O criador da Arcangel Surfware e artista Cory Arcangel.
Cory Arcangel faz um monte de trabalhos que, de cara, parecem piadas bestas. Mas aí você começa a pensar mais um pouco, e a coisa começa a parecer um comentário complicado sobre temas como obsolescência e arte nos games.
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Aos 33 anos, Arcangel foi um dos mais jovens artistas a ganhar um andar inteiro no Whitney Museum. Formado em violão no Conservatório Oberlin, ele já montou um “grupo de programação” para artistas-hackers e é provavelmente mais conhecido por uma série de videogames modificados, o destaque de sua exposição no Whitney em 2011. Ele também fez montagens de gatos em pianos tocando Shoenberg, descobriu como pedir pizza no Domino’s com uma única linha de código e pendurou “pinturas” em galerias feitas com um único clique no Photoshop.
Agora Arcangel está se preparando para lançar uma linha de roupas, a Arcangel Surfware, num evento pop up de um dia numa sala de conferência em um Holiday Inn de Nova York, onde suas novas obras de arte também estarão expostas pela primeira vez na cidade desde a mostra no Whitney.
A única promoção do evento foi um tuíte do Cory com link para um comunicado de imprensa num site comicamente datado, explicando que os produtos “consistem de tudo que uma pessoa precisa para ‘relaxar’ na cama o dia inteiro e surfar na internet com conforto”. O logo colorido apresenta um yin-yang, um emoticon, uma imagem de um laptop e o nome da marca em Comic Sans.
Parece mais uma pegadinha do que o lançamento de uma marca. Mas quando fui até o estúdio Gowanus, do artista, um assistente estava preparando o layout da exposição no computador, e Arcangel parecia totalmente sincero sobre a linha e sua estética esquisita anos 1990. Na mesa, estavam amostras de todos os produtos que estariam à venda (menos os lençóis da marca, que ainda não ficaram prontos). Agasalhos brancos, capas de aparelhos eletrônicos com a arte da série Photoshop Gradient de Arcangel, zines com códigos-fonte e discos de vinil de composições originais em Moog escritas no estilo do ápice clássico do house.
O Archangel terminou de comer um sanduíche e começou a me mostrar as coisas.
Fotos de Arcangel Surfware, cortesia de Cory Arcangel.
VICE: Eu não tinha certeza se isso era pra valer.
Cory Arcangel: Acho que muita gente achou que era piada. Não é piada. É um negócio tão descarado que muita gente nem registrou que é uma coisa real, e tudo bem. Eles acharam que eu estava tirando com a cara de todo mundo. Mas tudo escrito no comunicado de imprensa é verdade.
Fiz um rascunho, depois mandei para um departamento de comunicação e eles destruíram tudo. É um comunicado de imprensa real. Eu nunca me descreveria como um artista revolucionário. Mas quando eles mandaram de volta, pensei: “Bom, certo, essa é a linguagem dos comunicados de imprensa. Vamos seguir o fluxo – isso é meio engraçado”.
Achei que tinha sido você quem deu esse tom estranho e corporativo.
Aconteceu naturalmente, mas é 100% real. Fazia parte da ideia do projeto – se você vai trabalhar com esses sistemas, você não pode ir contra eles. É mais divertido simplesmente seguir a corrente.
Quantas dessas roupas você produziu?
Tudo que fiz vai estar na loja pop up. Ainda não sei como vou colocá-las lá. Como obras de arte? Ainda não pensei muito bem nisso. Ainda não cheguei tão longe.
Mas é uma edição super limitada, ou é mais como quando uma banda manda fazer um monte de camisetas de uma vez?
Mais banda mesmo. Acho que vamos ter um ou dois itens de edição limitada.
Parece que a coisa toda é um grande projeto de arte. Mesmo o site e as entrevistas promocionais – é quase uma performance.
Sim, talvez. Estamos trabalhando nisso há anos. Levou muito tempo para chegar no tom certo, como conceitualizar tudo e descobrir o que eu queria fazer. Mas sim, é uma ideia completa.
Obviamente, há um tema do começo dos anos 1990 em tudo, incluindo sua entrevista por e-mail impressa em Comic Sans.
Sim, Comic Sans está no logo. É uma homenagem à internet dos anos 1990. Essa é a inspiração.
A arte exposta no evento será composta de coisas inéditas?
Não faço uma exposição aqui há três anos, desde minha mostra no Whitney. Tecnicamente, é uma sequência disso, então é legal que seja mais faça-você-mesmo.
Sua incursão na moda lida com esvaziar essa ideia de importância que pode estar ligada a você como artista?
É difícil explicar – só parece que há energia aqui. Acho que muito disso é intuitivo. Eu sinto algo como: “Ah, claro, preciso fazer essas exposições no Holiday Inn agora”.
Fazer exposições em instituições é muito incrível, porque você consegue se safar mesmo mostrando coisas bem intensas, porque a instituição vai se forçar na obra e vai dar um tipo de peso, algo com que você realmente consegue jogar. Talvez esse seja só outra maneira de jogar com o lado inverso do espectro – expor num espaço que não tenha nenhum peso institucional nem nada assim. Não sei mesmo.
Um urso polar com o boné da Arcangel Surfware.
Nesse limite borrado do que constitui a arte.
Eu entrei para a arte ao contrário, de uma maneira estranha. A ideia de ser um artista foi uma decisão prática para mim. Eu só gostava de projetos interessantes, e então simplesmente me chamei de “artista” porque era o caminho com menos resistência. Mas não tenho necessariamente nenhuma hierarquia interna sobre canais de distribuição. Você pode fazer algo legal – e isso não precisa terminar numa galeria. Mas claro, gosto de fazer a coisa da galeria porque tem sua própria dinâmica.
Os perfis seus que li por aí explicam como você estudou violão na faculdade e entrou para a música eletrônica e codificação, mas o que não entendo é como você foi desses projetos hackers para grandes exposições em museus.
Também não sei se entendo isso. Você está perguntando para a pessoa errada.
Você tem um plano de carreira?
Não, definitivamente não. As pessoas simplesmente me chamam e eu continuo dizendo sim. Essa é a maneira mais fácil de explicar isso. Apenas sigo a intuição do que as coisas interessantes são, e é isso que tenho feito, e isso é exatamente a mesma vibe. Só pensei, quero começar minha própria… nem sei como chamar isso. Linha de roupas? Linha de acessórios? Li várias dessas entrevistas com artistas de hip hop, e nunca entendi do que eles estavam falando – começar linhas de roupas e tal. Agora eu sei, e é muito mais complicado do que eu podia imaginar.
De que maneira?
Linguagens diferentes, fábricas, prazos, envios, licenciamento, tudo isso. A arte, na verdade, é muito Mamãe e Papai. Eu fazia algo no estúdio e enviava para o museu. E tem várias partes envolvidas; é fascinante. Parabéns para as pessoas que têm empresas de roupas. Levou anos para montar tudo isso.
O site de promoção confunde as pessoas?
Não sei. Não falei com ninguém ainda – sabe quando você faz alguma coisa e ela some no espaço? De certa maneira, é uma coisa com que estou confortável, porque arte é isso.
Arte é alguma coisa que você faz e sete anos depois alguém diz: “Ah, isso foi muito legal”. Estou acostumado a trabalhar numa escala de tempo existencial para os projetos.
Quanto mais penso no projeto, mais ele parece ser sobre essa estética feia datada, como o logo de yin-yang.
Quando eu era criança, o surfe era popular nos subúrbios dos Estados Unidos. Quando você tinha 12 anos, você ia ao LC Penney e comprava roupas Ocean Pacific. Eu tinha um monte de adesivos de yin-yang no meu violão que eram dessas marcas de surfwear, e eu não tinha nenhuma conexão com elas, era isso que estava na minha mente.
Eu queria o yin-yang porque ele tem a ver com o lado espiritual do surfe – eu sei, é ridículo – e o computador e o smiley. Eu sabia que queria esses três itens. Em termos de visual, é como eu gosto que as coisas pareçam. Não posso explicar mais do que isso. É esse o nível do meu senso de design. É o melhor que consigo fazer.
Desculpe ter dito que era feio.
Não, estou totalmente feliz.
Dentro do estúdio de Arcangel.
Acho que qualquer explicação para o que está por trás de uma obra de arte fica aquém da experiência de simplesmente se envolver com ela.
O que eu achava que estava fazendo quando fazia arte dez anos atrás na verdade, não chegava nem perto disso. Faz sentido? Eu não estava nem remotamente perto de ter qualquer entendimento do que eu estava fazendo na época.
Numa palestra no Metropolitan, você citou Duchamp dizendo que uma parte de ser artista é fazer a arte, a outra parte é projetar a entrada disso no mundo. Isso parece relevante nesses projetos.
Certo. Não pensei em como falar sobre isso ainda, na verdade. Essa segunda parte está em andamento agora. Ainda não entendi o que é isso ainda, então estou meio que voando.
Duchamp tinha essa obra que é meio que rotatória – ela gira e quando gira faz uma ilusão ótica. Era uma obra muito famosa e ele quis vendê-la como uma invenção, então, ele fez a estreia no que era tipo uma exposição comercial para invenções, e ele tinha certeza que isso seria o sucesso da convenção. Foi um fracasso total. Vamos ver aquelas bolas de capim seco passando quando abrirmos a loja pop up.
Se for um fracasso, vai ser meio que incrível também – como obra de arte.
Nem vamos falar assim. Eu realmente quero que alguma coisa aconteça, quero continuar trabalhando com moda. Estou fazendo de tudo para fazer isso como se fosse o Lil Wayne. Quando ele faz uma companhia, ele dá duro para transformar numa companhia de verdade. Eu vou dar duro e tornar isso uma companhia de verdade. Também quero meio que apropriar o fim comercial dessa estrutura o melhor que puder. Então estamos tentando fazer sucesso.
A linha vai ser distribuída em outras lojas?
Ela vai estar disponível na loja pop up e, nesse dia, o site também vai entrar no ar ao vivo, então será possível comprar tudo pela internet, e também quero ver se algumas lojas podem pegar isso, mas não vai ser uma coisa global de qualquer maneira. Talvez algumas pequenas lojas de arte possam continuar com isso. Seja lá quem quiser pegar, dou de bom grado. Mas provavelmente as pessoas vão vir principalmente pela internet.
Você tem alguma grande aspiração que não realizou ainda? Alguma coisa fora das artes?
Só quero continuar a tentar coisas novas, acho. Eu sei que isso soa chato. É o seguinte, sempre tem tanta coisa legal acontecendo. O jeito como as coisas mudam tão rápido agora, sempre aparecem essas oportunidades. Quero fazer webisódios. Tem sempre coisas novas incríveis que você pode fazer.
Mas em termos de coisas concretas, provavelmente vou fazer mais composições no futuro e mais escultura. Essa é provavelmente a resposta mais concreta que posso dar a você. O trabalho vai mudar um pouco, acho. Tipo, acho que aqueles zines meio que representam o fim no meu tempo com computador – quando pegar todos eles, vou pensar: “OK, esse foi meu trabalho com computador, agora isso está impresso e seu meu hard drive explodir, tudo bem, não importa mais, acabou”. Hora de fazer outra coisa. Essas são ideias vagas do que está acontecendo. Mas isso pode mudar. E mais lojas pop up.
Então, você vai continuar fazendo isso?
Ah, sim, definitivamente. Essa é só a primeira linha. Quero continuar fazendo zines, fazendo discos e espero fazer outro estoque disso. Só tenho que me livrar desse antes.
Arcangel Surfware estreia no dia 17 de maio, numa loja pop up de um dia no Holiday Inn do Soho, Nova York, e on-line. Saiba mais aqui.