrear um motivo. "Vocês não têm direito de fechar estradas", frisou um visitante para um guarda-florestal da Floresta Nacional Payette, Idaho. "Isso é guerra, e vou começar a atirar se isso continuar."

Publicidade

O Governo Federal americano – principalmente através da BGT, do Serviço Florestal e do Serviço de Pesca e Vida Selvagem – gerencia cerca de 20% da paisagem americana. Essa terra está concentrada no Oeste: o Serviço Florestal e a BGT cuidam de 81% da terra em Nevada, 67% em Utah, 62% em Idaho, 53% no Oregon e 48% na Califórnia – mais de um quarto de todos os estados da região. E não é o caso de que essas terras devam ser públicas para sempre: a BGT é apenas um dos escritórios na história americana lidando com terras vagas, datando do começo da própria República, e o propósito do gerenciamento federal de terras era facilitar a distribuição de propriedades públicas para cidadãos privados e interesses corporativos. A maioria das terras que continua sob controle federal entrou no sistema depois que Theodore Roosevelt criou o Serviço Florestal em 1905, porque ninguém as queria ou por um acidente da história: a única razão para a BGT gerenciar as terras em Josephine County, por exemplo, é que uma grande conspiração envolvendo propriedades dadas pelo Estado para a Ferrovia Oregon e a Califórnia – e parcelada fraudulentamente para propósitos de lucro madeireiro – foi exposta em 1904, implicando a maior parte da delegação de congressistas do Oregon. Para restaurar a confiança do público e acabar com a conspiração, o governo federal apreendeu as terras.

Houve tentativas periódicas de entregar essas terras de volta aos estados. Isso não deu em nada porque temia-se que os estados não pudessem lidar com o fardo financeiro de mantê-las. Em vez disso, em 1946, o Congresso fundou a BGT para gerenciá-las, criando um estranho legado em que duas agências ocupam papéis aparentemente contraditórios: A BGT e o Serviço Florestal não são agências de preservação, como o Serviço de Parques, e têm a tarefa de facilitar certos níveis de exploração agropecuária, mineira e madeireira ao mesmo tempo em que protegem o meio ambiente, sítios arqueológicos e atuam como forças da lei.

Publicidade

Em 1976, o Congresso revogou o Homestead Act e o substituiu pela Federal Land Policy and Management Act, que codificava o papel do Serviço Florestal e da BGT em preservar o acesso de "múltiplos usos" para terras públicas. A lei deixou claro pela primeira vez – ou, pelo menos, pela primeira vez para quem não tinha lido os sinais – que o governo federal planejava manter os lotes no Oeste para sempre.

Isso desencadeou o que ficou conhecido como a Rebelião Sagebrush, originalmente uma pressão legislativa dos estados do Oeste para reclamar terras federais e designar áreas desocupadas como selvagens. O movimento expressava uma desconexão que nunca foi realmente curada: agropecuária, mineração e exploração da madeira no Oeste são modos de vida que nunca realmente acabaram; assim, em lugares onde o Serviço Florestal e a BGT controlam as terras, eles colocam milhares de regras que são vistas por muitas pessoas como símbolos de uma sociedade exageradamente regulamentada e comandada por um governo federal inalcançável, mais interessado em controlar do que se envolver com seus cidadãos.

O resultado é que as duas agências, na cabeça de vários habitantes do Oeste, têm o mesmo papel que o NYPD, o Departamento de Proteção Ambiental, a Comissão de Pontos Turísticos, o Departamento de Construções e o Departamento de Transporte teriam caso se juntassem numa única agência eternamente subfinanciada em Nova York. Isso não seria responsabilidade de um prefeito e de um corpo legislativo eleito localmente, mas dos dois departamentos federais (o Serviço Florestal é parte do Departamento da Agricultura, assim como a BGT é parte do Departamento do Interior) baseados em Washington e comandados por oficiais não eleitos. Esses oficiais, que fazem leis fora de um processo legislativo apesar de eles funcionarem como a força total da lei, foram apontados na era de Obama, um presidente para qual poucos desses locais da zona rural que interagem com essas agências votaram.

Publicidade

E a aplicação das leis por essas agências muitas vezes é desigual e caprichosa. Há histórias muito recentes de cabanas de mineração incendiadas dentro e em volta da Grants Pass sem a notificação que a decência humana exigiria, e muitos mineiros veem isso como uma tática de punição para tirá-los das florestas. Pensando nos anos 70, quase todo mundo da comunidade de mineração conhecia alguém que teve a propriedade queimada: uma matéria do San Francisco Chronicle de 1990 investigou mineiros sendo expulsos pelas chamas da Floresta Nacional Klamath, perto deles o suficiente para serem considerados vizinhos nessa parte do mundo. "Começamos a queimar cabanas obviamente abandonadas, que ofereciam risco de incêndio, com permissão dos proprietários", contou um oficial do Serviço Florestal. "Isso parece ter acelerado entre os caras do Serviço Florestal. Quem queimava mais cabanas? Aí isso virou uma corrida", continuou o oficial. "Então, começamos a planejar isso. Começamos a escolher pessoas para podermos queimar as cabanas. Eu mesmo já queimei cabanas. É uma sensação horrível."

A rebelião de Sagebrush nunca morreu inteiramente; hoje, isso inspira um movimento muito similar que tira força do descontentamento da comunidade e que está sendo usado para minar a legitimidade da BGT e do Serviço Florestal no Congresso. Pelo menos duas leis foram introduzidas em 2015 pedindo a transferência de terras públicas para os estados, onde os legisladores geralmente são íntimos dos interesses pecuários, mineradores e de petróleo e gás em grande escala. Num nível estadual, os legisladores têm usado o descontentamento com as regulamentações exageradas para pressionar por leis tiradas do American Legislative Exchange Council, uma organização que serve como instalação de produção em massa de uma legislação de direita apoiada por companhias como a Exxon e a Koch Industries. Mesmo sendo tão burocráticas e muito mais difíceis de responsabilizar que as agências do governo, essas companhias têm grande interesse em enfraquecer leis de proteção ambiental federais.

Publicidade

Esse descontentamento abasteceu o crescimento de grupos como o Oath Keepers, fundado em 2009 por um formando em Direito de Yale chamado Stewart Rhodes. Esse grupo agora diz ter 30 mil membros, formado principalmente por ex-militares e policiais. A agenda contrarregulatória do Oath Keepers vai de elementos sombrios e insanos profundamente enraizados no pensamento americano até coisas que qualquer um preocupado com liberdades civis e bem-estar social acharia razoáveis. Supervisores liberais os chamam de extremistas de direita; eles, por sua vez, se chamam de defensores da Constituição americana. Em muitos casos, é difícil saber a diferença.

Em Grants Pass, a questão tem a ver com disputas de regulamentação e uma longa história de desconfiança entre as pessoas que trabalham e vivem nas terras públicas e os funcionários incumbidos de gerenciá-las. Em março, os dois mineiros de Grants Pass receberam notificações da BGT informando que estavam violando regras que exigiam que eles submetessem um plano de operações de sua concessão – coisas como corte de árvores, eliminação de resíduos de mineração e construções de moradia e trabalho. Os mineiros argumentaram dois pontos: o primeiro é que a BGT tinha voltado atrás na palavra de seus próprios agentes, que teriam dito que a mina tinha um título de exceção desses processos pelo Surface Minerals Act de 1955 (essa alegação está sendo discutida no Departamento do Interior); o segundo é que, na visão deles, a BGT e o Serviço Florestal tinham um histórico de agir primeiro e justificar depois. "É assim que os policiais fazem com os mineiros", me falou Rick Barclay. "Somos como cidadãos de segunda classe. Eles só querem tirar as pessoas da floresta."

Publicidade

Barclay trouxe a questão para Rice e os Oath Keepers, que revisaram os documentos e sentiram que o caso apresentava um problema constitucional: se a BGT viesse e queimasse os equipamentos dos mineiros antes da audiência, ela estaria violando a Quarta Emenda contra busca e apreensão ilegais. Se a agência agisse antes que os mineiros tivessem chance de fazer uma queixa, estaria violando a Quinta Emenda, que garante o direito a um processo legal. Foi aí que as armas entraram na história. "A única razão para minhas coisas ainda estarem de pé", frisou Barclay, "é que esses caras estão dizendo que vão atirar em quem tentar colocar fogo aqui. Se você não quer ter o nariz quebrado, não o meta nos meus negócios".

O mineiro David Everist perto do local de uma cabana incendiada.

A placa indicando o escritório interagências BGT/Serviço Florestal é a primeira coisa que você vê ao sair da Interstate 5 e entrar em Medford, uma típica cidade cinza e verde do Oregon ao norte de Siskiyou – e uma das poucas cidades de tamanho considerável que pontuam o vasto e selvagem triângulo de terra entre Eugene, Sacramento, na Califórnia, e Reno, em Nevada. O escritório foi o primeiro lugar onde parei quando cheguei ao Oregon um dia antes da entrevista coletiva em Josephine County. Naquela quinta-feira chuvosa, o lugar estava cercado por uns cem manifestantes, alguns deles armados. Joseph Rice estava falando da caçamba de uma caminhonete branca. "Eu jurei proteger a Constituição contra inimigos estrangeiros e domésticos", ele exclamava, "e inimigos domésticos são aqueles que abusam dos direitos de alguém dentro dessa Constituição".

Publicidade

Depois dos discursos, me apresentei a Rice. Ele é um ex-piloto de helicóptero do Exército, musculoso e de andar ligeiramente manco. Quando apertei sua mão, ele foi rigorosamente educado. Fiquei vendo-o lidar com um voluntário de barba grisalha cujas fotos apareceriam mais tarde no Daily Mail. O homem chegou dizendo que faria "qualquer coisa para ajudar – só quero estar envolvido".

"Você sabe cozinhar?", perguntou Rice.

O homem respondeu que podia tentar. "E, sabe, se tiver alguma chance de participar, sabe, de um treinamento tático, estou pronto", ele destacou. Rice disse que o avisaria.

Depois, me apresentei a Barclay e Backes, os donos da mina, e a outro mineiro chamado David Everist, que me contou uma história impossível de acompanhar sobre ele ter visto sua cabana ser incendiada e ter sido preso por se recusar a abandonar o local onde minerava na floresta nacional próxima. Ele falou tanto e tão detalhadamente sobre as leis de mineração que tive de inventar uma reunião para dar o fora. Isso se tornaria uma experiência recorrente.

O protesto acabou à medida que a chuva aumentava. Fui embora e liguei para o meu contato na BGT local, um oficial de relações públicas chamado Jim Whittington, com quem eu já tinha falado de Nova York. Ele se ofereceu para conversar comigo em pessoa, e sugeri que nos encontrássemos no escritório interagências agora que o protesto tinha acabado. Eu já estava no estacionamento, uma vez que eu tinha dito para o Shawn, o fotógrafo trabalhando comigo nesta matéria, para me encontrar ali. Whittington fez uma pausa e comentou vagamente que a reunião seria "ah… inconveniente". Ele perguntou se eu conhecia outro lugar na área. Eu tinha visto um Starbucks no final da rua e sugeri isso como opção, e ele disse que conhecia o lugar. "Podemos nos encontrar lá em quinze minutos", ele afirmou, como se estivesse dirigindo pela região esperando meu sinal.

Publicidade

Shawn e eu fomos até lá. Ainda estava chovendo e fazia frio, mas o Starbucks não permitiu que fotografássemos lá dentro; então, nos sentamos embaixo de um guarda-chuva numa mesa externa. Whittington, que reconheci de fotos numa postagem um tanto sinistra de um blog antigoverno, se aproximou com um homem que pesquisou a cena e disse que ela seria satisfatória. Pedimos desculpas por estarmos na chuva, porém Whittington disse: "Não, eu ia sugerir que conversássemos aqui mesmo", ele reiterou. "Lá dentro, as pessoas podiam ouvir coisas que…" Me senti como se estivesse tentando comprar drogas.

O centro de mídia dos Oath Keepers.

O outro homem se apresentou como Tom Gorey, um oficial de relações públicas de alto escalão que tinha vindo de Washington para comandar os eventos na mina. Isso parecia razoável – Whittington tinha soado exausto nas duas vezes em que falei com ele. Eu tinha lido textos vilificando Whittington (por exemplo, uma postagem de blog intitulada "O PORTA-VOZ DA BGT, JIM WHITTINGTON, É UM MENTIROSO COMPULSIVO? ELE PRECISA DE AJUDA PROFISSIONAL?") e ouviria opiniões similares sobre ele e Gorey, considerando ambos palhaços ou manipuladores malignos. No entanto, eles eram o que você esperaria de gente de relações públicas trabalhando em questões ambientais para uma agência do governo: Whittington tinha uma fala mansa e estava usando um colete do estilo "pai que faz caminhada"; Gorey, um cara mais velho que obviamente já tinha lidado com uma boa parcela de moradores nervosos do Oeste, era um pouco mais rude e intrometido, mas só ligeiramente. Eles foram simpáticos e razoáveis, embora também fossem os representantes de um governo enfrentando um sério desafio de legitimidade, e não conseguiram nos encontrar no seu próprio escritório a 800 metros dali. A situação era pra lá de absurda.

Publicidade

Eles estavam conformados com a loucura: "Tudo que aconteceu foi que fizemos a constatação de um descumprimento", resumiu Gorey. Se Backes e Barclay não estivessem contestando os direitos de superfície, eles teriam de entregar um plano de operações ou remover sua cabana e equipamentos. "A situação é que eles estão dizendo: 'Ah, não, temos superfície'. Aí eles podem fazer um apelo." Os mineiros tinham, de fato, feito isso naquele dia, significando que o caso deles deveria ser julgado pela Câmara de Apelações do Departamento do Interior. "O direito ao processo nunca foi um problema", ele atestou. "Nada vai acontecer com a estrutura deles."

Perguntei o que tinha provocado o impasse então. "O que eles dizem é que a BGT vai queimar a cabana, tirar o equipamento deles, e que tudo isso vai acontecer antes que eles cheguem à Câmara de Apelação", explicou Gorey. Os Oath Keepers e os mineiros diziam que manteriam sua posição até que um juiz decidisse impedir a ação da BGT. E eles ainda estavam se preparando para uma aparição no dia 25 de abril, quando o aviso de descumprimento entraria em vigor. Faltavam dois dias.

Perguntei a Whittington sobre a queimada de estruturas, que era a questão correndo pela cidade até chegar à recepcionista do Motel 6 onde estávamos ficando – uma mulher de 30 e poucos anos que nunca tinha minerado na vida. "Isso aconteceu no passado", ele contou. "Nos anos 70, você tinha esses caras que basicamente faziam uma cabana e diziam que isso estava ligado à mina. Eles basicamente estavam se apropriando." Isso não ia necessariamente contra a teoria dos mineiros de que as agências queriam tirar as pessoas da floresta. "Há várias cabanas deterioradas por aí – e, sim, queimamos cabanas. Mas devemos ter queimado uma nos últimos 15 anos."

Publicidade

"A narrativa deles é que capangas da BGT vão chegar e pisotear os direitos deles", continuou Gorey. "Mas isso é mentira." Ele sabia que o ressentimento tinha vindo de algum lugar e estava na agência tempo suficiente para saber aonde isso podia chegar: "O que eles dizem é: 'Ei, vocês estão fechando as terras e não podemos usá-las do jeito que queremos'.", ele frisou. "O sucesso do movimento ambiental colocou restrições, e há esse ressentimento. Junte isso com interpretações forçadas da Constituição, coisas como [argumentar que] os xerifes são os grandes jogadores do governo – quer dizer, é isso que estamos enfrentando." Perguntei se a BGT poderia invadir o local em 25 de abril. "Somos o governo", enfatizou Gorey. "O que fazemos melhor é mandar cartas."

Perguntei-lhe qual seria o futuro da agência que arriscava começar uma revolução toda vez que tentava pedir a um acampante para reciclar suas garrafas. "Boa sorte para a milícia tentando desestabilizar o governo federal", ele ironizou. "Podemos ter perdido a batalha em Bundyville, mas vamos ganhar a guerra."

Um sinal dos tempos no Oeste de hoje: já sabíamos o procedimento antes de chegar ao local do acampamento dos Oath Keepers na cidadezinha de Merlin, a parada seguinte da estrada depois de Grants Pass. Você entra com sua 4x4 numa estrada de terra. Homens armados no portão sinalizam para você parar; depois, cercam o veículo. Você desce a janela e diz o que veio fazer ali, e eles te direcionam para o estacionamento depois da entrada. Se eles te deixam estacionar dentro do perímetro, eles conferem embaixo do seu chassi com um espelho para ver se não há explosivos. Você sai do carro, e um homem sério com uma pistola no coldre te diz para acompanhá-lo o tempo todo. Foi assim em Bundy, e é assim nas reuniões por todo o Oeste. Nosso acompanhante, que tinha uns 60 anos embora fosse alto e ágil, falou para o Shawn: "Nada de fotos. Está claro?". Três homens barbados, usando uniforme camuflado completo e carregando fuzis, nos olharam como quem encontra uma dupla de universitários na festa do pijama da filha.

Publicidade

Isso era só interpretação – em parte. Passamos pelos guardas carrancudos; assim que começou a chover, nosso acompanhante virou-se para o Shawn: "Essa coisa das fotos", ele comentou, dando o primeiro sorriso que vi na base. "Foi intimidante o suficiente para você?". Ele nos levou para o trailer velho que os Oath Keepers estavam usando como "centro de mídia", marcado com um cartaz escrito à mão. Passamos quase uma hora e meia lá dentro, durante a qual a chuva nunca parou. Nosso acompanhante nunca saiu da porta. "Nada vai acontecer", ressaltou Mary Emerick, a relações-públicas do grupo e braço-direito de Rice, quando entramos. "Mas, no caso de algo acontecer, ele está ali. E vocês sabem que ele está ali."

Os Oath Keepers são uma organização de ativistas proeminentes e grupos como o ramo de Josephine, operando com grande independência. Eles cresceram desde que Rhodes fundou o grupo depois da eleição de Barack Obama, e a mensagem deles tem sido muito mais efetiva que a das milícias dos anos 90 a que eles geralmente são associados. Eles não dizem se opor ao governo federal, por exemplo. Eles se organizam ao redor da promessa de defender a Constituição. Também juraram desobedecer dez ordens hipotéticas que acreditam que o governo poderia emitir. Isso inclui a relativamente amena "Não vamos conduzir buscas sem mandado"; no entanto, há outras que evocam traços do medo de uma guerra racial das antigas milícias, como "Não vou obedecer ordens de bloquear cidades americanas, as tornando gigantescos campos de concentração".

Publicidade

Rhodes policia sua mensagem agressivamente, se certificando de que os membros não façam comentários racistas, e apresenta o movimento como apolítico, apesar de o grupo ter ajudado a patrocinar um encontro do CPAC (Conservative Political Action Conference) e os membros armados do grupo terem aparecido em duas ocasiões durante os tumultos em Ferguson, uma ação que muitos observadores do movimento Patriot consideraram inflamatória. Só que esse agrupamento tem dado duro para se apresentar como envolvido e capaz de responder aos confrontos nas comunidades. O presidente Obama "gostaria de ver uma guerra de raças", Rhodes afirmou numa palestra recente, exortando as pessoas a se prepararem para ações como essa. "Pense no Katrina", ele continuou, "mas no país inteiro".

Ainda assim, a área do acampamento era quase perturbadoramente sossegada. Havia uma fogueira com várias pessoas ao redor, alguns trailers servindo como escritórios e uma cozinha caótica coberta com lonas. Um homem baixinho com um bronzeado forte e cabelo oleoso emergiu da cozinha, trazendo batatas fritas para Emerick. Aquela era a tarde do dia 24 de abril, um dia antes de a ordem de descumprimento entrar em vigor, e o primeiro dos dois dias que passei com os Oath Keepers. A maioria dos voluntários parecia estar na própria mina, esperando.

Emerick parecia, como qualquer pessoa envolvida num impasse, um pouco desgastada. O agente de seguro dela ligou, e ela falou com uma voz cansada que depois retornaria. "Tive um acidente descendo a colina outro dia", ela explicou. "Um coiote entrou na frente do meu carro; agora, todos os caras me chamam de Coyote Down." Ela disse que Rice tinha perdido seis quilos desde que as coisas tinham começado.

Publicidade

Alguns voluntários tinham gastado milhares de dólares em equipamentos antes de vir para cá.

Ela parecia uma guerreira antigoverno improvável, mas sua história ilustra bem como muitas pessoas normais se envolvem com o movimento constitucionalista. Ela era do sul da Califórnia e administrava uma escola fundamental numa cidade chamada Diamond Bar. Era avó e agiu assim com a gente logo que chegamos. Ela se mostrou consciente de sua idade e peso quando Shawn pegou a câmera; além disso, não parecia ressentida com nossa política ou com o fato de que dois caras tatuados com óculos de aviador tinham aparecido na operação militar que ela estava ajudando a comandar. Ela veio a Josephine County em 1989, acompanhando o marido: "Naquela época, o lugar era chamado de 'Beirute do Oregon'", ela contou. "Eu disse: 'Aonde você está me levando?'." A comparação não se aplica mais porque Beirute – e Josephine – se tornou menos violenta.

Ela viu a deterioração da segurança local em primeira mão, pois trabalhava para Gil Gilbertson, um ex-xerife do condado que conhecemos naquela manhã. O escritório de Gilbertson – fora sua simpatia assumida pelo movimento Patriot – era um lugar natural para uma constitucionalista começar. O Serviço Florestal e a BGT gerenciam 90% de Josephine County. O governo federal não paga impostos por essas terras; logo, por décadas – como ainda é comum no Oeste –, o condado recebia sua compensação na forma de royalties das vendas de madeira, o que permitiu que ele não aumentasse os impostos sobre propriedades. Só que a BGT e o Serviço Florestal foram diminuindo o comércio de madeira com o tempo, e, em 2012, o governo acabou com os programas de pagamento para o condado. O departamento de xerife quase entrou em colapso por falta de fundos: A cadeia praticamente fechou, roubos em Grants Pass cresceram 80% em apenas um ano e suspeitos de crimes presos com propriedade roubada geralmente recebiam uma multa e eram liberados. Permissões para carregar armas subiram 49%; assim, muitos cidadãos começaram a policiar a cidade por si próprios, o que levou o New York Times a dizer em 2013 que "grupos de moradores armados podem criar novas tensões" no condado.

Publicidade

Olhando para Josephine County, não é difícil pensar que, se o controle da terra fosse local, e não federal, as coisas teriam sido diferentes. Gilbertson, o ex-xerife, chegou a se recusar a apoiar uma medida eleitoral que teria trazido mais eleitores e fundos para seu departamento. Emerick apoiou essa posição. "Não é uma questão de ser antigoverno ou antilegislação", ela destacou. "Mas as pessoas estavam dizendo 'Nos dê esses milhões de dólares', e não acrescentavam nada." Gilbertson perdeu a eleição, enquanto Emerick mergulhou em seu trabalho com os Oath Keepers. Agora, ela era a chefe de operações de Rice e estava sempre em contato com Stewart Rhodes. "Mesmo antes disso", ela comentou, "Stewart falava com Joseph pelo telefone uma vez por semana. Ele quer tornar esse grupo um modelo nacional".

Rice chegou. "Por que você está falando com esses caras?", ele perguntou, bem-humorado. Rice concordou, depois de algo parecido com um ato de implorar ter surgido de minha parte, em nos levar até a mina na manhã seguinte, o dia em que a ordem de descumprimento entrava em vigor. Eu disse que tinha comprado um mapa topográfico e que planejava chegar até lá a pé, já que eles tinham impedido repórteres de ir até a mina. Ele olhou ligeiramente preocupado para mim. "Acredite, você não teria ido muito longe."

Eles estavam lidando com uma horda de voluntários. "É um problema tático se eu te der números", Emerick ressaltou quando perguntei quantas pessoas tinham chegado desde que o conflito começou. "Mas todo mundo tem de preencher a papelada quando chega – é assim que eles se livram dos malucos."

Publicidade

Perguntei que tipo de coisa eles faziam quando não estavam comandando uma operação militar, e ela disse que eles participavam de reuniões da comunidade, que foi como os mineiros os conheceram, e faziam trabalhos voluntários, que tinha sido como Emerick os conheceu. "Era um projeto de construir um parquinho para crianças deficientes", ela relatou. "Doze deles vieram, e estava fazendo 30 graus. Um incêndio florestal começou; então, eles estavam respirando quase só fumaça. Aí começou a chover. Lembro que esse cara, um guarda-florestal, continuou trabalhando – tipo: 'Bom, pelo menos está menos calor'. Quando acontece alguma coisa, são esses caras que se levantam para resolver a questão."

Essa foi nossa primeira imagem de algo que é difícil entender quando vemos a situação de longe. Passamos duas tardes no acampamento, esperando para ver o que aconteceria no dia 25 de abril, e ficamos amigos dos voluntários, fazendo piadas em volta da fogueira, comendo, indo até a loja comprar barras de cereal para os caras e Coca Diet para Emerick. Eles tinham vindo de todo o Oeste, alguns até do Alasca, e o traço mais comum entre eles – e, pelos menos para mim, um com o qual eu conseguia me identificar – era a necessidade de um propósito. "Não somos caipiras banguelos. Não fazemos aquela merda ariana – isso é o completo oposto do que queremos", um jovem chamado Matt, de um grupo de Willamette Valley, me procurou para dizer. "Isso não é liberdade. Isso não é igualdade. Fazemos cursos desde abate de pequenos animais até costura. Só queremos ajudar uns aos outros, ajudar as pessoas."

Publicidade

Eles também não gostavam da ideia de ser chamados de antigoverno, e não achamos uma só pessoa nas milícias que aceitasse o termo. Em nenhum momento, pensamos em mencionar o nome Barack Obama. Alguns caras de um grupo chamado Idaho III% nos chamaram de lado para que um deles, que deixou claro que era hispânico, pudesse falar: "Cara, não escreva que somos antigoverno ou antifederais – acreditamos num governo em que as pessoas possam dar sua opinião. Temos democratas aqui. Temos até um cara no grupo que queria fazer, sabe, mudança de sexo. E algumas pessoas viram problema nisso. E aí tivemos uma reunião, e certas pessoas tiveram de sair do grupo."

Perguntei quem teve de sair. "As pessoas que viam um problema nisso!", ele exclamou. "Somos constitucionalistas. O que a Constituição diz sobre mudança de sexo?"

Um carrinho na mina Sugar Pine.

No dia em que a ordem entrava em vigor, entramos no Toyota Tacoma verde de Joseph Rice e fomos até a mina. "Não acho que eles vão aparecer. Acho que isso não seria do interesse deles", ele comentou quando saímos do acampamento. "Mas, dito isso, hoje é o prazo final. Para nós, é uma operação de segurança, e, seja lá o que for preciso para manter a segurança da mina, é isso que vamos fazer."

Rice foi tão intenso que era enervante dividir a cabine da caminhonete com ele, embora fosse fácil entender por que jovens militares que nunca o tinham visto antes vieram até aqui para segui-lo. Ele falava com uma firmeza que te fazia pensar que ele não estava acostumado a ser questionado, porém havia algo de merecido em sua autoconfiança – às vezes, ele parava por meio minuto procurando as palavras certas, como alguém que prefere não dizer nada a falar sem primeiro se satisfazer com a justiça do que está dizendo. Ele cresceu em San Fernando Valley, Los Angeles, mas se mudou para Massachusetts quando era adolescente. Ele se juntou à Guarda Nacional de Massachusetts depois do colegial e trabalhou como piloto de helicóptero e avião, atuando depois pelo país com aviação, busca, resgate e supressão de incêndios em lugares como Havaí, Flórida, Montana e Alabama. Depois, ele foi ao Afeganistão como soldado contratado, ele contou. Lá, ele foi ferido em combate e não pôde mais trabalhar como piloto. "Quebrei o tornozelo em dois lugares e fodi o joelho. Cheguei em casa na véspera de Natal, fui ao médico e ele disse que a situação estava complicada. Já faz dois anos, e ainda estou tentando retomar minha posição de piloto."

Publicidade

Ele também foi um dos pilotos envolvidos na busca pela família Kim, uma história que virou sensação na mídia do Oregon. Uma família de quatro pessoas, indo ao litoral do Estado durante o feriado de Ação de Graças, seguiu um atalho de uma estrada remota da BGT e ficou presa na neve. Rice voou com a operação de resgate por dias e foi um dos pilotos que encontrou a família congelando no carro. Ele também ajudou a localizar o corpo de James Kim, o pai, que congelou até a morte depois de sair para procurar ajuda. A Bear Camp Road, onde eles se perderam, é talvez a estrada mais famosa da BGT do país – ela tem até uma página na Wikipédia –, e James Kim não foi o primeiro viajante a morrer ali tentando chegar ao litoral. Essa também era a estrada onde viramos quando saímos da rodovia, rumando para a floresta.

Perguntei a Rice qual era sua inclinação política. "Fiquei muito descontente com o que tenho visto acontecer com esse país depois do 11 de Setembro", ele frisou. "E acho que, se o que aconteceu com os nossos direitos e liberdades civis desde o atentado tivesse acontecido de um dia para o outro, haveria revolta nas ruas.

"Viajei muito internacionalmente", ele continuou, "e sempre sei quem é o americano, e isso é uma vergonha – eles [os americanos] são os únicos que se abaixam e tiram os sapatos no aeroporto. E, quando o governo começou a espiar os americanos, monitorar chamadas telefônicas, manter registro do tráfico eletrônico e registros dos americanos só por serem americanos, e quando falamos em escutas sem mandado, julgamentos secretos FISA, assassinato de cidadãos americanos no exterior sem julgamento, não é isso que jurei defender."

Publicidade

Apontei que os problemas que ele estava mencionado eram anteriores à administração Obama. "Não sou político – eu vejo o mundo como moralmente certo ou errado", ele explicou. "E essa situação aqui com a BGT não é um problema da administração atual. Isso aconteceu sob o Bush, aconteceu durante a era Clinton – essa é uma questão cultural de longo prazo." Viramos em outra estrada de terra e paramos para abrir um portão trancado. Ele pegou o rádio para informar que estava se aproximando. "Você não vai querer se afastar agora", ele destacou. "Você não vai os ver, mas eles vão ver você."

"…se o que aconteceu com os nossos direitos e liberdades civis desde [11 de Setembro] tivesse acontecido de um dia para o outro, haveria revolta nas ruas."

Alguém respondeu pelo rádio. "Todas as estações, fogo no buraco", alguém disse.

"Eles estão explodindo alguma coisa", pontuou Rice. Ele não disse de que se tratava, mas não eram caminhões da BGT. Tudo que eu conseguia ver eram árvores e floresta.

"Gook vai explodir sua carga!", gritou a voz no rádio. "Gook" era o codinome do chefe de segurança da mina, um soldado gigante e genioso chamado Brandon Rapolla, que esteve em Bundy Ranch. Seguimos em frente, sob medronheiros e cedros. Chegamos a uma curva na estrada, onde três homens armados com AR-15s e usando uniforme camuflado estavam parados perto de um buldôzer ladeado por trincheiras, o que deixava a estrada intransponível.

"Ei, é o chefe!", alguém gritou. Eles ligaram o buldôzer, o tiraram da estrada e o colocaram de volta na posição quando passamos.

Chegamos a uma grande clareira sob os pinheiros, onde a cabana de George Backer e Rick Barclay continuava de pé. Havia dezenas de caras ali, a maioria deles armados. Parecia que eles estavam se concentrando para invadir Yosemite. "E você não pode ver a maioria das pessoas que temos aqui", frisou Rapallo.

Backes, um homem meio índio de fala mansa e com uma longa ficha criminal, andou até nós. Rice tinha trazido um cartão gigante assinado por simpatizantes da área, feito para os voluntários trabalhando na mina. Ele estudou o cartão. "Vai levar um tempo para ler tudo, e provavelmente vou ficar emocionado pra caralho", Backes disse. "Vou escreveu alguma coisa, mas eles provavelmente não vão conseguir ler."

Passamos quatro horas na mina – o que, apesar de toda a confusão, era só um buraco de quatro por seis, cavado num encontro geologicamente auspicioso entre uma rocha de nefrite e um bloco bonito de serpentinita e saprólito. A tensão, querer ver se algo ia acontecer, acabou assim que saímos da caminhonete. Só graças a Rice, os caras da operação mantinham algum senso de disciplina, porque aqui era impossível imaginar que a BGT mandaria mais do que um pombo-correio até a Bear Camp Road. Os Oath Keepers, fossem eles uma milícia antigoverno ou não, tinham transformado o local numa zona de comando militar, onde o governo tinha se abstido. Eu estava esperando ver um impasse cara a cara. Isso parecia um duelo ao meio-dia, em que uma das partes tinha pegado o trem das 11 para fora da cidade.

George Backes lê um cartão assinado por simpatizantes locais.

Na minha última manhã ali, dirigi para encontrar Barclay, o outro dono da mina. Ele tinha uma barba grossa e era uma bola de músculos, mesmo aos 58 anos, e tinha unhas, como todos os mineiros que encontramos, mais grossas que uma moeda. Apertamos as mãos e nos sentamos numa mesa no canto de um armazém – o único local de negócios de qualquer tipo – perto da casa dele, na cidadezinha de Applegate. "Você tem GPS?", ele perguntou quando marcamos a reunião. Eu respondi que sim. "Bom", ele começou. "Você pode se perder como o resto dos turistas." Ouvi a história dele sobre ter rodado o Oeste com o pai seguindo as greves – mudando do Kansas para o Texas, do Texas para o Utah e de volta para o Kansas – e sobre como ele tinha chegado a Josephine County quando adolescente, descobrindo então a mineração. "A primeira vez que subi lá, caramba, tinha ouro ali bem nas pedras", ele destacou.

Falamos sobre as frustrações que todos os mineiros da área pareciam compartilhar. No final, foi a raiva que trouxe as armas; além disso, a distância dos políticos dos outros envolvidos na situação (os mineiros, os Oath Keepers e seus simpatizantes de um lado, e os agentes federais, ativistas e seus simpatizantes no outro) era difícil de aceitar. Eles falavam uns dos outros da mesma maneira como acontece em toda insurgência, da Irlanda do Norte ao Iraque. "Essas pessoas são bandidos", ele acusou, se referindo à BGT e ao Serviço Florestal – foram exatamente as mesmas palavras usadas para descrever os Oath Keepers na entrevista coletiva. "É uma arrogância cultural", ele afirmou. "Essa administração pisoteia nossos direitos."

Um estudioso da lei diria que as ordens administrativas da BGT são uma expressão de um direito democrático maior a fim de estabelecer agências da lei para garantir o bem coletivo. Mas talvez os supervisores liberais, agindo com uma preocupação muito justa com a intimidação política e a possibilidade de violência que ações como essa podem trazer, são rápidos demais em desconsiderar o descontentamento de pessoas como Barclay. Qualquer insurgência política nasce da distância entre o governo e os governados, o sentimento entre alguma parte da população que não consegue exercer influência política sem trazer armas para a discussão.

Algo aconteceu no Oeste nos últimos 40 anos para criar essa atitude entre certas pessoas, particularmente pessoas como Barclay, que dependem da terra para viver. Grupos como o Oath Keepers alcançaram essas pessoas e deram a elas a sensação de retomar um país tão embaraçado em regras, vigilância e controle – do NSA ao contrato com o cartão de crédito, passando pelas dezenas de milhares de regras governando o que você pode ou não fazer no que parecer ser uma floresta intocada. Você não precisa ser um membro de milícia para pensar que a ideia básica de cidadão livre foi reimaginada nesse país, sem nenhum partido político oferecendo uma voz para aqueles que lutam contra essa mudança.

Rick Barclay em Applegate, Oregon.

Você pode pensar, como eu pensava, que as frustrações dessas pessoas foram cooptadas por uma ideologia corporativista, que fez tanto quanto o governo para burocratizar e regular a vida deles. Você pode pensar, como eles pensam, que meu próprio ambientalismo e crença num bem-estar social servem de desculpa para as regulamentações do governo, que têm mudado a natureza do significado de acesso a terras públicas ou do que é ser um americano livre. Só que esses são pontos que, pelo menos nesse caso em particular, pudemos discutir como pessoas razoáveis. Há muita gente incrível envolvida, ou tentando se envolver, em operações como essa da mina Sugar Pine que parece genuinamente perigosa, e é inevitável que alguém acabe morrendo com a frequência que isso vem acontecendo.

(No momento em que escrevo, os Oath Keepers estão se mobilizando para outra ação numa mina, dessa vez por uma disputa em Lincoln, Montana, com o Serviço Florestal.) Não há resposta fácil, porém não seria ruim tentar ouvir esses grupos antes de assumir que eles são loucos ou fascistas. "Muitos desses caras acham que devemos começar algum tipo de, sei lá, guerrilha", disse Barclay. "E isso é muito contraproducente. Mas eles passam por cima das pessoas o tempo todo."

Quando terminei minha entrevista com Barclay, uma linda mulher de cabelo grisalho, usando joias elaboradas e um vestido de linho, veio se apresentar. Ele obviamente tinha se tornado um herói na cidade. "Eu só queria desejar boa sorte", ela frisou. "Eu costumava trabalhar nas minas com meu pai. Você se lembra da Lost Blue Empress?", ela questionou, se referindo a uma mina local. Barclay falou que sim. Ela apertou a mão dele.

Fomos até a caminhonete dele para ver alguns documentos, e um cara num Chevy tunado parou ao lado. "Me dá um autógrafo", ele perguntou a Barclay, brincando. "Não, sério, você está fodendo com eles, Rick." Conversamos por um tempo, enquanto o cara fazia carinho no labrador de Barclay, o Brown. "A foto do Brown saiu no Daily Mail da Inglaterra!", exclamou Barclay, admirado. "Você acredita nisso?"

Perguntei como ele se sentia tendo desencadeado toda essa loucura. Eu tinha levado um vídeo de um ativista que tinha participado de Bundy Ranch, falando sobre "pesos pesados" e anunciando que "estamos num impasse" com a BGT. Era difícil ver aquilo como algo além de um chamado para a violência. "Não podemos deixar os chineses ou o governo ficarem com o ouro", ele continuava. "Isso pertence ao povo."

"Bom, não sei de nada disso", comentou Barclay, sorrindo. "O ouro não pertence ao povo. O ouro pertence a mim."

Tradução: Marina Schnoor