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Marie-Eve De Grave: Li o primeiro livro dela, Le noir est une couleur, e fiquei com uma impressão forte. Pensei "isso é uma coisa e tanto!" Então acompanhei Réal em 2005, durante sua última jornada a Paris, e a filmei. Mas ela estava doente, no fim de sua vida, e isso deixou uma impressão forte em mim. Senti — não que eu amasse essa mulher —, mas fiquei profundamente tocada por ela.Como foi filmar Réal no hospital, logo antes dela morrer?
Não me dei conta de que ela estava morrendo, honestamente. Mas pude filmar seu último poema, Morte de uma Prostituta, o que foi um presente maravilhoso. Aí ela morreu duas ou três semanas depois, e eu pensei "o que vou fazer com esse presente?"Por que você acha que Réal não é tão famosa internacionalmente?
Quando seu livro foi lançado em 1974, ele foi editado de certa maneira, e as pessoas que o publicaram não viram o poder dele. Viram só uma prostituta. Mas Grisélidis não era apenas isso. Levou tempo, e um editor que estava disposto a reler todos esses livros e dar a eles uma segunda vida.A percepção dela como uma trabalhadora sexual que virou escritora limitou seu sucesso artístico?
O fato de ela ser uma prostituta a seguia como uma sombra. Sim, ela era uma prostituta, mas é uma vergonha que ela tenha sido definida por isso. Grisélidis também era uma artista.Como ela era pessoalmente?
Quando a conheci, tive essa sensação de familiaridade, como se já a conhecesse. Ela era muito sincera; ela tinha uma personalidade enorme. Ela olhava para a sociedade com grande humanidade. Fiquei impressionada com a inteligência dela.
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Acho que estamos num período muito estranho e retrógrado. Tudo pelo que nossas mães lutaram — liberdade, igualdade, liberação sexual — bom, agora estamos de volta à idade média. Claro que ser prostituta é horrível quando você é explorada ou traficada. Mas há tipos diferentes de trabalho sexual. As prostitutas que conheço são muito inteligentes e conhecem profundamente a humanidade. Elas já viram de tudo.Como tem sido a reação ao filme?
Tenho conhecido mulheres que se identificam como feministas e que odiaram. Elas se opõem ao retrato do trabalho sexual. Sinto que nossa sociedade não lida muito bem com o sexo. Sexo é tudo, mas temos medo dele. Grisélidis sabia disso, ela entendia esse tipo de alienação. Mas a realidade é que o trabalho sexual é muito mais complexo e complicado. Era isso que ela estava dizendo.Você mostrou o filme para alguma trabalhadora sexual? O que essas pessoas acharam?
Muitas pessoas que conheciam Grisélidis assistiram ao filme. Elas ficaram emocionadas com a complexidade que o filme dá a ela.Réal contradizia dois grandes tabus da sociedade — ela era uma mãe não-convencional (alguns diriam uma mãe ruim) e trabalhava abertamente como trabalhadora sexual. Foi difícil representar isso?
Não posso dizer que foi fácil para os filhos dela, ter uma mãe como Grisélidis. Mas agora eles são livres, são artistas, assistentes sociais e pintores. Eles fazem o que querem, eles não ligam para conformismo.Para mim, Grisélidis era cheia de paradoxos — como todos nós. Você é mãe, mas às vezes não quer ver seus filhos, é esposa mas às vezes não quer ver seu marido. Acho que se fôssemos honestos com nós mesmos, aceitaríamos que ser humano é difícil. É um trabalho muito duro!Tradução: Marina Schnoor.Siga a VICE Brasil no Facebook, Twitter e Instagram.