Este foi, mais coisa menos coisa, o post do Álvaro Costa no Facebook depois da nossa noite. Agora é a minha vez de contar o dia seguinte. O Santo Diablo e o La Peste têm muita coisa em comum. Os dois são tímidos amadores, mas enquanto comunicadores precisam de intenção. Essa noite foi um monte de cristal que começou no terceiro aniversário do Radio Bar.
O Álvaro a acordar, todo arranhado do tralho que deu para cima de uma desconhecida.
VICE: Ontem, quando eu cheguei as três da manhã já estavas a regar pessoas com whisky e a cavalgar num cavalo branco alado. Álvaro, são duas da tarde: queres falar sobre a noite passada?
Álvaro Costa: O Diablo é provavelmente a personagem mais próxima da minha realidade. Mas só o liberto raramente, se libertasse mais vezes já estava num manicómio ou hospício.
Quem é o Santo Diablo?
É o meu lado pessoal, um mix santero brujo. [E passámos por mais um fã do AC que tentou entrar no carro onde estávamos a conversar.] Eu estou um gajo across the board. Viste esta cena VICE, que é parares numa passadeira e um gajo que me reconhece querer entrar no teu carro? Um adepto do Porto. E ontem levaste com outros filmes, ou seja, eu estou numa fase em que o povo adora-me, ou o caralho. [Alguém buzina e acena para o meu parceiro.] Viva o Porto! [Relembro que acordámos no domingo da decisão do título.] O Santo Diablo é mesmo isso, uma personagem muito próxima de mim. Musicalmente, tenho 30 mil discos e faço imensos cenários.
A refeição mais importante do dia.
Velvet Underground!
Isso é tudo vinil?
Vinil já tive 20 mil, mas agora com CDs e música tenho 30 mil. Dá-me para fazer o que eu quiser. Tenho várias personagens. Já fui o Pasteleira Sinatra, Pasteleira Electric, o Pasteleira Pasteleira. Às vezes sou bom rapaz também [alusão à dupla com o Miguel Quintão, Bons Rapazes] e aí sou um mestre de cerimónias, somos os Pet Shop Toys.
Quando é que fazemos uma dupla? Estou a precisar de guito.
Pá, vamos a isso. I’m game!
Dizes isso porque na loucura da noite passada eu fui o teu agente improvisado?
Claro! Foste capaz de sacar mais 40 por cento. Basicamente o Santo Diablo é um pouco o meu lado mais rock and roll, macacadas e cenas que eu sempre fiz. Tenho 53 anos, porra! O Santo Diablo é isso, a minha ligação à cultura hispânica, o meu lado Virgen de los muertos.
Esta foto não precisa de legenda.
Mas tu ainda acreditas na cena do “die young” e “fade away”? Pensas nessa merda.
No meu caso, é muito simples. Como já tenho para aí dez vidas, tenho de pedir a um dealer mais vidas! Dá-me o céu! Não faço a mínima ideia de como ainda estou cá. Já tive momentos em que de facto… Foda-se. Se o gato tem nove vidas, sete em algumas culturas, eu já vou em 11. A cena do “die young”, quer dizer… Com 53 anos como é que eu me vou preocupar? A cena “young” já acabou. Já não acredito nessa merda porque ainda estou vivo.
Os gatos também mijam na casa das outras pessoas?
Mas eu não mijei… Aquilo era água! Água! Cheirava a água e álcool. Podes escrever aí, vomitei água. Isso sou incapaz de fazer. A tua casa estava molhada com água.
Mas nunca te mijaste pelas pernas abaixo? Tipo, golden shower a solo?
Não, francamente não. Nada disso. Sou marado com cenas higiénicas. Tomo três banhos por dia e merdas do género.
Mas és obsessivo-compulsivo?
Naaa, equilibrado. Tem que ver com a minha infância.
Já sabes onde está o teu carro?
Está na garagem, não está? Olha que eu tenho uma excelente relação com a polícia. Até gostava de lançar uma campanha: camas para os polícias do Porto! Agora muito a sério, fiquei chocadíssimo com essa cena. A nossa polícia a dormir no chão, não faz sentido nenhum. Eu acredito na lei e ordem. Mais questões?
Álvaro, agora és tu quem deve ter questões relativamente à noite passada. O que queres saber? Ontem fiz CSI no teu vomitado…
Devo dizer que se isto fosse um filme, seria o… Hmm, o Ressaca 5? Basicamente o Santo Diablo é essa merda, um gajo que gosta de sarilhos. E os sarilhos gostam dele. A puta da noite foi o quê? Para já, quero dizer que adoro o Ricardo Salazar. Quando for dono desta merda vou tirá-lo da advocacia. Vai ser útil para me evitar sarilhos. O Ricardo é uma pessoa com muita vontade e visão. Abriu o Radio Bar sempre a acreditar. Sempre virado para o rock. E pagou-me mais sem eu saber — não vim cá pelo dinheiro, como bem sabes. Como tenho a onda profissional aproveitei que estavas ao lado para seres o meu agente. Confundi-te!
Sem-abrigo gourmet.
Na boa, foi super tranquilo.
Mas que aconteceu? Foram as garrafas de whisky? Três, quatro?
Já estavas no México, Aguascalientes, a pôr gasolina no povo.
Mi casa es su casa. Ontem estive em minha casa. Um dia que eu tenha uma cena minha, convido os amigos e é isto. Eu fui um homeless deluxe, mas bastante organizado. Ontem, ainda me lembrei de que tinha um agente que falava italiano e inglês. Mas conta-me mais…
Ok, fui eu que te salvei o telemóvel.
Ah, este é dos chineses! É para atirar à parede, nunca trago o meu telemóvel bom para estas merdas. Tenho sempre uma tanga, este custou-me 20 euros. Ou seja, mesmo na puta da maluqueira, mantenho a cabeça organizada.
E acordaste finíssimo! A primeira frase foi “onde estão as chaves?”. Passados uns segundos disseste que estavam na garagem, juntamente com o carro.
Acho que o termo pode ser: elegantemente fodido. Vai ser o título. Agora vou-te falar de DJs, sou DJ. Aquela onda Bowie. Há gajos muito bons tecnicamente, mas são chatos, autistas. Nós estávamos ali para divertir as pessoas. Estamos a viver tempos difíceis e ontem um dos meus desejos era que alguém fizesse filhos.
Tu estiveste perto — havia camisas de mulheres abertas com as tuas mãos —, mas depois levaste comigo na cama!
Eu tenho um lado bi, mas não militante. Quando estou marado fico mais bi do que é habitual. Em relação à minha sexualidade, desde menino que representei o meu país em todas as embaixadas femininas do mundo. E quando tinha 18 anos fui para Amesterdão. Foda-se, cheguei lá e Portugal era o Afeganistão. Fui para a Suíça e, só num dia, foram logo três ou quatro. Sabes que quando emigrei para a Suíça fui lavar pratos e outras merdas. O meu lado proletário. Fui lavar pratos para ganhar dinheiro para viajar. Não era rico e tinha família na Suíça — em vez de estar na praia de papo para o ar, fui trabalhar. O rigor, o cumprir, o nunca chegar atrasado vem daí.
Ouve esta: a minha família, uma vez, prepara o jantar só que eu não apareço, fui engatado por uma loira mamalhuda. Acordei, não sabia onde é que estava. Entretanto, a família já estava a ligar para Portugal e eu apareci no dia seguinte. Esta história… Sou eu, é o Santo Diablo este gajo! Tenho esse lado teenager, sou o teenager mais velho do país. No bom sentido. O Santo Diablo provoca merdas, mas não tem um guião. Tem uma carga sexual que está on fire, sou um hedonista de reacção. [No mesmo momento, uma turista tailandesa surge no horizonte e sorri. Sorri como todas as mulheres devem sorrir: a anunciar uma nova história e o prazer de a descobrir. É o anúncio de mais uma narrativa, um b-roll que fica para o nosso lado dionísio.]