É praticamente impossível ter vivido no Brasil entre a segunda metade dos anos 1990 e a primeira dos 2000 sem ter tido contato com a nossa versão da série Acústico MTV. O formato surgiu na MTV norte-americana, mas chegou rápido por aqui, quando Marcelo Nova gravou um piloto (nunca exibido) no formato, em 1990. Até o último, de 2012, foram 32 edições do Acústico, algumas delas servindo como tábua de salvação para diversas bandas de rock que estavam em baixa (Capital Inicial, Ira!, Kid Abelha), mas também rendendo vendas expressivas para nomes populares (Zeca Pagodinho, Roberto Carlos).
Existe uma lógica para o Acústico MTV ter funcionado tão bem no Brasil, chegando ao ponto de algumas bandas continuarem apostando no formato até hoje, mesmo sem a tutela da MTV. Em um país conservador e geralmente fechado a estéticas mais ousadas, fica fácil pensar como o Titãs fofo é extremamente mais palatável do que o Titãs brabo. Só que o Acústico também é vastamente odiado por muitos fãs de música do país, por ter suprimido parte da criatividade e da originalidade dos nossos artistas, fazendo toda uma geração de discos bem-sucedidos parecer meio igual: com som de violão.Além de tudo, que fique claro: esta lista é altamente pessoal. Cada pessoa tem uma relação muito individual com os acústico — aquele que estava sempre rodando no carro dos pais, o que tocava no boteco da sua vizinhança, o que algum amigo esqueceu na sua casa ou até mesmo o piratão “Melhor do Acústico MTV” que você comprou no camelô —, então, a discordância aqui é quase premissa. Por exemplo, na minha infância/pré-adolescência em Maceió, um dos três DVDs que minha mãe costumava alugar na promoção de fim de semana (pega sexta e só devolve segunda) era um Acústico MTV. Meus favoritos daquela época eram Cidade Negra e Capital Inicial, mas de lá pra cá muita coisa mudou: essas duas bandas só existem (ainda) por causa do sucesso dos álbuns desplugados, o rock passou a ser tão raro no mainstream quanto uma opinião sensata do Roger Moreira no Twitter e, muito provavelmente, a locadora de DVD que você frequentava virou uma dessas barbearias hipster em que se pode tanto cortar o cabelo quanto comer um hambúrguer artesanal.
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Notas: o Acústico do João Bosco (1992) não foi incluído por não ter saído em vídeo; o do Barão Vermelho (gravado em 1991) também ficou de fora, já que só foi lançado como extras em um DVD de 2006. A menção honrosa vai para o acústico do Roupa Nova, que só não pôde ser ranqueado por não ter sido feito pela MTV.Algumas bandas de rock, nos acústicos, até conseguem expandir sua sonoridade usual mesmo sem guitarras e sintetizadores. É o caso de Paralamas do Sucesso e O Rappa. Outras usam o formato para se reapresentar em estéticas menos datadas, como Engenheiros do Hawaii e Kid Abelha. A maioria, contudo, acaba sendo apenas uma encarnação substancialmente menos expressiva que a original, elétrica. O Titãs é o maior exemplo: faixas como “Bichos Escrotos” e “Diversão” soam quase ridículas ao violão (“Calma que hoje é acústico”, o Paulo Miklos meio que se desculpa), ninguém está cantando bem (a exceção é o Miklos), as músicas parecem pequenas demais para orquestras de sopros e cordas e nem a participação do Jimmy Cliff chega a empolgar. Junto a isso tudo, tem o que o disco representa: foi o primeiro acústico de rock (segundo mais vendido até hoje), com um sucesso espontâneo que abriu caminho para outros artistas do gênero perderem o pudor de abrir mão das guitarras para conseguirem ser mais comerciais. Se levar a sério (orquestra, convidados ilustres, milhares de violões) é uma das principais razões para artistas mais desbocados, como era o próprio Titãs, perderem a graça. Entre as coisas que este acústico influenciou estão “Epitáfio”, a escalada do Nando Reis cantautor e todos os outros volumes roqueiros da série.
31. Titãs (1997)
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30. Bandas Gaúchas (2005)
29. Lulu Acústico MTV II (2010)
28. Legião Urbana (1999)
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27. Capital Inicial (2000)
26. Zeca Pagodinho II (2006)
25. Marina Lima (2003)
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24. Roberto Carlos (2001)
Na época, esse Acústico era esperado como uma (finalmente) mudança de rumo na carreira do rei. É também resultado de uma novela nos bastidores, já que Roberto Carlos supostamente tinha o sonho de fazer um acústico na MTV (dizem que chamou até um numerólogo para decidir a quantidade de faixas), mas a Globo era (e ainda é) detentora dos direitos do cantor. Depois de acordos e desacordos, as gravações foram realizadas e a MTV acabou sem poder exibir o programa na TV, apesar de ele ter saído em CD/DVD. O repertório é até bem selecionado, mas a produção é tão pasteurizada que soa como se tivessem colocado uma banda de churrascaria ao lado de uma orquestra. Além de tudo, uma sofrência decente naturalmente requer um vozeirão emocionado e, neste disco, o Roberto parece fazer esforço zero para cantar além do necessário.
23. Arnaldo Antunes (2012)
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22. Ira! (2004)
21. Cidade Negra (2002)
20. Sandy & Junior (2007)
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19. Lobão (2007)
18. Lenine (2006)
17. Gal Costa (1997)
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16. Ultraje a Rigor (2005)
15. Paulinho da Viola (2007)
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14. Marcelo D2 (2004)
13. Engenheiros do Hawaii (2004)
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12. Moraes Moreira (1995)
Dos primórdios dos acústicos (o terceiro a ser lançado), este volume traz Moraes Moreira disposto a reinventar sons próprios e clássicos do Novos Baianos. Tem umas ousadias muito interessantes, como a simples “Preta Pretinha” virando um épico de quase dez minutos cheio de solos de todos os tipos e das intervenções amalucadas do cantor. Ele também explora as cordas em marchinhas e xotes (“Pombo Correio / Festa do Interior”), reforça os sambas com sanfona ou sopros (“Brasil Pandeiro”, “Lá Vem o Brasil Descendo a Ladeira”) e, como de costume, enche a plateia de histórias. Apesar de artisticamente ambicioso, é um dos volumes menos comerciais da série e, em geral, um dos menos lembrados pelo público.
11. O Rappa (2005)
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10. Kid Abelha (2002)
9. Art Popular (2000)
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8. Rita Lee (1998)
7. Os Paralamas do Sucesso (1999)
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6. Jorge Ben (2002)Este volume com certeza poderia estar melhor posicionado na lista, mas ele é parcialmente um golpe. Desde que trocou o violão pela guitarra no meio dos anos 1970 (a partir de África Brasil), Jorge Ben Jor nunca voltou a usar o instrumento acústico. A expectativa era de que esse show marcasse a volta dele ao violão de náilon e àquela sonoridade eternizada em álbuns como Samba Esquema Novo (1963) e Tábua de Esmeralda (1974), mas ele acabou optando por um violão de aço (de 12 cordas), tocado quase do mesmo jeito que uma guitarra. No fim das contas, essa abordagem acaba deixando tudo menos animado do que costuma ser (nas apresentações de Ben Jor), mas o acréscimo de cordas e sopros no estilão anos 1970 contribui para algumas faixas (“Take It Easy My Brother Charles”, “Menina Mulher da Pele Preta”) ficarem mais instigantes. Claro, ainda assim é Jorge Ben Jor, e com um repertório irretocável.
5. Charlie Brown Jr. (2003)Basta ouvir a performance agressiva de “Hoje”, com participação do Marcelo Nova (Camisa de Vênus), para entender por que o Acústico do Charlie Brown Jr é tão único. Enquanto a maioria das bandas, quando tentam se adaptar ao violão, partem para a exploração da canção, a trupe do Chorão mostra que não é preciso de guitarras para soar parrudo. Não há concessões: é bateria acelerada, gritaria e a postura do malandro urbano eternizada pelo profeta menos sagaz da nossa música. Até mesmo nas participações — RZO e Marcelo D2, além do Nova —, ninguém chega para amaciar o som, e sim para contribuir na barulheira (a exceção é Negra Li, e em uma música de viés político). Para completar, as lentas (“Zóio De Lula”, “Tudo Que Ela Gosta de Escutar”) se encaixam como uma luva no formato, e algumas delas, como “Como Tudo Deve Ser” (ancorada no baixo viajante do Champignon), ficam até mais adequadas que as versões originais. O Acústico é a celebração do CBJr. no auge — e não um retorno à relevância —, entrosado e fazendo o que quer, logo antes de a banda voltar a trabalhar com Rick Bonadio e sofrer com desavenças entre integrantes, mudanças de formação e o trágico fim, dez anos depois, com a morte do Chorão.
5. Charlie Brown Jr. (2003)Basta ouvir a performance agressiva de “Hoje”, com participação do Marcelo Nova (Camisa de Vênus), para entender por que o Acústico do Charlie Brown Jr é tão único. Enquanto a maioria das bandas, quando tentam se adaptar ao violão, partem para a exploração da canção, a trupe do Chorão mostra que não é preciso de guitarras para soar parrudo. Não há concessões: é bateria acelerada, gritaria e a postura do malandro urbano eternizada pelo profeta menos sagaz da nossa música. Até mesmo nas participações — RZO e Marcelo D2, além do Nova —, ninguém chega para amaciar o som, e sim para contribuir na barulheira (a exceção é Negra Li, e em uma música de viés político). Para completar, as lentas (“Zóio De Lula”, “Tudo Que Ela Gosta de Escutar”) se encaixam como uma luva no formato, e algumas delas, como “Como Tudo Deve Ser” (ancorada no baixo viajante do Champignon), ficam até mais adequadas que as versões originais. O Acústico é a celebração do CBJr. no auge — e não um retorno à relevância —, entrosado e fazendo o que quer, logo antes de a banda voltar a trabalhar com Rick Bonadio e sofrer com desavenças entre integrantes, mudanças de formação e o trágico fim, dez anos depois, com a morte do Chorão.
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4. Zeca Pagodinho (2003)
3. Cássia Eller (2001)
2. Lulu Santos (2000)
1. Gilberto Gil (1994)
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