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"Discriminação racial no Facebook é real", diz memorando de ex-funcionário

O Vale do Silício continua um lugar em que há mais cartazes de Black Lives Matter do que pessoas negras.
Facebook Headquarters
Imagem: Jason Koebler.

Pouco antes de sair do Facebook, um gerente de parcerias da companhia enviou um memorando para a equipe do mundo todo. A mensagem começava com uma frase arrebatadora: “O Facebook tem um problema com negros”.

O homem em questão é Mark S. Luckie, responsável por gerenciar relacionamentos com influencers que usavam a plataforma. No memorando, falava como a empresa decepcionara funcionários e usuários negros com suas políticas e composição de equipes.

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“A população de funcionários do Facebook não reflete sua base de usuários mais engajada”, ele escreveu no memorando postado publicamente no Facebook e LinkedIn nesta terça-feira. “Em alguns prédios, tem mais cartazes do 'Black Lives Matter' que pessoas negras… A discriminação racial no Facebook é real.”

Luckie foi um funcionário de alto escalão em várias empresas do Vale do Silício e, antes disso, foi parte de uma equipe do Washington Post indicada ao Prêmio Pulitzer. Ele foi nomeado pelo The Root como um dos afro-americanos mais influentes em 2013 e 2014 e é o autor de The Digital Journalist's Handbook. Antes do Facebook, Luckie trabalhou no Reddit e Twitter, onde atuava com jornalistas para mostrar a eles como usar melhor essas plataformas.

O memorando diz que, enquanto ele estava no Facebook, outros funcionários da companhia “seguravam suas carteiras ou colocavam as mãos nos bolsos quando eu passava”. Ele disse que essa experiência não era incomum e que muitos empregados negros tinham medo de falar sobre isso porque sabiam que “levantando nossas vozes, poderíamos colocar em risco nossas relações profissionais e o avanço de nossas carreiras”. Ele acredita que muitos funcionários negros são colocados em equipes só para atingir metas de diversidade e ser uma verificação de sensibilidade em certas políticas. Eles não eram integrados apropriadamente para atingir os objetivos maiores das equipes.

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“Nos últimos anos, estamos trabalhando para aumentar a variedade de perspectivas entre aqueles que constroem nossos produtos e servir as pessoas que os usam pelo mundo”, disse o porta-voz do Facebook Anthony Harrison para a Motherboard por e-mail. “O crescimento na representatividade de pessoas dos grupos mais diversos trabalhando em diferentes funções pela empresa é a chave para nossa capacidade de ter sucesso. Queremos dar todo o apoio para todos os nossos funcionários quando questões são reportadas e quando pode haver microcomportamentos que vão se acumulando. Vamos continuar fazendo todo o possível para ser uma empresa realmente inclusiva.”

Luckie disse que, como os funcionários negros se sentem marginalizados dentro da empresa, as políticas se refletem também no modo como as pessoas negras que usam o site. Luckie apontou que a empresa tem derrubado repetidamente conteúdo postado por negros que são “esforços positivos como se fossem discurso de ódio, apesar de muitas vezes não violarem os ternos de serviço do Facebook”.

“Há uma teoria predominante entre muitos usuários negros de que seu conteúdo tem mais chance de ser derrubado na plataforma. Mesmo que as teorias sejam em grande parte anedóticas, o Facebook faz pouco para dissuadir as pessoas dessa ideia”, escreveu Luckie. “Isso empurra para as margens as comunidades não-brancas que o Facebook afirma apoiar. Isso diminui a probabilidade dessas pessoas continuarem envolvidas no mesmo nível com nossa plataforma.”

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As políticas de discurso de ódio do Facebook realmente prejudicam pessoas não-brancas e, especificamente, afro-americanos. Como o Motherboard relatou este ano, o Facebook proíbe “supremacia branca” na plataforma, mas permite especificamente “nacionalismo branco” e “separatismo branco”, que, de acordo com historiadores que estudam raça nos EUA, são indistinguíveis da supremacia branca. Na verdade, esses rótulos estão sendo usados por supremacistas brancos para maquiar a supremacia como algo menos violento e cheio de ódio.

Depois dessas políticas sobre supremacia branca terem sido implementadas, grupos como o Color of Change e o Lawyers' Committee for Civil Rights Under Law pediram formalmente ao Facebook para fazer mudanças. A empresa disse a Motherboard que está considerando essas as, mas nenhuma decisão oficial foi anunciada até agora.

O Facebook se comprometeu a participar de uma auditoria civil externa, mas a empresa tem buscado minar alguns dos grupos que mais pressionam para que a auditoria seja feita. O New York Times relatou este mês que o Facebook contratou um grupo conservador chamado Definers Public Affairs para lutar algumas de suas batalhas de relações-públicas; o Definers destacou laços do Color of Change com o bilionário George Soros, que frequentemente é vilificado pela direita em ataques antissemitas.

“O Facebook e o Vale do Silício no geral têm construído seu modelo de negócio sobre as costas de pessoas negras e não-brancas, que superam o índice no Facebook e no Twitter”, me disse Brandi Collins, diretora de justiça de mídia do Color of Change, por telefone este ano. “Já vimos várias vezes o Facebook sendo pego com a mão na cumbuca, seja censurando ativistas negros online ou sendo reticente em lidar com grupos de ódio. Eles sempre chegam um dia atrasado e com um dólar a menos e tratam os negros no Facebook como se fossem um desastre de relações públicas com que precisam lidar.”

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Num press release publicado no final de semana de Ação de Graças, o chefe de comunicações e políticas do Facebook, Elliot Schrage, escreveu que a empresa contratou os Definers para “entender as origens e conflitos de interesse em potencial dos nossos críticos”.

“Esse trabalho pode ser usado internamente para informar nossas abordagens e onde é apropriado compartilhar isso com repórteres”, escreveu Schrage. “Esse trabalho também é útil para ajudar a responder alegações injustas em que o Facebook vem sendo escolhido a dedo para críticas e para nos distinguir positivamente dos nossos competidores.”

Mais cedo na terça-feira, o Facebook concordou com uma reunião presencial com o Color of Change para discutir algumas das preocupações do grupo. O memorando de Luckie vai dar muito assunto para os dois grupos discutirem.

Luckie anunciou no memorando que estava deixando a empresa em parte por causa das questões que ele destacou. “Depois da minha partida, vou me focar em reconstruir minha vida e desenvolver meu podcast de ficção científica recém-lançado”, ele escreveu.

Luckie não respondeu os pedidos da Motherboard para comentar o assunto.

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