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Música

Quatro bons pedaços de vinil para expandir o cérebro

Cenas que nos vieram bater à porta.

Se há defeito que não se pode normalmente apontar a um vinil de 12 polegadas é o facto de nos ocupar demasiado tempo com a sua música aborrecida, tal como pode acontecer com um LP ou um duplo-LP. O 12 polegadas, formato preferencial para a música de dança (no seu sentido mais amplo), encontra-se muitas vezes obrigado a apresentar os seus argumentos de um modo mais conciso do que acontece num álbum. Entre os muitos que são lançados todos os meses, os próximos quatro vieram bater-me à porta e passam agora a ser destacados.

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VÁRIOS

EP 2

Inner Surface Music

No sábado passado, enquanto esperava por uma dose de carne de porco à alentejana, fiquei a saber do rumor que dá conta de que a Natalie Portman odeia as sirenes das ambulâncias europeias. Aparentemente, a actriz refere que lhe recordam demasiado do Holocausto, o que não acontece no caso das ambulâncias americanas (muito mais politicamente correctas, claro). O que aqui se passa será provavelmente uma mariquice da diva nascida em Israel, mas obriga-nos a pensar que todo o tipo de som tocará no trauma de alguém. Duvido por isso que a Natalie Portman tenha qualquer interesse em escutar os dois discos de equipa que a Inner Surface lançou no ano passado: o primeiro deles em vinil amarelo e o segundo — alvo desta achega — num vermelho que não deve nada ao acaso.

Não foi a sorte que deu a cor ao

EP2

, da Inner Surface, porque o vermelho aqui espalmado é realmente o que melhor simboliza a techno de choque escutada nestas quatro malhas de dentes afiados. Muito por causa disso,

EP2

 é aquele tipo de disco que devemos manter fora do alcance de alguém que ande a tratar da cabeça com ajuda médica. As oportunidades para estabilizar, durante

este disco, são aliás escassas: “Tilt”, do japonês Yuji Kondo, aprisiona os ouvidos entre quatro paredes feitas de ritmos claustrofóbicos, enquanto “Asyntehtic”, de D Carbone, fica perigosamente próxima de ser um pedaço de pesadelo rave (semelhante ao que vemos quando o filme

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Irreversível

 se enfia na discoteca Rectum e crânios começam a ser esmagados com extintores).

 EP2

 é assumidamente duro, da mesma maneira que

EP1

 também o era sem quaisquer remorsos. Deve ser aqui que a techno separa os homens dos meninos.

MATTHEIS

Isms EP

Nous’klauer Audio

Não papo a história do menino nascido numa pequena ilha holandesa, que vem associada ao lançamento deste Isms EP assinado por Mattheis, embora essa também não me tire por completo a tesão necessária para ouvir este disco. Pois é, parece que alguém achou que seria boa ideia apresentar

Matthijs Verschuure, no press-release de Isms, como o rapaz que um dia partiu de uma modesta localidade holandesa para hoje estar ao serviço da humanização da techno. Este cenário, que lembra “Sonhos de Menino”, do Tony Carreira, não deve, mesmo assim, impedir que encontremos nas três malhas do EP Isms razões suficientes para metê-lo a rodar no prato e montar a sua techno como se fosse um potro prestes a ser cavalo. O que aqui encontramos é uma techno guiada em crescendo e bombeada por ritmos de valor sexual certificado (principalmente “Prism2”), ainda que por enquanto à porta de uma maturidade que nos deixe com os tomates caídos no chão e mais perto do Hélio Imaginário.



Se há defeito que não se pode normalmente apontar a um vinil de 12 polegadas é o facto de nos ocupar demasiado tempo com a sua música aborrecida, tal como pode acontecer com um LP ou um duplo-LP. O 12 polegadas, formato preferencial para a música de dança (no seu sentido mais amplo), encontra-se muitas vezes obrigado a apresentar os seus argumentos de um modo mais conciso do que acontece num álbum. Entre os muitos que são lançados todos os meses, os próximos quatro vieram bater-me à porta e passam agora a ser destacados.





VÁRIOS


EP 2
Inner Surface Music

2013




No sábado passado, enquanto esperava por uma dose de carne de porco à alentejana, fiquei a saber do rumor que dá conta de que a Natalie Portman odeia as sirenes das ambulâncias europeias. Aparentemente, a actriz refere que lhe recordam demasiado do Holocausto, o que não acontece no caso das ambulâncias americanas (muito mais politicamente correctas, claro). O que aqui se passa será provavelmente uma mariquice da diva nascida em Israel, mas obriga-nos a pensar que todo o tipo de som tocará no trauma de alguém. Duvido por isso que a Natalie Portman tenha qualquer interesse em escutar os dois discos de equipa que a Inner Surface lançou no ano passado: o primeiro deles em vinil amarelo e o segundo — alvo desta achega — num vermelho que não deve nada ao acaso.  



Não foi a sorte que deu a cor ao 

EP2

, da Inner Surface, porque o vermelho aqui espalmado é realmente o que melhor simboliza a techno de choque escutada nestas quatro malhas de dentes afiados. Muito por causa disso, 

EP2

 é aquele tipo de disco que devemos manter fora do alcance de alguém que ande a tratar da cabeça com ajuda médica. As oportunidades para estabilizar, durante

 

este disco, são aliás escassas: “Tilt”, do japonês Yuji Kondo, aprisiona os ouvidos entre quatro paredes feitas de ritmos claustrofóbicos, enquanto “Asyntehtic”, de D Carbone, fica perigosamente próxima de ser um pedaço de pesadelo rave (semelhante ao que vemos quando o filme 

Irreversível

 se enfia na discoteca Rectum e crânios começam a ser esmagados com extintores).

 EP2

 é assumidamente duro, da mesma maneira que 

EP1

 também o era sem quaisquer remorsos. Deve ser aqui que a techno separa os homens dos meninos.








MATTHEIS


Isms EP

Nous’klauer Audio

2013




Não papo a história do menino nascido numa pequena ilha holandesa, que vem associada ao lançamento deste Isms EP assinado por Mattheis, embora essa também não me tire por completo a tesão necessária para ouvir este disco. Pois é, parece que alguém achou que seria boa ideia apresentar Matthijs Verschuure, no press-release de Isms, como o rapaz que um dia partiu de uma modesta localidade holandesa para hoje estar ao serviço da humanização da techno. Este cenário, que lembra “Sonhos de Menino”, do Tony Carreira, não deve, mesmo assim, impedir que encontremos nas três malhas do EP Isms razões suficientes para metê-lo a rodar no prato e montar a sua techno como se fosse um potro prestes a ser cavalo. O que aqui encontramos é uma techno guiada em crescendo e bombeada por ritmos de valor sexual certificado (principalmente “Prism2”), ainda que por enquanto à porta de uma maturidade que nos deixe com os tomates caídos no chão e mais perto do Hélio Imaginário.



 



NEPAL


Drift
Sequencias

2013




E ao quinto lançamento, só no ano de 2013, a

Sequencias

voltou a confirmar todos os motivos pelos quais mereceu a nossa estimação nos últimos tempos. A responsabilidade desse feito recaiu sobre um repetente da casa que dá pelo nome de Nick Lapien. Já há uns meses aqui tínhamos abordado a sua foda rumo ao espaço, que torna fascinante a techno escutada em 

A Machine of Desire

, do seu disfarce

Metropolis

. Mas desviando a atenção para o seu disco enquanto Nepal, a primeira certeza com que se fica é a de que Nick Lapien tem pernas para correr em vários tipos de terreno.



Sem ser um bicho completamente diferente daquele que respirava ofegante em A Machine of Desire, este Drift devolve Nick Lapien à terra alinhando-o com um tipo de música que nunca deixará de ser necessário, enquanto a noite desejar ser elegante. A missão de Nepal passa muito por oferecer aos clubes deste mundo as malhas certas para que os seus clientes se sintam pessoas mais bonitas. Talvez por isso a faixa intitulada “Glow” disponha, ao longo de 13 minutos, uma house em que a melodia vai e vem, como se nos estivesse a atrair com a sua provocação. Mas é no Lado B que Nepal apresenta o seu grande trunfo: “Rebuild” aproveita tão bem o trompete de Mark Nieuwenhuis, para aveludar o seu jogo rítmico, que até nos deixa com vontade de gritar à janela que adoramos “lounge”. Pontos então para Nick Lapien e para o critério da Sequencias, que aos poucos nos vai dando a volta à cabeça.







DOTTING


Sosuu


Kin-Ben Label


2013




Se é evidente que o hip-hop, desde o seu início, influenciou a sua representação nos vídeos transmitidos pela MTV, a partir de certo momento parece que o inverso também aconteceu. Desde então, algumas malhas projectavam, em disco, o tipo de imagens a que estávamos habituados na televisão (mais tarde no YouTube). Talvez o suspeito número um, nesta conspiração do boomerang, seja Hype Williams, um nome que vem colado a uma estética MTV repleta de slow-motions, levitações, explosões hiperbólicas e toda uma realidade em suspenso. De todos os clichés visuais possíveis, a queda da chuva em slow-motion será a preferida dos vídeos de hip-hop pertencentes a uma era cheia de 

bling-bling

. Escutamos “On to the Next One” ou “Tom Ford”, do patrão Jay-Z, e o que encontramos são dois exemplos evidentes de produções de algum modo conscientes de que nada tem mais estilo do que a chuva a cair lentamente (o Jigga até se refere às gotas de água no primeiro tema).



Esta particularidade do hip-hop traduz-se enfim na ideia de que a pintura através de salpicos é muito mais dinâmica do que aquela que se faz com um pincel em trajecto atinado. Não admira portanto que este Dotting invoque os “salpicos” no seu nome, enquanto a sua distribuidora Underground Gallery vai ainda mais longe ao recuperar a arte de Jackson Pollock (reconhecido pela técnica de gotejamento) para o texto que acompanha o lançamento de 

Sosuu

. Embora não seja de todo inédita a aproximação entre a techno e o hip-hop (a malta da Raster-Noton explora esse híbrido há anos), Dotting trabalha os dois géneros de maneira que nenhum deles chegue a ser predominante. 

Sosuu 

poderá até ser visto principalmente como um 12 polegadas de techno minimal, mas é impossível ignorar alguns momentos em que os seus baixos são tão old-school como os Run-DMC a passear umas sapatilhas Adidas. Enquanto isso acontece os salpicos de som caem mais lentamente, como se Hype Williams tivesse alguma vez gravado um vídeo em Niihama-City, a morada da label que se atreveu a lançar um 

Sosuu

 que nos deixa bastante satisfeitos.



NEPAL

Drift

Sequencias

E ao quinto lançamento, só no ano de 2013, a

Sequencias

voltou a confirmar todos os motivos pelos quais mereceu a nossa estimação nos últimos tempos. A responsabilidade desse feito recaiu sobre um repetente da casa que dá pelo nome de Nick Lapien. Já há uns meses aqui tínhamos abordado a sua foda rumo ao espaço, que torna fascinante a techno escutada em

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A Machine of Desire

, do seu disfarce

Metropolis

. Mas desviando a atenção para o seu disco enquanto Nepal, a primeira certeza com que se fica é a de que Nick Lapien tem pernas para correr em vários tipos de terreno.

Sem ser um bicho completamente diferente daquele que respirava ofegante em A Machine of Desire, este Drift devolve Nick Lapien à terra alinhando-o com um tipo de música que nunca deixará de ser necessário, enquanto a noite desejar ser elegante. A missão de Nepal passa muito por oferecer aos clubes deste mundo as malhas certas para que os seus clientes se sintam pessoas mais bonitas. Talvez por isso a faixa intitulada “Glow” disponha, ao longo de 13 minutos, uma house em que a melodia vai e vem, como se nos estivesse a atrair com a sua provocação. Mas é no Lado B que Nepal apresenta o seu grande trunfo: “Rebuild” aproveita tão bem o trompete de

Mark Nieuwenhuis

, para aveludar o seu jogo rítmico, que até nos deixa com vontade de gritar à janela que adoramos “lounge”. Pontos então para Nick Lapien e para o critério da Sequencias, que aos poucos nos vai dando a volta à cabeça.

DOTTING

Sosuu

Kin-Ben Label

Se é evidente que o hip-hop, desde o seu início, influenciou a sua representação nos vídeos transmitidos pela MTV, a partir de certo momento parece que o inverso também aconteceu. Desde então, algumas malhas projectavam, em disco, o tipo de imagens a que estávamos habituados na televisão (mais tarde no YouTube). Talvez o suspeito número um, nesta conspiração do boomerang, seja Hype Williams, um nome que vem colado a uma estética MTV repleta de slow-motions, levitações, explosões hiperbólicas e toda uma realidade em suspenso. De todos os clichés visuais possíveis, a queda da chuva em slow-motion será a preferida dos vídeos de hip-hop pertencentes a uma era cheia de

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bling-bling

. Escutamos “On to the Next One” ou “Tom Ford”, do patrão Jay-Z, e o que encontramos são dois exemplos evidentes de produções de algum modo conscientes de que nada tem mais estilo do que a chuva a cair lentamente (o Jigga até se refere às gotas de água no primeiro tema).

Esta particularidade do hip-hop traduz-se enfim na ideia de que a pintura através de salpicos é muito mais dinâmica do que aquela que se faz com um pincel em trajecto atinado. Não admira portanto que este Dotting invoque os “salpicos” no seu nome, enquanto a sua distribuidora Underground Gallery vai ainda mais longe ao recuperar a arte de Jackson Pollock (reconhecido pela técnica de gotejamento) para o texto que acompanha o lançamento de

Sosuu

. Embora não seja de todo inédita a aproximação entre a techno e o hip-hop (a malta da Raster-Noton explora esse híbrido há anos), Dotting trabalha os dois géneros de maneira que nenhum deles chegue a ser predominante.

Sosuu

poderá até ser visto principalmente como um 12 polegadas de techno minimal, mas é impossível ignorar alguns momentos em que os seus baixos são tão old-school como os Run-DMC a passear umas sapatilhas Adidas. Enquanto isso acontece os salpicos de som caem mais lentamente, como se Hype Williams tivesse alguma vez gravado um vídeo em Niihama-City, a morada da label que se atreveu a lançar um

Sosuu

 que nos deixa bastante satisfeitos.