Seu eu pudesse comprar ações de seres humanos, encerraria minha conta poupança, pegaria toda a grana que meus avôs me deram desde criança, pediria um belo empréstimo e usaria tudo isso pra investir em Hod Lipson. Ele é o diretor do Laboratório de Síntese Computacional da Universidade de Cornell e, como a maioria dos diretores de centros de pesquisas da Ivy League, trabalha em coisas que só 0003% das pessoas do planeta conseguem entender, mas que provavelmente irão afetar todo mundo.
Entre outros temas, ele estuda robótica evolutiva, um subconjunto da Inteligência Artificial cujo foco é desenvolver robôs que, de maneira independente, aprendam otimização de design através de uma guerra Darwinística entre os vários algoritmos que existem dentro dos cérebros de robôs. Lipson representa um vasto campo que tem potencial para provocar uma verdadeira mudança na forma com que seres humanos interagem com outras máquinas – exatamente como seus romances de ficção científica previram. Grande parte da pesquisa de robótica evolutiva está centrada em inovações práticas, que sugerem que humanos estão limitados ao poder do nosso design. Mas, em um nível muito mais filosófico, a robótica evolutiva pode permitir que os robôs desenvolvam complexos de características sociais impossíveis de programar e que podem, na verdade, enaltecer algumas recém-descobertas leis da natureza.
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Algum dia ele poderá muito bem ser conhecido como o pai da modernidade ou, se o projeto der uma guinada mórbida, o arquiteto do exército de robôs que escravizou a raça humana. No futuro, quando Hod estiver congelado em uma câmara de preservação, robôs cantarão hinos sobre Hod Lipson aos domingos, votarão em conservadores racistas movidos pela total fidelidade a Hod Lipson, e passarão séculos em guerra porque nações inteiras de robôs não concordarão com outras nações no que diz respeito a Hod Lipson. Assim, o preço de suas ações iriam às alturas, e eu passaria o resto da minha vida me banhando com diamantes liquefeitos e comprando fazendas de criação de leopardos-das-neves. Essa pode ter sido a conversa mais importante que jamais terei em minha vida.
Vice: Acho tudo relacionado à robótica evolutiva super intimidador. Dá pra explicar isso?
Hod: Antes de tudo, é um campo inteiro. Existem outras pessoas e grupos como nós. Basicamente, é a ideia de usar o que entendemos como evolução biológica para desenhar o corpo e o cérebro de robôs, além de controlar sua metodologia. Como tantas outras áreas da IA, existem dois lados. Um é muito prático, no qual nós só queremos desenvolver máquinas melhores com a expectativa de que, ao realizar esse tipo de otimização inspirada na evolução biológica, poderemos projetar robôs impossíveis de serem projetados por seres humanos. O outro lado é muito mais filosófico, baseado na ideia de que talvez essa (evolução) seja o caminho para se projetar os robôs inteligentes que temos imaginado há 40 anos, mas nunca fizemos. Talvez seja uma maneira alternativa de criar, em máquinas, esses comportamentos complexos que não conseguimos criar manualmente. Essa é uma visão para longo prazo, uma meta muito mais filosófica que os pesquisadores dessa área estão buscando.
Você, pessoalmente, está focando mais no lado filosófico e sci-fi da robótica evolutiva ou trabalha em ambas as frentes?
Nas duas, com certeza. Em alguns dos projetos nosso objetivo é ter robôs que possam encontrar caminhos mais rapidamente do que se fossem programados por humanos.
Sabe, eu acho a indústria robótica realmente fascinante porque não há muito um lado do consumidor ainda, o que parece ser algo que você está criando. Sei que existem projetos enormes como o Asimo, da Honda, mas me parece que o que você está fazendo não tem nada a ver com isso.
Bom, existem vários robôs em torno de nós feitos pela Honda, Toyota e outras empresas do tipo, mas eles são programados, sabe? São máquinas, não são vivos. Falta algo muito importante neles. A evolução é interessante porque pode criar, a longo prazo, coisas muito mais sofisticadas do que qualquer outra que poderíamos fazer manualmente. Mas justamente por isso, por não ter participação humana, não se sabe exatamente o que esperar, o que é uma parte do mistério da vida. Quando você olha para um robô da Honda que foi desenvolvido por uma equipe de engenheiros, sabe que cada peça, e o que ele pode fazer, foi desenhada e aprovada por um humano. Não há mistério nenhum, é tudo evidente. Mas quando você lida com uma máquina evoluída, não sabe tudo sobre ela. Existem algumas coisas que você sabe, mas é só uma pequena fração de um todo desconhecido. Você pode observá-la por fora, mas não tem a completa noção do que está acontecendo dentro. Essa é a parte dos robôs que nos fascina.
Então se é assim, e você não sabe na verdade o que acontece dentro do robô, como funciona exatamente? Tudo é construído com algoritmos aleatórios? Parece um processo super complicado e confuso.
Na verdade é muito mais simples que desenvolver um robô do jeito tradicional. Vamos dizer que se você estiver evoluindo o cérebro do robô, tudo o que você tem que fazer é dar ao robô milhares de programas concorrentes e diferentes. Alguns deles irão extrair conseqüências melhores que os outros, e essas conseqüências se reproduzirão mais. O original será reforçado, e haverá mais cópias do programa original e bem sucedido.
Então isso é construído na sobrevivência do mecanismo mais apto ou é uma função implícita desses robôs?
Não. Esse processo é algo construído. A ideia é a de pegar o que funcionar e fazer mais cópias desse processo bem sucedido. Depois de um tempo você faz um monte de cópias e os robôs, geralmente, se aperfeiçoam. Você usa esse princípio simples para deixá-los mais rápidos e eficientes. É por isso que essa coisa que vemos acontecer é uma área muito interessante. Está melhorando o cérebro e o corpo do robô por conta própria. Além disso, não se trata apenas do robô. Acho que várias coisas, como robôs corretores de ações, são melhoradas por princípios evoluídos com milhares de programas para ver quem pode ser melhor.
Já que parece existir um lado bem proeminente dessa área que tem a ver com o avanço dos robôs que imaginávamos nos livros do Isaac Asimov, você já se encontra no ponto de conversar com gente que projeta animatronics? Me parece o próximo passo no desenvolvimento.
Hmmm… Pessoalmente não. Tem muita gente trabalhando na robótica que dá duro para fazer com que robôs fiquem atraentes. São essas as pessoas que alinham os movimentos ao ponto de fazer com que pareçam que estão tocando um violino, ou fazer com que um dinossauro se mexa exatamente como um dinossauro se movimentava. É uma coreografia bem específica, e mesmo que seja uma grande conquista, não é real. Estamos atrás de máquinas que possam aprender por si próprias. A maioria dos nossos robôs não anda muito bem, e não são exatamente obras-primas em termos de visual. Provavelmente poderíamos, manualmente, fazer um robô aranha que corresse mais rápido, tivesse um visual melhor, que fosse mais fidedigno, mas não é o que queremos. O que queremos é um robô que possa fazer isso por conta própria. A esperança é que se a máquina consegue fazer tudo sozinha, então vai acabar chegando mais longe do que os humanos poderiam projetar, já que temos limites.
Dos traços que você relacionou nesse catálogo gigante de possibilidades, há algum que você notou ser dominante, como acontece na evolução normal?
Bom, as pessoas estão trabalhando em tipos diferentes de coisas, mas estamos mais preocupados com a locomoção. Não sei apontar nenhum traço em especial, do tipo como alguns preferem o rastejar ao andar. Acho isso desinteressante, dada a totalidade. Contudo, há algo interessante que acontece quando você permite que os robôs criem modelos de si próprios: às vezes eles criam modelos errados e inflados. Mudanças assim nos levam a muitas questões interessantes sobre psicologia e como os humanos criam, várias vezes, modelos de si mesmos que não são tão precisos. Às vezes a imagem é inflada, deflacionada, e às vezes é errada, ao ponto de criar uma gama de problemas.
Então você também está começando a encontrar problemas sociais nos seus robôs? Acredito que você possa ter uma descoberta profunda em mãos.
Bom, não estamos nesse nível ainda, mas é possível notar isso quando os robôs começam a ficar mais complexos em seus comportamentos e padrões de pensamento, e ao deixá-los aprender ao invés de programá-los; você vai começar a ver esses problemas, que são paralelos aos traços psicológicos dos humanos. Desses traços comportamentais acredito que tiraremos um robô incrivelmente esperto e racional.
Você acha?
Acho que quanto mais sofisticados ficamos, e como pessoas construirmos essas coisas, estaremos lidando com todos os tipos de questões resultantes da complexidade dos robôs, como esses auto-modelos que causam suposições erradas e outros problemas sociais.
Essa é a parte mais fascinante dessa área de estudo. Você está começando a identificar coisas que podem ser problemas em uma cosmovisão da sociedade, e as está vendo representadas hiperbolicamente nesses robôs.
Estamos olhando para esses robôs com o objetivo de poder perguntar coisas que queremos respondidas como seres humanos – do tipo, qual a origem da esquizofrenia e encontrar maneiras de entender padrões e problemas de comunicação. É muito difícil responder essas questões sobre os humanos porque seres humanos são muito complexos. Podemos enxergar robôs como plataformas para perguntar e responder questões em domínios diferentes. Não é como humanos, obviamente, mas muito mais transparente, e podemos usar isso como uma ferramenta para o entendimento.
Você já conseguiu relacionar esses traços comportamentais com o ambiente externo? Onde você pode obter traços sociais específicos?
Ainda não chegamos lá, mas é definitivamente algo que queremos fazer. Também existe uma área inteira de robótica social que foca no como os robôs interagem com pessoas, como pessoas interagem com robôs, e como cada um deles vê o outro.
E sobre como robôs interagem com outros robôs?
Isso é uma coisa na qual estamos trabalhando nesse exato momento. Estamos muito empenhados em observar como robôs constroem uma imagem mental de como os outros robôs de fato são. Existem oportunidades para apresentações mútuas.
Como um todo, claro que essa área é muito interessante, mas também parece bastante assustadora. As pessoas deveriam temer o futuro da robótica evolutiva?
Por estar envolvido nisso, sei que estamos bem longe de qualquer coisa com a qual devamos nos preocupar. Mesmo assim, é uma tecnologia muito poderosa, então sou muito cauteloso até certo ponto. É uma das razões pelas quais acho muito importante que façamos pesquisas, deixemos tudo bem aberto e discutamos com o público. Assim, todos ficam cientes de tudo e podem opinar. Ninguém deve fazer esse tipo de coisa a portas fechadas.
As pessoas estão fazendo isso a portas fechadas?
Acho que não saberia se estivessem, mas, até onde sei, existe uma grande comunidade na qual tudo é aberto. Como eu disse, porém, todos os robôs que fomos capazes de produzir com essas técnicas são, atualmente, inferiores aos quais os engenheiros fazem e programam manualmente. Ainda não alcançamos o topo da robótica em termos de capacidades. Ainda é uma questão de saber se é uma busca que vale a pena.
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