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Tecnologia

Um Passeio pela Primeira Conferência da Dogecoin

Homens sem camisa, cachorros engraçados e pessoas muito empolgadas com a criptomoeda Dogecoin participaram de um evento em San Francisco.
Foto: Max Cherney

Na primeira conferência da história da moeda digital Dogecoin, uma garota de 14 anos explicava como enriqueceu da noite para o dia, e depois voltou para a sarjeta novamente, só com Dogecoins. Após seus comentários espirituosos no Reddit terem gerado doações em dogecoins – em geral na casa dos 100, ou cerca de cinco centavos de dólar por cada doação – ela apostou sua fortuna em uma batalha de League of Legends contra um amigo e, para sua enorme tristeza, perdeu tudo.

Victoria, a garota, compareceu à Dogecoin San Francisco, organizada pela Follow the Coin, para entender mais do que realmente se tratava a moeda digital relacionada a memes (além de dar gorjetas às pessoas no Redddit). “Minha família acha estranho, mas o negócio é sério”, ela me contou. E, pela aparência das coisas na conferência, Victoria está certa. A moeda Dogecoin é de verdade.

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Nós já falamos que valia a pena levar a Dogecoin a sério, e que ela foi mais bem-sucedida que o Bitcoin em seus primeiro anos, caso isso seja medido em termos de valor de mercado (o valor total da moeda em dólares). Agora a moeda digital baseada em um meme de um cachorro conhecido por frases gramaticalmente incorretas e absurdas na fonte Comic Sans é a quinta maior moeda digital do mundo (com um valor de mercado de cerca de US$ 33 milhões). Ela foi alardeada na conferência como a “moeda virtual mais negociada do mundo”, e não é difícil ver o porquê.

Foto: Max Cherney

A Dogecoin encontrou seu nicho em pequenas transações – como contribuir com pequenos valores para campanhas de financiamento coletivo – e, assim como seu irmão mais velho Litecoin, recentemente considerada pela Bloomberg como um “concorrente de baixo custo” da Bitcoin, orgulha-se de fato de ser fácil de usar. “O mundo é plano, e as moedas são planas também”, afirmou Matt Conn, CEO da MidBoss Games, referindo-se ao livro de 2005 de Thomas Friedman.

Na conferência, um argentino elegante e um australiano com dreads ficaram sabendo que eu nunca tinha usado a Dogecoin. “Você tem um telefone Android?”, perguntaram. Eu tinha. Após eu ter baixado o aplicativo de carteira virutal, o australiano me deu 1.000 dogecoins – ou o equivalente a cerca de 50 centavos de dólar. Tudo isso levou cerca de um minuto. Depois de o download da blockchain ter acabado algumas horas depois, eu comecei a distribuir dogecoins.

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A facilidade de se começar a usar a Dogecoin provavelmente explica o porquê de 900 pessoas terem se inscrito para a conferência realizada na sede do SOMA, do Wordpress, um espaço que pôde receber confortavelmente as cerca de 300 pessoas que compareceram.

“É ótimo poder usar bitcoins para comprar uma passagem na Virgin Atlantic ou em uma concessionária da Tesla Motors”, me disse Jackson Palmer, criador da Dogecoin, “mas poucas pessoas de fato fazem isso. Moedas digitais são úteis para pequenas compras de até US$ 10”.

Jackson Palmer, o criador do Dogecoin. Foto: Facebook/Follow the Coin, utilizada com permissão.

Palmer elaborou essa ideia em sua palestra, que deu o pontapé inicial no evento. Ele sugeriu que o sucesso da Dogecoin fará com que pessoas de todos os lugares queiram usar a moeda digital para fazer compras, e com que negócios de todos os portes aceitem a dogecoin. O valor inerente da Dogecoin não deve ser o de que ela pode ser trocada por formas mais antigas de moedas estatais, uma ideia que claramente vai contra a Bitcoin. “O verdadeiro teste para nós é se meus pais e minha família se sentirão confortáveis ou não para usar a Dogecoin”, afirmou Palmer.

É curioso notar que os eventos da Dogecoin atraem uma turma atípica – pelo menos para eventos de tecnologia. Era clara a participação acima da média de mulheres em relação a alguns outros eventos (embora ainda não tantas como algumas pessoas esperavam). Eu também vi duas famílias que trouxeram seus filhos (Victoria veio sozinha, com a autorização de seus pais). “Eu vim só pela cerveja”, um dos pais me disse. “Ele [seu filho] está aqui por causa da Dogecoin”. Quem também estava ouvindo atentamente às palestras foram empreendedores do Bitcoin, tal como Brian Armstrong, CEO da Coinbase.

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Hood, o artista que doou milhões de Dogecoins em um protesto contra o aumento dos alugueis de San Francisco, apresentou aos organizadores da Dogecon SF um depoimento gravado no qual ele louvava a generosidade dos Shibes (o nome usado por entusiastas da Dogecoin para se referirem uns aos outros), e encorajou a todos a “mudar os corações dos gananciosos” através “da arte e do boca a boca”.

A mensagem de Hood reverbera por entre a comunidade Dogecoin. A Dogecoin já foi usada para angariar fundos para algumas causas interessantes, tal como enviar um carro de corrida para a pista Talladega, da NASCAR, que foram destacadas durante o debate sobre a comunidade e suas doações filantrópicas. A Dogecoin Foundation angariou mais de US$ 100.000 para ações de caridade, disse-me Ben Doernberg, membro do conselho, as quais incluem projetos que ajudam iniciativas relacionadas à AIDS, outros que fornecem cães guia para crianças necessitadas, e outra que trabalha para salvar Shiba Inus (o cachorro do meme Doge) no Colorado.

As discussões da conferência também se concentraram em algumas das questões mais preocupantes enfrentadas pelas moedas digitais no presente e no futuro. Questões tributárias, por exemplo, são um enorme desafio – não apenas para pessoas que usam moedas digitais, mas também para startups que precisam trabalhar com bancos. Os bancos em geral têm medo de empresas que usam e trabalham com moedas digitais, disse-me a advogada Alice Townes.

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Quando as palestras já estavam acabando, à noite, a cultura de memes que é tão central para o branding da moeda digital apareceu com toda força. Aquilo era, afinal, uma conferência da Dogecoin, ou seja, muita diversão! Havia comida, e goró, e o que acabou se tornando uma competição de fantasias (o cara de cueca derrotou o astronauta, por razões desconhecidas). E, assim como outros eventos Dogecoin, havia cachorros fofos.

Foto: Max Cherney

O que emergiu das três horas de debates e palestras foi que, para além da fachada fofa da Dogecoin, surge um grupo muito sintonizado às tecnologias e que está tentando criar uma moeda digital para o uso cotidiano, além de injetar alguma diversão nas criptomoedas.

Embora tais moedas tenham um futuro incerto que certamente envolverá desafios regulatórios e resistência das instituições financeiras estabelecidas, a conferência fez com que o desafio das moedas digitais parecesse tangível. E para Palmer e outras pessoas com quem eu conversei ao longo do dia, o evento foi mais uma prova que o ethos das moedas digitais de ideias sérias, amizade e generosidade não é apenas factível, mas também popular.

Tradução: Eduardo Sá