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AIDS

Pinturas Fortes Representam o Trauma da Crise da AIDS

“A AIDS ainda está com tudo, não é mesmo? E ainda por cima, vi no noticiário que a AIDS veio da África… de um macaco… Por que tudo tem que vir da África?”

Vista da instalação, ‘Mark Bradford. Be Strong Boquan’, Hauser & Wirth New York, 18th Street, 2015 © Mark Bradford Cortesia do artista e de Hauser & Wirth Foto: Genevieve Hanson

Surpreendentemente, Spiderman é a obra de maior sucesso em Mark Bradford. Be Strong Boquan, a nova exposição solo de Mark Bradford na galeria Hauser & Wirth. A instalação sonora de seis minutos, repleta de palavrões, expõe de forma hilária tudo o que há de errado com a discriminação pública histórica e o estigma atual e velado em relação àqueles que vivem com HIV/AIDS. A performance de Mark Bradford, exibida numa tela preta com legendas, poderia facilmente ser confundida com o especial Delirious de Eddie Murphy, exibido em 1983 pela HBO. Mas o que Spiderman e a exposição — que também inclui uma nova série de pinturas abstratas de Bradford — representam são um claro desafio à histeria homofóbica que definiu tanto os 10 primeiros minutos de Delirious quanto a opinião pública na década de 1980.

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Vista da instalação, ‘Mark Bradford. Be Strong Boquan’, Hauser & Wirth New York, 18th Street, 2015 © Mark Bradford Cortesia do artista e de Hauser & Wirth Foto: Genevieve Hanson

Andando para frente e para trás sobre o palco e vestindo uma combinação de justíssimas calças e jaqueta de couro vermelho, Eddie Murphy começa sua performance dizendo: “tenho algumas regras quando faço stand-up: viados não podem olhar para a minha bunda”, seguido pelo riso do público. “Sabe o que é assustador com essa merda toda de AIDS? É que ela mata as pessoas. As coisas não são mais como nos bons tempos em que doenças venéreas eram coisa simples.” O especial gravado logo após o início da crise da AIDS, que posteriormente seria responsável pela morte de toda uma geração de homossexuais. “A AIDS ainda está com tudo, não é mesmo?” pergunta Bradford, em uma alusão clara ao stand-up de Murphy. “E ainda por cima, vi no noticiário que a AIDS veio da África… de um macaco… Por que tudo tem que vir da África?” A primeira experiência do artista na comédia como forma de arte performática é sua forma de usar da abstração para lembrar aqueles que morreram em decorrência do HIV/AIDS. Spiderman também revela o papel que o medo desempenhou na ausência de um programa governamental que poderia ter salvado a vida de muitas vítimas dadoença. “Sei como a AIDS é um problema sério em todo o mundo. Sei que a AIDS não é engraçada. Estamos em 1996 e estou muito mais consciente sobre a AIDS agora”, disse Murphy em uma retratação pública.

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Vista da instalação, ‘Mark Bradford. Be Strong Boquan’, Hauser & Wirth New York, 18th Street, 2015 © Mark Bradford Cortesia do artista e de Hauser & Wirth Foto: Genevieve Hanson

Também estão em exibição novas pinturas que, através da materialidade de diversas camadas, remetem ao caos que a crise da AIDS dos anos 1980 deixou nos corpos de suas vítimas e na psiquê coletiva. Três pinturas, Jayquan, Maquan, eBoquan, com pontos negros sobre branco e cor-de-rosa representam de forma abstrata o sarcoma, que se espalha intensamente pela tela. Antes de o avanço nos medicamentos contra a AIDS atingirem o nível atual, em que não há mais sinais visíveis, essas eram marcas cutâneas daqueles que haviam contraído a doença. As obras também abordam de maneira sublime as batalhas que ao longo de décadas mudaram as experiências da comunidade LGBT. Os pontos parecem mapear as conquistas, obtidas com muito esforço,  da população LGBT para suas vidas, sempre com muitas cicatrizes. Há também uma cativante escultura em larga escala, Waterfall, composta de cordas e papel pintado pendurados por uma viga de metal, e o vídeo Deimos — que na mitologia grega é o nome da figura que personificava o terror — no qual são vistas rodinhas de patins movendo-se descontroladamente pela tela, possivelmente remetendo ao papel que a AIDS desempenhou no fim da atitude positiva em relação ao sexo, que culminou na cena da roller disco.

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Vista da Instalação ‘Mark Bradford. Be Strong Boquan’, Hauser & Wirth New York, 18th Street, 2015 © Mark Bradford Cortesia do artista e de Hauser & Wirth Photo: Genevieve Hanson

Tomando a crise dos anos 1980 como ponto de partida, Mark Bradford. Be Strong Boquan questiona os efeitos de longo prazo que a AIDS desencadeou nas políticas sexuais,a lacuna geracional na comunidade LGBT e o que foi feito pela sociedade para lembrar aqueles que faleceram, além de chamar atenção para os estigmas sofridos por pacientes com HIV/AIDS hoje.

Vista da instalação, ‘Mark Bradford. Be Strong Boquan’, Hauser & Wirth New York, 18th Street, 2015 © Mark Bradford Cortesia do artista e de Hauser & Wirth Foto: Genevieve Hanson

Mark Bradford. Be Strong Boquan está em exibição na Hauser & Wirth até 23 de dezembro. Para mais informações, clique aqui.

Tradução: Flavio Taam