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Música

“Onde Predomina o House Chato, Eu Brilho”, Diz Scratcha DVA

Aproveitamos que o produtor londrino está de rolê pelo Brasil para falar sobre viagens, absorver influências, Hyperdub e como aproveitar um bom momento para produzir um novo álbum.
Anna Mascarenhas

Era um dia bem brasileiro, daqueles em que o sol está estalando no céu e não tem nenhuma nuvem suavizando o tom de azul celeste. Sentei em uma mesa do Mirante 9 de Julho, que inaugurou há pouco tempo ali atrás do MASP. Logo encontrei Scratcha DVA, junto do Akin Deckard, e começamos um papo bem bom sobre a sua passagem pelo Brasil. O clima tropical era o que o deixava mais empolgado em relação à viagem, afinal, o produtor londrino está acostumado com os dias tipicamente cinzas e chuvosos.

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Seu primeiro set no país, acontece nesta quinta (3) em Curitiba, na sexta (4), ele é o convidado especial da festa Metanol, em São Paulo, como parte de um ciclo de comemorações pelos seis anos de existência do coletivo e no domingo (6) ele fecha sua passagem pelo brasil com um DJ set na Wobble, no Rio . DVA é conhecido por transitar magicamente pelo grime, funky UK, garage, footwork e outros gêneros, distanciando-se dos rótulos pré-determinados. É por isso que ele é o responsável pelo programa de rádio do seu selo, o Hyperdub — que já lançou trampos incríveis do Rashad, Flying Lotus, Burial, Kode9 (o dono do selo), Jessy Lanza e outros. No comando do programa Grimey Breakfast Show, ele mistura com precisão as diversas abordagens sonoras do selo em edições mensais ao vivo na Rinse FM.

Conversamos sobre dubstep, ceviche, viagens, festa de rua. Você confere tudo isso no papo abaixo. Solta o mouse:

THUMP: É a primeira vez que você faz uma turnê pela América Latina? O que está achando até agora?
Scratcha DVA: Sim, sim. Estou gostando bastante, principalmente do clima. Antes eu estava no Peru e peguei dias bem ensolarados por lá.

O Peru foi a primeira parada na América do Sul, certo? Já tem alguma história interessante pra contar? Soube que você não é muito fã de ceviche.
Não, não. Na verdade eu sou! O gosto é muito bom, mas eu não como carne crua, nada cru na verdade. Eu odeio sushi! Mas quando estávamos na mesa, eles me falavam que era cozido. Então o prato chegou e o gosto era bem bom, mas fiquei dois dias passando meio mal. E, por causa disso, acabei não saindo muito. Então não tenho nenhuma história sensacional ainda.

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Quanto tempo você vai ficar aqui no Brasil?
Acho que eu vou embora no dia 11 de setembro, fico uma semana e pouco. Vou pra Curitiba primeiro, depois Rio de Janeiro e então vou pra Argentina fazer dois shows. Ai volto pra São Paulo e depois estou de volta em casa.

Você está animado pra fazer alguma coisa tradicionalmente brasileira?
Estou empolgado para ir nas festas de rua. Porque quando eu penso no Brasil, penso em pessoas dançando nas ruas, como um Carnaval rolando todos os dias. Essa é a imagem que eu tenho na minha cabeça do Brasil, então eu realmente quero ir numa festa de rua. Ontem [na segunda, dia 31 de agosto], o Akin (Deckard) me levou num lugar sinistro. Você entra e a primeira coisa que você nota são os livros, então eu estava "ok, estamos numa livraria". E mais pra frente, tem uns caras cozinhando carne. Em outro lado, tem gente vendendo DVD e também um bar. E fica um monte de gente fumando e conversando do lado de fora. E eu fiquei pensando, que tipo de lugar é esse?

Quando eu penso no Brasil, penso em pessoas dançando nas ruas.

Você é um artista que está sempre em movimento, seja produzindo seus EPs, seus shows na rádio ou sets malucos ao redor do mundo. Alguma dessas atividades faz você se sentir mais em casa do que as outras — ou você sente que tudo é igualmente parte de quem você é como artista?
Faz apenas cinco anos que eu estou viajando. Antes disso eu estava sempre produzindo música, então eu nunca viajava pra fazer DJ sets e esse tipo de coisa. Quando eu comecei a viajar, eu entrava no avião e pensava que eu ia abrir meu laptop e fazer várias tracks incríveis. Depois eu comecei a pensar "puts, eu preciso viajar e isso quer dizer que eu não posso fazer música". E por isso eu acabava indo pros lugares e ficando pouco tempo, fazia o trampo e ia embora pra casa. Agora, eu quero passar mais tempo nos lugares. Tipo essa tour agora, alguns shows estão fechados e eu poderia ir pra casa logo depois mas eu disse pro meu agente, o Devin, que eu queria ficar o máximo de tempo. E enquanto isso, ter diferentes tipos de inspiração, criatividade. Em Lima, perto da casa do promoter, tinha um penhasco com vista para o mar. Eu moro em Brixton, então meu quintal é uma bosta. Não tiro muita inspiração disso. Por isso viajar é ótimo, especialmente agora que eu estou fazendo um álbum novo. Viajar tem atrapalhado minha produção musical, mas ao mesmo tempo tem me ajudado bastante a ter uma perspectiva diferente. O que eu mais gosto nesse processo é ver como outras pessoas vivem. Sabe, eu nunca tinha pensado que iria pra Lima e agora que estive lá e pude ver um pouco como as pessoas vivem, como pode ser mais difícil ou mais fácil pras pessoas. Como a luz do sol deixa as pessoas mais felizes, tipo, eu nunca tinha reparado nisso antes. E agora eu sei que eu sou do jeito que eu sou por causa do lugar onde eu moro e eu sei disso por causa das viagens.

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Leia: "A História Oral do Dubstep na Inglaterra"

Como é a sua relação com a Hyperdub? Qual foi sua impressão no começo, quando você entrou no projeto e como você enxerga a evolução do selo?
Eu vejo um desenvolvimento do selo como uma transição. A Hyperdub sempre lançou diferentes tipos de música, trabalhou com diferentes artistas, como Zomby, Flying Lotus, enfim. Predominantemente, era dedicada ao dubstep. Mas então rolou essa transição com a qual o selo se distanciou do dubstep, mas não totalmente. E eu penso que Ikonika, Cooly G e eu — quer dizer, Ikonika está mais perto do dubstep, mas não é dubstep, entende o que quero dizer? E Cooly G, que tem essa influência estranha house mas com um pouco de dubstep também. E eu chego, no meio do grime e do funkhouse, então existe essa transição. E eu acho que precisava disso. Eu não sei, não posso falar pelo Kode9, mas eu acho que precisava disso. Imagine se não tivesse feito isso. Será que estaríamos aqui, você ainda estaria falando sobre tracks antigas e entediantes de dubstep? Mudar faz você se manter atual. E pra mim o selo tem sido um bom selo e eu sou facilmente influenciado, estou o tempo todo fazendo minhas coisas mas me influencio fácil. E eu gosto de muitos tipos diferentes de música. E se você conhece minhas coisas antes do selo, também, sabe que eu já fiz muitas coisas diferentes. E estar num selo como o Hyperdub, que te permite ser livre, é isso que funciona pra mim.

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Leia: "Metanol na Rua, Ikonika no Comando"

Você acompanhou bem de perto o desenvolvimento e transformação da cena dubstep do UK, em torno de 2006. Pode nos contar um pouco sobre a sua perspectiva desse processo?
Eu só acho que, assim como tudo que se torna popular, sabe, muito popular, haverá um problema em relação a isso. E isso é tudo o que eu poderia dizer sobre isso. Não posso falar muito porque eu não estava dentro da cena. Claro que eu acompanhava o som, mas não sei se posso falar sobre a mudança já que eu não estava produzindo naquela época.

O que você acha desse momento específico da música eletrônica no geral, atualmente?
Bom, acho que pra algumas pessoa é extremamente ruim e pra outras é ótimo. Então, se você está tocando house comum, techno, tipo puts-puts, e você tem onde tocar, pessoas pra te assistir, ok, seja feliz fazendo isso. E tem pessoas como eu que meio, tipo, eu leio sempre que as pessoas dizem que meu som é diferente, fora do padrão. Então em tempos como esse, onde predomina o house chato e as pessoas não sabem muito bem pra onde ir, eu brilho. Porque eu gosto de coisas interessantes. Então eu estou tendo um bom momento. Em Londres, especialmente, não sei sobre os artistas daqui, mas na Inglaterra, se você não está constantemente lançando coisas, produzindo, aparecendo na mídia, você é meio que esquecido. Porque tem muita gente na cena. Então, eu não lanço nada desde outubro de 2013 até agora, mas estou tocando e fazendo tour e a Hyperdub me ajudou muito nisso. Isso prova que eu estou tendo um bom momento.

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Mas você está produzindo um álbum novo agora, certo?
É, eu deveria estar no estúdio agora mas eu tirei um mês de folga. Eu entrei no estúdio e fiquei lá por três meses sem parar, nem tinha tempo de lavar o meu saco, saca? E eu bloqueei as janelas pra que a luz não pudesse entrar durante o dia. E então eu tive um mês de folga e agora eu ia voltar ao trabalho mas surgiu a oportunidade de fazer essa tour. E eu vim pra cá, mas quando acabar vou voltar direto ao trabalho.

E o lançamento será quando?
Ah, acho que só no ano que vem. Faz muito tempo, então estou sendo mais conceitual. Não estou no estúdio mexendo com diferentes equipamentos e fazendo tracks, o que também é legal. Mas dessa vez estou adicionando um conceito diferente nisso.

Seus sets são bem dinâmicos e parece que você cuidadosamente se adapta a vibe do lugar onde você está tocando. O que podemos esperar do seu set na sexta-feira?
Eu meio que gosto de entender a vibe de quem vai tocar comigo, pra não ficar muito diferente. No Peru, eu estava meio preocupado, porque eles gostam muito de cumbia, esse tipo de coisa, e eu achava que ia matar a pista, mas na verdade foi bem incrível. E, sabe, tinha uma razão pra eles terem me colocado ali e eu fiz o que eu tinha que fazer. Acabei tocando bastante UK funky, que é basicamente da onde eu vim. Eu toquei grime antes disso, mas UK funky é onde eu me sinto mais à vontade. Então, acho que nessa tour eu vou tocar bastante UK funky, e não só as coisas que eles sabem, mas coisas que eu ando tocando ultimamente, com mais bass e influência dubstep. Obviamente eu também gosto de footwork, that's my shit. Basicamente vou tocar uma mistura de coisas que eu gosto, entre 130 BPM e 160 BPM. É assim que eu acho que vai funcionar.

Obrigada, Scratcha!

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