A KKK Despertou o Ódio na Assembleia Legislativa da Carolina do Sul no Final de Semana

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A KKK Despertou o Ódio na Assembleia Legislativa da Carolina do Sul no Final de Semana

Foi um espetáculo marcado por ódio, tensão racial, queima de bandeiras confederadas e um vasto espectro de ideologias idiossincráticas e confusas.

Todas as fotos por Justin Schmitz.

No sábado, a Assembleia Legislativa da Carolina do Sul em Columbia foi palco de um protesto organizado pelos Loyal White Knights of the Ku Klux Klan, um grupo da Carolina do Norte. Realizado algumas semanas depois do assassinato de nove pessoas numa igreja história afro-americana em Charleston – e a remoção subsequente da bandeira confederada do Capitólio – o evento pareceu um retrocesso à era de Jim Crow. Foi um espetáculo marcado por ódio, tensão racial, queima de bandeiras confederadas e um vasto espectro de ideologias idiossincráticas e confusas.

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A cobertura da mídia norte-americana foi pesada nas semanas anteriores ao protesto, e só aumentou com o contraprotesto organizado pelos Black Educators for Justice, um grupo da Flórida liderado por James Evan Muhammad, professor e ex-diretor de educação dos Novos Panteras Negras. Com dois atiradores de elite da polícia posicionados no telhado da Assembleia, Muhammad discursou com outros aliados do Poder Negro, incluindo Niecee X do Huey P. Newton Gun Club de Dallas.

Por volta das 15 horas, sob pesada proteção policial, uma procissão de cerca de 60 cavaleiros da Klan – muitos usando coletes à prova de balas – e simpatizantes tomou os degraus da Assembleia. Eles rumaram para uma área protegida por uma barricada, onde podiam capitalizar em cima de seu direito sancionado pelo governo de se reunir. Usando camisas pretas com patches relacionados à Klan e insígnias de supremacia branca, o grupo não tinha microfone ou pódio. Os educadores estavam falando desde o meio-dia sobre poder negro, união e a necessidade de mudança social e no sistema; o Klan ofereceu uma mensagem arcaica não amplificada, gritando obscenidades, palavrões raciais e fazendo pose.

O espetáculo parecia uma peça de teatro péssima ou uma briga num estacionamento, só que em vez de atores ou adolescentes bêbados, você tinha o que já foi o grupo de supremacistas brancos mais temido e perigoso dos EUA balançando bandeiras confederadas, uma bandeira nazista e rasgando a bandeira de Israel. (Mais tarde, quando encurralados no estacionamento, mas ainda protegidos pela polícia, um cavaleiro do Klan mostrou a bunda para os manifestantes.) Outro simpatizante, usando regata e calça camuflada, imitou um gorila para os manifestantes negros. Isso tudo foi parte de um dedo do meio agressivo, e de certa maneira efetivo, lançado contra todo mundo que não fosse branco e a favor da bandeira.

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Um simpatizante da KKK indo para os degraus da Assembleia; momentos depois ele foi nocauteado por um anarquista anti-KKK.

O comparecimento foi bem menor que as 200 pessoas prometidas pelo líder do grupo, Robert Jones, também conhecido como James Spencer, também conhecido como Chris Barker, mas o total de manifestantes anti-KKK de todas as raças, simpatizantes não afiliados da bandeira confederada, curiosos, jornalistas e cinegrafistas chegou aduas2 mil pessoas (segundo estimativa do Departamento de Segurança Pública da Carolina do Sul, como informado pelo New York Times). Isso apesar dos pedidos da governadora republicana Nikki R. Haley e do prefeito de Columbia, Steven K. Benjamim, de que o protesto do grupo de ódio de outro estado fosse ignorado.

O calor de quase 34º C combinava com os ânimos dos presentes. No decorrer do dia, várias brigas e discussões começaram entre os manifestantes e contramanifestantes, com a polícia correndo para apartar as coisas.

Manifestantes do contraprotesto dos Novos Panteras Negras.

"Eles disseram que os negros tinham que ser acorrentados e eu perdi a cabeça", disse Chris Daugherty, 32 anos, ex-cabo do exército norte-americano, depois de começar a discutir aos gritos com o simpatizante do KKK que fazia gestos de gorila. A polícia teve que separar os dois. "Eu disse: 'Fui para a guerra por este país. Não pelos negros, não pelos brancos, não pelos muçulmanos, não pelos cristãos, mas pelo povo. Vi meus companheiros morrerem. Luto pelas pessoas'. Ele disse que não era racista, mas veja como ele fala com qualquer um que não seja branco. Ele queria dizer que eu não era nada por causa da cor da minha pele".

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"As emoções se incendeiam com o racismo", continuou Daugherty, que estava usando um boné do Iraque Livre e uma CamelBak para se manter hidratado. "Quando isso atinge o nervo, a tensão vai de 0 a 100. Eles dizem que isso é uma questão de herança, mas usam essa palavra para esconder sua intenção real. Se pudessem fazer isso do jeito que queriam, eles estariam gritando crioulo no microfone."

"Ei, cara", um policial branco disse a Daugherty – que é birracial – alguns minutos depois. "O que você disse ali foi poderoso."

Os cavaleiros da Klan andando até a Assembleia.

Simpatizantes da bandeira confederada na sombra durante o protesto da KKK.

Cruzei com uma mulher branca de cerca de 40 anos que tinha discutido acaloradamente com uma senhora negra de 60 – outro enfrentamento separado pela polícia.

"Eu estava tentando tirar fotos para ser justa e documentar os dois lados", disse a primeira mulher, que estava com o filho adolescente que usava um boné com a bandeira confederada. "Essa senhora negra racista disse: 'Sai daqui, sua racista… Nem venha começar nada comigo'. Veja, não estamos do lado da KKK. Só porque estamos usando esse boné, e eu acredito nisso – minha família morreu nessa guerra – isso não quer dizer que sou racista. Deus sabe que não. Mas não gosto de ser chamada de racista. Ela precisava calar a boca porque obviamente a racista é ela." Alguns minutos depois, as duas mulheres fizeram as pazes e o filho dela pediu desculpas.

"Não tem problema", disse a senhora negra. "Não precisa se desculpar comigo, você estava defendendo sua mãe."

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Enquanto os educadores continuavam seu protesto, falei com um homem branco de meia idade chamado Billy, de Florence, Carolina do Sul. Billy estava usando um boné de veterano do Vietnã e perguntei a ele sobre a procissão inter-racial de motoqueiros que tinha acabado de passar, vários deles usando bandanas cobrindo o rosto.

"Eles estão dizendo 'Calem a boca'", ele me disse sobre os motoqueiros, que veríamos depois no palco como parte do grupo anarquista antirracista apoiando os educadores, com cartazes dizendo "Foda-se a KKK", "Morte para o 88" e "Queime o Sistema Racista". O morador de Florence apontou os dois atiradores no telhado da Assembleia, depois me disse que não concordava que a bandeira fosse retirada.

"Tudo que ouço é racismo e escravidão", disse Billy gesticulando para onde os educadores estavam discursando desde o meio-dia.

Perguntei sobre as reformas na educação e no sistema legal sobre as quais os educadores estavam falando.

Billy refletiu: "Algumas pessoas escutam o que querem escutar".

"Pode ser todo mundo que escuta assim?", perguntei.

Nessa hora, a mulher dele se aproximou com um olhar agressivo. "Ele disse que somos o inimigo?", ela perguntou ao marido sobre o homem que discursava. "Ele está falando sobre as pessoas com a bandeira ou sobre nós?"

"Vamos embora", ela disse, o puxando. "Isso é racista."

Alguns minutos antes do protesto da KKK, vi um casal sentado na sombra entre o grupo de simpatizantes da bandeira e manifestantes anti-KKK, sem indicar abertamente de que grupo faziam parte.

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Dillon, Carolina do Sul. O homem enrolado na bandeira gritava "Enforque todos eles!", para a KKK. "Eles roubaram minha bandeira", ele disse, enquanto um homem negro de dreads passava, o encarando antes de se afastar. "Foda-se a KKK!", ouvimos uma voz acompanhada por tambores. "É isso mesmo", o homem da bandeira respondeu.

Um manifestante mostrando sua opinião sobre a bandeira confederada.

Os eventos do dia ofereceram uma visão totalmente diferente da cena no tribunal depois da tragédia na Igreja Metodista Africana Emanuel em junho. Inesperadamente, alguns familiares das vítimas perdoaram o atirador Dylann Roof, um nativo da Carolina do Sul de 21 anos.

"Esse não é o estado que era quando você foi embora", me disse Brett Harris, estudante de ciência política de 20 anos da Universidade da Carolina do Sul, na noite anterior ao protesto, quando jantávamos num restaurante Yesterdays do centro. Harris, que se identifica como um republicano com tendências libertárias, trabalha na Câmara dos Representantes da Carolina do Sul, onde testemunhou o debate de 15 horas sobre aretirada da bandeira.

"Posso te dizer, o inferno congelaria antes deles retirarem a bandeira. Foi preciso algo dessa magnitude para que ela fosse derrubada", me disse Harris. Ele reconheceu que a decisão foi uma conveniência política, mas enfatizou que nosso estado natal não é famoso por se curvar ao que é conveniente na política.

"No final das contas", ele disse, "acho que foi o imperativo moral que realmente derrubou a bandeira. A legislatura queria ter a mesma dignidade que as famílias das vítimas mostraram a Dylann Roof."

Considerando o que Harris estava dizendo – fiquei feliz, surpreso e orgulhoso, como todo mundo, ao saber que a bandeira seria retirada – perguntei se o grande retrato na parede perto do general confederado Robert E. Lee era Stonewall Jackson, e ele confirmou. Na área do bar do restaurante, havia outro retrato de Lee, dessa vez na frente da bandeira confederada.

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Membro confederado Catherine Harris, da Carolina do Sul.

No protesto de sábado, a única coisa que parecia unir a todos era a desconfiança com a mídia.

"Vocês vão mostrar isso de forma justa?", perguntou a membro das Filhas dos Confederados Catherine Harris (sem relação com Brett, até onde vi) a um grupo de jornalistas. Harris, que estava com uma bandeira grande da Soberania da Carolina do Sul (a bandeira usada no estado quando ele se separou da União) na frente do Monumento da História Afro-Americana, disse que tinha vindo do outro lado do estado para participar do protesto. Harris usava um véu preto até que a polícia pediu que ela o tirasse. Quando confrontada por manifestantes negros irritados, que perguntavam por que ela tinha escolhido ficar exatamente naquele lugar, Harris leu um discurso emocionado sobre o monumento aos soldados confederados na frente da Assembleia.

"Algumas pessoas estão assustadas por causa da mídia", disse um dos educadores, vestindo roupa camuflada e um colete à prova de balas com o desenho do continente africano. Outra mulher branca, de 20 e poucos anos, carregava um cartaz que dizia "A MÍDIA criou a 'Guerra de Raças'!". Quando perguntei se podia tirar uma foto do cartaz, ela concordou, mas depois ficou preocupada.

"Bom, não estou de nenhum lado aqui", ela disse na defensiva. "Fui a favor de retirarem a bandeira", ela disse, baixando a voz. "Quando você lê isso, você pensa, de certo modo – "

"Que você é racista por ter feito esse cartaz?", eu disse.

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"É."

"Não sei. Acho que você tem uma opinião forte. Não te conheço."

"OK, só queria deixar claro que você não estava pensando isso", ela disse.

Garrafas plásticas foram atiradas pelos dois lados.

Um manifestante apaga o cigarro na bandeira confederada.

"Quanto a relações interpessoais, o Sul progrediu", me disse Chenjerai Kumanyika, professor-assistente da Universidade Clemson, na manhã de sábado, antes ir para a Assembleia para o que ele descreveu como "um dia de ódio que não deve ser perdido".

"As pessoas vão ser muito educadas", acrescentou Kumanyiaka, que compareceu à Assembleia nos dois finais de semana anteriores para o protesto contra a bandeira do NAACP, no dia 4 de julho, e no dia 10 de julho, quando a bandeira foi retirada. "Eles vão te convidar para ir à igreja. Depois vão votar em políticas que visam destruir você e toda a sua categoria de pessoas." Kumanyika continuou, rindo com tristeza: "Muita gente que defende a bandeira confederada, se você acusá-los de racismo, eles vão dizer 'Odeio racismo!' Mas são profundamente comprometidos com a bandeira".

James Yeh é da Carolina do Sul e mora no Brooklyn. Siga-o no Twitter.

Justin Schmitz mora em Athens, Geórgia, e trabalha na Lamar Dodd School of Art Photography Fellow.

Tradução: Marina Schnoor