Viagem

Fotógrafa retrata o belíssimo universo negro

No verão passado, quando Dev Hynes lançou Freetown Sound, seu terceiro disco de estúdio sob a alcunha de Blood Orange, ele escolheu para a capa a foto de um jovem casal negro apaixonado. Bem vestido em tons de verde-amarelado, os braços em torno de sua garota, um jovem sentava na cama, olhando diretamente para a câmera na foto de um ambiente interno em grande formato. “Binky & Tony Forever”, como se chamava a foto, foi encenada em 2009 pela fotógrafa Deana Lawson em seu próprio quarto. Na vida real, Binky e Tony são amigos, não amantes, mas o objetivo da foto altamente estilizada é retratar o amor negro, pouco representado, como jovem, feminino e livre.

Deana Lawson, Kingdom Come, Addis Ababa, Etiópia, 2015. Impressão de jato de tinta, em moldura Sintra,55 x 44 polegadas. Edição 1 de 3, com duas provas para o autor. Cedida pela artista/ Rhona Hoffman Gallery, Chicago.

Visualizar uma negritude muitas vezes invisível é um tema que surge ao longo da obra fotográfica de Lawson, que viaja o mundo criando imagens de negros em locais como Haiti, Congo, Jamaica, Etiópia, o sul dos EUA e sua vizinhança em Bed-Stuy, Brooklyn. Em Deana Lawson, sua mais recente exposição individual no Contemporary Art Museum em St. Louis, fica ainda mais claro que por mais que as fotos da artista de 36 anos sejam tiradas em lugares distantes e envolvendo completos desconhecidos, o esforço de todos os envolvidos vai contra clichês culturais. É como se Lawson fosse a responsável pela composição de um álbum de fotos familiar intimista que retrata os detalhes internos vívidos e significativos de um universo negro contemporâneo.

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Deana Lawson, Kingdom Come, Addis Ababa, Etiópia, 2015. Impressão de jato de tinta, em moldura Sintra,55 x 44 polegadas. Edição 1 de 3, com duas provas para o autor. Cedida pela artista/ Rhona Hoffman Gallery, Chicago.

As fotos altamente posadas dão a impressão de que Lawson, que exibirá novos trabalhos de no Whitney Biennial deste ano, começa tudo com um conceito. No caso de “Kingdom Come”, tirada em 2015 em Addis Ababa, Etiópia, esta poderia muito bem ser encarada como um retrato de linhagem e tradição. Já “Otisha”, tirada em Kingston, na Jamaica, conta uma história diferente, uma história de negritude que subverte noções clássicas de beleza enquanto objeto a ser usado somente pelos branco. Usando a Vênus como inspiração, Lawson cria, a partir da negritude, sua própria definição, criticando os monopólios estéticos estreitos que a branquitude impõe sobre o corpo, a sexualidade e o canône do retrato. Sua figura resiste à reclinar-se, usando o sofá branco da sala para manter uma pose assimétrica, elevando-se. A porção inferior do corpo da modelo angula-se para fora do sofá, comunicando assim uma ruptura no posicionamento da beleza, feminilidade e força negras.

Deana Lawson, Otisha, Kingston, Jamaica, 2013. Impressão de jato de tinta em moldura Sintra, 35 x 45 polegadas. Cedida pela artista/Rhona Hoffman Gallery, Chicago.

Deana Lawson, a exposição, mostra como a fotógrafa lida com uma grande variedade de tradições fotográficas de forma a capturar a estética negra pelo mundo. A exposição conta ainda com as obras “Emily and Daughter” e “Khadafi”, duas imagens apropriadas impressas pela artista em 2015. A primeira retrata o amor de uma mãe, já segunda mostra um homem negro bem-vestido posando em cima de um carro; ambas representam expressões de identidade raramente retratadas sem filtros em meio à fantasias públicas ou na cultura pop. “Khadafi” emite um ar cool muitas vezes mediado por branco através de meios de consumo como gravadoras, revistas e programas de TV. A imagem oferece ainda o contexto em que Lawson trabalha: ela não cria novas representações da negritude e sim adiciona uma nova iconografia a uma tradição que já existe há tempos dentro da diáspora africana global.

Deana Lawson, Congregation, Porto Príncipe, Haiti, 2012. Impressão de jato em tinta em moldura Sintra, 34 x 45 polegadas. Edição 1 de 3 com duas provas da autora. Cedida pela artista/Rhona Hoffman Gallery, Chicago.

Com verdadeiros mundos de distância entre si, as obras”Living Room”, “Oath” e “Mickey & Friends” todas revelam casais se abraçando em diversos momentos da vida, em diferentes estágios de vestimenta/nudez. O contato entre as peles comunica uma familiaridade e intimidade existente entre todas as culturas negras, não importando onde as fotos de Lawson são tiradas.

Esta matéria foi originalmente publicada no CREATORS UK.

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