Comida

As amostras de ostentação mais bizarras que vi trabalhando em restaurantes de alto escalão

Às vezes, um chihuahua precisa de um bife de vitela mal passado.
Andrea Strafile
Rome, IT
MS
Traduzido por Marina Schnoor
champagne
Foto: VICE.

Em 2019, um post no Reddit pediu pras pessoas compartilharem as exigências mais ultrajantes que já encontraram trabalhando no mundo da hospitalidade de alto escalão. Entre as repostas tinha a história de uma mulher que pagou US$ 100 pra cuspir na cara de um garçom, moleques ricos suíços pedindo um champanhe caro para derramar na pia, e um número impressionante de histórias com cachorros.

Fascinado com os contos desse mundo geralmente impenetrável, decidi encontrar o que eu pudesse na Itália, lar de alguns dos restaurantes mais luxuosos do mundo. Depois de falar com a equipe de cinco dos restaurantes mais chiques da Itália, descobri três coisas: não importa o que aconteça, os funcionários nunca podem perder a calma, não tem limite para o que os ricos vão pedir, e que encontrar pessoas para falar abertamente sobre esse tipo de coisa é extremamente difícil.

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De todos os hotéis e restaurantes com três estrelas da Michelin pra onde liguei, quase todo mundo desligou na minha cara ou achou que era trote. Mas nem todos.

Até recentemente, Valentina* era sommelier de um restaurante de hotel famoso em Veneza – o tipo de lugar frequentando pelos insanamente ricos. “Vi muita coisa estranha”, ela me disse por telefone. “Quando um cliente rico ou importante fazia uma reserva, a gente dava a ele a maior mesa, com um sofá e vista para a Lagoa [de Veneza]. Mais de um fez escândalo porque a mesa não dava pra ser vista de todo o restaurante, porque eles queriam ser vistos lá.”

Do outro lado da escala, também pediam a ela pra negar que alguém muito conhecido estava claramente comendo no restaurante. “Quando tínhamos VIPs ou atores famosos, a regra era protegê-los e sempre negar que eles estavam ali”, ela disse. “Alguém podia estar sentado na mesa ao lado de Spielberg ou Robert Redford – se a pessoa perguntasse, você tinha que responder algo do tipo 'Quem, aquele cara? Não, você se confundiu, senhora'. Era muito estranho, porque às vezes o cliente estava realmente sentado ao lado dessas pessoas famosas.”

Valentina também testemunhou coisas que você não esperaria num restaurante de alto escalão. “Uma noite apareceu um casal – ela era muito elegante e bonita, ele estava usando um monte de correntes douradas no pescoço e com a camisa desabotoada”, ela disse. “Vimos a mulher escrevendo num caderno a noite toda. Achamos que ela podia ser uma crítica de culinária ou jornalista, mas acabamos descobrindo que aquilo era uma sessão de terapia. Depois do jantar – ou sessão – ele pediu a mulher em casamento, ela disse não, e ele se levantou como se nada tivesse acontecido, deixando uma gorjeta bem generosa.”

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Piazza Duomo é o único restaurante de três estrelas da Michelin na região de Piedmont na Itália. Como um dos 30 melhores restaurantes do mundo, eles tendem a atender todos os caprichos dos clientes.

“Pessoas do mundo inteiro vêm comer aqui. Não somos um hotel, então a clientela é muito variada – eles vêm aqui para ter uma experiência”, disse o sommelier do restaurante, Vincenzo Donatiello. “Tinha um casal de uns sessenta ano com um chihuahua. Quando fizeram o pedido, eles pediram para o cachorro primeiro: lombo de vitela mal passado.”

Roberto Riccardo Tornabene é o chefe dos garçons do Restaurante Felix Lo Basso, com vista para a Piazza Duomo em Milão. Ele me contou sobre um cliente que “se sentou e acendeu um cigarro no meio do restaurante, como se fosse totalmente normal”. Outro, ele disse, “chamou um táxi para ir até a farmácia comprar adesivos de nicotina. Quando o taxista voltou, o cliente disse que não era aquela marca, e mandou ele de volta pra farmácia. Quando o motorista chegou pela segunda vez, o cliente não tinha dinheiro em cash, então tivemos que pagar o taxista.”

Roma é lar do restaurante com três estrelas da Michelin La Pergola, empreendimento de Heinz Beck no hotel Cavalieri Waldorf Astoria. Aqui, todo desejo é uma ordem pra eles – de um magnata russo que exigiu que a piscina fosse aberta para ele no inverno, custando milhares de euros ao hotel, até uma mulher que pediu um cigarro e recebeu um maço numa bandeja de prata.

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Marco Reitano é o sommelier do La Pergola há 25 anos, então já viu de tudo. “Se vamos falar de ostentação, então temos que falar de vinho”, ele disse. “Hoje, temos um porão com cerca de 3.400 garrafas. Uma vez, um cliente regular estudou a lista de Bordeaux 1982 por um longo tempo. Esse talvez seja o melhor [vintage] da história. Eventualmente, ele pediu sete garrafas só pra ele – para sentir a diferença nos sabores de cada uma. A conta deu mais de € 20 mil.” Marco também pode experimentar das garrafas abertas.

“Outro cliente tem medo da cor preta”, ele continuou. “Então, se temos pratos em porcelana escura, temos que servi-los em pratos brancos.”

Marco também tem algumas histórias fofas: “Era verão e estávamos com uma família muito importante da Ásia jantando no terraço. Perguntamos para o filho de sete anos se ele gostava do Coliseu. Ele disse que sim, mas que ficava triste por não poder ver os gladiadores. Bom, aqui no hotel nos temos festas à fantasia. Então mandamos um garçom bonito, alto e musculoso se vestir de gladiador para entreter o menino”.

Tem muitos hotéis de luxo em Roma, mas o Hotel Hassler – conhecido por seu restaurante, Imàgo – é um dos melhores. “Uma das coisas mais estranhas foi quando uma família apareceu para jantar com balanças de precisão, porque queriam que a gente cozinhasse o menu gourmet com pesos específicos”, ele disse. “Do vinho ao óleo, com quantidades específicas para cada membro da família, claro.”

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“Uma das coisas mais engraçadas”, ele continuou, “foi quando uma senhora japonesa passou mal e desmaiou. O marido estava segurando a cabeça dela e pediu para ver o chefe, preocupado. O marido me chamou, colocou minha mão embaixo da cabeça da mulher e continuou comendo. O chef viu e ficou abismado, mas como já tinha morado no Japão, ele sabia que os japoneses mantêm a compostura, mesmo em situações extremas”.

É isso: os obscenamente ricos também fazem coisas engraçadas. E lembre-se, da próxima vez que você se sentir mal por pedir mais ketchup pro garçom, relaxe – tem gente que pede um bife inteiro pro cachorro.

Matéria originalmente publicada pela VICE Itália.

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Tradução do inglês por Marina Schnoor.