FYI.

This story is over 5 years old.

Outros

Minha Tentativa de Ser uma Pessoa Melhor Através do CrossFit

Foi bastante assustador e dolorido, mas até que foi divertido.

Ilustração por Heather Benjamin.

Você já olhou para uma foto sua e pensou: Não é possível que essa seja eu. Quem é essa pessoa? E é você mesmo, e você é obrigada a reconhecer, talvez pela primeira vez em muito tempo, como é que está sua cara? Eu tive um momento desses alguns meses atrás. Meu time tinha vencido um jogo de boteco que a gente estava tentando ganhar há anos e aí tiramos uma foto do grupo e foi ótimo, apesar de que, depois de ver a imagem, fingi um pouco na felicidade, porque fiquei um pouco desnorteada de perceber – de algum jeito, de repente, naquele instante, acho que finalmente consegui enxergar – como eu tinha deixado a minha imagem real se afastar tanto da minha ideia de mim mesma. Eu sabia que tinha engordado, mas fui ingênua de achar que de repente estava bem. Quer dizer, eu sabia que TECNICAMENTE tinha engordado uns 13 ou 18 quilos – ainda não quero subir na balança –, mas de alguma forma achava que poderia estar dando certo para mim, ou era um tipo invisível de gordura. Ha-ha.

Publicidade

Então decidi experimentar o CrossFit, porque tem cara de ser assustador e intenso, o que é o oposto da minha vida. Aparentemente, existem cerca de 11 mil academias afiliadas da CrossFit no mundo, em comparação a 13 em 2005, nove anos depois do programa ter sido "inventado". Muita gente chama de culto e tira sarro. Mas as pessoas fotografadas nas infindáveis matérias de tendência sobre CrossFit normalmente são incríveis, e eu com certeza estava disposta a ficar viciada na coisa e virar uma pessoa irritante e entrar para o culto se, por algum milagre, o negócio vingasse e eu conseguisse ficar parecida com uma das mulheres com aqueles tops de malhação da hora e short de Lycra com um corpo tão em forma que dá até medo.

Mas aí eu fui fazer uma aula de CrossFit.

A academia – ou "box" – parecia uma caverna industrial de treinamento de gladiadores enfiada atrás de uma porta despretensiosa e normal em uma ruazinha do Brooklyn. Estava cheia de gaiolas de metal preto, barras, argolas e pilhas de pesos – além de fileiras de kettlebells e bolas medicinais, cordas de pular penduradas, um recôncavo de remos ergômetros e um canto com uma pilha de caixotes de madeira –, mas no geral grandes espaços vazios com colchonetes pretos e grama artificial.

No começo da aula, cada um se apresentou e contou seu histórico de prática de exercícios físicos e expectativas. Alguns disseram que correm ou nadam ou jogam basquete. Eu disse que não fazia exercício nenhum, na esperança de que isso pudesse justificar qualquer coisa que acontecesse depois, mas aí um casal fofinho que chegou atrasado também falou que não fazia exercício. Só que aí eles eram super-rápidos e fortes em aparentemente tudo e nunca ficavam sem fôlego. Principalmente quando aprendemos burpees, um exercício horroroso em que você joga o corpo todo no chão e depois pula e levanta – se conseguir – e fica de pé de novo, e bate palmas sobre a cabeça enquanto salta. E depois faz de novo. E de novo e de novo e de novo.

Publicidade

Depois de uns dez desse, percebi que, em algum momento, comecei a dar uns gemidos em voz alta, tipo tenista (!), o que foi emocionante, porque eu nunca tinha gemido de tanto fazer esforço. E aí terminamos com quatro minutos de agachamento livre – 20 segundos subindo e agachando como se fosse fazer xixi, seguido de dez segundos de descanso, oito vezes – o que pode não parecer muita loucura, mas deve ter sido com quase certeza o exercício mais difícil que já fiz na vida. Caí no chão logo depois, nos primeiros passos que tentei dar para descer da área dos colchonetes para ir para o vestiário.

Mas eu estava tão cansada que nem liguei se paguei de idiota e, àquela altura, eu só queria ir para casa deitar. E nunca mais voltar.

A preocupação com pessoas que praticam CrossFit em excesso ou de forma inadequada levou a pelo menos uma ação judicial, em 2008, em que o querelante, um técnico da marinha, processou a academia que frequentava (não a CrossFit em si), alegando que as orientações do instrutor fizeram com que ele desenvolvesse rabdomiólise, doença que provoca a "quebra rápida de músculo esquelético devido à lesão no tecido muscular", e que muitas vezes tem como causa o "exercício físico extenuante" (citações da Wikipédia). Ele estava mijando sangue e ficou um mês internado e acabou ganhando US$ 300 mil. Para conscientizar sobre os riscos da técnica mal aplicada, o CEO da CrossFit, Greg Glassman, fez diversos artigos sobre rabdomiólise para a publicação online da CrossFit (que não é avaliada por outros especialistas), a CrossFit Journal. Em um post de 2005, três anos antes do processo, Glassman escreveu:

Publicidade

Até hoje, vimos cinco casos de rabdo induzida por exercício associada com os treinos da CrossFit. Todos os casos levaram à internação dos atingidos… O caso mais grave ficou muito doente, o mais leve reclamou apenas de dor muscular… No entanto, dor muscular não explica bem o desconforto da rabdo. O pior caso, de um sujeito da SWAT, narra que seis dias tomando morfina na veia nem fizeram cócega na dor dele.

A ilustração que acompanha o post, sob a palavra "RABDO", é o desenho de um palhaço meio Krusty marombado sangrando com cara de infeliz, ligado num aparelho de hemodiálise, os rins no chão. O desenho do palhaço uma hora começou a ser chamado de "Tio Rabdo" e, mais tarde, um repórter o chamou, num post famoso da Medium em 2014, de "perturbador mascote extra-oficial da CrossFit".

Em casa, a dor me deixou inesperadamente tonta e eufórica. Mesmo que não fosse rabdo, rsrs, meio que adorei a dor e a queimação – eu quase não conseguia sentar direito e, se movimentos rápidos e subir e descer de escada fizessem parte do meu trabalho, talvez eu tivesse que faltar a semana toda. Era como se tivesse um outro corpo inteiro dentro do meu normal que estava acordando. E ela estava brava e malvada, não porque eu a tivesse incomodado, mas pelo tempo que eu tinha demorado para lembrar que ela existia. E eu estava adorando mancar e gritar quando sentava: "CASO ALGUÉM TENHA ESQUECIDO QUE EU FIZ CROSSFIT POR ACASO EU JÁ CONTEI DO CROSSFIT".

Publicidade

Então me matriculei para a chamada aula "Na Rampa", curso de seis aulas em duas semanas para iniciantes em que você aprende a fazer os exercícios de CrossFit do jeito certo, uma exigência para todo mundo que quer continuar praticando.

A sessão que escolhi começou na manhã seguinte à minha primeira aula. Acontece que a academia é muito mais silenciosa às 6h da manhã e só tinha quatro alunos. E o nosso instrutor era muito bacana e parecia muito gentil e compreendia que a situação de estar ali poderia inibir. Ele também foi ótimo de entender o limite pessoal de cada um e de ajudar sem deixar ninguém se sentindo idiota ou nojento. Ele também é um cara muito em forma, estilo puxador de peso, e tinha uma barba grande.

Todo mundo conversou um pouco e depois começamos a aprender sobre CrossFit. Durante uma hora, arfei e suei e me senti esquisita, fazendo flexões e abdominais e pseudopuxada alta (com uma grande barra de borracha), e meio que me diverti, ou não exatamente, mas tinha alguma coisa tipo satisfação, e quando voltei para casa, não consegui parar de falar sobre como eu estava "fazendo CrossFit".

Mas nas duas semanas seguintes, alguma coisa mudou. O que começou como um desejo de ficar EM FORMA E FORTE (isto é, magra e gostosa) meio que se transformou em querer que meu instrutor e as pessoas da aula gostassem de mim e ficar ansiosa para estar com eles, de um jeito simples e bobinho. Porque ficou claro desde o começo que eu não conseguia acompanhar, em termos de nível de exercício, e quase tudo tinha que ser adaptado para as minhas limitações físicas. Mas isso foi meio que libertador, porque os treinos continuavam sendo exaustivos – só não eram mais tão assustadores ou baseados em comparações. E foi legal estar em um lugar com pessoas novas, fazendo uma coisa nova, com cara de besta.

Tradução: Aline Scátola