Um Conto de Duas Cidades: a Era Disco em Bushwick

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Um Conto de Duas Cidades: a Era Disco em Bushwick

Um testemunho intenso da vida incrível e selvagem da Nova Iorque dos anos 1970, através da lente de Meryl Meisler.

Este artigo foi originalmente publicado na edição de Outubro da VICE Magazine.

Nos finais de 1970, Nova Iorque era uma cidade selvagem, a viver tempos selvagens. Eu vivia os meus ribombantes 20 anos, estava tremendamente apaixonada por toda aquela energia e andava sempre com a máquina fotográfica a tiracolo. Em 1977, conheci Judi Jupiter, uma provocadora nata. Propus-lhe uma sessão fotográfica para uma revista em que trabalhava como freelancer. Ela aceitou e começámos a fotografar a cena das discotecas que, na altura, estava a começar a explodir em todo o lado. Quando, em Abril desse ano, o Studio 54 abriu portas, havia sempre multidões para entrar. Para nos destacarmos, fazíamos fatos absolutamente extravagantes para a Judith. Um fato novo de cada vez.

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Uma noite, estávamos no meu apartamento a preparar-nos para sair quando, de repente, BUM!, as luzes apagaram-se em todo o prédio… e em todos os prédios à volta. O metro estava parado, os semáforos não funcionavam, mas nada nos podia parar. Montámos nas nossas bicicletas e seguimos pelas ruas escuras, apenas iluminadas pelos faróis intermitentes dos carros, em direcção à baixa da cidade, até pararmos em Columbus Circle. Estavam algumas pessoas à entrada do Studio 54, mas as portas estavam fechadas. Batemos, mas ninguém respondeu. Esperámos mais um bocado, voltámos a bater. Mas a coisa era a sério. A cidade estava a viver um verdadeiro apagão geral. Voltámos ao Studio 54 uns dias depois e foi como se nada se tivesse passado.

"O bairro era um monte de escombros, tijolos, cimento e bocados de madeira por todo o lado. Vestígios do fogo posto que tinha destruído praticamente tudo em volta".

Entretanto, enquanto toda a gente vivia em clima de festa permanente nas discotecas de Manhattan, pela rádio ouvi uma notícia sobre um sítio de que nunca tinha ouvido falar: Bushwick, Brooklyn. Aparentemente, estava em chamas, com saques e motins a acontecerem ao abrigo da escuridão que por ali ainda permanecia. As imagens dos incêndios e dos distúrbios durante o apagão ficaram cravados para sempre na minha cabeça.

Alguns anos mais tarde, em Dezembro de 1981, quando me tornei professora de arte na Escola Preparatória 291, em Bushwick, essas imagens voltaram a assaltar-me a mente. No meu primeiro dia, ao sair do metro, cheguei mesmo a pensar se o professor de arte anterior teria sido morto.

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O bairro era um monte de escombros, tijolos, cimento e bocados de madeira por todo o lado. Vestígios do fogo posto que tinha destruído praticamente tudo em volta. A escola era uma das poucas estruturas em funcionamento e era uma espécie de híbrido. Parte escola, parte abrigo, parte prisão. Era atordoante. Miúdos a tentarem aprender e a tentarem divertir-se no meio do caos absoluto. professores a tentarem encontrar um propósito, pelo meio de um bairro despedaçado.

Ensinei em Bushwick entre 1981 e 1994. Entrar e sair do metro era a cada dia uma aventura só por si. Não se conseguia prever quem é que estaria por ali à espreita. Comecei a andar sempre com uma máquina fotográfica de plástico, das mais baratas. Depois das aulas ia experimentado diferentes trajectos até ao metro, numa tentativa de descobrir cada rua, cada esquina e captar o ambiente e as inúmeras histórias que estavam ali para serem contadas.