O governo iraniano começou a reconectar o país a internet global na manhã desta quinta-feira, mais de quatro dias depois de responder a grandes protestos nas ruas sobre os preços dos combustíveis com um apagão quase total da internet.
O Irã vem sendo amplamente criticado por cortar a internet numa tentativa de conter os protestos contra um aumento de 50% no preço dos combustíveis. Isso é visto como um esforço para evitar que a comunidade internacional monitore como o governo tem reagido aos protestos, que começaram na sexta.
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A Anistia Internacional afirmou esta semana que pelo menos 106 pessoas foram mortas por forças de segurança desde que os protestos começaram, e alertou que a contagem de mortos pode chegar até 200.
Na quarta, vários meios de comunicação estatais publicaram matérias destacando os danos que o apagão causou na economia iraniana. O ministro das comunicações Mohammad-Javad Azari-Jahromi teria dito que transações online “caíram em 90%”, enquanto o membro da Câmara do Comércio Ali Kolahi disse que o apagão teve um impacto nas exportações. “Não temos ideia de onde estão nossos carregamentos”, ele disse para a agência de notícias conservadora ILNA.
Líderes iranianos disseram mais cedo na semana que restaurariam o acesso à internet assim que os protestos terminassem. Na quinta, a Guarda Revolucionária de elite do Irã disse que a calma retornou ao país.
A agência de notícias semioficial Fars informou que o acesso a internet está sendo religado, e que o acesso a telefones fixos e ADSL já tinha sido restaurado em meia dúzia de províncias além de em partes da capital, Teerã.
A Agência de Notícias Estudantis Iraniana relatou que o acesso a serviços de redes sociais como WhatsApp e Instagram tinha sido restaurado.
O NetBlocks, um grupo de defesa de direitos digitais que usa dados em tempo real para rastrear apagões de internet pelo mundo, confirmou que a conexão com a internet global estava subindo, mas alertou que ainda estava em apenas 10%.
No começo da semana, a conexão dentro do Irã tinha caído para 4%, com apenas oficiais do governo e algumas agências de notícia estatais mantendo o acesso.
Uma fonte na província de Homozgan, que pediu para não ser identificada, deu a VICE News provas do acesso a redes sociais, mas disse que a velocidade da internet é tão baixa que vídeos não podem ser postados.
Enquanto os iranianos tomam as ruas, os aiatolás em Teerã continuam a usar violência e detenções para oprimir seu povo. A mensagem dos EUA é clara: o povo americano está com o povo iraniano.
Críticos dizem que o governo cortou o acesso para evitar que os manifestantes se coordenassem e mobilizassem online, e para evitar que grupos de direitos humanos observassem como as forças de segurança estavam respondendo ao levante.
Todos têm direito de protestar por um futuro melhor. Peço que o governo iraniano acabe com o apagão da internet e pare a violência contra os manifestantes.
O governo preencheu o vácuo de informação culpando forças internacionais – incluindo EUA, Israel, França e Arábia Saudita – por apoiar a violência que explodiu depois do aumento do preço dos combustíveis na sexta.
Teerã disse que estrangeiros tinham se infiltrado nos protestos e estimulado a violência, acusações que então foram amplificadas pelas estações de TV estatais.
Mas o governo não deu números concretos sobre os mortos, feridos ou detidos na ofensiva contra os manifestantes.
Um relatório da Anistia Internacional desta semana disse que as forças de segurança “usaram força excessiva e letal para acabar com protestos, em grande parte pacíficos, em mais de 100 cidades do Irã, protestos desencadeados pelo preço dos combustíveis”.
O processo de derrubada da internet foi um dos mais complexos já rastreados pelo NetBlocks, e um especialista disse a VICE News no começo da semana que o governo provavelmente estava planejando essa ação há muito tempo.
“Em cada rodada que eles experimentaram distúrbios domésticos na última década, o governo iraniano fez avaliações de suas estratégias e resposta, e aprendeu lições”, disse Sanam Vakil, pesquisador sênior da think tank de Londres Chatham House, a VICE News na quinta. “O que estamos vendo hoje é que eles estavam preparados para esses protestos, porque imediatamente vimos a presença das forças de segurança iranianas nas ruas, e o apagão da internet foi um sinal de que eles estavam prontos.”
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