Mesmo que o estereótipo do “artista maluco” possa ser tão equivocado quanto o tropo do “artista pobre”, a luta com a depressão apareceu no trabalho de muitos artistas e fotógrafos ao longo da história. Vincent Van Gogh, Diane Arbus e Francesca Woodman são apenas três exemplos de artistas cujo trabalho é repleto de reflexões sobre seus demônios interiores.Para Tara Wray, a fotografia se tornou um jeito de lidar com isso, e seu livro Too Tired for Sunshine, publicado pela Yoffy Press este ano, uma espécie de manta terapêutica – um pastiche dos altos e baixos de sua vida, um veículo para seguir em frente em seus momentos mais deprê.
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O livro foi aclamado não só pela crítica, mas também por fotógrafos que se identificaram com a solução criativa que ela encontrou pra passar pelos momentos mais sombrios de sua vida. Uma mulher entrou em contato com Wray pelo Instagram, dizendo que tinha começado a fotografar para salvar a própria vida. “Ela começou a fotografar depois de ter sido internada num hospital psiquiátrico”, diz Wray. “Ela disse que usar uma câmera deu a ela um meio de estar presente no mundo, mas também uma proteção para se sentir segura. Eu soube ali que as pessoas estavam compartilhando coisas reais, e que tínhamos topado com algo poderoso.”Wray recentemente lançou “The Too Tired Project”, um site interativo que funciona como uma sessão de terapia sempre acessível, uma conta no Instagram e uma hashtag (@tootiredproject e #tootiredproject), além dum livro que será publicado no futuro apresentando outras histórias e trabalhos de fotógrafos, sempre relacionados com saúde mental.Tendo confrontado isso na minha própria vida e trabalho, aqui faço um perfil de seis fotógrafos contribuindo com o projeto pra abordar essas questões de diferentes ângulos. Alguns deles fazem trabalhos que descrevem sua depressão, outros usam fotografia como sua própria cura, ou, como Wray, oferecem uma combinação de final aberto de ambas as coisas
Arielle Bobb Willis
Arielle Bobb Willis, de Nova York, tem depressão desde que era bem nova. No começo de sua adolescência, ela usava sua câmera como ferramenta pra lidar com isso. As fotos dela – brilhantes, ousadas e coloridas – não são o que você esperaria de um trabalho lidando com este tipo de questão. Ela descreve sua paleta – que é como um tratamento com luzes para transtorno afetivo sazonal – como “reivindicando o poder e alegria em momentos de tristeza, confusão ou confinamento”.
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Tirando referências das pinturas clássicas do século 20 de Jacob Lawrence, além de elementos altamente estilizados da fotografia de moda contemporânea, Willis desenvolveu seu próprio código pra capturar as muitas camadas da vida. Corpos, geralmente com a cabeça coberta ou obstruída por tecidos de cores primárias – como roupas de tamanho grande – ganham formas esculturais. Trabalhando com até três modelos de uma vez, Willis os faz se abraçar, contorcer e metamorfosear em um. Às vezes ela gira a imagem em 90 ou 180 graus, aumentando a sensação de caos colorido dismórfico. “Acho que você vê isso nas fotos”, diz Willis, “a tensão entre meus períodos de depressão e como estou lutando para trazer mais cores para a minha vida”.As locações variam de becos urbanos para topos de prédios, quintais e cenários mais rurais da Costa Leste dos EUA, registrando não só os muitos lugares em que ela morou – Nova York, Carolina do Sul, Nova Orleans – mas também o impulso metafórico sem direção de estar em vários estados emocionais ao mesmo tempo.
Leah Freed
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A exposição da tese recente de Freed no Photographic Center Nortwest de Seattle, Feeling Bad About Feeling Good About Feeling Bad, é uma referência à necessidade obsessiva de trabalhar como distração, a ajudando a lidar com os fatores estressantes de todo dia, que ela descreve como “coisas que ficam pairando e absorvem o foco mental, tempo e energia”. É um ciclo contínuo, repetitivo e terapêutico. Em forma de mostra, uma rede de mais de 100 variações de um erro técnico de um negativo de 35mm – cada uma impressa à mão – parece uma superfície envelhecida da lua: aberta e impressionante, mas ainda desmoronando. Freed animou essas imagens num vídeo de queima dolorosamente lento que vai te fazer chorar só de assistir.
A série mais longa de Freed é Breath Studies, que ela faz colocando uma câmera pinhole cheia de papel sensível à luz 4x5 em seu peito durante ataques de pânico e deixando em exposição enquanto foca seus pensamentos, contando até dez cada vez. O resultado são imagens em preto e branco tiradas direto dos negativos, mostrando vários estágios de clareza – pedaços de nuvens e céus escuros misturados, ilustrando o peso do mundo acima.Agora com 58 anos, Michael Bach sofreu com depressão pela maior parte de sua vida. Estigmas sociais o impediram de abordar o problema até ele ter 30 anos e sofrer um surto logo depois de completar seu mestrado em fotografia. Ele destruiu todos os seus negativos e a maioria de suas impressões, jurou nunca mais trabalhar com fotografia, e começou a atuar como modelo para outros artistas como meio de ganhar a vida.
Michael Bach
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Mas dez anos depois, algo mudou. Depois de tomar antidepressivos, ele começou a ver o mundo em termos visuais de novo. “Me peguei fazendo imagens mentais na minha cabeça enquanto observava o mundo ao meu redor”, diz Bach. “De repente, o mundo estava cheio de luz e possibilidades.”Quando tremores neurológicos impediram seu trabalho como modelo, ele começou a fazer autorretratos com uma câmera 8x10. As imagens resultantes – muitas vezes tiradas em porões escuros ou à noite – são borradas, caóticas e – nos limites do que a fotografia é capaz de capturar – dão ao observador um vislumbre das emoções cruas e do desconforto físico da experiência de Bach.
Os problemas físicos de Bach recentemente limitaram sua habilidade de fotografar e processar filme analógico, então ele passou a usar um iPhone e uma pequena câmera digital, o que continua a ser uma forma de terapia visual. As fotografias de Bach com o celular têm um clima diferente e mais espontâneo, uma quebra dos parâmetros encenados do seu trabalho em formato grande, mas ainda contêm uma autoconsciência e honestidades brutais, o ajudando a aceitar suas inseguranças. “As fotos dançam na linha tênue entre a repulsão e desilusão que sinto com meu corpo”, diz Bach, “e a beleza que luto para encontrar e criar essas imagens”.
Ryan Pfluger
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A câmera acabou se transformando não só numa ferramenta para interagir com estranhos, mas também para se reconectar com o pai afastado em viagens pelo país de carro, durante as quais ele fez retratos íntimos e emocionais. Numa dessas imagens, Pfluger e seu pai estão deitados em camas paralelas de um hotel. Seu pai, sem camisa, olha para frente, enquanto Pfluger confronta a câmera e o espectador. É uma imagem impressionante que não apenas sugere o monólogo interno de Pfluger, mas talvez preveja seu trabalho futuro.
Se descrevendo como extremamente introvertido, Pfluger continua a viver uma vida bastante solitária, preferindo relações um a um, o que, segundo ele, “pode levar a uma sensação de solidão”. Como seus primeiros trabalhos com estranhos da internet e seu pai, a fotografia tem ajudado Ryan a superar isso num nível profissional. Ele canaliza sua própria inquietação num mecanismo que faz seus temas – sejam pessoas posando para um projeto pessoal ou celebridades como Tilda Swinton, Cat Power e Billie Joe Armstrong, ou até o presidente Barack Obama – se abrirem. “Claro, é irônico”, diz Pfluger, “ser um fotógrafo principalmente de retratos, mas ficar desconfortável em interagir com pessoas no geral”.As viagens recentes de Pfluger nos últimos anos mostraram a ele que esse desconforto pode ser universal. “Há uma sensação subjacente de ser incompreendido, não ter uma comunidade ou não sentir que sua casa é onde você deveria estar”, ele diz. “Acho que esquecemos como atos simples, de ser gentil com um estranho ou tirar um momento para fazer alguém se sentir especial de maneira não-transacional, podem nos levar longe.”
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Nathalie Ghanem-Latour
The Six Months é uma coleção de cenas cotidianas sutis de obstrução que refletem as barreiras mentais de Ghanem-Latour, fotografadas na hora de almoço de seu trabalho num bairro estranho e remoto nos arredores de Paris. Em uma fotografia, um festão de bengalas de doce vermelho e branco se estende diagonalmente num plano de grama recém-cortada. É uma quebra geométrica estranha do enquadramento – um detalhe brilhante e óbvio numa paisagem urbana que fica no caminho, mas ainda assim provavelmente passa despercebida pelos pedestres comuns. Outra foto retrata um buraco num arbusto aparado no subúrbio – talvez um sinal de tentativas sem sucesso de ultrapassar barreiras emocionais. Em outra imagem, andaimes cercam o busto de uma estátua grega, a protegendo mas também a prendendo.
Para Ghanem-Latour, essas fotos são lembretes dos tempos em que ela se sentiu fora de lugar no mundo. “Andar e tirar fotos era meu jeito subconsciente de lidar com esses problemas”, ela diz. “Por um momento, eu sentia que podia finalmente relaxar e ser eu mesma. Com a fotografia, posso tomar o controle do meu ambiente, e isso permite me expressar de maneiras que minha ansiedade de timidez não deixam. Isso me dá uma voz e me mostra minha força em momentos que não tenho nenhuma.”
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Joseph P. Traina
A imagem de capa do livro mais recente de Traina, Lost in Seattle, publicado pelo Kris Graves Projects este ano, pode ser um guarda-chuva pra tudo isso. Traina está sentado num colchão coberto de plástico, desviando o olhar da câmera, o rosto iluminado por uma luz natural estilo Hopper, esperando por algo mudar, sem um final à vista. Outras imagens capturam a paisagem em mutação de Seattle como um símbolo do desconforto de Traina com o mundo. Fotos de árvores cobertas com redes protetoras contra insetos compartilham espaço com fotos de interior de tecido de cortinas se derramando como galhos de chorão.
Muitas das imagens de Lost in Seattle são parte da série em andamento Be Gentle with Yourself, na qual Traina justapõe autorretratos com imagens alteradas de sua infância para entender melhor a raiz de tudo e aprender a implementar métodos de se cuidar. “Durante esse tempo na minha terapia”, diz Traina, “aprendi a ouvir o que minha criança interior precisava, a cultivar um espaço seguro, um lugar para ser visível”. Muitos desses retratos – reencenações criadas durante os pontos baixos de Traina – visam dar um passo atrás, refletir e processar.“Sou meu maior inimigo”, diz Traina. “Brinco às vezes que ninguém me odeia mais que eu. É estranhamente reconfortante, ser o melhor em me odiar. Estou trabalhando nisso. Estou encontrando maneiras de amar e me sentir amado.”