Congresso aterroriza movimentos sociais com reforma na Lei Antiterrorismo

MTST protestando na Av Paulista

Cada geração tem seu movimento social que ficou lembrado na história do Brasil, a exemplo dos caras pintadas, nos anos 1980, e os atos das Jornadas de Junho, mais recentemente em 2013 – e que implodiram a noção de que é na rua que povo mostra suas queixas e aceitações àqueles que regem os governos democráticos.

Apesar do direito à manifestação, sempre existem aqueles que acabam se exaltando ou extrapolando o próprio exercício de manifestar e, às vezes, acabam criminalizando as manifestações, quaisquer que sejam sua posições políticas ou ideológicas. Para assegurar que os confrontos não ofereçam risco à vida dos próprios manifestantes, a legislação, por meio da Lei Antiterrorismo criada em 2007 e aprovada em 2016, consiste como terrorismo “a prática de terror social por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião”.

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Ou seja, a lei 13.260 rege as penalidades contra a prática e o financiamento de crimes terroristas, ameaçar, transportar e guardar explosivos e gases tóxicos, conteúdos químicos e nucleares que interfiram na ordem pública. As penas variam entre 12 a 30 anos de reclusão em regime fechado.

Incendiar, depredar meios de transporte públicos ou privados ou qualquer bem público, hackear sistemas de informática, de comunicação ou de transporte também estão inclusos na lei como crimes terroristas.

Na saga de aprovação entre as casas legislativas, o debate acerca da lei alertava sobre uma parte do texto que permitia que juízes criminalizassem as ações de movimentos sociais. Quando passou pelo Senado, foi retirada qualquer criminalização de movimentos sociais e as manifestações políticas no texto final. Na sansão, a então presidente Dilma Rouseff (PT) vetou qualquer possibilidade que apontasse riscos contra os movimentos.

Agora, em 2018, a lei voltou a ser discutida na Câmara dos Deputados. O Projeto de Lei 272/2016, elaborada pelo senador Magno Malta (PR-ES), propõe uma emenda na Lei Antiterrorismo para complementar outras condutas consideradas como atos de terrorismo. E, dessa vez, o documento que foi discutido no dia 31 de outubro deste ano, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ) no Senado Federal, propõe que quem abrigar pessoas que tenham praticado algum ato de terror sejam presas em regime de segurança máxima e punição de atos relacionados a motivação política, ideológica ou social.

Magno defendeu a reforma dizendo ao jornal O Globo que “eles [os movimentos sociais] estão com medo porque o que eles fazem é terrorismo mesmo e têm de ser punidos”.

Durante campanha eleitoral, o então candidato e agora presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), aliado de Magno Malta, afirmou que as ações do Movimento dos Sem Terra (MST) e Sem Teto (MTST), além de outros, devem ser enquadradas na Lei Antiterrorismo.

Para o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), o novo texto permite prender militantes de movimentos estudantis e sindicais. “Estamos criminalizando o MST”, enfatizou o parlamentar, que defendeu uma audiência pública antes da votação no plenário.

O professor Marcelo Figueiredo, do departamento de Direito Público da PUC-SP, relembra que liberdade de manifestação e de expressão são ambos direitos constitucionais e não podem ser diminuídos ou restringidos fora das hipóteses da Constituição. “Não se pode criminalizar a livre manifestação de pensamento, ou o direito de associação e protesto”, complementa. O Código Penal já pune as ações de excessos, como invasão de propriedade ou destruir uma propriedade pública, acrescenta o mestre em Direito.

Desde a discussão do projeto de lei, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) desaprovou os pontos de criminalizar a conduta dos movimentos sociais da Lei Antiterrorismo. O advogado Manuel Nabais da Furriela, representante da Comissão de Direito do Refugiado, do Asilado e da Proteção Internacional da OAB, conta que “a Constituição prevê o direito das pessoas se associarem, de pertencerem a um determinado tipo de organização, sindicato, partido político e inclusive os movimentos sociais”.

Manuel indica que o ideal seria se a legislação aprimorasse as questões que identifiquem os grupos e organizações que promovem o terrorismo, para não permitir que entidades sejam criadas com esse propósito. “O que não se pode é simplesmente criminalizar sem nenhum tipo de verificação a fundo, se efetivamente elas [as organizações] são ilegais ou possam causar algum tipo de problema”, finaliza.

Agora é aguardar a nova data em que a CCJ irá discutir e revisar o tema antes da votação na Câmara dos Deputados, e acompanhar qual será a situação dos movimentos sociais na Lei Antiterrorismo.

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