Vivi como um profissional do Instagram por uma semana

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Vivi como um profissional do Instagram por uma semana

Não basta viver, tem que viver com estilo.

Esta matéria foi originalmente publicada na VICE Alemanha .

Odeio começo de ano. Nunca sei o que fazer da vida — com todos esses meses em branco pela frente, zombando de mim por não ter um plano para eles ainda. Fico me sentindo como se estivesse preso num videogame, numa fase que ainda não sei jogar direito. Eu deveria estar pegando moedas? Socando inimigos? Melhor só esperar?

Durante esses meses incertos do ano, encontro algum consolo acompanhando de perto aquele segmento da sociedade que sempre parece ter tudo planejado — instagramers profissionais. Essas pessoas não vivem simplesmente, elas vivem com estilo. Elas sempre estão lindas nas selfies, levantando uma taça de Chandon com a legenda "Ano novo, novo eu! Muitos projetos excitantes pela frente!" Já sou meio vlogueiro, mas o único "projeto excitante" que tenho para 2017 é aprender a coreografia completa de Thriller. O que é excitante, mas não do mesmo jeito.

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Todas as fotos cortesia do autor.

Suspeito que a vida seja melhor quando você vive um tipo de existência que atrai seguidores no Instagram. Muita gente diz que o Instagram não é real e que é tóxico comparar sua vida com a dos outros — o que eu sei que é um conselho bem-intencionado, mas chatinho. Acontece que eu adoro me comparar com os outros — e se os outros conseguem, por que eu não posso encher minha vida de #promessasdeanonovo e filtros que tornam cada momento capturado mais significativo? Talvez seja a única coisa que consiga me tirar dessa deprê do começo do ano.

Dia 1

Fui num evento para blogueiros e influencers das redes sociais uma vez, que na verdade era só uma apresentação de eletrodomésticos. Socializei com dois blogueiros de culinária lá, que me disseram que purê de grão-de-bico é igualzinho massa de cookie. Então, com os ventos dessa experiência nas velas, decidi começar minha semana fazendo massa de cookie de grão-de-bico para o café da manhã. Eu já tinha todos os ingredientes no armário da cozinha mesmo — grão-de-bico, leite, açúcar, baunilha e gotas de chocolate. Pode me chamar de Gwyneth.

Quando acabei de amassar o grão-de-bico, fui pra cama com meu notebook e uma revista de moda, porque parecia o lugar mais Instagram para consumir aquele café da manhã questionável. Legendei esse momento na minha mente como um gostoso "Café da manhã na cama!" e comi minha primeira colherada. Logo percebi que puré de grão-de-bico não parece nada com massa de cookie. O gosto era de decepção. Todo mundo sabe que blogueiros de culinária são os influencers mais perversos das redes sociais, mas eu não esperava que eles fossem mentir na minha cara. Algo me diz que vai ser uma longa semana.

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Dia 2

Depois da decepção de manhã de ontem, meu dia não ficou muito mais Instagram. Então hoje, decidi investir pesado. Depois de almoçar num restaurante, obriguei meu namorado a tirar uma foto minha no esquema "look do dia". Levei 45 minutos para montar esse visu hoje de manhã e levei minha câmera SLR para o almoço, só para capturar perfeitamente esse visual espontâneo e casual.

No meio da sessão, percebi que precisava mostrar as canelas se queria me passar por uma estrela do estilo do Instagram. Então tirei minhas meias e as joguei para fora do enquadramento. Como estrelas do estilo do Instagram sobrevivem de canela de fora num frio de -3º C é algo que ainda não entendi direito. Quando terminamos, meu namorado e eu escolhemos uma das 50 fotos que fizemos — uma que dissesse #arrasou.

LookdoDia concluído com sucesso.

Dia 3

Todo mundo que é popular no Instagram faz ioga, fato. Mas parece que ninguém faz para relaxar — você sempre lê a frase "Estava numa reunião depois corri pra casa para fazer um pouco de ioga". Por que não fazer uns exercícios de respiração calmamente no caminho pra casa então, né? Bom, consegui incluir uma sessão de ioga de 20 minutos no meu dia hoje.

Decidi fazer isso com ajuda de uma aula de ioga no YouTube. O instrutor dizia para imaginar que você estava "inalando um fio dourado pelo nariz". Se estivesse realmente inalando um fio dourado, eu teria um ataque de pânico, mas tenho que admitir que exercícios de ioga são realmente relaxantes. Tão relaxantes que acabei esquecendo de tirar uma #selfie enquanto fazia minha ioga. E se não postei uma foto fazendo ioga no Instagram, eu realmente fiz alguma ioga?

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Dia 4

Talvez por causa da ioga, acordei às 6 da matina. Como uma aranha em sua teia, pronta para atacar um inseto distraído, esperei meu namorado, Dominik, acordar para tirar uma foto das minhas costas enquanto eu fingia que estava dormindo.

Parece simples, né? Mas o Dominik levou uns 5 minutos para fazer um clique em que eu parecia casual e relaxado no meu sono falso. Depois que ele posicionou meus membros perfeitamente e tirou a foto, era hora do café da manhã. Fomos para um lugar que já vi no Instagram algumas vezes, que serve "açaí na tigela". A tigela era uma belezinha mesmo, mas foi difícil tirar uma boa foto do prato. A luz naquele lugar era um pesadelo para influencers como eu, sinceramente.

Se isso já não fosse ruim o suficiente, percebi que depois de passar quatro dias como instagramer profissional e eu ainda não tinha sido convidado para nenhum evento com outros instagramers. Inaceitável. Minha raiva súbita me fez convidar meus amigos mais bonitos para ir a um bar da moda, tomar uns drinques e comer finger food. Alguns apareceram, mas quando tentei explicar o que estava fazendo, ninguém deu muita bola. Eles não se importaram de tirar uma selfie todo mundo junto, mas quando comecei a discutir a hashtag que a gente deveria usar, recebi uns olhares tortos. Muito depois a gente dividiu a conta e corri para casa pra fazer um pouco de ioga.

Dia 5

Por mais que eu tire sarro dos profissionais do Instagram, tenho que admitir que ser um por uma semana é exaustivo. Não é fácil tentar achar pequenos momentos da vida cotidiana que podem ser interessantes o suficiente para compartilhar com outras pessoas.

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Além disso, macacos selvagens tiram fotos melhores do dia deles que eu. Sempre que eu tentava fazer um flatlay (quando você fotografa objetos de cima) minha mão começava a tremer. Agora tenho umas 52 fotos de uma tigela de açaí no celular, o que fica dando aquela mensagem chata de "você precisa liberar espaço no seu aparelho". A maior ajuda que tive essa semana foi meu namorado, que explorei como um estagiário numa revista de moda. Mas foda-se — minha vida parece maravilhosa e tudo está indo às mil maravilhas agora.

Dia 6

Se quero ter uma vida prolífica e de sucesso no Instagram, preciso dar outra chance para comidas. Então decidi fazer uns muffins de mirtilo veganos sem açúcar.

Apesar de não dizer isso na receita e ninguém que conheço ser intolerante a lactose, usei leite sem lactose e escolhi farinha sem glúten para fazer meus muffins — acho que não conta como receita no Instagram quando tem glúten no processo. Saindo do forno, os muffins ficaram uma porcaria, mas chiques o suficiente para usar de acessório no meu #flatlay acima.

Dia 7

Hoje é o último dia do meu experimento e tenho a coisa toda planejada. Acordei cedo, preparei um café da manhã saudável e saí pra fazer jogging — principalmente para postar uma foto minha com o look de jogging. Meus seguidores parecem ter apreciado meu plano já que comecei a receber likes mesmo antes de sair de casa. Mas lá fora estava frio pacas, infelizmente. Como sou o tipo de pessoa que abre muito a boca quando está correndo, tipo um golden retriever, depois de alguns minutos minha garganta estava doendo tanto que parecia que eu tinha engolido uma gilete.

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Voltei pra casa — depois de cinco minutos de corrida, mas meus seguidores não precisavam ficar sabendo. Fiquei me sentindo culpado, então resolvi cozinhar mais alguma coisa — cookies dessa vez. A receita levava 400 gramas de açúcar, nenhum grão-de-bico e uma caralhada de glúten e dessa vez realmente consegui comer todos.

A vida como um profissional do Instagram não é fácil como parece e, por coincidência, a vida em geral não é fácil como os instagramers fazem parecer. É possível que minha vida seja simplesmente chata demais para ser acompanhada por estranhos, mas suspeito que não sou o único. É só não gosto de lidar com as pressões que vêm de fingir que a vida é sempre ótima e que tem sempre uma lição inspiradora para tirar de todo momento mundano.

Bom, tentei ver as coisas assim: cookies de grão-de-bico estão para cookies de verdade como momentos do Instagram estão para momentos reais, espontâneos e maravilhosos da vida. E esse pensamento pode ser o que eu precisava para derrotar minha deprê de começo de ano.

Tradução do inglês por Marina Schnoor.

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