Crime

'O Exterminador' recebeu a maior sentença já dada por escravidão sexual e crimes de guerra

O brutal chefe de guerra Bosco Ntaganda é a primeira pessoa que a Corte Penal Internacional condena por escravidão sexual e violência sexual contra suas próprias tropas.
MS
Traduzido por Marina Schnoor

A Corte Penal Internacional condenou o ex-chefe de guerra congolês por ordenar massacres, escravidão sexual e recrutar crianças como soldados a 30 anos de prisão na quinta-feira passada. Foi a sentença mais pesada já dada pelo tribunal, e torna Ntaganda a primeira pessoa condenada pela CPI por escravidão sexual.

Bosco Ntaganda, um brutal líder militar conhecido como “O Exterminador”, foi condenado por 13 acusações de crimes de guerra e cinco crimes contra a humanidade, cometidos quando ele comandava a milícia União dos Patriotas Congoleses na província de Ituri, no leste da República Democrática do Congo, em 2002 e 2003.

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Em julho, Ntaganda foi considerado culpado por atrocidades incluindo ordenar massacres, estupros, escravidão sexual e recrutar crianças como soldados. Seu grupo cometeu os crimes contra a etnia rival numa tentativa de controlar Ituri, levando milhares de pessoas a fugir da província rica em recursos.

Na sentença, o juiz Robert Fremr descreveu Ntaganda como o líder-chave que deu as ordens para “matar civis”.

Num dos ataques, os milicianos mataram 49 pessoas, incluindo crianças e bebês, numa plantação de bananas no vilarejo de Kobu, massacrando civis com pedaços de pau, facas e facões.

“Alguns corpos foram encontrados nus, alguns com as mãos amarradas, outros com as cabeças esmagadas. Vários corpos foram estripados ou mutilados de alguma maneira”, disse Fremr.

Ntaganda também foi responsável pelo estupro e escravidão sexual de crianças, incluindo estupro sistemático de mulheres de sua milícia por homens do grupo. Ele também supervisionou o recrutamento de crianças como soldados, e matou pessoalmente um padre católico.

Fremr disse que muitas das vítimas e testemunhas dos crimes de Ntaganda ainda têm “cicatrizes permanentes, tanto físicas quanto psicológicas, incluindo perda de memória de longo prazo, transtornos neurológicos, e extensos problemas físicos”.

Ida Sawyer, vice-diretora da divisão da África da Human Rights Watch, disse que o caso foi histórico: Foi a primeira vez que a CPI condenou alguém por escravidão sexual e crimes de violência sexual contra seus próprios combatentes.

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“A sentença de 30 anos para Ntaganda manda uma mensagem forte de que mesmo pessoas consideradas intocáveis podem pagar por seus crimes um dia”, disse Sawyer. “Mesmo que a dor das vítimas não possa ser apagada, elas podem tirar algum conforto de ver a justiça prevalecer.”

Mas ela diz que as condenações dele só cobrem crimes cometidos na província de Ituri, e vítimas também querem que ele seja julgado por ataques a outras regiões. Além disso, segundo ela, há mais líderes de milícia que precisam ser trazidos à justiça por crimes no leste do Congo, onde cerca de 130 grupos armados continuam ativos.

Mais de 60 mil pessoas morreram em confrontos na região desde 1999, com milícias rivais lutando para controlar minas e extração de madeira.

Por anos depois de cometer seus crimes em Ituri, Ntaganda foi um símbolo da aparente impunidade cercando o conflito. Ele voltou ao exército nacional congolês, atuando como general de 2007 a 2012, aí desertou para fundar um novo grupo rebelde, o M23, que se voltou contra o governo.

Depois ele se tornou o primeiro suspeito procurado a se render a CPI, entrando na embaixada americana da capital de Ruanda em 2013 para se entregar. Promotores dizem que ele fez isso porque uma divisão no M23 resultou em ameaças contra Ntaganda.

Ntaganda alegou ser inocente durante o julgamento, dizendo aos juízes que era um “soldado, não um criminoso”. Ele já apelou das condenações.

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