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Vice Blog

Toda Quarta é Dia de Revolução na Bielorrússia

A Bielorrússia é casa da última ditadura da Europa. Enquanto as nações árabes lutam pela sua "libertação", a Bielorrússia continua estagnada no coração da Europa.

O capangas de Lukashenko incentivam o eleitorado (a ficar em casa)

Ontem foi quarta-feira, o que significa que mais uma vez as ruas de Minsk foram tomadas pelos mais cautelosos revolucionários de 2011. Num dos países mais militarizados do planeta, cobrir a cara com uma máscara, ostentar cartazes e gritar nas ruas não são atividades muito recomendadas.

A Bielorrússia é casa da última ditadura da Europa. Enquanto as nações árabes lutam caoticamente pela sua “libertação”, a Bielorrússia continua estagnada no coração da Europa—uma vergonha para o bastião da democracia que é a União Europeia. Há vários anos, a Bielorrússia viveu um milagre econômico, lucrando drasticamente com a revenda de petróleo russo. Para um país cuja identidade nacional foi constantemente importunada por bullies europeus como Napoleão, Hitler e Stalin, esse dinheirinho russo era um bom cascalho.

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Até que veio outro mauzão da História acabar com tudo: doze anos atrás, Alexander Lukashenko chegou ao poder, aboliu o limite de dois mandatos para presidente e começou a mandar seus todos os seus rivais para a prisão. Ainda assim, os bielorrussos não se chatearam muito; afinal, havia dinheiro, comida, e, pela primeira vez em sabe-se lá quanto tempo, as forças militarizadas europeias não estavam tentando invadir Minsk.

Mas o dinheiro acabou (como sempre acontece) e os ânimos começaram a se exaltar (como também sempre acontece). O rublo bielorrusso desvalorizou drasticamente e os preços dobraram. Durante anos, a única coisa que os bielorrussos produziram foram tratores e preços de petróleo inflacionados, mas agora o dinheiro escasso faz com que eles comessem a não ser capazes de pagar pelas importações. O país já deve à Rússia cerca de 35 milhões de euros e, no mês de junho passado—provavelmente por estarem fartos das desculpas esfarrapadas de Lukashenko—os russos diminuíram para metade o fornecimento de energia à Bielorrússia.

A traseira de uma van militar não é um bom lugar para se estar.

Confrontados com uma situação de pobreza, os bielorrusos têm começado a se tornar cautelosamente desobedientes. Estão cansados do seu ditador, mas, ao mesmo tempo, têm medo dele--e com razão. Ao contrário das gerações da Líbia, os bielorrussos são, de forma geral, cidadãos de classe-média e têm muito a perder se entrarem em confrontos com o déspota que tem mantido a nação estável. A maioria dos anarquistas e rivais políticos que existiu durante esses doze anos foi presa ou simplesmente desapareceu, deixando um vazio no lugar onde poderia ter nascido uma ideologia alternativa. Mas, apesar da oposição ter sido tão habilmente apagada da agenda nacional, o país está começando a estremecer.

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Todas as quartas-feiras, há mais de um mês, grupos de manifestantes têm se juntado em Minsk e outras cidades para marchar contra Lukashenko. Supostamente organizados através de uma rede social por um grupo dissidente de bielorrussos que moram em outros países, estes manifestantes evitam entoar cânticos e recorrer à violência, numa tentativa de evitar a fúria de Lukashenko. Em vez disso, aplaudem. Só que nem isso os salva de sofrerem represálias. Lukashenko contratou capangas estrangeiros que atacam quem quiserem. Arrastam pessoas para fora da multidão e as enfiam em vans não identificadas, dentro dos quais os espancam até chegarem à prisão. Mais de 1.700 pessoas foram presas desde que os protestos começaram, no mês passado.

Na semana passada, segundo o que noticiava um jornal local, um homem com apenas um braço foi preso por andar pela rua aplaudindo—um feito deste fascismo dadaísta apenas igualado pela história de outro homem que foi preso por entoar cânticos com mensagens contra o governo. Homem esse que era mudo.

Assim que alguém é forçado a entrar no veículo, é imediatamente levado para uma delegacia da polícia por estes tais não identificados e obrigado a ficar de pé, virado para uma parede, durante horas. Ninguém verifica os seus documentos e eventualmente as pessoas são aprisionada em celas já tão cheias que só há espaço para ficarem de pé. Os mais sortudos são liberados após cerca de 12 horas. Os menos sortudos são geralmente mantidos em cativeiro durante dez dias. Aqueles que têm pouca sorte podem simplesmente desaparecer. Um conhecido meu que vive em Minsk foi preso tem uma semana, por estar batendo palmas na rua. Teve azar e só vai ser libertado depois do sábado. Segundo outros protestantes bielorrussos que conheci, uma mulher que esteve nos protestos sofreu um aborto após ter sido espancada numa prisão em Minsk. Chamam-lhe “a primeira morte desta luta.”

Perante tamanha repressão, os protestos continuam. O país não é particularmente otimista e faz tanto tempo que vivem oprimidos que já se habituaram a simplesmente encolher os ombros e seguir com as suas vidas. Mesmo assim, à medida que a economia continua a colapsar, o movimento continua timidamente a ganhar ímpeto, com as pessoas indo às ruas para protestar—ainda que de forma discreta—contra um regime que as pode dizimar num piscar de olhos.

Na semana passada, os manifestantes em Minsk mudaram a tradição das quartas-feiras, evitando o principal local de concentração, a Praça Oktyabrskaya, e espalhando os protestos pela cidade. Ainda não se sabe o que aconteceu ontem, mas, o que quer que tenha sido, parece que muitos bielorrussos vão passar os próximos dez dias vivendo às custas de Lukashenko.

POR: ALEX MILLER VICE BY
FOTOGRAFIAS: ANTON MOTOLKO