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Errata? O Ipea Errou, mas o Brasil Continua Machista

Não importa se é 65% ou 26%, ser mulher no Brasil ainda é perigoso.

Duas semanas atrás, eu e a Débora Lopes escrevemos uma matéria falando sobre as duas pesquisas divulgadas pelo Ipea. Uma era uma pesquisa de opinião chamada Tolerância Social à Violência Contra as Mulheres e a outra era é Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde. Com isso, muita gente só sacou agora: o Brasil é machista.

Inclusive, a pesquisa incentivou a criação da campanha online #Eu Não Mereço Ser Estuprada, que alcançou a marca de 11 mil usuárias que puderam participar e expressar seu repúdio pelos resultados. Inclusive, a criadora da campanha, Nana Queiroz, recebeu diversas ameaças de estupro por conta disso.

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E hoje (04/04), foi divulgado pelo próprio Ipea que a pesquisa de opinião Tolerância Social à Violência Contra as Mulheres foi publicada com erros. Um deles foi que a afirmação "mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas" obteve 26% de aprovação dos entrevistados e não 65%, como publicado anteriormente. Inclusive, essa afirmação foi a que mais chamou a atenção. Em termos práticos, nada de grave vai rolar porque é uma pesquisa de opinião, o negócio agora é saber o que é que vai rolar quanto à opinião nacional sobre o assunto.

O gráfico correto é esse aqui:

É claro também que muito chorume que consegue passar batido na internet deu as caras com o resultado das pesquisas. E não duvido nem um pouco que, com a errata, esse pessoal do chorume vai considerar uma vitória, esses caras tipo o “liberal sem medo da polêmica” que escreveu “não tenho dúvidas de que 'garotas direitas' correm menos risco de abuso sexual” e outros otários que prestam esse maravilhoso desserviço na internet, a ponto de falar que a violência contra à mulher no Brasil é exagero ou que curtem chamar qualquer mulher de FEMINAZI (um termo que adoro, aliás).

Parece que toda essa parcela de brancos privilegiados ainda não sacou que a sociedade machista que eles tanto defendem com unhas e dentes é sim um problema social, a ponto de ser uma puta de dor de cabeça para qualquer mulher pegar um metrô porque ela tem que conferir à sua volta se algum otário quer encoxá-la.

Em vista da publicação da errata, acabei conseguindo conversar com a Luana Pinheiro, técnica do Ipea, que me informou que o relatório corrigido será publicado entre hoje ou amanhã no site oficial do Ipea e que “mesmo com os erros, isso não reduz de forma alguma a gravidade que a pesquisa trouxe à tona. Ainda 58,5% concordam que se a ‘mulher soubesse se portar, não haveria estupros’, ou seja, mais do que a maioria concorda que a vítima é culpada pelo estupro”. Lembrando a todos também que a outra pesquisa “Radiografia” não está errada e que 70% das vítimas de estupros são crianças e adolescentes.

E também não recebi nenhuma errata sobre a pesquisa do Fórum de Segurança Pública (publicada no ano passado) que mostrou que o número de denúncias de estupros no Brasil é superior ao número de denúncias de homicídios. Hoje, quando saí da cama para trabalhar, não senti nada diferente e acho que nenhuma mulher se sentiu mais segura de alguma forma. Nada mudou para nenhuma de nós. Tanto faz se é 65% ou 26%, ainda é perigoso ser mulher no Brasil.

Siga a Marie Declercq no Twitter: @marieisbored