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Dicas para te reformares antes dos 30

Os motivos por que ninguém quer trabalhar.

Numa altura em que as reformas antecipadas foram cortadas e para o caso da medici­na não encontrar forma de rejuvenescer o teu ADN, é importante dar ênfase a profissões que te permitam ver as tardes da Júlia antes de teres 200 anos. Isto porque não queremos que morras sem a experiência de ganhar um torneio de sueca na cooperativa da terceira idade e sem fazer umas sessões de hidroginástica num dos centros de saúde estatais que abundam em Portugal. A água das piscinas é que poderá ser em doses homeopáticas, o que significa que não irão haver vestí­gios da mesma, de tão diluída no ar.

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Como queremos que usufruas das benesses new-age que o governo tem reservadas para ti, aqui ficam algumas sugestões de labores em que te podes reformar ainda com os dentes todos. Actor/ actriz/ realizador porno
É uma carreira na qual tens boas possibilidades de te reformares aos 24, tipo a Sasha Grey. Ela era uma espécie de Nadia Comaneci do mundo da pornografia, mas ao menos as proezas executadas tinham algum tipo de utilidade — o que já não se pode dizer dos saltos triplos em cima de uma barra executados pela Nadia. Se estivéssemos naquele filme do Ridley Scott, a Sasha encarnaria o Russel Crowe e a Nadia seria aquele gajo de quem já ninguém se lembra, que faz xixi pelas pernas abaixo antes de entrar na arena. Além disso, este é um ramo que se enquadra nos parâmetros de empreendedorismo actuais: por que não realizares filmes creampie com pastéis de nata? O revivalismo nacionalista é o novo punk! Vê o sucesso da pornografia islâmica: eles sacam da burca da mesma maneira como o Bowie sacava da suástica na fase do The Thin White Duke e tu sempre podes pintar umas quinas na cara enquanto comes alguém em frente à câmara. Cortaram-te a luz e não tens forno para aquecer aquelas natas do supermercado? Estás à vontade para usar uns manjericos como cenário e meter umas socas minhotas nos teus actores. Não tarda nada e estás na capa da Visão como empreendedor do ano, ao lado do dono de uma loja de manicure canina. Boa! DJ/ VJ/ LJ
Tem de ser qualquer coisa acabada em "jay", até podes dizer que és BJ (Bebe Jolas) e fica tudo a achar que passas uns vídeos e que tens sotaque de Paranhos. Depois veste-te igual ao pessoal que pára em discotecas hipsters e finge que vives na época do pós-punk londrino. Se não tens andamento para adquirir o look acabei-mesmo-agora-de-dar-um-chuto, não te preocupes. Descolora o cabelo e passa um bocado de fome, depois veste-te tipo avó gótica e anda calçado com botufas — aquele híbrido de bota com pantufa. Movimenta-te sempre com os olhos semicerrados que, além de te conferirem um ar misterioso, podem contribuir para dares com a tola numa parede qualquer e assim o pessoal acha que estás mesmo todo cego, enquanto só fumaste um cigarro e bebeste uma cerveja daquelas para meninas. Quando começares a ficar com sono, podes ir para casa encenar uma sessão fotográfica com os teus amigos à lá Ryan McGinley. Depois, enfia tudo no Facebook. Assim, ninguém adivinha que a tua vida não é uma montanha russa, mas sim aqueles simuladores em que a tua mãe te deixava andar quando tinhas oito anos. Ah, a música? Só tens de sacar umas trilhas de um gajo qualquer no Sound­Cloud, carregar no play e repetir tudo o que foi dito em cima. Se não és lá muito bom na cena da ilusão e se te custa ceder à superficialidade, vais ter de andar mesmo todo fodido para frequentar o meio. Começa com uns copos e vai subindo em escalada. Passa pelo MD e pela coca se não resultar, cola antes um selo. Se, mesmo assim, deres por ti a questionar muito o teu estilo de vida, é porque a tua consciência é mesmo artilharia pesada e, nesse caso, só te safas com cavalaria. Passando para aí, já tens menos probabilidades de chegar à altura da reforma e o teu problema ficou resolvido. Voluntário
Para seguires esta carreira, provavelmente, és endinheirado e, como a offshore suíça dos teus pais torna a questão da reforma antecipada irrelevante, podes passar a tua vida adulta em trabalhos de missionário a tentar impingir as tuas ideologias ocidentais aos mais necessitados sim, porque é sempre bom pensares que alguém necessita de ti. Aproveita é os intervalos entre as tuas postas de fotos no Facebook com criancinhas em África para fazeres uma introspecção. Aliás, pensando melhor não faças nada disso, caso contrário ainda chegas à conclusão de que quem precisa de educação és tu e lá se vão pelo cano abaixo os planos para aquela trip ao Senegal e, assim, as vidas dos senegaleses perdem a oportunidade de serem tocadas pelas tuas redes sociais. Atleta olímpico
Também é uma boa opção: vê como o Phelps chegou ao pico da carreira aos 27 anos (que consiste em não haver nada mais para ganhar). Deve ser o equivalente pornográfico a não haver mais ninguém para comer, portanto, como há mais pessoas do que medalhas, o mundo porno pode ser considerado como um trabalho de futuro. Além disso, a menos que andes feito autista a correr atrás de uma bola, a prob­abilidade de teres patrocínios decentes é tão elevada como o apoio das autarquias a actividades culturais não-institucionais. Na pornografia, pelo menos, sempre tens a oportunidade de ter uma conta bancária simpática, ao contrário da alta competição que, na maioria dos casos, só oferece a possibilidade de glória e medalhas, uma espécie de DMT para o ego. A única desvantagem é que o visionamento de filmes XXX não faz parte do serão de domingo e os teus papás não vão querer exibir aos amigos a quantidade de coisas que consegues enfiar pelo teu rabo porque distender excessivamente partes corporais só é aceitável se suscitar admiração e não excitação. A escolha difícil
Se nenhuma destas opções apelou aos teus talentos inatos, podes sempre ser procrastinador profissional. Deixa-te ficar por casa a ver programas japoneses de culinária no YouTube e aprende a remover entranhas de lesmas do mar. Ou então, vê os anúncios daquela máquina que tritura ananases inteiros, ou outros do género, de sertãs que fazem panquecas tipo compasso. Entretanto, vai jogando Playstation. Faz isto durante uns meses segui­dos e depois mete baixa psiquiátrica, porque sempre te dá o salário mínimo. Para não descurares o teu futuro, podes tentar candidatar-te ao cartão branco para um manicómio, uma certidão de inadequação social: mas sê persistente, porque, a esta altura do campeonato, entrar no Royal College of Art tem menos pré-requisitos. Por isso, prepara-te: vais ter de te empenhar em provar que és um espéci­me humano mesmo todo fodido e a única coisa que queres é ver panquecas com óculos 3D e ser marginalizado por pessoas com saúde mental perfeita, que querem é ver avatares em 3D. Enfim, coragem! Estas são as dificuldades em escolher carreiras de jeito num mundo de pessoas que ainda não se fartaram de ver a Sigourney Weaver metida com extraterrestres.