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Música

DJ Patife e o seu caso de amor com o Drum and Bass

Conversámos com Dj Patife sobre o seu percurso, o estilo, a sua passagem pelo Tomorrowland (Brasil) a paixão pelo Drum and Bass. E ainda tivemos direito a uma mixtape com algumas das suas batidas mais recentes.

"Foi amor à primeira vista, ou melhor, à primeira audição. Cresci no meio dos bailes black, nos quais o rap, o funk, o soul, o samba-rock rolavam. Então, por volta de 1992/93, essas batidas quebradas e superaceleradas começaram a surgir. Aquilo foi como um choque, o primeiro amor, o primeiro beijo".

A frase é do DJ Patife, que nos conta sobre a descoberta do Drum and Bass. De facto, se a música pode ser uma motivação para a vida, o artista, no RG Wagner Ribeiro de Souza, foi completamente engolido por este universo. Tudo começou, para ele, no final dos anos 80, quando, já aos 12 anos de idade, experimentava com as suas mixtapes nas festas de garagem, quermesses e festas de aniversário, tentando emular as performances que ouvia na rádio que tanto o fascinavam, o som das equipas Chic Show, Black Mad, Kaskatas e Zimbabwe.

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Mais tarde, tornou-se um admirador de DJs como Iraí Campos, DJ Hum, KL Jay, Ricardo Guedes, Tibor e Marky. Mas o jovem Wagner não queria ser um mero amador, o que ele queria era descobrir as melhores músicas e fazer misturas como eles. Então as suas aspirações levaram-no a fazer parte do movimento hip hop de São Paulo, onde começou a sua carreira, digamos, profissional, como DJ do grupo 'Fatos Reais'. A sua maturidade artística foi desenvolvendo-se naturalmente, até que, no ano 2000, explodiu comercialmente ao produzir misturas para uns quantos artistas de renome da MPB (Música Popular Brasileira), em parceria com os produtores Xerxes de Oliveira e Mad Zoo. Quem viveu este momento, lembra-se perfeitamente de como a sua colaboração com a cantora e compositora Fernanda Porto na canção "Sambassim" e na versão de "Só Tinha de Ser com Você", todo um êxito na voz do Tom & Elis, causou um enorme impacto.

Esta última, fez parte da banda sonora da telenovela "Um Anjo Caiu do Céu", transmitida na Globo . Desde então, o DJ cruzou os sete mares, tocou em mais de 50 países, foi destaque em festivais como Homelands, Glastonbury, The Big Chill, The Montreux Jazz Festival, Shizuoka (Japão), WMC Miami, Rock In Rio (Rio de Janeiro e Lisboa), Festival de Verão de Salvador, Planeta Atlântida e todas as edições do Skol Beats. Além disso, lançou seis álbuns e ganhou uma série de prémios e menções. Em Dezembro passado, DJ Patife lançou a sua própria discográfica, o Bahtekum Records, de onde já saíram dois temas daquilo que pode vir a ser o presságio de um novo disco. "Talvez role para esse ano. Vamos ver!", diz-nos o DJ. "Trabalho em diversos sons neste momento. Alguns serão lançados no meu selo e outros em projectos especiais para o Verão europeu. Em Maio, saio em turné por Inglaterra, Portugal, Áustria, Rússia e República Checa".

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Patife será também um dos representantes do Drum and Bass no Tomorrowland Brasil, que tem lugar nos dias 1, 2 e 3 de Maio na Fazenda Maeda, em Itu, no interior de São Paulo. Ele toca no espaço Marky & Friends no primeiro dia do evento. Aproveitando esta deixa pedimos ao Patife que nos cedesse uma mixtape do que anda a tocar actualmente. Desfrutem do mix e acompanhem a conversa que tivemos com o mestre dos beats acelerados:

VICE: Tu és reconhecido como um dos primeiros e mais importantes DJs a difundir o Drum and Bass no Brasil e a associá-lo à MPB. Quais as canções que mais te orgulhas de ter misturado ou lançado na tua fase ascendente?
DJ Patife: Sem dúvida alguma, a versão de "Só Tinha de ser com Você", composição do Tom Jobim e do Aloizio de Oliveira, que regravámos com a Fernanda Porto, é a que mais me emociona até hoje. Foi um aprendizado enorme, conheci pessoas e músicos maravilhosos nesse trabalho e a música é linda! O remix de "Sambassim", também da Fernanda Porto, foi o que me lançou ao mundo, e o encontro com Max de Castro em "Pra Você Lembrar". Foi a primeira experiência, e uma pessoa nunca esquece - em jeito de trocadilho [risos]. O teu nome e o do Marky são sempre citados quando o assunto é Drum and Bass. Mas quais são as peculiaridades do teu estilo e do dele? Vocês seguem caminhos estéticos e performativos diferentes?
É notório que, performaticamente falando, o Marky é brutal. É lindo de ver a relação dele com os gira-discos, é um show! Eu sou mais tímido, intimista, se assim posso dizer, gosto do warm-up de preparar o ambiente para o outro DJ chegar. Mas, entre uma coisa e outra, às vezes dou um UP, para atribuir certa dinâmica à pista. O Marky mistura mais os estilos do próprio Drum and Bass. Eu, quase que sigo a mesma linha, mais melódica, com vocais e com muita mistura que vai do samba ao jazz, reggae/ragga, e assim por diante.

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Como comparas o cenário nacional do começo dos anos 2000, quando a cultura clubber começou a afirmar-se e tu apareceste com misturas para artistas da música brasileira, com o panorama actual? Digo, tanto em termos artísticos como de público e de infra-estruturas.
São dois períodos completamente diferentes. Há quinze anos atrás, estávamos ainda totalmente ligados a tocar e produzir. A música era o foco principal de tudo. Ninguém imaginava um dia ter um mercado como este e também não sabíamos como conduzir a carreira direito, como se vender, promover, etc. Ou seja, fomos à pré-escola. Cada dia era uma aprendizagem. E obviamente, o tempo foi passando, mais pessoas e empresas interessadas nesse mercado foram chegando e levaram a dance music e o DJ para o patamar em que se encontra actualmente. Quais foram as tuas principais influências? Quais são os nomes básicos na tua colecção de dance music?
Nada me impactou tanto na vida como Michael Jackson, Jorge Ben Jor, Public Enemy, Racionais MC's, NWA e Drum and Bass! Poderias citar e comentar os momentos mais marcantes da tua carreira?
O período no movimento hip hop, entre 1989 e 1993. A minha fase como DJ residente na Arena Music Hall, entre 1995 e 1998. O contacto com a Movement & V recordings, em Londres, em 1998. Fazer parte do casting da Sambaloco Records/Trama. Todas as edições do Skol Beats e o primeiro trio eléctrónico só com DJs em Salvador, com Marky e Fatboy Slim. Qual a tua memória musical mais antiga? O primeiro som que ouviste e te fez enlouquecer ao ponto de te tornares um coleccionador de álbuns, um DJ profissional e tudo mais?
"Billie Jean". Aquela batida, a dança do Michael Jackson, é inesquecível. Run DMC foi impactante também. Mas foi o DJ e suas performances que me alucinaram.

Que tipo de som ouves em casa mas não levas contigo para as pistas de dança?
Amo Marisa Monte! Há umas semanas, a música do último disco dela, "Aquela Velha Canção", ficou no repeat do meu telemóvel e do meu carro, durante horas. Sou apaixonado por reggae, a base de tudo. Creio que se não fosse o reggae, tudo aquilo que diz respeito ao DJ talvez não fosse como é hoje. Os teus sets hoje em dia são feitos mais de clássicos ou de coisas actuais? No Tomorrowland, por exemplo, qual vai ser o estilo da tua apresentação e o que achas deste tipo de festival, enorme e mais comercial?
Sempre achei difícil falar sobre sets. Só sei na hora. Tudo depende do tipo de evento, se as pessoas na pista vão cair na minha onda. Procuro tocar o novo, mas sem ser cansativo. E é claro que entre uma e outra [música] rola um clássico. Para o Tomorrowland, ainda não pensei em nada. O Tomorrowland é um festival como muitos outros [festivais] e com um lineup muito extenso. Aqui no Brasil ficou rotulado como EDM (Electronic Dance Music), e não é. Se olharmos para as edições na Bélgica, até surpreende pela quantidade de áreas e atracções completamente diferentes do EDM. Não tenho absolutamente nada contra o EDM, não é o meu som favorito e também não consumo, mas reconheço que esse cenário é responsável por agregar muita coisa ao mercado da dance music. Claro que há prós e contras, mas a vida é assim com qualquer coisa, e o hype sempre existiu e existirá. Lembras-te, por acaso, que até o Drum and Bass e o rap já foram hype? Até o arrocha e o sertanejo hoje são hype! Na tua perspectiva, o que tem aparecido de inovador e instigante no Drum and Bass e nos seus desdobramentos?
O que me encanta no género é a possibilidade infinita de agregar sons, fusões e influências nele mesmo. Há sempre alguém daqui ou de fora a misturar ou criar sonoridades diferentes. Aqui no Brasil, destaco L-Side, Unreal, Chap, Andrezz & Level 2, que têm feito excelentes sons. O norte-americano Dave Owen tem feito coisas de que gosto muito, e também o inglês LSB e os russos Command Strange & Intelligent Manners.

Segue o DJ Patife nas redes sociais: Twitter // Facebook // YouTube // Soundcloud // Vimeo // Mixcloud.

Este texto foi inicialmente publicado em Thump.