Todas as fotos são de autoria da Rebecca Smeyne, salvo indicação contrária
Sex and the City. CBGB’s. Andy Warhol. Rent. Todo mundo que sonha em se mudar para Nova York tem uma fantasia cor-de-rosa sobre o que espera encontrar aqui. A minha era Michael Alig, o party boy mais infame do mundo.
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Bem, não exatamente. A minha fantasia era Macaulay Culkin com o rosto pintado, dançando sob globos espelhados em Party Monster. O filme cult imortalizou a ascensão de Alig de suburbano excluído a promoter de festas mais poderoso da cidade — e a sua inevitável queda, em 1996, depois de Alig e seu colega de apartamento, Robert “Freeze” Riggs, matarem o seu amigo e traficante Andre “Angel” Melendez, de 25 anos, sob os efeitos de um coquetel de quetamina, heroína, Rohypnol e crystal meth.
Quando descobri Party Monster, era uma adolescente solitária do outro lado do mundo, em Tóquio, e há pouco havia começado a frequentar os clubes locais. Não sabia exatamente o que estava procurando nesses lugares miseráveis, mas vendo Alig e seus amigos dançarem em um caminhão conduzido por uma drag queen louca de ácido, soube que eles haviam encontrado o que buscavam. “Não importa a sua aparência!”, declara James St. James, amigo de Alig, na frase mais famosa do filme de 2003. “Se você tem uma corcunda, jogue glitter nela e vá dançar!” Party Monster me mostrou como os clubes podiam ser lugares radicais, onde freaks se tornam astros que brilham no escuro. Nas minhas viagens de ônibus solitárias para as aulas de natação, mergulhei na trilha sonora do filme, uma coleção anacrônica de electroclash que incui nomes como Vitalic, Miss Kitten e Ladytron. Começava a entender que a dance music soava como liberdade.
Quando cheguei a Nova York, em 2007, Alig já estava preso há uma década, cumprindo uma sentença de 10 a 20 anos por homicídio culposo. Parecia não haver consenso na opinião dos nova-iorquinos sobre o seu legado, com as gerações mais jovens e mais velhas igualmente divididas. Para alguns, suas festas sem limites representavam o auge da cultura clubber da cidade. Para outros, o uso excessivo de drogas e o terrível assassinato que ele cometeu simbolizavam o último suspiro de uma era — o momento em que as coisas foram longe demais e a cidade começou a reprimir os clubes. Descobri que o que as pessoas pensavam de Alig seguidamente revelava mais a respeito da sua própria relação com a vida noturna — ele havia se tornado um espelho das nossas próprias fantasias e medos.
Perambulando de um clube escuro a outro, às vezes sentia como se estivesse na iminência de tocar o seu fantasma; eu entrava num lugar e o ar ainda estava gelado. Quando fui ao Limelight — um clube em uma igreja profanada do qual Alig era um dos dirigentes, onde ele organizava a sua lendária festa Disco 2000, às quartas-feiras — me deparei com a visão assustadora de uma Nova York elitizada. O clube estava cheio de turistas e electro ruim, e tinha adotado até um novo nome cafona, Avalon.
Por duas vezes — em novembro de 2006 e em julho de 2008 — Alig tornou-se elegível para a liberdade condicional e voltou aos holofotes. Nas duas ocasiões, ele recebeu uma negativa após os seus testes para drogas darem positivo. Quando ele finalmente foi solto em liberdade condicional, em maio de 2014, entrei na disputa entre os jornalistas por aquela cobiçada entrevista pós-prisão. Queria saber o que todos queriam. O que acontece quando você coloca um club kid selvagem em uma gaiola de ferro por quase duas décadas? Agora que estava solto, Alig tentaria fazer um retorno triunfal à sociedade de Nova York, ou se afastaria da vida pública — como Riggs havia feito, quando foi libertado em 2010? E se ele decidisse voltar a trabalhar na vida noturna, será que a minha geração de club kids, que agora domina a cena, estaria disposta a dar a ele uma segunda chance?
No centro dessas questões estava um dilema fundamental: Alig era um sociopata perigoso, ou apenas um ex-junkie problemático, obcecado por atenção, que teve uma péssima noite?
O New York Times conseguiu a primeira entrevista, encontrando-o na saída dos portões da prisão, no dia em que ele foi libertado, onde uma van com capacidade para 15 pessoas, cheia de amigos de Alig — incluindo, segundo o repórter, “três caras com o cabelo pintado e espetado, que haviam passado toda a manhã tomando vodka com Red Bull” — esperava a sua chegada. Também estavam na van: Esther Haynes, ex-chefe de redação da revista Jane, que é a editora das memórias de Alig, Aligula, e duas equipes de filmagem — uma fazendo imagens para Party Monster 2, e a outra um documentário sobre a sua vida, intitulado Glory Daze.
Na viagem de volta à cidade, usando uma conta no Twitter que o seu relações-públicas o ajudou a manter enquanto ele estava preso, Alig postou uma radiante foto vestindo uma camisa social azul e óculos, lambendo um copo da Starbucks e dando uma piscadela. Ele podia facilmente ter passado por um tiozão, não fosse pela legenda: “Quem precisa de cocaína quando você pode ter uma descarga de cafeína com um espresso duplo da Starbucks? #drugfree“.
Quase todo grande veículo de comunicação cobriu a soltura de Alig. Entrevistei até mesmo a mãe dele, Elke Blair. “Vou dizer a ele para te ligar de volta”, ela disse num carregado sotaque alemão. Mas ele nunca ligou.
No primeiro dia em que voltei para casa, tive um momento existencial. Parte de mim queria se esconder em um chalé; a outra parte me dizia para fazer o que sempre quis fazer.
Então, em maio de 2015 — quase exatamente um ano depois de Alig sair da prisão — um vídeo dele apareceu no feed do meu Facebook. Aparentemente, o seu mais novo projeto era uma série de videos caseiros no YouTube chamada The Pee-Ew Show (agora intitulada Peeew!), que ele havia começado a produzir em parceria com o amigo e ex-Club Kid Ernie Garcia, também conhecido como Ernie Glam, em setembro de 2014. Descritos como “uma indecente sátira cômica de talk show” na sua página no YouTube, os vídeos, de frequência diária, mostravam a dupla comentando uma variedade de assuntos em voga — da nova música do Hot Chip a vídeos russos de pegadinhas envolvendo masturbação — incluindo as suas próprias histórias de noitada no meio. Amigos dos seus antigos círculos de vida noturna, como James St. James e DJ Keoki apareciam às vezes como convidados especiais.
Neste episódio em particular, os dois riam de como Glam havia pegado um saquinho vermelho de drogas do chão em um evento da Red Bull Music Academy chamado Storm Rave, apenas para se dar conta de que era um convite em forma de piada para uma festa em um barco organizada pelo Rinsed. Alig tirava sarro de Glam por ter caído no truque. “Esta é a versão do mundo dos clubes para a nota de cem dólares com um barbante que eles jogam na calçada para ver quem vai pegar”, ele ria, atrevido como sempre. Percebi com um arrepio de excitação que o mundo de Alig se aproximava do meu. Eu tinha estado presente no mesmo evento da Red Bull. Os caras do Rinsed eram meus amigos. Na verdade, naquele instante, eu tinha o mesmo saquinho vermelho no bolso.
Duas semanas depois, nossos mundos finalmente colidiram quando chegou um e-mail de Glam na minha caixa de entrada. Ele havia me achado através de uma matéria que eu tinha escrito sobre cards colecionáveis dos Club Kids, datados dos anos 90, cujo preço estava chegando a 112 dólares no eBay. Ao que parece, Glam era um dos vendedores.
Ele agora me escrevia para perguntar se podia me mandar uma cópia do seu novo livro, chamado The Darkest Tunnel [‘O Túnel Mais Escuro’, em tradução livre], uma história sobre assassinato, drogas e prostituição ambientada na vida noturna de Nova York, para que eu fizesse uma crítica. (Sim, o livro era para ser de ficção.) Aproveitei a oportunidade para perguntar se poderia assistir às filmagens do próximo episódio de Peeew!, que ocasionalmente chegava ao seu 200º episódio naquele fim de semana. E assim, sem mais nem menos, ganhei um convite para ir até o apartamento de Glam no Bronx, onde finalmente conheceria Alig em pessoa. Para acalmar a excitação nervosa que percorria o meu corpo, lembrei a mim mesma que as celebridades nunca são tão legais quanto parecem de longe. Também sabia que Alig era um manipulador habilidoso da mídia. Até mesmo Michael Musto, ex-jornalista do Village Voice, que escreve sobre Alig desde os anos 90, observou que ele adorava “se fazer de vítima” quando falava com a imprensa.
Em um sábado quente e ensolarado, 13 de junho, quando apareci na casa de Glam — um apartamento de três quartos modesto, limpíssimo, luminoso e repleto de pop art colorida. Alig entrou na sala de estar radiante, usando uma camiseta branca, jeans folgados e tênis vermelho-vivo. Embora a sua constituição física fosse mais corpulenta e as suas bochechas maiores do que eu tinha visto em fotos dos anos 90, o seu rosto guardava vestígios do garoto bonito que ele havia sido — olhos azuis como poços profundos, lábios carnudos e uma pele quase sem rugas. Era louco pensar que ele tinha 49 anos.
Alig estava morando no quarto de hóspedes de Glam desde que havia saído da prisão, há quase um ano. Além de gravar Peeew!, estava aproveitando este tempo para trabalhar na AligMart, uma loja virtual que vende mercadorias com a sua marca e cópias das suas pinturas — um hobby que ele adquiriu na prisão.
“Eu sabia que ele teria dificuldade em arranjar um lugar para viver sem emprego”, Glam me disse, enquanto sentávamos os três ao redor da mesa da cozinha. “Foi complicado no começo, porque [meu marido] precisa de ordem, e Michael representa desordem.” Mas Glam, nativo de Sacramento, é um amigo fiel de Alig. Quando estava começando sua carreira de promoter, Alig o recrutou no banheiro de um clube chamado Copacabana, em 1988; não demorou até que Glam começasse a ajudá-lo a organizar festas, recebendo 100 dólares para ser go-go dancer no Limelight. Entre 1990 a 1993, eles chegaram a dividir um apartamento em Chelsea. “É igualzinho a como era naquela época, só que sem todas as drogas”, ri Glam, referindo-se à sua nova vida como colegas de apartamento.
Peeew! nasceu do tempo que Alig e Glam passavam filmando coisas em casa. Embora estivessem afastados desde 2009 — a última vez que Glam visitou Alig na prisão — eles ainda adoravam andar por aí como drag queens aposentadas, trocando farpas e piadas grosseiras. “Tínhamos esses papos loucos durante o café da manhã e chegávamos a chorar de rir, porque tudo era muito engraçado”, disse Glam. “Então decidimos fazer um programa disso, para entreter pelo menos um ao outro.”
A dupla tinha passado a tarde inteira gravando cenas para o programa. Depois da nossa entrevista, eles me arrastaram até o quarto de Glam para a próxima cena, uma paródia da notícia mais quente da semana: a fuga dos assassinos David Sweat e Richard Matt da Clinton Correctional Facility, em Dannemora, Nova York. Fingindo ser Sweat e Matt, cobrindo a cabeça com capuzes e fazendo sotaques italianos ruins, Alig e Glam discutiam — o que mais? — como era ver suas fotos na televisão.
Mas esta cena bizarra não foi nada comparada ao que aconteceu mais tarde naquele dia, quando Alig foi entrevistado por Megyn Kelly, da Fox News. Aparentemente, os três anos que Alig passou na Clinton Correctional Facility — e o seu longo histórico como figura pública — qualificavam-no como “celebridade especialista” em cultura prisional. Ele também havia aparecido na CNN no começo daquela semana, vestindo uma camiseta vermelha berrante com os dizeres “Call My Agent” [“ligue para o meu agente”], para discutir o mesmo assunto. Em todos os seus comentários, Alig infalivelmente chamou a atenção para o seu passado como promoter de festas. Quando Kelly perguntou como os prisoneiros conseguiram dissimular o barulho da fuga, ele disse que seguidamente havia música alta na prisão até as 6 horas da manhã. “Lá é mais barulhento do que num clube!”, exclamou.
Antes de se tornar uma fonte especialista da Fox News — e ex-rei do submundo de Nova York — Alig era um garoto desajustado de South Bend, Indiana. A sua mãe, Elke Blair, era uma imigrante alemã que se mudou para os Estados Unidos depois de se casar com o seu pai, John, um programador de computadores que ela conheceu quando ele servia o exército durante a Segunda Guerra Mundial. Quando Alig tinha quatro anos, os seus pais se divorciaram e ele ficou com a mãe. Em uma entrevista de 1997 ao New York Daily News, Blair descreveu seu filho como “um estudante brilhante e sensível que não gostava de esportes” e preferia programas de televisão como I Love Lucy. Quando era adolescente, ela disse, Alig trabalhava em uma loja de roupas masculinas depois da escola, e seguidamente era o primeiro a adotar as últimas tendências, como usar gravatas de couro ou ouvir Devo.
Mas esse vanguardismo cultural tornava Alig diferente do resto dos garotos na Penn High School, uma escola pública — assim como a sua homossexualidade. “Algumas várias vezes, Michael voltou para casa com um olho roxo, o nariz sangrando, a camiseta rasgada”, Blair contou ao Daily News. “‘Entrei em uma pequena briga’, ele dizia. Agora sei que ele sentia vergonha.”
Em 1984, Alig terminou a escola entre os 3% melhores classificados da sua turma e ganhou uma bolsa para a Fordham University, em Nova York. Ele teve dificuldades para se encaixar na conservadora universidade jesuíta, que dificilmente era o escape que ele esperava. Como muitos outros garotos de cidades pequenas tentando sobreviver na cidade grande, ele rapidamente perdeu a cabeça. Já no primeiro semestre, depois de terminar a relação com um namorado, Alig tentou se matar tomando uma overdose de antidepressivos prescritos pelo seu médico de Indiana. Ele sobreviveu — e contou para a mãe que era gay ao telefone quando acordou, alguns dias depois.
Mas a passagem infeliz por Fordham também abriu caminho para a entrada de Alig na vida noturna. Uma noite, um colega de faculdade que estava saindo com o artista Keith Haring levou Alig para uma das festas de Haring no Area — um efêmero e mítico clube com instalações imersivas que mudavam a cada seis semanas, incluindo uma piscina projetada para se parecer com uma tigela de sopa de letrinhas (para o tema “Comida”) e uma rampa cheia de skatistas na pista (para o tema “Radical”).
“Eu recém havia chegado de Indiana, e parecia um mundo mágico; o ar parecia elétrico”, disse Alig ao Huffington Post sobre a sua crucial primeira noite no Area. “Eu podia sentir que tudo no mundo estava vindo deste lugar. E eu precisava fazer parte dele.”
Alig decidiu se dedicar a penetrar este glamuroso mundo novo, e começou a trabalhar como ajudante de garçom no Danceteria, um clube de três andares que era a incubadora criativa mais vibrante daquela época — em momentos diferentes, Madonna trabalhou lá como garçonete, Sade como bartender e LL Cool J como ascensorista. Em 1985, Alig pediu transferência de Fordham para o Fashion Institute of Technology, mas abandonou os estudos depois de um ano. Enquanto isso, continuou tentando subir na hierarquia social da vida noturna, persuadindo o proprietário, Rudolf Piper, a deixá-lo organizar suas próprias festas no clube.
Andy Warhol, na época o rei do glitter de Nova York, era tudo que Alig e seus amigos aspiravam ser. “Todos nós íamos nos tornar Warhol Superstars e nos mudar para a Factory”, Alig contou à Interview em 2010. “O engraçado é que todo mundo teve a mesma ideia: não se fantasiar, mas rir de quem se fantasiava. Mudamos nossos nomes. como eles faziam, e nos fantasiamos com roupas escandalosamente loucas para nos tornar uma sátira deles — mas acabamos nos tornando o que satirizávamos.”
A morte de Warhol, em 1987, abriu espaço para uma nova geração de estrelas da vida noturna, e as festas de Alig se estenderam do Danceteria, do Limelight, do Area e do The Palladium para o Red Zone, o The Palace e o World. Para atrair público para esses lugares, ele organizava “festas proibidas”, de guerrilha, em que seus amigos fantasiados tomavam de assalto lugares cotidianos, como um Burger King, um McDonald’s, um Dunkin’ Donuts ou até mesmo caixas eletrônicos e plataformas de metrô, munidos de um boombox tocando música a milhão, e dançavam até a polícia aparecer. Convenientemente, Alig sempre garantia que houvesse um clube próximo para dar continuidade à festa, provido com outra das suas táticas de marketing — um open bar. Em março de 1988, ele já estava na capa daNew York Magazine, com a jornalista Amy Virshup dando a ele e à sua gangue o apelido “Club Kids”, um nome que ela pegou emprestado de Piper.
Mas o talento empreendedor de Alig tinha um lado mais sombrio. A Disco 2000, sua festa icônica no Limelight, realizada de 1990 a 1996, era conhecida por suas performances extremas e subversivas — como a vez em que uma mulher fez sexo com o toco da perna de um dançarino amputado, e o homem que bebia copos do seu próprio mijo. “Havia sempre essa ousadia anárquica nos planos de Michael que os tornava muito tentadores”, escreveu um ex-club kid, Fenton Bailey, no blog da sua produtora, World of Wonder, que esteve por trás de Party Monster e RuPaul’s Drag Race. “O próprio Michael pegou o hábito de mijar dentro de garrafas de cerveja e passá-las adiante como drinks grátis, e de mijar do balcão da Disco 2000, em cima das pessoas na plateia.”
À medida em que as festas de Alig se tornavam cada vez mais extremas, o mesmo acontecia com o seu uso de drogas. No começo, Alig estava “quase limpo”, disse Peter Gatien, dono do Limelight, do Tunnel e do Palladium, ao site de notícias de celebridades unInterview. Em 1992 — cinco anos depois da capa da New York Magazine — Alig me disse que passava vários dias tomando um coquetel de heroína, quetamina, Rohypnol e cocaína. “O garoto que sempre ria dos junkies havia se tornado um”, escreveu Bailey no mesmo post. “A alegria da festa, que se jogava das escadas só para fazer drama, agora estava tão fodido que cair das escadas era tudo que ele conseguia fazer.”
Alig contou à Interview que começou a recorrer às drogas para dar conta do império que havia construído. “A pressão havia se tornado intensa, e precisávamos usar alguma coisa porque precisávamos estar de pé o tempo todo.” Ele também justificou os excessos como parte da sua crítica performática da cultura de celebridades. “Por incrível que pareça, eu realmente via isso como levar um projeto artístico ao extremo. Eu era o tipo de pessoa que diz: ‘Vamos ver até onde podemos levar isto. Vamos ver o que acontece’.”
Mas Alig estava tentando levar a vida noturna de Nova York ao limite no exato momento em que as autoridades declaravam guerra à ela. Em outubro de 1995, depois de uma investigação secreta de oito semanas, o Limelight foi o primeiro clube a ser fechado por uma ordem judicial, sob alegações dos procuradores municipais de que as drogas eram “excessivas” e vendidas “de maneira aberta e notória”. (O clube teve permissão para reabrir as portas algumas semanas depois.)
A campanha contra a vida noturna do prefeito Rudolph Giuliani não era só um problema legal — era cultural, também. Quando Peter Gatien foi preso em 1996, por supostamente controlar uma rede de narcóticos nos seus clubes, Limelight e Tunnel — que o procurador federal chamou de “supermercados virtuais de ecstasy” — o New York Daily News observou que “as batidas tinham como objetivo dar um fim às festas movidas a ecstasy da geração X”.
O conflito entre essas forças oponentes teve o seu ápice no dia 17 de março de 1996, quando um club kid chamado Angel Melendez apareceu no apartamento de Alig na West 43rd Street, onde ele às vezes dormia nos finais de semana com Alig e seu colega de apartamento, Robert “Freeze” Riggs. Melendez recebia US$200 por noite para trabalhar nas festas de Alig como anfitrião e vendia drogas paralelamente. O que aconteceu depois disso foi uma “briguinha boba”, por causa de dinheiro que era devido a Melendez, como Alig recentemente descreveu o ocorrido ao New York Post.
Alig me disse que Riggs e ele estavam sob o efeito de uma combinação de quetamina, heroína, Rohypnol e crystal meth quando Melendez começou a mordê-lo. Freeze então acertou Melendez com o cabo de um martelo, e Alig enrolou a mão em um moletom e esmurrou a cara de Melendez. “Talvez tenha sido a combinação de eu ter feito isso por muito tempo ou ter mais força do que imaginava, mas Angel parou de se contorcer”, Alig explicou ao Post. “Nós o deitamos no sofá, achando que ele estava inconsciente. Só algumas horas mais tarde percebemos que ele estava morto”.
Deixando o corpo de Melendez no apartamento, Alig e Riggs fugiram sem reportar a morte. Em vez disso, continuaram na balada; mais tarde, em setembro de 1997, Riggs diria à polícia que eles voltaram ao apartamente entre cinco e sete dias mais tarde “para fazer algo a respeito dessa terrível bagunça”. O corpo estava começando a se decompor, então Freeze deixou o apartamento para buscar uma caixa, facas afiadas — e heroína. Alig injetou dez sacos da droga e esquartejou o corpo de Melendez na banheira. Então, noticiou o Times, os dois colocaram os restos mortais em uma caixa, pegaram um táxi até a West Side Highway e os jogaram no Rio Hudson.
Eu tinha todos os sintomas de um sociopata, mas os sintomas associados a um sociopata são quase idênticos aos de um viciado em drogas.
Depois do crime, Alig continuou organizando festas, contando casualmente aos seus amigos que Freeze e ele tinham matado Melendez. Segundo o Guardian, ele até mesmo apareceu no Limelight com a palavra “guilty” [culpado] escrita no rosto. Muita gente pensou que ele estava brincando, ou tentando aplicar outro truque para chamar a atenção. Mas Alig afirma que Gatien surtou quando ele lhe contou o que havia acontecido várias semanas depois do assassinato, respondendo: “Você tirou o trabalho de mil pessoas. Os clubes serão fechados”. Em abril, a esposa de Gatien pagou a Alig uma indenização por seu desligamento. “Eles acharam que eu estava envolvido neste crime e não queriam ser associados comigo”, disse Alig.
Quando Michael Musto escreveu sobre o desentendimento entre Alig e Gatien na sua coluna no Village Voice, ele aludiu ao fato de que o desaparecimento de Melendez estava começando a chamar a atenção da vida noturna. O irmão de Melendez, Johnny, procurava-o desesperadamente pelos clubes de toda a cidade, oferecendo uma recompensa por qualquer pista. Em junho, o mistério chegou à capa da Voice com a manchete “A Murder in Club Land?” [“Um Assassinato na Baladalândia?”]
Nem o público, nem Alig sabiam ainda, mas o torso de Melendez havia aparecido nas águas de Staten Island em abril. Ele só foi identificado pelo médico-legista em novembro. Alig me disse que foi preso em 4 de dezembro de 1996, em um motel em Nova Jersey, onde frequentemente passava os fins de semana com o seu namorado traficante de heroína se chapando e assistindo ao programa America’s Funniest Home Videos. Riggs e ele se declararam culpados por homicídio culposo em outubro de 1997, e Alig cumpriu uma pena de 17 anos. Riggs foi solto quatro anos antes, em 2010, por bom comportamento.
A próxima vez que vi Alig foi numa noite úmida de fim de verão, em agosto. Nos dois meses em que não nos vimos, um novo documentário chamado Glory Daze: The Life and Times of Michael Alig [ainda sem título em português], do diretor Ramon Fernandez, havia sido lançado. No dia 25 de junho, Alig também tinha inaugurado duas exposições solo de arte, nas galerias Castle Fitzjohns e LESpace, do Lower East Side. As duas mostras exibiam pinturas que ele havia feito na prisão, e parte das vendas da mostra na LESpace foi revertida para a Art Therapy Outreach Center (ATOC), uma ONG que oferece arteterapia para vítimas de trauma.
Entrando em um bar em Williamsburg, encontrei Alig comendo nachos e tomando um refrigerante ao lado de um amigo musculoso e bem-arrumado. “Este é Patrick”, Alig disse com uma piscadela. “Ele não quer que ninguém saiba que é meu namorado.”
“Não sou chegado”, Patrick rapidamente esclareceu, sorrindo com um suspiro brincalhão.
Aos pés de Alig havia uma pilha bagunçada de pinturas enroladas, um laptop e outras quinquilharias. Quando perguntei por que estavam ali, ele deu a notícia: estava se mudando para o apartamento espaçoso de Patrick à beira-mar em Coney Island. Peeew! também estava de mudança. Alig e Glam iam começar a filmar o programa ao vivo, em frente a uma plateia, no dia 22 de agosto, no Lovegun, um clube gay em Williamsburg. Com todos esses avanços, parecia que a vida de Alig estava ficando cada vez melhor.
Depois da reunião, Patrick foi para casa, e Alig e eu caminhamos pela Bedford Avenue, procurando um sorvete para tomar em vez de jantar. Pouco depois das 21h, ele percebeu num susto que estava atrasado para se reportar ao seu agente de condicional, como faz toda noite — mas decidiu adiar a ligação.
Não consigo parar de fazer arte ou imaginar esses projetos loucos.
Depois de tomar nossos sorvetes, nos separamos. Encostada nos portões do metrô, enquanto uma multidão fervilhava à nossa volta, perguntei se ele havia encontrado alguma revolta em reação aos seus planos de retornar à vida noturna, ou se ele reconsideraria essa decisão se soubesse que ela incomodaria a família de Melendez. Alig disse que não havia falado com os parentes de Melendez por causa do seu acordo judicial, mas que se soubesse que eles estavam incomodados com o fato de que ele estava organizando eventos, “isso impactaria as minhas decisões”.
Ainda assim, ele não sabia que outra coisa poderia fazer da vida. “Não consigo parar de fazer arte ou imaginar esses projetos loucos”, explicou.
“Todo mundo neste país pode fazer o que quiser”, disse Alig, erguendo determinadamente o queixo. “Descobri isso por necessidade, quando me mudei para Nova York sem conhecer ninguém — eu tinha que fazer as coisas darem certo. O mesmo vale para este programa. Tem essa parte persistente de mim que continua fazendo as coisas até elas darem certo.” Ele me deu um olhar cru, despido de toda a afetação, e então desapareceu dentro do metrô. Era quase meia-noite, e me dei conta de que ele ainda não tinha ligado para o seu agente de condicional.
Alguns dias depois, a revolta finalmente explodiu, e não foi bonito. Os rumores começaram com um post no Facebook escrito por uma promoter e jornalista de 26 anos chamada Dreem (anteriormente conhecida como Mark Dommu). Dreem organizava uma festa mensal chamada Boop! no Lovegun, em parceria com um promoter chamado Paul Leopold, sob o nome The Culture Whore. Quando eles descobriram que as gravações de Peeew! aconteceriam aos sábados, na mesma noite da Boop!, decidiram levar a festa para outro lugar.
No seu post de 14 de agosto, Dreem explicou seus motivos: “Michael Alig simplesmente ASSASSINOU alguém, e não devemos apoiá-lo, especialmente em um contexto que envolva o entretenimento e a vida noturna”. Ela continuou: “Se você quer construir alguma espécie de espaço comunitário, não deixe palhaços assassinos em condicional usarem o seu bar”. Mas os comentários no post de Dreem se dividiam, com alguns argumentando que Alig havia pagado sua dívida legal com a sociedade e que deveria ser permitido a ele seguir em frente. Mas uma dos opositoras mais manifestas de Alig era Charlene, uma drag queen transgênera de 26 anos, membro do coletivo queer House of Bushwig. Por e-mail, ela reiteirou os sentimentos de Dreem a respeito de Alig. “Falo pela esmagadora maioria quando digo que Michael Alig não é bem-vindo na vida noturna queer do Brooklyn em qualquer circunstância. O que quer que tenha sido que Michael Alig fez pela vida noturna morreu com o homem que ele assassinou.”
Naquele fim de semana, o gerente do Lovegun, Pez Epstein, enviou uma mensagem de texto a Alig dizendo que os donos dos clube haviam decidido cancelar o evento. Alig mandou um e-mail com a notícia para o repórter Richard Johnson, do Page Six, e no dia 17 de agosto, Johnson transformou o escândalo em ebulição no tópico número 1 da vida noturna com uma manchete chamativa: “Club Kid Killer’s latest project is being boycotted” [algo como “O novo projeto do Club Kid Assassino está sendo boicotado”]
Dreem achou que o Page Six tinha entendido tudo errado. “A história toda tinha sido distorcida”, ela disse ao telefone, referindo-se à decisão de Johnson de apresentá-la basicamente como editora de vida noturna da revista Next. “Eles fizeram soar como se eu tivesse usado o meu cargo na Next para fazê-los cancelar a festa.” Dreem disse que Alig havia enviado um e-mail para o seu chefe na Next acusando-a de má conduta jornalística, mas afirmou que esta tinha sido “uma decisão de negócios, artística e moral” que não tinha nada a ver com o seu trabalho. “Sentimos veementemente que não podíamos fazer um evento no mesmo lugar em que um assassino [estava fazendo o seu].” Ela acrescentou que nunca pediu um boicote, e acusou Alig de “sempre tentar criar uma narrativa em que ele é a vítima”. “Isso é realmente delirante”, concluiu.
(Desde agosto de 2015, Dreem não trabalha mais na Next.)
Apesar das alegações de Alig de que está mudado, a vida noturna de Nova York talvez não esteja disposta a aceitá-lo de volta. O futuro da sua comunidade, disse Dreem, é em última instância o que está em risco para a geração atual de club kids — da qual grande parte prefere os ideais queer de construção de comunidade e auto-empoderamento ao cinismo e à libertinagem.
“Alig abriu o caminho para o que está acontecendo hoje, mas também acho que nos atrasou”, disse Dreem. “A vida noturna levou muito tempo para se recuperar do que ele fez com ela. Quando ouço aquela palavra, ‘club kid’, meio que sinto vergonha, porque parece que tudo é excesso sem substância alguma. [A possibilidade] dessa energia voltar à vida noturna me assusta.”
Me ligando de um barco a caminho de Fire Island, um reduto gay, o parceiro de Dreem, Leopold, questionou os motivos de Alig. “Se ele quisesse mesmo fazer alguma diferença, por que não trabalhar com pessoas que estão lutando para se livrar do abuso de substâncias? Não parece que ele está seguindo em frente de jeito nenhum — parece que ele está tentando capitalizar em cima da fama que ganhou por assassinar alguém.”
Por outro lado, o gerente do Lovegun, Epstein, disse que Dreem estava exagerando. “Todo mundo merece uma segunda chance”, ele disse. “Além disso, o Lovegun é um bar — não uma igreja”. Alig, por sua vez, parecia inabalado pela revolta que gerou e determinado a garantir que o show continuasse. “O fracasso não é uma opção”, ele me disse com convicção. “Depois de tudo isso, temos mesmo que fazer isso dar certo.”
Em 28 de agosto, recebi uma mensagem de texto de Alig me perguntando se eu havia visto o novo flyer da Boop!, que havia se mudado para um bar próximo ao meu apartamento. Eu disse que tinha notado que o flyer tinha o rosto de Macaulin Culkin, protagonista de Party Monster, estampado. “É esquisito, certo?”, Alig disse alegremente, referindo-se à Dreem. “Parece que ele está obcecado ou algo do tipo!”
Algumas semanas mais tarde, o Lovegun voltou atrás na sua decisão e resolveu sediar a festa de Alig. Pouco depois do pôr do sol, no dia 10 de outubro, fui até o clube de Williamsburg para a segunda gravação ao vivo de Peeew!. Duas drag queens enormes riscaram meu nome da lista. Lá dentro, a cena era notavelmente mais adulta do que aquela dos dias de glória de Alig no Limelight, mas ainda assim, a festa provavelmente era a coisa mais louca acontecendo na vizinhança antes da hora do jantar. Não devia ter mais do que algumas dezenas de pessoas em volta do bar, na sua maioria grupos de homens gays na casa dos 30 anos, vestindo casacos escuros de inverno, com alguns poucos personagens mais coloridos espalhados pela plateia — possivelmente contratados pelo próprio Alig. À certa altura, um dançarino esbelto tirou o seu fio-dental de couro e fez um movimento de vaivém com os quadris ao som de “Satisfaction”, do Benny Benassi, enquanto erguia um crucifixo contra a sua virilha, o pau perfeitamente escondido entre as pernas.
Alig e Glam estavam sentados em um pequeno palco cercado por câmeras, usando blazers bem-cortados e mantendo o público entretido com uma versão obscena de “colocar o rabo no burro”, chamando membros da plateia para “colocar o pau de Justin Bieber no corpo de RuPaul”.
No bar, conheci um casal vestido de maneira conservadora, na casa dos 40 anos. Nick e Marisa, que costumavam frequentar as festas de Alig, agora vivem com o filho em Westchester. Eles ficaram sabendo do evento desta noite através do Instagram do DJ de Alig. Quando perguntei a eles sobre como se sentiam a respeito do passado de Alig, Nick olhou de relance para a esposa e respondeu: “Muitos de nós fizeram coisas erradas quando eram jovens. Você ainda devia ser punido por isso?”. De modo similar, quando perguntei à mestre de cerimônias daquela noite, uma loira enorme, por que ela quis trabalhar com Alig, ela deu uma jogada de cabelo e disse: “Não sou de julgar as pessoas. E adoro pessoas que transformam suas vidas em uma obra de arte”.
Alig estava gostando da atenção, é claro, mas eu suspeitava que havia outro motivo para ele estar dedicando tanto esforço às suas festas e à pintura — porque ele acreditava que a arte poderia ser a sua passagem para a redenção. Vendo-o circular entre seus admiradores, seu rosto se iluminando cada vez que um fã ou amigo gritava seu nome — Michael! Michael! Vamos tirar uma foto! — eu me lembrava de uma frase dele que tinha lido em uma matéria que um dos seus amigos de prisão havia escrito à seu respeito para o Deadspin.
“A arte redime a moral, não é?”, Alig disse ao amigo na matéria. “A nossa cultura perdoa Woody Allen e Roman Polanski das acusações feitas contra eles. Ezra Pound foi basicamente perdoado de traição por causa da sua poesia brilhante. Você diz que conseguiu superar o que aconteceu entre nós porque me acha talentoso. Espero que o mundo consiga fazer o mesmo.”
Em uma tarde de sexta-feira de novembro, peguei o trem F até a última estação, Coney Island, e caminhei até um bairro residencial fechado onde Alig vivia com Patrick desde agosto. O apartamento chique que eu tinha visto em fotos na verdade era um duplex de dois andares, tão próximo da praia que você conseguia ouvir o rugido do mar da porta de entrada.
Alig abriu a porta no meio de uma ligação em viva-voz com um amigo não-identificado sobre quem deveria estar na lista de convidados e com quais promoters ele iria trabalhar nas gravações de Peeew! daquele fim de semana — “Ele não chama público! Não fez nada pelo meu site!”. Mesmo depois de perguntar se eu queria limonada e voltar da cozinha com um copo, ele continuou andando pela casa, falando alto ao telefone. Aproveitei a oportunidade para dar uma inspecionada na sala de estar, que dava para um pátio coberto com churrasqueira e, mais além, para as águas reluzentes nas quais o corpo de Melendez um dia havia desaparecido.
Você não pode pedir desculpas por uma coisa dessas. Soaria quase como um insulto. Não é algo que eu possa dizer em palavras.
Quando Alig finalmente desligou, sentou-se em uma cadeira de frente para mim na mesa da cozinha e explicou que havia convencido Patrick a deixá-lo ficar no apartamento de graça, e a investir na linha de roupas que ele estava para lançar. “Sempre achei pessoas que cuidassem de mim, desde que mudei para Nova York, e tem que ser uma coisa meio figura paterna — Rudolf [Piper, dono do Danceteria] foi o primeiro, depois Frank Roccio no World, depois Maurice Brahms no Red Zone e no [Ice] Palace, depois Peter Gatien, e agora Patrick. Sua voz virou um sussurro enquanto ele admitia um lapso freudiano: “Chamo Patrick de ‘Peter’ às vezes”.
Como se antecipando a minha confusão sobre o que Patrick ganhava com isso, Alig continuou: “Não é uma relação manipuladora. Ele gosta de viver indiretamente através de mim, e eu mantenho esta casa muito limpa — fico de joelhos toda manhã para limpar este chão”. Ele parou e acrescentou uma nova interpretação: “Para ele não custa nada que eu more aqui. Ele vai ganhar uma linha de roupas por [me dar] comida, basicamente. É um bom negócio!”
Nossa conversa se voltou para a vida noturna, como habitualmente acontecia. Três dias antes havia acontecido a 17ª edição de uma tradição da vida noturna gay chamada Glammy Awards, e perguntei a Alig se ele tinha ouvido falar a respeito. No segundo em que as palavras saíram da minha boca, ele me dirigiu um olhar assustador, se levantou furioso e se arrastou até o segundo andar. Pelo teto, podia ouvi-lo jogando coisas e rosnando para si mesmo: Ela me pergunta se ouvi falar dos Glammys? Inacreditável!
Depois de ficar sentada por alguns minutos, vendo as sombras se tornarem cada vez maiores à medida em que o sol se punha atrás da ponte Verrazano, subitamente me dei conta do quanto estávamos sozinhos. Um medo silencioso percorreu minha espinha. Até este momento, eu tinha ignorado os alertas para ficar atenta à minha segurança perto de Alig, confiando em um instinto de que ele não era mais perigoso — não de uma maneira violenta, pelo menos. E se eu tivesse errado no meu julgamento?
Quando Alig voltou com uma expressão zangada, ele arrogamente jogou um papel dobrado na minha direção. “Eu criei os Glammys”, ele fungou, e percebi que tinha nas mãos o programa para uma cerimônia de premiação realizada no Limelight em 2 de setembro de 1992. Em uma letra cursiva dourada, estava escrito: “Michael Alig e Kelly Cole apresentam — os Glammies — O Oscar dos Clubes”.
Abrindo o papel, passei os olhos pela lista de categorias — “Melhor Festa”, “Melhor DJ”, ” Prêmio Puta de Platina (Maior Vadia)” — reconhecendo indicados que posteriormente pertenceriam à elite da vida noturna, como o DJ Junior Vasquez, a scene queen Susanne Bartsch e o fotógrafo Patrick McMullan. Mais tarde, pesquisando o Glammy Awards, descobri vários artigos creditando a sua versão mais atual à fundadora Cherry Jubilee, e nem as respostas dela em entrevistas, nem o site do prêmio mencionava a versão de Alig. Talvez, em uma esnobada épica, eles sequer o tivessem convidado este ano.
De certo modo, a frustração de Alig é justificada. O apagar do seu legado — intencional ou não — parecia típico da natureza volátil da indústria de clubes, onde velhos conceitos são frequentemente reciclados, fazendo com que seja difícil distinguir entre apropriação, homenagem e pura coincidência.
O próprio Alig não esteve imune de pegar emprestado ideias de gerações anteriores; para uma Disco 2000, ele mandou convites em pedacinhos de papel imersos em ampolas cheia de um líquido com cor de mijo, um truque que faz lembrar os convites para a festa de inauguração do Area: pedaços de papel enfiados em pílulas que você tinha que dissolver na água. Por sua vez, muitas das melhores festas de hoje copiam truques famosos de Alig. Quando o designer de moda Telfar fez sua afterparty da New York Fashion Week em um White Castle, em setembro, ou quando o selo nova-iorquino UNO ocupou uma rotisseria especializada em frango frito durante as suas comemorações de fim de ano, foi impossível não pensar nos club kids dançando em um McDonald’s do Times Square em uma das festas proibidas de Alig.
Meu tempo com Alig estava se esgotando, então sugeri que caminhássemos na beira da praia, esperando que uma mudança de cenário tornasse mais fácil o que eu sabia que tinha que fazer a seguir: romper com a camaradagem que vínhamos construindo nos últimos sete meses e começar a fazer perguntas desconfortáveis sobre o assassinato e o tempo que ele passou na prisão. Colocamos nossos casacos e pisamos na areia, o ar salgado do mar chicoteando nossas cabeças encurvadas. Mas meus planos de interrogá-lo foram frustrados quando Alig pegou o celular e começou a transmitir nossa conversa via Periscope, mantendo a câmera apontada para o seu rosto enquanto contava aos seus espectadores que estava dando uma volta na praia com uma jornalista da VICE. Depois de alguns minutos, ele parou a transmissão, parecendo desanimado. “Olhe, a taxa de retenção está ruim.” Ele me mostrou o celular. “Isso quer dizer que as pessoas pararam de prestar atenção.”
De volta à casa de Patrick, Alig me levou até o seu quarto, que, descobri, era um sótão pequeno que você precisava subir uma escada para acessar, com vista para a sala de estar, sem a privacidade de uma parede divisória. Um lado do quarto havia sido transformado em um pequeno estúdio, com as suas pinturas pop art encostadas na parede. No outro lado, um sofá preto servia de cama improvisada. Sentamos, e sabendo que era a hora de termos a nossa conversa, Alig esticou um cobertor sobre nós, pegando um ursinho de pelúcia de trás de um travesseiro. Então enfiou a mão numa sacola cheia de caixas de Cry Baby Tears e abriu uma delas. Levando os doces à boca, com o ursinho docemente aconchegado em seus braços, ele parecia ter cinco anos de idade — em vez de quase 50.
“Quero te perguntar sobre o assassinato”, eu disse devagar. Ele mal hesitou, me olhando sem sequer piscar. “Me incomoda quando as pessoas chamam de assassinato, porque não foi isso — foi homicídio culposo”, ele insistiu. “Não foi premeditado. Não acordamos e dissemos ‘vamos matar Angel hoje à noite’. Para mim, tem uma diferença enorme.”
“E qual é?”
“A diferença é entre algo que pode ser perdoável, e algo que não pode.” Estávamos em silêncio, e o som de Patrick assistindo a televisão na sala de estar flutuou até o andar de cima.
“Você não quer que as pessoas pensem que você é uma má pessoa”, eu disse.
“Não sou, Michelle, não sou mesmo”, ele disse, sua voz se elevando para um apelo. Fiquei surpresa em ver lágrimas se acumulando nos cantos dos seus olhos. A maior missão de um club kid, ele me lembrou, era ajudar os excluídos a se tornarem o que realmente são. “É isso que eu gosto de fazer”, ele disse. “Uma pessoa ruim não gosta de fazer isso.”
Alig parecia determinado a me convencer de que era uma pessoa ética. “Eu me importava com as pessoas que trabalhavam para mim”, ele disse. “Se um clube não pagasse alguém, eu mesmo pagava.” Ele continuou: “É engraçado, porque foi isso que gerou a discussão. Angel veio buscar seu dinheiro. Ele tinha acumulado algo como US$1.200”, ele disse, referindo-se aos pagamentos devidos a Melendez por trabalhar como anfitrião nas suas festas.
Segundo Alig, na época do assassinato de Melendez, a gerência do Limelight tinha sido avisada por alguém de dentro que a polícia planejava dar uma batida no clube e prender uma lista de pessoas que eles acreditavam que vendiam drogas por lá, com o objetivo de conseguir informações sobre o proprietário, Peter Gatien, que estava sendo investigado por sonegação fiscal (Gatien foi condenado em 1999 e deportado para o Canadá, seu país de origem, onde vive hoje com a família).
Alig disse que a lista incluía Melendez, que apareceu primeiro no clube, às 2h da manhã, exigindo seu pagamento. Seguindo instruções de Alig, os seguranças o expulsaram — mas Melendez foi até o apartamento dele mesmo assim, cerca de seis horas depois. “Ele se sentia ignorado e queria que fizéssemos de tudo para que ele se sentisse fabuloso de novo”, afirmou Alig.
Então, Alig se virou para mim e perguntou de um jeito conspiratório: “Você já usou quetamina?”. Disse a ele que sim. “Graças a Deus, porque é muito difícil explicar como é para os entrevistadores que nunca usaram”. Toda a quetamina que ele tinha usado — combinada com outras drogas — fez com que ele sentisse como se estivesse vivendo dentro de um filme ao qual assistia na época: As Lágrimas Amargas de Petra Von Kant, o filme de Fassbinder de 1972. Descrevendo o incidente usando a linguagem de um sonho, Alig lembrou: “Eu só me lembro desse borrão enorme, todos nós nos chocando contra um vidro, com sangue se espalhando por tudo — é assim que eu imaginei. Freeze bateu nele com o cabo de um martelo, mas não bateu forte o suficiente para rasgar a pele”.
Alig disse que eles deixaram Melendez no sofá pensando que ele iria acordar. De manhã, perceberam que ele não estava respirando. “A partir daquele momento, parecia que estávamos num filme”, ele disse, repetindo a mesma metáfora de antes. “Parecia tão irreal.”
“Talvez o assassinato tenha sido um acidente”, eu disse, me referindo à sugestão dele de que a coisa toda tinha acontecido em uma confusão provocada pelas drogas. “Acho que o que enoja muita gente é o que você fez depois — deixando Melendez apodrecer no seu apartamento enquanto ia para a balada durante uma semana inteira, voltando para se chapar e esquartejar o corpo dele e se gabando disso para os seus amigos.”
“Em algumas versões da história que li na internet”, acrescentei, “você até mesmo injetou desentupidor de canos nas veias de Melendez. Coisas assim fazem você parecer um monstro”.
“Não injetamos desentupidor nele!”, protestou Alig. “Jogamos gelo, desentupidor, bicarbonato de sódio e provavelmente outras coisas no corpo. Achamos que ia mascarar o cheiro. Não sabíamos o que fazer — estávamos pensando dois minutos à frente.” Então, Alig me disse, Riggs e ele roubaram as drogas que Melendez tinha na mochila, e uma quarta pessoa presente na cena do crime que é raramente mencionada, Daniel Auster — filho do famoso escritor Paul Auster — roubou o dinheiro dele, US$3 mil no total. (Em 21 de janeiro de 1998, Auster se declarou culpado de posse de propriedade roubada em troca de cinco anos em liberdade condicional.)
Passar pelas abstinências na solitária foi louco. Foi a primeira vez na minha vida em que experimentei uma desesperança completa — e isso me deu mais motivos para usar drogas.
Fugir do apartamento para continuar usando drogas foi um comportamento clássico de junkie, Alig explicou: eles só queriam continuar se chapando para não encarar a realidade. E quando ele contou aos amigos sobre o assassinato, não estava se gabando. “Estava desabafando”, ele disse. “Todo as pessoas para quem eu contava se tornavam parte da conspiração, então isso tirava um pouco da culpa.”
No que parecia ainda outra tentativa de oferecer uma justificativa ética para o seu comportamento, Alig disse que Riggs e ele finalmente decidiram se livrar do corpo não só para salvar a própria pele, mas para preservar o emprego de todos que trabalhavam para o império Club Kid.
“Quando me mudei para o apartamento, Peter [Gatien] disse: ‘Nada de traficantes, suicídios ou overdoses’. Ele disse que, se acontecesse algum problema, entre 800 e 1000 pessoas ficariam sem trabalho. Eu tinha acabado de destruir a vida de uma família e ia destruir a vida de mais 800. Meu pensamento foi: ‘Vamos dar um basta nisso. Não vamos piorar mais as coisas’”.
“Eu queria morrer naquela noite”, Alig continuou, falando sobre a noite em que esquartejou o corpo. “Só injetamos um saco atrás do outro [de heroína] até chegarmos num ponto em que simplesmente não ligávamos. E eu só disse: ‘Ou um de nós vai morrer, ou vamos fazer isto’”.
“Não consigo me imaginar estando chapada o suficiente para esquartejar um corpo”, eu disse.
“Se você tivesse me entrevistado na véspera disso acontecer, eu teria dito a mesma coisa”, ele respondeu. “Quando você está nessa situação e tanta coisa depende disso, é como estar no terceiro andar de uma casa em chamas — você pula ou não? Precisa pular, ou vai morrer. Era questão de sobrevivência, minha e das pessoas no clube”.
“Não fui o primeiro promoter a ser encontrado com um cadáver no seu apartamento”, ele continuou. “Só foi grande coisa quando aconteceu comigo porque eu era o diretor de um clube e o DEA estava nos investigando. Era impossível que não fosse uma grande notícia.”
O problema, disse Alig, é que as pessoas não sabiam diferenciá-lo do personagem satírico que ele havia criado: “Quando você combina o personagem com o crime, é uma combinação horrenda”. O seu vício em drogas, ele acrescentou, agravou este problema de imagem ainda mais. “Eu tinha todos os sintomas de um sociopata, mas os sintomas associados a um sociopata são quase idênticos aos de um viciado em drogas”, disse Alig com naturalidade.
Por que alguém deveria acreditar que as drogas eram culpadas, perguntei, e não uma desculpa conveniente? “Odeio usar drogas como desculpa”, ele respondeu, muito embora isso parecesse ser exatamente o que ele estava fazendo. “Mas é impossível negar — eu usava drogas para não sentir. Eu queria amor. A heroína o substituiu.”
Quando chegou na prisão, Alig disse que se mantinha anestesiado, continuando a usar drogas como heroína e oxicodona, conseguidas através de outros presos que participavam da gangue Bloods — que ele alega que lhe faziam o favor porque vendiam ecstasy nos clubes onde ele fazia suas festas.
“Não conseguia me olhar no espelho e não estava fazendo a barba”, disse Alig, seu olhar vagueando para fora da janela, na direção do céu escuro. “Eu sabia que o que eu realmente precisava era experimentar a dor do que tinha feito, para poder pagar por isso de certa forma — embora não houvesse nada que eu pudesse fazer para pagar pelo que fiz. Você não pode pedir desculpas por uma coisa dessas. Soaria quase como um insulto. Não é algo que eu possa dizer em palavras.”
Alig acabou passando longos períodos na solitária porque seus testes para drogas davam sempre positivo. “Passar pelas abstinências na solitária foi louco”, ele disse. “Me fez surtar algumas vezes.” Para tentar sair, ele se feria na frente dos policiais. “Meus braços estavam todos cortados”, ele lembra. “Engoli limpador de banheiro, bati minha cabeça na parede, engoli uma pilha e tomei 120 comprimidos de Tylenol. Foi a primeira vez na minha vida em que experimentei uma desesperança completa — e isso me deu mais motivos para usar drogas.”
Hoje, ele diz que acredita convictamente que a punição deveria ser abolida para presos não-violentos. De fato, ele me contou que, duas semanas antes, havia ido até o Departamento Correcional para dar um discurso sobre o assunto e foi aplaudido de pé.
Em 2009, aos 43 anos, Alig teve uma crise de meia-idade. “Achei que nunca ia arranjar um namorado ou um emprego [quando saí]”, ele disse. “Tinha medo de toda essa gente jovem e criativa com quem não posso competir. Achei que minha vida tinha acabado, basicamente.” O terapeuta lhe disse que ele tinha que ficar sóbrio, e Alig basicamente decidiu tentar como um desafio, sem acreditar que algo mudaria de verdade. “Quando parei de usar drogas, percebi que estava delirando”, ele disse. Ele se voltou para a arte, que lhe deu esperança novamente. “Coloquei algumas pinturas na parede da minha cela, e todo mundo parava na frente dela e olhava as cores, e essa foi a primeira coisa em que mergulhei que me excitou, além das drogas.”
Passado um ano fora da prisão, Alig parecia se ver como uma figura inspiradora. “Recebo e-mails e cartas de pessoas que estavam à beira do suicídio”, ele disse. “Elas achavam que podiam superar isso porque eu consegui.” Ajudar os outros, Alig explicou, foi o motivo por que ele decidiu permanecer uma figura pública. “No primeiro dia em que voltei para casa, tive um momento existencial. Parte de mim queria se esconder em um chalé; a outra parte me dizia para fazer o que sempre quis fazer.”
“Não vou mentir e dizer que não gosto de atenção”, ele admitiu. “Não vou me desculpar por isso. Mas descobri uma mensagem poderosa. Tem gente que está por aí, com seus 40 ou 50 anos, pensando: ‘Por que se dar ao trabalho?’ Se dê ao trabalho porque vale a pena.”
Embora ele tivesse encerrado a nossa conversa de um jeito otimista, passei toda a viagem de metrô até em casa numa confusão triste, perdida em uma névoa de ambiguidade. Achei que as questões difíceis que eu havia guardado para o fim ajudariam a esclarecer as coisas, mas, em vez disso, meus pensamentos se entrecruzavam e recuavam em um labirinto insolúvel.
Contrapus tudo que Alig me disse com tudo que eu havia descoberto sozinha. Sim, acredito plenamente que tudo que ele mais quer é ser amado. Embora tenha mantido a compostura enquanto falava sobre os horrores que enfrentou na solitária, ele quase chegou às lágrimas — duas vezes — quando sugeri que as pessoas achavam que ele era uma má pessoa. Até quando eu estava prestes a ir embora, tudo que ele queria era me mostrar os caras bonitos com quem estava falando em aplicativos de encontros. Também acredito que o seu vício em drogas tenha contribuído tanto para o fim da vida de Melendez quanto para a destruição da sua própria.
Mas a mensagem inspiradora que ele apregoa parece mais baseada em autopromoção do que em altruísmo, coberta com a graxa de um revendedor de carros usados. Acho difícil comprar a ideia de que o objetivo de Alig para organizar festas seja ser um bom exemplo, assim como acho a sua alegação de que esquartejou o corpo de Melendez para salvar o emprego dos seus funcionários bastante ridícula. Também vi como Alig se transformou em um bully quando foi ameaçado por Dreem, acusando-a de chantagem e má-conduta jornalística em vez de tentar entender por que algumas pessoas talvez não o queiram por perto.
Pelo que vi, tudo que Alig faz, da sua entrevista com Megyn Kelly à sua relação com Patrick, é em benefício próprio. Mesmo quando ajuda outras pessoas, a sua maior motivação sempre parece ser os seus próprios interesses. E embora eu não ache que isso faça dele um sociopata perigoso, acho sim que o classifica como um oportunista perspicaz, para quem o poder pode ser uma arma perigosa.
Este solipsismo talvez explique a tendência de Alig de exagerar a verdade a ponto de mentir. Ele me disse que o seu terapeuta na prisão o diagnosticou com transtorno de personalidade histriônica, que é caracterizado pela Associação Americana de Psiquiatria como “um padrão de emocionalidade excessiva e necessidade de chamar atenção para si mesmo, incluindo comportamento inapropriadamente sedutor e uma necessidade excessiva de aprovação”. “Meu terapeuta disse que eu era o caso mais extremo que ele havia visto”, ele disse, o que parece quase uma piada pronta — porque, bem, é claro que alguém com transtorno de personalidade histriônica alegaria ser o caso mais extremo.
Se Alig deseja mesmo se redimir aos olhos dos seus detratores e pagar a dívida moral que algumas pessoas acham que ele ainda tem com a sociedade, fazer um trabalho humanitário ou ativista parece o caminho óbvio. Mas, além de dar um discurso sobre o confinamento em solitárias ou doar parte dos lucros da sua exposição de arte, Alig foi incapaz de fornecer exemplos de trabalhos que esteja fazendo para corroborar com a narrativa de redenção anti-drogas que ele está vendendo.
Mais do que um viciado em drogas regenerado, herói motivacional ou qualquer outra das novas personas que ele tenha criado para si mesmo, Alig me parece um legítimo vigarista — alguém que se mudou de uma cidade atrasada de Indiana para Nova York e se tornou um rei da vida noturna no tempo que levaria para se graduar na universidade. De modo similar, ele deixou a prisão com um crime na sua ficha, sem dinheiro ou perspectiva de emprego; um ano e meio depois, lançou um programa no YouTube, uma série de festas no Brooklyn, uma linha de merchandise e uma carreira incipiente como pintor — tudo isso criando uma dedicada base de fãs na internet e vivendo sem pagar aluguel.
Quando comecei a conversar com Alig, a revolta contra as suas festas me cativou porque levantava questões complexas sobre crime e punição, e sobre como a vida noturna policia a si mesma. Mas quanto mais eu mergulhava na sua psique, mais percebia que o dilema mais profundo da sua história era também o meu próprio.
Todo mundo que sacrifica regularmente o seu sono para os deuses da rave entende que a diversão sem fim tem um lado mais sombrio. A vida noturna atrai pessoas que gostam de extremos, e o hedonismo pode originar momentos de transcedência tão facilmente quanto pode descambar para o abuso de drogas, para a doença mental e para a violência. Sei que esta escuridão existe, porque já a toquei em banheiros apertados de afterparties sujas, onde carreiras são oferecidas por mãos errantes. Então, acima de tudo, escrevi esta matéria para saber se o que aconteceu com Alig poderia aconteceria comigo também. Talvez esta seja a fonte do seu domínio duradouro sobre a nossa imaginação coletiva — talvez todo mundo seja fascinado pelo perigo de ir longe demais, de cruzar um ponto sem retorno. Mas a tristeza particular de Michael Alig — o que alguns diriam que é a sua verdadeira punição — é que só ele sabe como é do outro lado, sozinho, lutando com a questão do que vem a seguir.
O Lovegun fechou permanentemente as suas portas no outono de 2015, deixando o Peeew! sem um lar. Alig está participando de diversos filmes, incluindo um filme club kid de zumbis intitulado ZomBikers.
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Tradução: Fernanda Botta
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