Antes de sequer ouvir qualquer música do produtor paulistano DESAMPA, fui fisgado pela forte expressão visual presente no seu Instagram: silhuetas misteriosas, rosto envolto em diferentes e geométricas máscaras conceituais, roupas e acessórios de marcas que traduzem o andrógino underground atual como HBA e DTTK. Questionado sobre o porquê do nome DESAMPA, o produtor conta que “além de especificar o lugar de onde eu sou, é uma palavra boa de falar e visualmente bonita”. Então não será estranho imaginar grandes cenários e ou enredos fatais ao ouvir suas produções, que contam também com a voz do produtor, de 23 anos.
Para o EP ///, que diz ser totalmente diferente dos seus dois anteriores, ele colaborou com o produtor indiano iMC durante uma temporada recente em Nova York. “Fui até seu home studio e em quatro horas já tínhamos ‘Icarus’ pronta”, conta sobre a segunda faixa do projeto e a mais instigante, já que sua voz é ouvida em diferentes tons e alterada de diversas formas, incorporando-se como mais um instrumento dentro de um mundo romântico e viajado. As faixas “Be” e “Waiting” completam o EP, que vai do romântico ao sexy e do sombrio ao dançante em poucos minutos – e que ele disponibilizou para nós, na íntegra. Trocamos um papo online por um tempo, e logo depois demos um rolê com o Vekr (esse remix da Ciara já é eterno), produtor integrante do coletivo Metanol.fm, e com quem também disse estar com planos de produzir juntos.
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THUMP: Você falou que no momento está trabalhando em um estúdio. Já trabalhou com alguma outra coisa antes?
DESAMPA: Sim, estou trabalhando em uma produtora de áudio. Acabei de começar na verdade, porque estava morando fora. Daí voltei e comecei a trabalhar com algo que me mostrasse novos caminhos de produção. Estou aprendendo a mexer no Logic. Até então, só sabia mexer no Live 9 e GarageBand. Já trabalhei em vários lugares. Em loja, com eventos, em uma agência de publicidade. Na produtora, eu mexo com mixagem, edição e gravação de voz.
Como foi a temporada em Nova York? Você foi para lá especificamente para gravar o EP?
Foi maravilhosa [a temporada]. Tive contato com pessoas, arte e música surreais e acabei presenciando uma cena de moda fora desse mundo. Eu fui com a cabeça aberta para fazer o que aparecesse na minha frente. No fundo, eu tinha certeza que queria gravar lá. Mas não sabia com quem e nem onde. Mas quando você está aberto para o mundo ao seu redor, coisas incríveis acontecem.
Quem é iMC, e como vocês se conectaram? Como foi trabalhar e produzir esse EP com ele?
iMC é um dos produtores mais inspiradores que já conheci. Nos conhecemos em um curso de produção musical que fiz em Nova York. Ele me chamou pra fazer uma jam session, aceitei, fui até o home studio dele e em quatro horas já tinhamos “Icarus” pronta. Rolou uma simbiose inexplicável naquele quarto. Foi como se um fantasma saísse de dentro de cada um de nossos corpos e se juntasse pra formar a música. As ideias estavam rolando no mesmo ritmo da cidade.
Você tem algum outro projeto ou EP anterior a esse?
Tenho dois EPs: Err em 2013 e Hue em 2014. Eles têm uma outra pegada, ainda falam intensamente comigo, mas estou numa outra fase agora. E depois desta estarei em outra e por aí vai.
A gente conversou um pouco lá sobre a colab com o Fatnotronic, mas me conta aqui direitinho como surgiu o contato com eles e o que você achou do resultado?
Surgiu um convite para remixar uma track minha do EP Hue, a faixa é “Not Afraid To Fail”. Eu aceitei, claro. E ficou bem legal, uma sonoridade diferente da que tinha composto, o que exatamente um remix tem que ser. Ainda não foi lançada, mas já tocou no Lollapalooza deste ano e levei um susto a hora que vi o vídeo pelo Instagram.
Quanto tempo levou pro EP ser produzido? Pode falar um pouco sobre cada uma das faixas, como o processo, o título e etc?
Foi bem rápido. Em quatro sessões já tínhamos terminado tudo. A gente queria gravar mais, mas eu tinha que voltar pro Brasil. O EP tem três faixas, a primeira é “Be”, ela saiu de uma ideia de relacionamento limitador, que não deixa a liberdade expressiva em primeiro plano. “Icarus” é o ponto de vista do Sol em relação ao mito grego de Ícaro. E “Waiting” narra a história de duas pessoas que estão perto mas não conseguem se ver e se aproximar. Mas elas não precisam, necessariamente, ter esses significados para as pessoas, foi algo que pensamos na hora de compor. Elas podem significar qualquer coisa. O título do EP saiu de um símbolo que eu via sempre no metrô saindo do East Village (onde o iMC mora).
Pow, e parece que moda/visual é um elemento importante pra apresentação do DESAMPA. Por que isso, e como você descreveria/definiria as suas inspirações visuais?
Total. Eu dou muita importância para estética. Como diz Bill Cunningham, “He who seeks beauty, will find it” (Aquele que procura a beleza, vai encontrá-la), eu me cerco de coisas visualmente estimulantes e isso é como um imã para mais coisas estimulantes. Eu sempre procuro imagens no JJJJound, VFiles, Tumblr… O que tem me inspirado são: imagens de tecidos de látex e transparentes, coisas biônicas e arquitetura.
Digo isso porque no seu insta/fotos de divulgação, eu vi você usando D.TT.K e HBA, que são marcas atualmente ligadas ao underground muito representado pela GHE20G0TH1K e a Fade to Mind. Você também acompanha o que eles fazem? Como você acha que o que eles fazem se conecta com o que rola aqui no Brasil, se é que se conecta de alguma forma?
Eu amo eles. Sigo direto. Tive contato com essa cena em Nova York. E é um mundo muito aberto à expressão corporal e visual. As músicas são pesadíssimas e é assim que eu gosto. D.TT.K é minha marca favorita, ela está criando um portal pra um futuro não tão distante. E os materiais usados por eles me deixam maluco. Eu acho que ainda não está conectando muito com o Brasil. Mas eu adoraria ajudar a trazer isso pra cá. Aliás… ideias.
Outro elemento que parece importante na sua apresentação visual são as máscaras. Mas são sempre todas diferentes umas das outras. O que a máscara representa para você? E você pensa em um dia achar uma máscara só sua e ficar com ela por um tempo? Quem as faz, você mesmo?
Adoro usar máscaras, elas me dão uma nova face. As máscaras representam algo que está dentro de mim e que quer sair. Eu sempre busco muito por novas máscaras, já tenho uma coleção. Eu tenho três delas que são só minhas. Feitas sob medida pela artista nacional Ligia Jeon. Ainda não fiz nenhuma pra mim, mas pretendo.
Você já tocou/apresentou ao vivo, ou apenas DJ sets? Conta um pouco como foi.
Faço os dois. Ultimamente eu tenho feito DJ sets. Sempre tento me apresentar mais ao vivo, mas por algum motivo não é tão fácil assim aqui em São Paulo. Eu amo me apresentar, acho que soo melhor ao vivo, canto melhor. Adoro cantar bem para as pessoas, me sinto bem. E em DJ set gosto de tocar músicas que eu tô curtindo e dançar pra caramba.
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