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Marcha da Maconha 2011

Se existe um marco zero pela luta da legalização da maconha no país, certamente é Ipanema. Foi no verão da lata em que o Posto Nove explanou-se pela primeira vez como ponto de encontro dos amantes da erva.

Se existe um marco zero pela luta da legalização da maconha no país, certamente é Ipanema. Foi no verão da lata em que o Posto Nove explanou-se pela primeira vez como ponto de encontro dos amantes da erva, tradição que permanece até hoje, após diversos episódios de enfrentamento, como o verão do apitaço nos anos 90 e mais um recente acontecimento conhecido como “a chuva de cocos na polícia”. A praia também é cenário desde 2002 de manifestações pela legalização da maconha, sempre no segundo fim de semana de Maio, em sintonia com marchas por todo mundo. A partir de 2007 o evento passou a ser conhecido como “Marcha da Maconha”, espalhou-se para outras cidades e vem atraíndo cada vez mais manifestantes e mídia.

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“Maconha, vende pra caralho” já dizia aquele proibidão do final dos anos 90. E essa é uma máxima que editores de revista e jornal levam muito a sério, seja pra denunciar uma apreensão, divulgar um estudo sobre o potencial medicinal da erva ou cair de malho em cima do movimento pela legalização que eles adoram estampar folhas, com camarões e tijolos de maconha nas suas capas -- é batata. Afinal, somos três milhões de maconheiros declarados no país ávidos por informação esperando a legalização para poder sair do armário e botar a estufa pra funcionar.

No decorrer dos anos, a Marcha vem arrumando uma série de tretas com um belo time de reacionários como o movimento integralista, os carecas do Brasil, a Igreja Católica e um punhado de deputados da banca conservadora e religiosa. Neste ano, foi a vez do nada-saudoso ex-governador e líder de milícias Anthony Menininho se manifestar contra a marcha. Antes disso, a PM carioca já havia prendido militantes que distribuíam panfletos convocando para a Marcha no boêmio bairro da Lapa, repetindo o que já havia acontecido em 2008. Desta vez, dez policiais da tropa de choque, destacados para conter assaltos dos “menores cracudos” na área, conduziram os quatro militantes à delegacia, de onde, após acionados os advogados da Marcha André Barros e Gerardo Santiago, foram liberados e responderão por apologia, num processo que certamente será arquivado como em 2008. Alguns dias depois saiu a decisão judicial que autorizaria a Marcha, isentando os manifestantes de serem acusados por apologia. A decisão baseava-se na liberdade de expressão e reunião garantidas pela constituição federal, e também pela costituição do Estado do Rio de Janeiro que diz que a força policial só será acionada para garantir a realização de uma manifestação. Ainda assim, um par de dias depois, a PM voltou a prender militantes que panfletavam. No entanto desta vez, a Policia Civil não autuou e os liberou.

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Com a autorização, os diversos grupos e indivíduos que organizam a Marcha no Rio intensificaram a divulgação, chegando a colocar um avião sobrevoando a orla, rebocando uma faixa de 20m convocando para o evento. O bloco carnavalesco Planta na Mente convocou uma série de ensaios abertos e festas para divulgar e levantar uns trocados para a realização da marcha. A última festa, marcada no campus da UNI-Rio, foi cancelada de véspera pela reitoria alegando suspeitíssimos problemas técnicos. O bloco agilizou-se para mudar o evento para a praia de Botafogo, onde passaram algumas horas ensaiando suas marchinhas herbífumas numa boa, dentre estudantes, canabistas, membros da torcida jovem do Botafogo e outros habitantes dos subterrâneos daquela enseada normalmente desabitada. A festa foi interrompida pela ação da polícia, acompanhada de uma enraivecida vizinha indignada com o barulho -- fato curioso, pois o prédio mais próximo ficava a quatro avenidas de distância. Após muita discussão, a PM encaminhou um representante do Bloco para a delegacia, onde o delegado de plantão aguardava do lado de fora da porta para dizer que não ia registrar tal palhaçada, sequer permitir a entrada de nenhuma das partes.

O sábado, dia 7 de Maio, amanheceu com um belo sol e, a partir das 14hs, canabistas de plantão e muitos repórteres começaram a se concentrar no Jardim de Alá, onde rolaram emocionados discursos dos advogados e organizadores da Marcha -- do músico Pedrada, da banda Planta de Equilíbrio, que foi preso ano passado por cultivar maconha, deste que vos fala até o Tico Santa Cruz e Carlos Minc (vocês achavam que eles não vinham? É?!). Teve um curioso papagaio de pirata, que deu entrevistas para todas as TVs, colava o tempo todo do lado dos discursantes, falou umas bobagens e absolutamente ninguém da organização jamais havia visto antes. Se não é pinel ou P2, certamente sairá (ou já saiu) de candidato nas eleições. Após a discursada, a Marcha saiu rumo ao Arpoador, com um carro de som bem maior que o dos anos anteriores e uma fusão do bloco Planta na Mente com a Orquestra Vegetal (formado pela facção canabista da Orquestra Voadora) que resultou num belo revezamento das marchinhas com grooves e reggaes.

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A galera do fórum Growroom e da Radio Legalize produziram várias faixas e um baseado gigante que cuspia fumaça verde -- a sensação do evento. Eles também distribuíam adesivos que os manifestantes colavam pelo trajeto, indo parar mais de uma vez nas motos e viaturas da PM que controlavam o trânsito. Numa dessas, lá pelo final do percurso, um manifestante mais exaltado teve a brilhante ideia de colar o adesivo no colete à prova de balas da PM. Ele foi imediatamente detido e arrastado violentamente para fora da Marcha, sendo seguido por repórteres e manifestantes que logo ocuparam as duas pistas da praia e cercaram a polícia de vaias. A resposta da PM veio em forma de gás de pimenta e da prisão de outros dois menores de idade. No final da história, os dois menores responderão por desacato e quem colou o adesivo ficou de testemunha, visto que o delegado não entendeu em sua ação nenhum crime. Depois desse episódio, o tratamento respeitoso com a polícia caiu por terra, e os manifestantes encerraram a Marcha bradando “Puta que Pariu! A PM é a vergonha do Brasil” e o clássico “Ei! Policia! Maconha é uma delicía!”.

Oficialmente encerrada a Marcha, as hostilidades cessaram, uma vez que a maioria dos soldados queria voltar pra casa. Em ritmo de maconheiro, a Marcha, que saiu do Jardim de Alá por volta das 16h20, chegou na entrada do Arpoador lá pelas 19h. Fontes internas revelam que um grupo de policiais planejava entrar com um ação de bullying contra a Marcha, mas até agora isso não passa de especulação. O fato é que é impossível eles não terem refletido sobre os discursos e faixas que dentre várias linhas de pensamento concordavam que quem é contra a legalização é a favor do tráfico de drogas.

TEXTO E FOTOS POR MATIAS MAXX