Nunca que o Movimento Passe Livre ( MPL) imaginaria uma disputa tão injusta: concorrer com o Jorge Ben durante o protesto de ontem (12/jan). Uma modesta lojinha de roupas íntimas ali na Praça Tereza Cristina, no centro da cidade de Guarulhos, em São Paulo, tocava “Chove, chuva” em alto e bom som enquanto a rapaziada tentava se organizar para o primeiro ato do ano na cidade contra o aumento da tarifa no transporte coletivo, que subiu de R$ 3 para R$ 3,50 na semana passada.
O protesto foi saudável, foi molecote, foi gostoso. Sabe aquele frescor juvenil implacável que os movimentos estudantis emanam? Pois.
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Calculamos quatrocentas pessoas presentes, no máximo. Acho que 99% delas mostravam uma disposição invejável, mesmo debaixo de um calor escaldante. Inclusive a molecadinha punk, de pinturas faciais com toques gótico-rupestres e jaquetas de couro cheias de patchs e rebites. Muito vigor, muita cantoria, muita dancinha e a Fanfarra do M.A.L. fornecendo seus batuques e trompetes. O poder ultrajovem é louco.
E uma coisa é curiosa: os integrantes do MPL de Guarulhos não carregam a mesma sisudez da molecada de São Paulo. Lá, eles são mais soltos, mais flexíveis. Teve assembleia pra decidir o trajeto e também teve assembleia pra decidir se valia a pena enfrentar a polícia ou não. Isso aconteceu quando o grande imbróglio era atravessar a Dutra – principal via que conecta Guarulhos a cidades como São Paulo – para chegar até a Vila Galvão.
De um lado, a polícia bateu pé e bloqueou a passagem. O coronel responsável avisou que se tentassem ocupar a famigerada e populosa via, a merda correria solta no ventilador, com direito a bombas de efeito moral, gás lacrimogêneo e balas de borracha.
O MPL tentou negociar com a PM, que se mostrou irredutível. Dando um show de classe e finesse, a passeata não pestanejou e deu meia-volta. Não tinha porque colocar em risco todo mundo que estava ali.
Guarulhos é uma cidade grande, grande mesmo. Mas o centro não é palco de protesto o tempo todo. Talvez por isso os transeuntes parecessem tão maravilhados vendo aqueles jovens protestando à luz do dia. E, instantaneamente, sacavam seus espertofones dos bolsos para registrar ao que assistiam.
O sagrado ritual da queima da catraca de papel foi realizado quase no final do protesto, mas a polícia não parecia familiarizada com o negócio e logo se empertigou com seus escudos e armas apontadas para os manifestantes. Foi só um susto. Tudo ficou em paz.
Mesmo com as diversas ameaças de um verdadeiro pé d’água despencar do céu e miar a marcha, o clima foi de tranquilidade total e o ato terminou no mesmo local em que começou. O santo do MPL é forte. Ainda que o Jorge Ben tenha entoado “Chove, chuva” através das caixas de som da loja de calcinhas e cuecas, não choveu.
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