Dismaland É um Monumento Presunçoso e Clichê à Agenda Datada de Banksy

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Dismaland É um Monumento Presunçoso e Clichê à Agenda Datada de Banksy

Bansky, os jovens britânicos têm coisas mais importantes com que se preocupar do que selfies, a princesa Diana e a ITV2.

Vamos admitir: Dismaland é um trocadilho tosco. Na melhor das hipóteses, isso é um tuíte depois de alguém ficar decepcionado com a Space Mountain ou um status do Facebook reclamando de pagar 7 euros por um cachorro-quente murcho, enquanto seu filho esperneia com medo do Pateta humano. Mas trocadilhos e metáforas visuais "sutis" são o modus operandi do Banksy desde que ele fez aquele estêncil do rato num viaduto. Policiais se beijando (é, pelos direitos dos gays)! Um homem com um lenço na cara jogando um buquê de flores em vez de um coquetel molotov (é, pela paz)! Um braço robótico saindo de um caixa eletrônico e atacando uma menininha (é, dinheiro é mau)!

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No entanto, Dismaland é mais do que um estêncil, claro; metade exposição de arte, metade parque de diversões, isso é tipo um Festival da Inglaterra ao contrário, uma celebração da decadência nacional britânica numa das partes abandonadas de Weston-super-Mare. O lugar conta com um castelo de conto de fadas decrépito, uma fonte com uma van da tropa de choque e um escorregador saindo dela, uma barraquinha de jogos onde você tenta derrubar uma bigorna de um pedestal com bolinhas de pingue-pongue. Numa época de descontentamento político local crescente, quando velhas divisões sociais são exibidas sem finesse pelo primeiro governo totalmente tory desde 1997, não é difícil entender por que a demanda por ingressos e o interesse da mídia crescem em torno da Dismaland. Porém, em 2015, Banksy consegue dizer algo além do óbvio?

Você só percebe o quanto o artista mira a esmo quando descreve suas tentativas. Walt Disney e um escândalo com carne de cavalo. Selfies com a polícia. Gatos gordos e programas de TV ruins. É uma lista bizarra, uma mistura de coisas que seu pai odeia com as reclamações de sempre de um anarquista.

Falando em TV ruim, havia um programa na televisão inglesa chamado Holiday Showdown. Nele, duas famílias experimentavam as férias umas das outras para ver como o outro lado vivia. Em 2006, eles exibiram um episódio em que a Família A, que geralmente viajava para lugares como a Tailândia, foi obrigada a aguentar uma estadia entediante em Weston-super-Mare; assim, a Família B foi tratada com escárnio absoluto por todos envolvidos por gostar das praias do sudeste inglês. Quase dez anos depois, a atitude em relação aos balneários ingleses não mudou. Eles são vistos como uma relíquia demodê da era anterior à das passagens de avião baratas, das cinzas espalhadas no caminho de uma decolagem violenta de um avião da Ryanair. Embora, antes, essa fosse a única opção para a maioria das pessoas e uma oportunidade de fazer brilhar os olhos, não de levantar a sobrancelha como hoje.

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Weston-super-Mare não dá a mesma sensação imediata de juventude de lugares como Brighton. Pelo contrário, as ruas perto da entrada de Dismaland estavam cheias de ônibus e mais ônibus lotados de gente de cabelo branco. Depois de desembarcar aqui, claro, elas se tornam uma gigantesca pegadinha de arte distópica.

Há duas filas para entrar, uma para quem já tem ingresso e uma para quem não tem. A primeira já era longa, mas a segunda era enorme, com gente sentada em cadeiras dobráveis esperando uma oportunidade de ouvir, ver e absorver o evangelho do Cardeal Banksy.

No meio do caminho, há uma sessão de revista caricata, na qual seguranças agressivos gritam com você e te fazem passar pelo detector de metais "sem razão". Participar de qualquer tipo de performance dramática amadora geralmente rende risos: você tem de ter um coração de pedra para ignorar alguém que está te fazendo rir. Isso não era um simulador de Guantánamo, eu não estava prestes a sofrer um waterboard com um galão de Fanta sem gás. Me disseram para colocar minha mochila no chão e depois pegá-la; em seguida, me desejaram "um péssimo dia".

Dentro do parque, uma coisa é imediatamente visível: filas. Filas se estendendo até onde a vista alcança. No entanto, não há barreiras nem marcas no chão. As pessoas formam filas serpenteantes por todo lado. Entendi: ingleses adoram filas! Porém, depois de sair de uma fila de uma hora, decidi dar uma olhada em volta, já que a perspectiva de esperar mais tempo atrás de outra pessoa me fazia querer deitar no chão.

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Andei no carrossel, no meio do qual há uma figura num macacão de proteção contra perigo biológico cercada de caixas de lasanha de cavalo. Os funcionários em jaquetas néon estavam uniformemente desinteressados – uma piada boa que passou despercebida para algumas pessoas, como uma mulher que ficou visivelmente irritada quando o operador da roda-gigante deu de ombros depois que ela perguntou "Quantas voltas isso dá?".

Dito isso, ainda era difícil acreditar como tudo é básico. Os cavalos do carrossel viram lasanha. Sacou? Banksy, saquei essa em 2013.

Mesmo assim, gostei de algumas coisas em Dismaland. Por exemplo, a exposição da maquete pós-revolta de Jimmy Cauty, com essa miniatura de policiais ilhados no meio do mar em cima de uma van. Mas outras coisas, como o cinema, pareciam cansadas e estranhas em vez de incisivas. Várias famílias com crianças pequenas estavam sentadas em cadeiras de praia assistindo a um vídeo do rosto de uma mulher envelhecendo, enquanto uma música sombria no pique Philip Glass tocava ao fundo. Claro, este é o ponto do lugar: sacudir os sentidos, justapor o conceito de pessoas relaxando ao sol com videoarte perturbadora. Só que, sem a cumplicidade dos espectadores, a arte é apenas boba: duas coisas olhando uma para a outra sem se compreender, como a sua assistindo ao Boiler Room.

A trilha sonora de música havaiana do parque era interrompida por uma criança pequena soltando mensagens como: "Se você se comportar, os comunistas não vão existir". Parecia algo completamente banal e não bateu pra mim. Era o tipo de coisa que um aluno metido da sexta série grita para os valentões que estão chutando sua bunda no recreio.

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O maior anticlímax do dia foi o castelo dilapidado. A maior espera do parque era para essa atração, com filas se misturando e separando. Ninguém tinha a menor ideia do que esperar – as pessoas só estavam paradas umas atrás das outras por instinto.

Dentro, havia uma tela verde na frente da qual as pessoas eram fotografadas; depois, os visitantes eram empurrados para uma sala completamente escura, à exceção dos flashes das "câmeras" da exposição. Elas iluminavam uma carruagem de princesa virada, cercada de paparazzi, com a Cinderela caída pela janela e dois passarinhos de desenho animado segurando seu vestido. Era para ser a Princesa Diana? Não sei. Acho que sim. Não liguei.

Nos últimos 20 anos, Banksy esteve ocupado construindo anonimamente seu culto à personalidade – embora tenha sido o manto de mistério que permitiu que ele fosse assimilado e corrompido. Hoje, o artista é o escrevinhador de muros anticapitalista, mas também o perfil fake do Twitter digitando mensagens positivas. Ele é um teórico num senso frouxo, apenas em sua forma memeficada. Isso é arte de cartaz, arte de papel de parede de computador, arte para rir e zombar. Estão sempre nos dizendo que esse grafiteiro invisível é um gênio, porém que evidência temos disso além de um muro pixado sendo vendido por um milhão de libras todo mês? A coisa toda grita: "Somos inteligentes. Você – mesmo não sendo não inteligente – também seria se lesse uns livros a mais. Você não tem angústia suficiente; então, aqui vai algo escondido num bolo de chocolate para você não ter de pensar muito". Isso não está zoando com os merdunchos tentando se divertir no sol da praia, e sim colocando uma mão pretensiosa no ombro deles e falando: "Claro que você pode andar nos brinquedos do parque, mas que tal abrir os olhos de uma vez?".

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Também acho uma coisa traiçoeira fazer um lugar propositalmente tosco e insatisfatório para que, quando as pessoas saiam de lá se sentindo alienadas e insatisfeitas, elas possam dizer que isso é parte da experiência.

Dismaland parece uma oportunidade perdida de Banksy e sua turma. Nas últimas duas décadas, mais e mais pessoas jovens vêm sendo marginalizadas ao mesmo tempo em que o mundo escorre em direção à aniquilação de tudo que elas amam: diversão, justiça, liberdade, perspectivas – qualquer coisa que lembre um futuro positivo. Ainda assim, o homem que poderia ser seu maior representante artístico fica feliz em martelar os mesmos tropos de que Nigel Havers reclama num episódio de Grumpy Old Men. Fazer fila; ser enganado por funcionários de barracas pouco confiáveis; seguranças excessivamente zelosos; cultura das celebridades; todas as reclamações que sustentam a hipocrisia sorumbática do estilo de vida "Keep Calm". Enquanto o twitter Very British Problems tiver seu próprio programa na televisão, realmente precisamos de Dismaland?

O que Banksy criou aqui foi um monumento endurecido para suas próprias picuinhas datadas, o que – num momento em que os jovens britânicos têm mais com que se preocupar do que selfies e ITV2 – manifesta mais um desfile de desilusão do que um comentário social cortante. Seu livro de colorir anticapitalista no estilo "Siga os números" se tornou tão arcaico quanto o cenário à beira-mar desse monumento cafona aos males da humanidade.

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Andei na roda-gigante e olhei para a praia de Weston-super-Mare. A maré estava lentamente subindo, como água derramada escorrendo por cima de uma mesa. Vi uma fila de crianças andando de burro pela areia molhada da praia. Era hora de deixar Dismaland e encontrar um burro para mim.

Todo mundo na praia estava rindo e correndo. Uma garotinha pegava punhados de areia e os jogava com raiva em piscinas de água parada. Se você queria uma dose de niilismo britânico inútil, não precisava ver mais do que essa cena.

Eu me aproximei do dono dos burros e pedi para dar uma volta. Só para crianças, ele me disse: limite de peso de 45 quilos.

Parecia que eu não me encaixava em nenhum lugar de Weston-super-Mare, nem em seu parque de diversões sem diversão, nem nas costas de seus heroicos burricos. Saí fora.

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Tradução: Marina Schnoor