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Música

Conhecemos as Pussy Riot antes de elas serem presas

As feministas mais famosas do momento.

Provavelmente, já ouviram falar das Pussy Riot, uma banda punk de feministas anónimas com letras anti-Putin, que

se recusam a tocar em palcos normais

e cujo objectivo-mor é derrubar o governo russo. Formaram-se em Setembro passado, depois do Putin anunciar que se ia recandidatar à presidência em Março deste ano, uma perspectiva assustadora, uma vez que a pobreza, os ataques terroristas, a corrupção e a perda de direitos civis têm sido os estandartes do seu reino no Kremlin.

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Desde a sua formação, as Pussy Riot têm feito manchetes com uma série de performances de guerrilha e ilegais, que incluíram tocar a “Revolt in Russia” na Praça Vermelha, em Janeiro. Acabaram presas devido às leis russas anti-protestos, mas na altura todos as oito elementos da banda foram libertados.

No entanto, foram presas novamente. A 21 de Fevereiro, o grupo deu um concerto na Catedral de Cristo Redentor em Moscovo e foi detido, mesmo antes das eleições que marcaram, a 3 de Março. Desta vez, nem todas foram libertadas: Nadezhda Tolokonnikova e Maria Alyokhin ainda estão sob custódia e iniciaram uma greve de fome, que dizem continuar até estarem de novo com as suas meninas. Todas elas correm o risco de cumprir uma pena que pode estender-se até sete anos de prisão se forem consideradas culpadas.

O assunto continua na ordem do dia e, por isso, a VICE decidiu relembrar uma entrevista que fizemos às Pussy Riot em meados de Fevereiro, a poucos dias de serem presas.

VICE: Então, o que é que vos inspirou a começar as Pussy Riot?

Kot:

As Pussy Riot iniciaram-se em finais de Setembro de 2011, imediatamente a seguir ao Putin ter anunciado que estava a planear o regresso à presidência e governar a Rússia durante, pelo menos, mais 12 anos.

Serafima:

Isso. Nessa altura, demo-nos conta de que este país precisa de uma banda punk feminista militante, de rua, que fure pelas praças de Moscovo, mobilize a energia pública contra os malfeitores do regime de Putin e que enriqueça a oposição cultural e política com temas importantes para nós: os direitos LGBT, a ausência de mensagem política na cena cultural e o domínio masculino em todas as áreas do discurso público.

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Porquê “Pussy Riot”?

Garadzha:

A rata é um órgão sexual feminino, que é suposto ser receptivo e sem forma. Por isso, queremos a revolução da vagina.

 De repente, começa uma revolta radical contra a ordem cultural estabelecida, que nos tenta definir constantemente e mostrar-nos qual é o nosso lugar na sociedade. Os sexistas têm certas ideias de como as mulheres se devem comportar e o Putin, já agora, também tem umas ideias de como os russos devem viver. Lutar contra isto tudo

 isso são as Pussy Riot.

Kot:

Não devias ter respondido a essa pergunta, Garadzha, porque normalmente não o fazemos. Quando a polícia nos interroga e pergunta: “O que querem dizer estas letras em inglês na vossa faixa?” Como nós tocamos temas anglófonos durante alguns dos nossos concertos ilegais e, como quase nenhum destes otários fala qualquer língua estrangeira, normalmente, dizemos algo do tipo: “Oh senhor polícia secreto, não é nada de especial, essas palavras só querem dizer ‘revolta dos gatinhos’.” Mas isso é mentira, claro. Na Rússia, não se deve dizer a verdade a um polícia ou agente do regime de Putin.

Quais são as vossas influências musicais?

Algumas de nós vão buscar inspiração a bandas clássicas do oi!-punk do início dos anos 80, como as The Angelic Upstarts, Cockney Rejects, Sham69 e outras deste género, que tinham energias musicais e sociais impossíveis. O som destes grupos agitou a atmosfera da sua década e a sua onda captura a essência do punk, que se resume ao protesto agressivo.

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Garadzha:

Muito do crédito vai para as Bikini Kill e as bandas da Riot Grrrl. Nós desenvolvemos o que elas fizeram nos anos 90, ainda que num contexto completamente diferente e com uma posição política exagerada, o que torna ilegal toda e cada actuação nossa. Nunca vamos dar um concerto num bar ou em palcos do estilo. Isso é muito importante para nós.

Kot:

A Tobi Vail entrou em contacto connosco depois de ler um artigo no Guardian e disse-nos que gosta muito do que estamos a fazer. Foi muito fixe ter feedback dela e do pessoal dos Le Tigre, que comentaram que a nossa performance na Praça Vermelha foi altamente. É bom ouvir isto, porque estas pessoas também nos influenciaram.

Quais são as vossas maiores influências femininas?

Serafima:

Provavelmente, a Simone de Beauvoir e o seu livro

O Segundo Sexo

. Também a Emmeline Pankhurst, pelo impulso que teve no movimento sufragista; a Shulamith Firestone, com as suas teorias malucas sobre a reprodução; a Rosi Braidotti e o seu pensamento nómada, ou as obras da Judith Butler.

Garadzha:

Como dissemos antes, em termos de grupos musicais e activismo, devemos todo o crédito ao movimento Riot Grrrl.

As Pussy Riot andam à procura de novos membros?

Sempre! As Pussy Riot têm de continuar a expandir-se e esse é um dos motivos por que preferimos usar sempre baraclavas – assim, os novos membros podem juntar-se ao grupo e nem interessa muito quem é que está. Podemos ser três, oito ou quantos formos, como no nosso último concerto na Praça Vermelha. Não interessa bem quem é que toca no próximo espectáculo, somos um corpo pulsante, sempre em crescimento.

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Tyurya:

Conheces alguém que queira vir até Moscovo, fazer concertos ilegais e ajudar-nos a lutar contra o Putin e contra os chauvinistas russos? Ou talvez até iniciar a sua própria Pussy Riot local, se a Rússia for demasiado fria e distante.

Vou arranjar uma baraclava de néon, então. Estão preocupadas com a polícia ou com a pressão do estado, se vocês aumentarem de popularidade?

Kot:

Não temos de nos preocupar, porque se os abutres repressivos do Putin atirarem-nos para a choldra, mais 10 ou 15 miúdas usarão as baraclavas coloridas e continuarão a lutar contra os símbolos do poder.

Serafima:

E hoje, com dez milhares de pessoas a irem para a rua frequentemente, o estado pensará duas vezes antes de fabricar um caso de justiça para nos arrumar. Há uma enormidade de fãs das Pussy Riot na Rússia.

Qual é o motivo por que escolhem ficar anónimas?

O nosso objectivo é distanciarmo-nos das nossas personalidades e dos símbolos, para atingirmos um protesto puro.

Tyurya:

Mudamos de baraclavas, vestidos, nomes e papéis dentro do grupo várias vezes. As pessoas saem, novos membros entram e o alinhamento em cada guerrilha das Pussy Riot pode ser completamente diferente.

Como é que vêem a Rússia com o Putin a governar?

Serafima:

Como é que vias a Líbia, no regime do Kadhafi? Como encaravas a Coreia do Norte, durante a era do Kim Jong-un, o brilhante camarada de 28 anos? Para nós, a Rússia do Putin

 o nosso “líder nacional”

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 não é diferente.

Tyurya:

Como uma ditadura de terceiro mundo, com todas as suas particulares fixes, cheias de classe: uma economia terrível e assente nos recursos naturais; níveis inacreditáveis de corrupção, ausência de tribunais neutros e um sistema político disfuncional. Com o Putin, iremos enfrentar mais uma década de sexismo extremo e de conformismo das políticas governamentais.

Qual é a vossa opinião sobre outros grupos anti-governamentais, como as Voina e as Femen da Ucrânia?

As Voina são porreiras, acompanhamo-las de perto, mas curtimos o seu período mais inicial, entre 2007 e 2008, quando elas passaram-se e começaram a fazer actos mesmo loucos e simbólicos como o "Fuck for the heir Puppy Bear!”, na noite as eleições presidenciais de 2008. Os desenhos delas de esqueletos e ossos a laser verde no parlamento russo, ou a encenação

 como prenda para o presidente da câmara

 do enforcamento de homossexuais e de imigrantes ilegais foram poderosos.

Serafima:

A nossa opinião sobre as Femen é uma história mais complicada. Por um lado, elas exploram uma retórica muito masculina e sexista nos seus protestos

 os homens gostam de ver gajas nuas e agressivas a serem atacadas pela polícia. Por outro lado, a energia delas e a capacidade em continuar a produzir as coisas são feitos incríveis e inspiradores: um dia estão na Suíça, a pular a cerca do Fórum Económico Mundial da Suíça, e no dia seguinte estão em Moscovo, a atacar a sede da maior produtora de gás natural da Rússia. E, mesmo depois de serem torturadas e humilhadas por agentes do KGB na Bielorrússia, decidiram continuar a lutar ainda mais arduamente. Essa determinação é muito importante nos dias que correm, falta isso a muitos grupos europeus e norte-americanos, mas estas miúdas sabem o que fazem.

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Qual é que foi o vosso concerto favorito até agora?

Garadzha:

Sem ser o da Praça Vermelha, todas nós adorámos aquele que fizemos no telhado de uma prisão, em Moscovo, onde estavam as pessoas que foram presas nos incidentes pós-eleitorais de 5 de Dezembro. Os presos políticos conseguiam ver-nos de dentro das suas celas e todos entoavam e acenavam, enquanto nós cantávamos a "Death to Prisons – Freedom to Protest". Os guardas prisionais e os administradores andavam a correr de um lado para o outro sem saber como agir, porque não faziam ideia sobre como tirar-nos do telhado. Ficaram tão assustados, que até ordenaram um recolher obrigatório dos reclusos: devem ter pensado que a casa viria abaixo depois de acabarmos de cantar. Isso foi brutal.

Têm já algum plano para actuarem em aparições públicas do Medvedev ou do Putin?

Tyurya:

O Putin é medricas demais para aparecer em público. Todas as suas “reuniões à porta aberta” são escoltadas por matulões e por fiéis ao Kremlin, que se abraçam e que mandam beijinhos. Mas um dia, vamos apanhá-lo certamente.

Serafima:

É melhor que ele saia antes que o apanhemos. O Putin nunca quererá encontrar-se frente-a-frente com as Pussy Riot!