FYI.

This story is over 5 years old.

Fotografia

Presos que fotografam presos

“Esse curso é a única coisa boa na prisão, o resto não me serviu pra nada.”

"Esse curso é a única coisa boa na prisão, o resto não me serviu pra nada."

Jorge cumpre 25 anos de prisão. Desde os 18, passou apenas 13 meses em liberdade. Manuel foi detido pela primeira vez quando tinha 13 anos e Franco [o ditador Francisco Franco 1892-1975] ainda não estava morto. Isso quer dizer que a prisão era um lugar em que um detento apunhalava o outro em pleno banho. Edu já foi preso nove vezes. Recaída em cima de recaída, tudo culpa da heroína. "O melhor que me aconteceu na prisão é continuar vivo, senão já estaria morto", diz Edu.

Publicidade

Todos os detentos citados no parágrafo anterior convivem no Módulo DAE (Departamento de Atenção Especializada), na prisão Catalunya Brians II, na Espanha, detenção feita para pessoas em situação de vulnerabilidade, sobretudo viciados em drogas. Boa parte dos detentos cumprem longas penas e costumam ser reincidentes no crime. "Isso aqui não recupera ninguém", fala Sergio, que cumpre uma pena de dez anos. "Ao contrário, é uma escola do crime, onde só se aprende novos métodos de roubar."

Kamal, 19, Marrocos. "O dia a dia é sempre o mesmo, vamos marcando os dias no calendário."

Os presos se reúnem duas vezes por semana na oficina de fotografia comandada por Pau Coll, membro do coletivo RUIDO Photo. Nas oficinas, os detentos aprendem noções básicas da fotografia até irem pra prática fazendo retratos. E é assim que passam por um processo criativo que os incentiva a refletir e analisar sua própria realidade.

"Esse curso é a única coisa boa na prisão, o resto não me serviu pra nada", diz Manuel. "Aqui, perdi tudo que tinha, minha família, minha casa, minhas filhas, que agora estão maiores", pontua ele. "Quando sair, aos 56 anos, não vai ter nada pra mim."

Para quatro dos detentos participantes da oficina, o próximo sábado, dia 15, será uma das poucas oportunidades que terão de sair da prisão. Eles irão à inauguração da exposição Adentro, presos que fotografían presos, também organizada pelo coletivo RUIDO Photo. A mostra reúne as melhores fotos feitas em duas prisões espanholas.

Publicidade

"Temos que viver pra contar", diz Óscar, de 27 anos, preso há nove. Se não há forma de colocar a vivência em palavras, a fotografia feita pelos detentos revela parte da realidade daquelas pessoas que estão privadas de liberdade.

Manuel, 56, Hospitalet del Llobregat. "Faz 43 anos que entrei na prisão. Na primeira vez, tinha 13 anos e o Franco nem havia morrido. Agora, isso pra mim é como uma casa."

Edu, 36. "Quando entrei aqui da última vez, entrei muito mal, vivia nas ras tendo uma overdose atrás da outra. O melhor que aconteceu na prisão foi continuar vivo, se não já estaria morto."

El Rasta, 21. "Aqui não tem nada complicado, nos dão comida, banho e cama. O que me deixa puto é não estar com meu irmão pequeno.Isso não vai dar pra repetir, o resto terei tempo de fazer ainda."

Mahmoud, 22, Senegal. "Pensava que vindo pra Europa conseguiria dinheiro e poderia ajudar minha família. Vim pra cá com meu irão, mas me meti com drogas e olha onde acabei."

Sergio, 48, Barcelona. "Minha primeira entrada na prisão foi em 1988 e me caguei, entrei na Modelo. As paredes eram cinza e pingava água do teto. Era uma gruta."

Óscar, 27, Terrassa. "A única coisa que ajuda a passar o tempo mais rápido é a droga. Nos primeiros anos de cana, vivia chapado todo dia."

Jorge 'El Punky', 23, Barcelona. "Não curtia as pessoas, mas depois de tanto tempo preso, quando saí, alucinava de ver gente nas ruas e nas calçadas."

Andrés, 20, Equador. "Lembro que assim que cheguei à Espanha vi as luzes do avião, o dinheiro em Euro e morri de frio porque era inverno."

Jorge, 42, Barcelona. "Não tenho fobias nem medo de sair, mas quando estou com gente me sinto deslocado, fico inseguro, tenho paranoia."

Siga a VICE Brasil no Facebook, Twitter e Instagram.