Pra botar no baile, no trampo e até no campo

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Pra botar no baile, no trampo e até no campo

Uma análise de como as camisas de várzea viraram status nas quebradas.

Faça um breve exercício quando estiver andando pelas ruas do centro ou das periferias de uma capital brasileira. Repare nas camisas de futebol mais extravagantes. Não estamos falando daquelas de time europeu, nem das de equipe profissional do Brasil, mais certinhas. Tratamos daquelas bem coloridas, com símbolos religiosos, personagens infantis e frases malucas. Pode reparar: no busão, no banco, no mercado, na padaria, no trampo ou no baile, pá, sempre terá uma. Se você olhar bem, vai passar a reconhecer times como Ajax da Vila Rica, Vila Fundão, Ratátá Futebol Clube, Pameirinha do Paraisópolis, 9 de Julho, Pionner, Vida Loka e Inter Pânico, entre outros clubes de quebrada.

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Ao longo da última década as camisas de várzea foram ficando cada vez mais loucas — em todos os sentidos — ganharam mascotes bolados, cores mais ousadas, cortes a laser semelhantes às camisas de times profissionais e um orgulho de usá-las. Pode usar camisa com o Seu Madruga boladão fumando uma tora? Pode. Pode usar a camisa com o Bin Laden, as torres gêmeas e chuva de dólar? Pode. Pode usar a camisa com uma imagem do Hulk, do Coringa, de arma, do que você quiser? Pode. Só saiba o que aquele time representa e que por trás de tudo isso há uma história sendo contada.

“A várzea antigamente trabalhava com catálogos. Só que aí começou a chegar uma demanda de gente exigente”, explica Renato Bezerra dono da Uniex, uma das principais fabricantes de camisas para times amadores do Brasil. “Todos queriam trazer identidade pra camisa.”

Eduardo Brechó, vocalista do Aláfia, jogador e torcedor da várzea comumente passeia com camisas do Simioni, time forte de Ribeirão Preto, ou do Santa Pelada, clube que fundou, em shows ou entrevistas. Ele explica o peso dessas camisas. “Muitas vezes quando a gente vai aparecer publicamente e aquilo será veiculado, escolhemos alguns símbolos que vamos portar. Os times que eu visto, as camisas que eu visto são de coisas que eu acredito, que eu quero representar e que me representam”, afirma enquanto veste uma camisa de manga longa com uma foto grande do Eazy-E, do NWA, com desenho de uma bandana no pescoço. “É status, no sentido de pertencimento, mas é uma reverência ao movimento que a gente está inserido.”

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Dos tempos dos protótipos até agora muita coisa já mudou. Bruno Melo, diretor do Palmeirinha do Paraisópolis conta como funciona o fardamento hoje. “Tem o kit atleta e o uniforme de jogos, que são para os jogadores do time principal e a nossa lojinha que vende camiseta, bermuda, agasalho. A camiseta da torcida é diferente, tem o mascote. É outra coisa.”

Wellington William, de 25 anos, que mora há cinco em Vargem Grande Paulista, está na arquibancada do campo do Palmeirinha do Paraisópolis com mais quatro parças à espera do jogo do EC Tiradentes, time de seu antigo bairro na zona leste. Ele e os amigos ostentam camisas do Turma Futebol Clube, da zona sul por baixo do moletom. Ele explica onde as camisetas são usadas. “A gente vai pra jogo, vai pros rolês também. Eles fazem homenagem aos amigos que vieram a falecer e podemos lembrar dos caras”. E fala da presença de chegar na balada com um fardamento. “Os meninos vão pro baile também, é da hora. Tem umas minas que ficam posadas com as camisas. Sempre tem aquelas que gostam.”

As it favela Tasha e Tracie Okereke falam sobre o respeito que as camisas representam nas comunidades. “Quando você usa uma camisa de um time você tá representando uma quebrada, que não necessariamente é a sua, mas uma quebrada que você considera, que você frequenta e sabe. É uma coisa bem regional. É desrespeito você usar uma camisa de várzea por estética e se você não conhece o time ou a quebrada”, afirma Tasha.

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Muito além da discussão de bonito e feio, brega ou estiloso pra caralho, Tracie explica o que são essas camisas. “A estética tem a ver com o que a rua ou a quebrada mais se identifica, a frase que o grupo tem como bordão. É uma estética foda e varia muito.”

Hoje o cenário do futebol amador na capital paulista tem cerca de oito mil times, alguns deles com média de torcedores maior do que de jogos profissionais e movimenta, além da economia, tradições e culturas muito específicas.

Assista ao nosso documentário sobre a ostentação das camisas de várzea nas quebradas de SP:

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