A Busca por uma Alternativa à Camisinha Feminina
Créditos: Parceria Internacional de Microbicidas

FYI.

This story is over 5 years old.

Tecnologia

A Busca por uma Alternativa à Camisinha Feminina

Pesquisadores testam o que pode ser o cálice sagrado da saúde sexual: um anel microbicida anti-HIV.

Existe um cálice sagrado entre os cientistas que trabalham com saúde sexual: um aparato discreto e confortável com o qual as mulheres possam se proteger do HIV.

Ao redor do mundo, apenas 5% dos homens usam camisinha com frequência. Convencê-los a usar pode ser difícil, no mínimo — ainda mais em países onde o estupro atinge níveis alarmantes. Despejar milhões de preservativos também não muda muita coisa. Na região da África Subsariana, onde há uma frequente distribuição de camisinhas, a estatística permanece alarmante: uma em cada cinco pessoas tem HIV.

Publicidade

A Parceria Internacional de Microbicidas (IPM) espera que o "anel de dapivirine" seja a solução que tanto buscamos. A organização sem fins lucrativos conseguiu angariar fundos de um vasto leque de organizações filantrópicas e americanas ao alertar para a urgência de proteger o sexo feminino do vírus.

"Esperamos que, pela primeira vez, o anel anti-HIV ajude as mulheres a se proteger contra a contaminação", disse Zeda Rosenberg, diretora executiva da IPM.

O anel de dapivirine é uma argola de silicone poroso, projetada para as mulheres encaixarem no cérvice. É embebido em um remédio antirretroviral capaz de matar o vírus HIV, que, aos poucos, é liberado no órgão; as mulheres terão que trocar o anel todo mês. Por carregarem o anel todos os dias, as mulheres poderão se sentir protegidas mesmo quando não houver camisinhas à mão — isso é muito importante, dado que mulheres têm duas vezes mais probabilidade de contrair HIV em relações sexuais com um homem do que o oposto.

O anel de dapivirine está em fase de testes na África — no Estágio III de estudos clínicos, mais precisamente. Mais de cinco mil mulheres já testaram o anel ao redor do mundo. Essa linha de frente na guerra contra o HIV está dando um passo corajoso, já que, nessa fase experimental, há uma chance de contrair o vírus. Resultados preliminares devem sair em 2016, e o anel deve estar disponível em países-alvo da África e dos trópicos até 2018.

Publicidade

O método é apenas um entre diversos anéis microbicidas em desenvolvimento ao redor do mundo na corrida para proteger as mulheres contra o HIV. A organização CONRAD — sediada na Virgínia, atuante há duas décadas no campo de aperfeiçoamento da proteção à mulher — está desenvolvendo outro aparato pioneiro.

Não é a primeira vez que microbicidas "controlados por mulheres" foram aclamados como uma chance de mudar o mundo. Na última vez, o resultado foi uma decepção catastrófica. Em 2004, cientistas achavam que teríamos géis microbianos no mercado até 2010; mais de 60 tipos passaram por testes, sob a forma de géis, esponjas, supositórios e anéis. Mas estudos clínicos revelaram que muitos não só eram ineficazes, como alguns chegaram a piorar a taxa de infecção por HIV: géis vaginais de celulose sulfato, por exemplo, provaram ser altamente cáusticos para o tecido vaginal e aumentaram o risco de pequenos rasgos, que deixam o contágio mais provável.

"O fracaso dos géis nos anos 2000 foi muito desalentador", disse Rosenberg. Mas a necessidade de um microbicida eficaz é tão urgente que abandonar o objetivo está fora de questão para a IPM, a CONRAD e outras organizações. Rosenberg trabalha no meio desde os anos 90 e se lembra muito bem do hype, da esperança e da frustração dos géis microbianos.

Considerando que talvez seja impossível desenvolver uma vacina contra o HIV, a IPM — que trabalha há 11 anos nesse conceito — acredita que seus anéis antirretrovirais (ARV) embebidos em remédio podem ser a grande aposta na batalha para deter a pandemia. Os anéis se destinam apenas ao mundo emergente. É a inversão do modelo tradicional de pesquisa e desenvolvimento, que cria medicamentos para o mundo emergente como uma forma de testes para os países ricos.

Publicidade

"A possibilidade de um anel que contém um microbicida e um contraceptivo no mesmo aparato seria o mais atrativo."

O trabalho da IPM é financiado por fillantropos como a Bill and Melinda Gates Foundation, que já concedeu auxílios de 130 milhões de dólares. Assim como o desenvolvilmento da pílula de progesterona e estrogênio combinados, sustentado nos anos 1920 pelas filantropas e sufragistas Margaret Sanger e Katharine Dexter McCormick, os microbicidas foram movidos a convicções políticas.

"Apesar do fiasco de géis microbicidas, ainda há muito interesse em anéis, pois contêm — em termos de contracepção — uma dose relativamente baixa, e o Nuvaring [anel contraceptivo já presente no mercado] é bem popular", disse Terri Walsh, diretora de pesquisa e análise do Conselho de Saúde na Família da Califórnia (CHFC), sediado em Los Angeles. Por fim, o plano é produzir um anel que previna tanto gravidez quanto infecção por HIV. "A possibilidade de um anel que contém um microbicida e um contraceptivo seria o mais atrativo."

Mas uma ideia que soa incrível no papel não necessariamente funcionará de fato entre quatro paredes. A camisinha feminina, por exemplo: especialistas em saúde sexual a defendem como uma medida profilática que confere à mulher o poder de se proteger mesmo quando um amante sem consideração se recusa a usar camisinha. Se é verdade ou não, ainda é incerto. O fato é que um homem pode se recusar a penetrar uma camisinha feminina assim como pode se recusar a colocar uma camisinha masculina — ou, em caso de estupro, pode arrancá-la, não?

Publicidade

Embalagens de uma camisinha feminina. Créditos: inga/Flickr (CC BY 2.0)

Mais importante ainda, a camisinha feminina costuma ter apenas 16% de aprovação em estudos clínicos. Conforme um marido de um casal de Los Angeles me contou quando eu estava fazendo pesquisas para um artigo sobre novos designs de camisinha, os preservativos femininos "são terríveis e merecem a reputação que carregam".

Será que as mulheres vão achar o anel incômodo ou desconfortável?

"Não tivemos problemas com nossas participantes usando o anel de dapivirine", disse Walsh, do CHFC, que conduz estudos para testar novas formas de contracepção (como estudos de "quebra e deslize" de camisinha em larga escala). Se considerarmos que o anel vaginal Nuvaring já é bem-sucedido no mercado, é razoável presumir que anéis de prevenção de HIV sejam tão confortáveis quanto.

Em que pé que está o estudo? "Todo mundo está prendendo a respiração", disse Rosenberg. "E no fim das contas, temos que lembrar que esses vírus apresentam mutações e se adaptam rápido, então ainda precisamos manter os pés no chão e não presumir que tudo foi solucionado quando o produto for lançado."

Em outras palavras: mesmo se o anel de dapivirine der certo, não será a última arma necessária na batalha para proteger as pessoas — mulheres em particular — contra o HIV.

"Assim como temos uma variedade de contraceptivos que mulheres podem escolher a gosto — pílulas, anéis, DIUs, diafragmas, injetáveis, implantes, etc. —, precisamos ter em mente que as elas também precisam de uma variedade de opções quando se trata de prevenção de HIV, pois cada uma tem necessidades diferentes", disse Annette Larkin, da CONRAD, que pretende colocar os anéis microbicidas na mão das mulheres (ou melhor, no cérvice) nos próximos três anos. "Atualmente não existem métodos de prevenção de HIV que mulheres possam usar quando bem entenderem. Por que NÃO deveríamos fazer esta pesquisa é a questão."

Tradução: Stephanie Fernandes