Como foi o ato anti-Temer em Curitiba
Foto: Isabella Lanave/ R.U.A Foto Coletivo

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Como foi o ato anti-Temer em Curitiba

Foram duas mil pessoas, segundo uma contagem não oficial (a PM não se manifestou).

O alto-falante num volume desumano atrapalhava o rapaz que perguntava se havia xerox na banquinha de jornal. "VIVA SÉRGIO MORO!", bradavam uns trocentos watts na Boca Maldita, em Curitiba. Às 16h10 do último domingo (15), 34 pessoas acompanhavam a manifestação a favor do magistrado, da Lava Jato e também do governo interino de Temer. "Vamos dar tempo ao novo presidente", bradava uma senhora de verde e amarelo em frente a um bonecão de posto de uns 20 metros que representava o juiz em sua versão herói, o Super Moro.

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No caminho até a Praça Santos Andrade, local de concentração dos manifestantes anti-Temer, mórmons paravam pedestres para distribuir panfletos e ler trechos da Bíblia. Havia um colorido multiforme nos que se reuniam nas escadarias da Universidade Federal do Paraná contra o governo instituído após a admissão do processo de impeachment. A maioria vestia preto. Muitos, vermelho. Bandeira do Brasil, só duas: penduradas no carrinho de pipoca. "Quero que o Brasil melhore, mas sou contra essas coisas aí", me disse o pipoqueiro, meio em cima do muro.

Foto: Isabella Lanave/ R.U.A Foto Coletivo

O ato foi convocado via Facebook por Thiago Régis, estudante de Direito na Unicuritiba. Reuniu, em sua maioria, universitários e artistas. Duas mil pessoas, segundo uma contagem não oficial (a PM não se manifestou). A ideia era caminhar até o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, órgão vinculado ao extinto Ministério da Cultura, agora incorporado ao Ministério da Educação. Desde a madrugada da última sexta-feira (13), um grupo de artistas ocupa o espaço em forma de protesto.

Foto: Isabella Lanave/ R.U.A Foto Coletivo

A multidão deixou as escadarias e saiu às ruas, acompanhada por duas motos da PM. Não havia carro de som. As palavras de ordem eram passadas adiante como que num jogral. Uma onda sonora chegava até quem estava no fim da fila. "Golpistas não passarão!". "Olha que piada, bate panela, mas quem lava é a empregada." "Fora Temer!".

A manifestação interrompeu um cruzamento central de Curitiba. Cartazes "Fora Temer" foram mostrados aos motoristas, que não reagiram, nem com buzinas. Um motoqueiro, numa moto coloridíssima e usando um macacão de Moto GP faz birra: ele acelera mesmo parado, fazendo muito barulho. No meio da multidão, jovens erguem suas bicicletas. Aplausos.

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O grupo sobe a rua Amintas de Barros e um chiado vem lá da frente. Estamos em frente a um hospital. Pedem silêncio. De repente os batuques param, a conversa rareia. Ouvem-se somente os pés marchando e algumas mãos para cima. Enfermeiras na janela dão apoio com tchauzinhos de mão inteira.

Foto: Isabella Lanave/ R.U.A Foto Coletivo

Já na Rua José de Alencar, há um garoto gordinho ostenta um moletom vermelho na janela de um prédio de luxo. É aplaudido, por mais que esteja somente segurando um moletom vermelho.

Após dois quilômetros de caminhada, o grupo chega ao IPHAN. Já é noite. A rua está tomada por pelo menos três quadras. Ao redor, trocam figurinhas Antônio Júnior, diretor artístico do Festival Internacional Olhar de Cinema, a atriz e diretora Nena Inoue, e o dramaturgo e compositor Octavio Camargo. "O desmonte, a dissolução do MinC, é um dos sintomas de um novo governo repressivo. O ministério surgiu há pouco tempo [1985], e foi uma vitória histórica para a representatividade da classe artística", disse Camargo, que pretende encenar no IPHAN um dos cantos de Ilíada, de Homero, nos próximos dias de ocupação.

Foto: Isabella Lanave/ R.U.A Foto Coletivo

Após alguns discursos, um trio de rap feminista faz rimas por um mundo "sem dominado e sem dominador." Um poeta compara dunas e pedras à resistência. E um trio de punk rock lascivo desperta sensações em um público que começa a se dispersar. "Bota sua pica na minha boca/ aí quando ela bater na goela/ eu mordo seu caralho e cuspo no seu cu." O casal de velhinhos no apartamento da frente se recolheu.

Ao final do ato, há uma pequena treta entre uma manifestante de boina verde e o pessoal da organização. Ela foi contra a liberação da rua. "Isso não é resistência!", bradou. Chamou de covarde um dos que defenderam a abertura da José de Alencar após uma hora e meia.