Toda a gente fala dos Ornatos Violeta esta semana. É obra esgotar sete coliseus, com letras lamechas, que pararam nos anos 90. Por isso, decidi ir ver o que é que se ia passar na despedida da banda do Manel Cruz, na sua terra de origem.
Quando cheguei à Passos Manuel, parecia que estava num santuário: pessoal às carradas, a subir a rua, em fila indiana. Um caos de gente, malta a vender cachecóis, adolescentes, pré-adolescentes, adolescentes que já não são adolescentes e um mar de cotas que parecia estar ali não por causa do gajo do Ídolos, mas sim porque, realmente, queriam prestar culto à banda que marcou uma era. Como o Manel diz, “o amor é isto e nada mais”.
Foi mais ou menos isso que aconteceu. Começaram naquela canção que atira verbos para o ar, na esperança de fazerem sentido, passaram pelos inéditos, e mostraram praticamente tudo o que havia para mostrar do Cão! e de O Monstro Precisa de Amigos, os dois discos que lhes garantiram a cena de mega-banda portuguesa.
Claro que, a certa altura, em especial quando o chão do Coliseu tremia, perguntava-me o que estava ali a fazer: lembrei-me, especialmente, do meu irmão de 16 anos, que ouvia umas canções numa série matinal para crianças — que envolve um cão, numa clara imitação do original austríaco —, na TVI, e que, a partir daí, ficou fã dos Ornatos. Portanto, para quem, como eu, começou a ouvir Ornatos numa idade normal, a deleitar a literacia das letras, o monte de gente aos saltos ao meu lado deixou-me um bocado preocupada. Estariam ali porque, tal como o meu irmão, curtem ver o Fernando Luís a fingir que é actor?
De qualquer maneira, a melancolia das canções dos Ornatos funciona não só com as letras que-parecem-fazer-tanto-sentido-sobre-o-amor-e-outras-conices-do-género, mas com a lembrança dos tempos passados — estilo lembrar-me de que comecei a fumar ao som da “Débil Mental”, num telhado de Aveiro. E, por isso, só por isso, já valeu a pena ir ver os Ornatos: ver o Manel, o Kinörm, o Peixe, o Nuno Prata e o Elísio Donas a suarem as estopinhas e a dizerem palavrões emocionados. Foi bonito.
No final, com uma monumental dor de costas pelas três horas em pé no Coliseu, cheguei a casa com umas palavrinhas a ressoarem-me na cabeça: “Mas deixa o nosso amor morrer.” Acho que isso vai ser impossível, pessoal.
Fotografia por Joana Castelo